quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Agulha Revista de Cultura # 202 | fevereiro de 2022

 

∞ editorial | Taanteatro Companhia e Surrealismo

 


00 | Este terceiro número da série SURREALISMO SURREALISTAS é uma homenagem nossa à Taanteatro Companhia, em São Paulo, que tem à frente Maura Baiocchi e Wolfgang Pannek, de modo que a edição contou com a valiosa curadoria deste último, que também traduziu quase todos os ensaios.

 

01 | O horizonte deve conter a cilada de seus extremos. A travessia acidental dos desapegos. Tudo em sua pele será escrito como se fosse a feição triunfante do caos. Uma alegoria com suas faixas de extravios e a rebentação das águas que levamos em nosso íntimo. Os deuses insistem na decomposição das causas humanas, de modo que é preciso não deixar os corpos perecerem sob o selo das falsificações clericais. É preciso guardar o vigor que nos protegerá das sutilezas da moral. Manter abertas as portas para que o ar agitado do imprevisto circunde nossos corpos permitindo que as forças ocultas não cessem de buscar a rubrica de suas bênçãos. Eis onde viemos dar. Eis onde estamos. Não importam os mundos esquecidos, as chacinas na memória, os frequentes atentados contra a preservação do mistério. Há um furor mortal nos fanatismos que não devemos deixar invadir o palco de nossa representação da história. Ainda que toda escrita seja queimada, algo em nosso espírito deve se manter radiante como a fiação elétrica das descobertas incessantes. Pássaros ou serpentes, deuses ou vultos irreconhecíveis, não devemos temer o empirismo desde que ele não se limite a criar uma teia de ilusões. Os caminhos da eficácia não devem ser perturbados pelos falsos iniciados. Mesmo quando os vestígios de algumas civilizações são destruídos, devemos manter a irradiação do milagre. Recordemos com a sombra astral de Robert Charroux: O mistério não está na interpretação ou na influência caprichosa dos astros, mas na capacidade diferente de recepção dos indivíduos.

 

02 | Taanteatro – Uma conversa com Maura Baiocchi e Wolfgang Pannek

 

FM | Nada melhor do que o princípio. No caso de vocês, como se conheceram?

 


MB | Conheci Wolfgang em 1992 quando fui convidada ao ‘92 Butoh & Related Arts Festival, em Bremen, na Alemanha. Era a fase inicial da Taanteatro Companhia, fundada no ano anterior em São Paulo. Estávamos trabalhando no espetáculo O Livro dos Mortos de Alice, obra inaugural da companhia, quando recebi o convite do Freiraum Theater, que organizava o festival e onde eu já havia me apresentado em 1989 e 1991. No festival, que contava com várias estrelas do Butoh daquela época como Kazuo Ohno, Carlota Ikeda e Ko Murobushi, apresentei dois solos, Frida Kahlo: uma mulher de pedra dá luz à noite, no teatro e Variação em Negro, ao ar livre. Wolfgang estava na plateia de Frida Kahlo e nos conhecemos após a apresentação. Ele veio ao camarim me cumprimentar e dali seguimos para um restaurante onde todos os participantes do festival se reuniam após as apresentações. A partir daí não desgrudamos mais até o final do festival. Ele me acompanhou na oficina que ministrei e em passeios pela cidade. Foi amor à primeira vista ou talvez eu o tenha enfeitiçado durante a apresentação de Frida. O teatro de arena lotou, então ele e algumas pessoas sentaram no chão no corredor central da sala. No final de uma das minhas cenas eu depositava uma peça do meu figurino no chão do proscênio. Era uma capa que compunha o figurino da cena sobre o casamento de Frida com Diego Rivera. E como Wolfgang estava posicionado bem próximo do local onde a capa deveria ser deixada ao final da cena, suas pernas ficaram cobertas por ela. Essa grande capa, feita de um tecido dourado e renda, tinha uma função superimportante na coreografia e simbolizava alguns fatos ocorridos na vida de Frida Kahlo. Em um momento da coreografia, remetia ao terrível acidente sofrido por Frida no início de sua juventude. As descrições que existem sobre esse acidente dizem que ela foi encontrada quase sem vida, coberta de sangue e um pó dourado, desses usados em pinturas, que se desprendeu de potes que ela mesma carregava. Em outro momento a capa se transformava em um leito de núpcias. Tudo ao som de Fratres de Arvo Pärt, o que conferia à cena uma atmosfera lírica, romântica e trágica ao mesmo tempo. Assim foi o início de nosso romance, como num filme, muito especial.

 

WP | Na época eu trabalhava como editor de artes cênicas da revista Bremer. Escrevi sobre o festival e, depois de entregar meu artigo, vi que o desenhista gráfico ilustrou o texto com uma foto do espetáculo da Maura. Abaixo da foto havia duas fotos menores, uma de Ohno, a outra de Ikeda. Informei que a dançarina brasileira não era a atração principal do festival, mas aqueles artistas japoneses. "A foto dela é a mais bonita”, ele retrucou, e a imagem ficou. Logo depois, assisti ao seu espetáculo sobre Frida Kahlo. A sala estava lotada. Consegui um lugar no chão, no centro do proscênio. No final de uma dança com uma capa dourada, Maura lançou o adereço sobre minhas pernas onde ele ficou até o término da apresentação. A obra magnetizou a plateia e foi ovacionada. Esperei a saída da Maura do camarim, me apresentei e saímos juntos para um encontro de artistas. Na semana subsequente nos vimos todos os dias até o retorno dela ao Brasil. Na hora da despedida, eu disse a ela que eu não queria que nosso encontro terminasse assim. Ela concordou. Combinamos que eu fosse ao Brasil assim que possível. Encerrei meu trabalho na revista, tranquei a matrícula em meus estudos universitários, abandonei o plano de estudar teatro na Dinamarca e fiz alguns bicos para arranjar dinheiro. Dois meses mais tarde, cheguei no aeroporto em Guarulhos, onde fui recebido pela Maura. Ainda naquela mesma manhã, viajamos para Santos, onde ela realizou um trabalho no Sesc. Esperei na praia, ao lado da carcaça de uma tartaruga encalhada, e assisti a um jogo de futebol de areia. No dia seguinte, de volta a São Paulo, comecei a participar dos ensaios da Taanteatro Companhia.

 

FM | É conhecida a observação de Roland Barthes de que a fotografia, como o teatro, é uma encenação. Naturalmente penso que toda a criação é fruto desse princípio de encenação, pois não é outra a forma encontrada pelo homem de desentranhar seu caudal de pensamentos, sentimentos e intuições. Leio em texto do Wolfgang que a encenação de atmosferas de tensão exige o arranjo sensível da polifonia de forças e formas múltiplas, diversas e híbridas, que operam relações de reciprocidade. Encenação, sim, mas também observo no plano conceitual do Taanteatro essa concepção do teatro como imagem do mundo fenomênico, como entendia Juan-Eduardo Cirlot. Um teatro de exaltação da imaginação e de invenção permanente, como evoca Maura. Podemos saber um pouco mais sobre essa definição de vocês de um teatro coreográfico de tensões?

 


WP | À primeira vista, a proposição de Roland Barthes pode surpreender, pois na comparação entre fotografia e teatro, reparamos, de inicio, mais em seus aspectos distintivos, por exemplo, a bi-dimensionalidade, o estático, a mudez no caso da foto; a espacialidade, o movimento e a sonoridade por parte das artes performativas. Não me recordo dos argumentos de Barthes, mas a articulação artística de um determinado tema sempre pressupõe um arranjo espaço-temporal dos elementos de linguagem empregados e, num sentido amplo, é possível chamar esses arranjos de ‘encenação’. Ainda assim, existem diferenças importantes entre essas disciplinas.

As artes performativas são caraterizadas pela interpenetração energética e semiótica de dimensões, elementos e linguagens diversos: espaço, tempo, luz, corpos e objetos, movimento, som, imagem, texto etc. São artes múltiplas, heterogêneas e híbridas, e a encenação se alimenta dessa impureza. O processo de encenação exige eleger as forças e formas que devem integrar a performance de acordo com o seu tema, a compreensão e a calibragem das interrelações ou tensões intermodais entre seus elementos (por exemplo entre luz e som, movimento e cor) e a percepção qualitativa e dinâmica do próprio acontecimento performativo que surge através dos processos interativos e que se concretiza em contato com o público.

No taanteatro (ou teatro coreográfico de tensões) partimos da ideia das interrelações energético-semióticas entre todos os fenômenos da natureza e da cultura (e, consequentemente, das artes performativas) chamando-as de tensões. A partir desta imagem do mundo, avizinhada ao plano do dionisíaco em Nietzsche, tudo o que existe, vive, age e se comunica faz isso graças a sua participação de um jogo infinito de tensões múltiplas em constante transformação. Os corpos com suas intratensões se constituem em função de suas intertensões com outros corpos e ambientes, e vivem sob o efeito das infratensões sociohistóricas de seu tempo.

O princípio tensão transcende determinações meramente discursivas. Como denominador relacional comum, possibilita a conexão e mediação dos elementos mais heterogêneos na encenação. Empregamos o princípio tensão e a tipologia de tensões com fins analíticos e criativos, por exemplo, no desenvolvimento do movimento corporal e como ponto de partida da composição das linguagens de uma performance. Dessa composição intra, inter- e infratensões de uma performance, dança ou peça emana uma atmosfera tensiva que transcende seus componentes individuais e que influencia, enquanto ambiente afetivo, a qualidade da realização e recepção do acontecimento performativo.

O taanteatro não tem fixação ideológica, nem vínculo político-partidário, mas em função dos critérios apontados – multiplicidade, heterogeneidade, diversidade, hibridismo – se posiciona decididamente na contramão de qualquer tipo de totalitarismo, incluindo as tendências reacionárias recentes no Brasil e no exterior.  

Não almejamos criar imagens ou linguagens modelares de representação. Imagem e linguagem variam, ou podem variar, entre uma produção e outra, dependendo do tema, das circunstâncias sociopolíticas e das intenções artísticas. Mas dificilmente nos atemos à ideia de um mero mimetismo realista da vida social, mesmo que crítico. Gostamos de inventar imagens inusitadas, movimentos novos e dramaturgias desconcertantes que desafiam o imaginário e transcendem o senso comum. É certo que uma certa dose de concretude temática favorece o estabelecimento de uma relação mais contundente com o público, por acentuar a relevância da obra performativa em relação à experiência vivida de quem assiste. O devaneio lírico completamente abstraído da percepção cotidiana pode ser tão enfastiante quanto o excesso de fotorrealismo social. A interação entre reflexão crítica e imaginário poético atiça a tensão entre o real e o possível, e faz que com que o convite ao novo e à inovação, expresso por meio da obra, pareça motivado, não como propriedade ou privilegio do artista e de sua obra, mas como potencial de seu encontro com o público.

Curiosamente, muitos agentes culturais politicamente engajados defendem ainda a ideia de que o povo precisa e somente compreende histórias que mimetizam o cotidiano por meio de uma linguagem cotidiana. De acordo com essa ideia paternalista, classes sociais menos escolarizadas carecem de um imaginário poético não discursivo (e, por consequência, de seu poder transformador). Experiências nossas em teatros de periferia e de bairro, com espetáculos sobre Frida Kahlo, Nietzsche e Artaud, nos demonstraram o contrário.

 

FM | Me utilizo de uma das técnicas do Taanteatro e aqui distribuo as cartas de um questionário: 1. Quais os motivos da criação?; 2. Com quem buscam interlocução? 3. Como se sentem entre seus pares?

 

MB | Trabalho profissionalmente com dança, teatro e performance desde meados dos anos 1970. É certo que os motivos de criação evoluem ao longo dos anos, mas em meu trabalho sempre se fundiram uma percepção onírica do mundo em que vivemos com sua reflexão crítica.  Bumerangue, meu primeiro trabalho coreográfico com grande elenco, foi apresentado uma única vez no Teatro Nacional em Brasília, em 1981, e censurado na sequência por problematizar, de forma poética e documental, o militarismo e a liberdade de expressão na capital do país. Apesar de talvez não ser recebido dessa forma, meu trabalho sempre teve essa dimensão do político, mas expressa numa linguagem corporal e imagética poética que apela primeiramente à sensação e que desperta o pensamento como consequência da relação afetiva.

Em meu repertório e no da Taanteatro Companhia, há múltiplos exemplos disso: Quando somem as borboletas (1989) abordava a destruição do meio ambiente. Frida Kahlo: uma mulher de pedra dá luz à noite (1991) se aproximava de uma icônica artista comunista da América Latina. O Livro dos Mortos de Alice (1992) explorava a politicidade do inconsciente. Ironizamos as representações políticas e religiosas do poder em Arará - histórias que os ossos cantam (1997), tematizamos a situação de gente em situação de rua com Esperando Godot (2000), encenado como intervenção urbana. Tratamos da autopercepção histórica brasileira em Máquina Hamlet Fisted (2011) e enfocamos questões de gênero em Androgyne (2013) e em TRANS (2014).  A questão do colonialismo emergiu em Mensagens de Moçambique (2018). Retomamos a discussão do descaso ambiental em DAN devir ancestral (2009), como a criação de conceitos como ecorporalidade e ecoperformance, por meio do 1º Festival Internacional de Ecoperformance e o filme APOKÁLYPSIS (2021). E, conforme diz o teórico teatral Hans-Thies Lehmann, buscamos formular um "crítica abrangente da civilização” através de nossos ciclos de trabalhos dedicados à vida e à obra de Nietzsche e Artaud, realizados entre os anos de 1996 e 2016.

Do ponto de vista criativo, buscamos interlocução com pessoas de áreas como música, artes plásticas, artes performativas e audiovisuais, literatura, filosofia e ecologia – e de nacionalidades variadas. A Taanteatro Companhia sempre teve uma vocação transcultural e supranacional. Nosso elenco atual tem gente do Brasil, Alemanha, Moçambique e Argentina.

No diálogo com o público, nunca priorizamos um grupo específico definido por uma pauta identitária ou um critério sociológico. Nos apresentamos em todo tipo de teatro e espaço cultural, entre centro e periferia, bem como em ambientes alternativos, urbano ou natural. Isso implica também uma disposição comunicativa com todo tipo de gente, independentemente de origem étnica e nacional, social e econômica e orientações políticas, religiosas, filosóficas e sexuais.      

Creio que ganhamos algum reconhecimento de nossos colegas de profissão e junto aos setores da academia e da imprensa. O fato de a Taanteatro Companhia persistir por trinta anos no meio cultural brasileiro produzindo ano após ano, não somente coreografias e peças, mas também eventos, festivais e livros sobre nossa teoria e metodologia, acarreta inevitavelmente um certo respeito, mesmo que não haja identificação estética. Por outro lado, quase nunca escapamos de sermos percebidos como um “caso à parte”, conforme escreveu Nelson de Sá, em 1998, numa crítica sobre a nossa montagem de Homem Branco e Cara Vermelha, texto de George Tabori. E apesar de nosso trabalho ter sido contemplado várias vezes pelo fomento municipal à dança e por prêmios municipais, estaduais e federais, nunca tivemos grande proximidade com os artistas da dança desde que recebi a bolsa Vitae de Artes em 1991 para realizar o projeto Taanteatro: uma pesquisa para a transformação da dança.

O aspecto dinâmico e transformativo do taanteatro e a dificuldade de enquadrá-lo em termos estéticos colaborou, possivelmente, com seu status à parte no Brasil e fez proliferar trabalhos de TCC e de pós-graduação de estudantes de universidades de diferentes estados brasileiros. Também é interessante notar que nosso trabalho encontrou respostas muito positivas no exterior, tanto em relação ao meio artístico, quanto ao universo acadêmico, por exemplo, na Argentina, França, Austrália, Inglaterra e no Canadá, onde passou a integrar programas de estudos.  

 

FM | Há no Surrealismo uma espécie de eixo que permite raiz e movimento do Taanteatro, ou vocês diriam que há um móvel mais amplo ou distinto que os inspira?

 

WP |  É preciso levar em conta que os movimentos artísticos do início do século XX viviam experiências históricas muito distintas das atuais e nutriam expectativas extremas relativas a sua capacidade de intervenção social e política. Essas esperanças quase religiosas investidas nas artes perderam sustentação depois da Segunda Guerra Mundial e no decorrer dos empreendimentos pós-modernistas. Hoje, o valor da arte nos processos de formação e transformação sociais é reconhecido, mas a ideia de sua potência revolucionária se tornou muito mais modesta – micropolítica, por assim dizer. 

Apesar disso, existe por parte da Taanteatro Companhia uma certa afinidade com ideias, imagens e figuras caras ao Surrealismo, uma filiação sensível a uma tradição, ainda que de ruptura, à qual pertence o pensamento surrealista. Lautréamont, Artaud e Frida Kahlo tiveram impacto concreto na trajetória e no repertório da companhia, e, de forma mais difusa, as obras de Baudelaire, Rimbaud, Nerval, Jarry, Duchamps, Magritte, André Masson, Salvador Dalí ou Hans Bellmer fazem parte de nossa formação cultural.


A dança Butoh, criada por Tatsumi Hijikata, teve um papel preeminente no período de fundação da Taanteatro Companhia. Essa dança vanguardista japonesa absorveu influências literárias decisivas de autores como De Sade, William Blake, Lautréamont, Jean Genet e Antonin Artaud. Em Surrealismo e teatro coreográfico de tensões busquei detalhar a ressonância surrealista nas obras e nos métodos da Taanteatro Companhia. Resumidamente, trata-se de nossos projetos em torno dos Cantos de Maldoror e da vida e obra de Artaud, do “clima surreal” e do efeito onírico de nossas encenações, bem como de processos de formação e criação artísticas em que estados alterados de consciência exercem um papel importante. [1] O furioso apelo surrealista à imaginação inventiva e transgressora, em combinação com a ideia de que a arte seja algo que sempre está por vir, ou, como diz Artaud: "O teatro ainda não existe". Essa abertura ao futuro, essa crença na potência criativa da imaginação, típicas do surrealismo, caracterizam também nossa performativividade. Há, além disso, outras aproximações: o interesse em culturas ancestrais, em estados oníricos e alterados de consciência como material de criação, a vocação transcultural e internacional, o hibridismo midiático.

Admitindo de bom grado essas ressonâncias, é preciso deixar claro que o teatro coreográfico de tensões não está comprometido com nenhum programa ou código estético histórico em particular, incluindo o Surrealismo. O que nos separa do movimento artístico em torno de Breton é a descrença em verdades absolutas, sectarismos e atitudes papais. A Taanteatro Companhia atua numa outra fase da história e desenvolve concepções e práticas de autoria própria. Uma das forças motrizes do taanteatro, mais distante das aspirações bastante urbanas do Surrealismo, é o seu lado “eco”, expresso em conceitos e práticas como ecorporalidade e ecoperformance. Esse resgate ambiental no plano performativo manifesta-se, entre outras coisas, na organização do Festival Internacional de Ecoperformance. [2]

 

FM | Recorto aqui uma observação da historiadora Carolyn Butler Palmer, na qual ela diz que a dança desempenhou um papel integral na busca surrealista para recuperar verdades suprimidas pelo desenvolvimento da cultura ocidental moderna nos últimos quinhentos anos, concluindo que a arte baseada na perspectiva linear era um dos oponentes mais valiosos dos surrealistas. Estão de acordo? E como se verifica a aplicação dessa oposição no Taanteatro?

 

WP | Desconheço a obra e os argumentos de Butler Palmer. A partir de minhas leituras, eu não poderia confirmar que a dança – enquanto prática – tenha exercido um papel integral no período constitutivo e mais ativo do Surrealismo, isto é, entre o início dos anos 1920 e o final dos anos 1940. O movimento, o erotismo e o êxtase da dança estão presentes nas obras de Picasso, Max Ernst e Dalí. Mas o fascínio exercido pela dança vem desde as culturas antigas da África, Índia, China, Grécia; é uma constante da pintura medieval e é também um tema frequente das obras de Degas, Rodin, Toulouse-Lautrec, poucas décadas antes do Surrealismo. Quer dizer, a exploração das verdades libidinais da dança não é exatamente um privilégio surrealista.

Na história da dança dos séculos XX e XXI há múltiplas tentativas de exploração coreográfica do imaginário surrealista. Por exemplo, no caso de Dalí e Bellmer. Mas é importante ressaltar que a encenação de paisagens, atmosferas e figuras extraídas da produção visual do Surrealismo não é uma condição suficiente para se falar em dança surrealista. Tampouco podemos equiparar os exercícios de improvisação em dança contemporânea com o projeto da écriture automatique, sem levar em consideração se esses improvisos também estão imbuídos do estado de espírito e dos objetivos poéticos e políticos do Surrealismo. Talvez o Butoh de Tatsumi Hijikata seja a dança que mais se aproximou do Surrealismo, não primeiramente em termos formais, mas sobretudo metafísicos, ao criar uma dança que se propõe a explorar as trevas das pulsões corporais e da consciência humana. A linguagem curvada, torta e desacelerada do Butoh opõe-se também à linearidade apolínea citada por Butler Palmer.

A meu ver, é preferível evitar expressões grandiloquentes como “verdades suprimidas pelo desenvolvimento da cultura ocidental moderna nos últimos quinhentos anos”. Não acredito no valor de verdades supra-históricas e absolutas. Se a chamada cultura ocidental deu preferência a paradigmas culturais lineares em detrimento de paradigmas curvilíneos, ela não se reduz simplesmente à supressão de verdades, mas dedicou-se à criação de outras formas de verdade. O mesmo vale para a cultura oriental, se é que denominações e dicotomias generalizadas como ocidental e oriental ainda detêm algum sentido específico. É fundamental ter consciência crítica das imagens que norteiam nosso pensamento e nossas vidas, justamente para evitar que essas imagens se transformem em figuras sagradas e opressivas ou em oposições absolutas e mutuamente excludentes. Reta e curva, ambas são linhas possíveis que podemos explorar.

 

FM | Na magistral entrevista que Eugène Ionesco concedeu a Claude Bonnefoy, ele observa que sempre foi seu interesse denunciar certos delitos, logo destacando que esta talvez não fosse a função da arte, que deveria, segundo ele, a de tornar real o irreal, de suscitar o imprevisto. O que pensam vocês dois a este respeito?

 

MB | As observações do grande Ionesco ressaltam a tensão entre realidade e imaginação, entre crítica e criação. Assim, tocam na antiga relação entre o verdadeiro, o belo e o bom, ou seja, entre existência, estética e ética. Numa obra de arte, uma coisa não enfraqueceria a outra? Afinar artisticamente essa tensão entre o factual e o possível foi sempre desafiador. Mas creio que é possível conciliar com êxito essas funções ou características numa mesma obra de arte. E então, quando isso acontece, é o nirvana do criador. Hoje, com os avanços da experimentação artística e do hibridismo de linguagens, uma poética crítica não somente é perfeitamente viável, mas desejada e aceita, tanto pelo artista quanto por seu público. A contaminação entre as mais diversas modalidades de expressão – incluindo dimensões documentais e biográficas, corporais e discursivas, analógicas e digitais –, somada à crescente influência de correntes filosóficas atuais, colaboram para discutir a vida, no seu mais amplo sentido, à luz da arte, e para redimensionar a arte sob a luz do fator sociopolítico.

 

WP | Debates sobre a função da arte são motivados por tendências ideológicas, pelo horizonte epistêmico e por inclinações pessoais de um determinado locus histórico; e, muitas vezes, pela fusão inconsciente dessas influências. Da determinação de uma suposta essência da arte, deduz-se a sua função. É difícil encontrar uma definição filosófica inteiramente satisfatória do que seja arte e é improvável que a arte tenha uma função atemporal e única que independe do contexto sociohistórico de seu exercício e usufruto. Mas a ausência de um critério absoluto e definitivo da função da arte não invalida o valor das preferências culturais e individuais de um determinado período da história.

Conforme eu disse acima, a Taanteatro Companhia percebe seu trabalho artístico também como político – por exemplo, eco-político –, mas não como instrumento ideológico. Problematizamos questões como poder, colonialismo, gênero e meio ambiente, mas a denúncia nunca foi nosso foco. A mera denúncia investe numa linguagem ideologicamente fundada, linear, inequívoca. Com frequência, parte da pressuposição de deter um saber superior e consolidado, e estabelece entre artistas e espectadores uma relação assimétrica de transmissão desse saber. Talvez haja circunstâncias sociais excepcionais capazes de justificar essa abordagem, mas em geral, a denúncia artística sofre da fraqueza de antecipar suas respostas na formulação de seus questionamentos e por instrumentalizar não somente a arte, mas também o público. Em resumo, a denúncia está baseada numa visão anti-poética da arte sem interesse na criação do novo ou imprevisto no ato comunicativo. Não existe um modelo padrão de conciliação do poético e do político em arte e, a meu ver, não deve existir. Qualquer modelo, neste campo, tende ao totalitarismo e passa a exercer a função que afirma combater.

 

FM | Se pensarmos em três nomes relevantes da música contemporânea – Egberto Gismonti, Frank Zappa, Keith Jarrett –, podemos acompanhar os dois primeiros nos inúmeros arranjos de uma mesma peça, como uma obsessiva procura de sua melhor realização, enquanto que no terceiro, em seus concertos de piano solo, o que se verifica é o entendimento de que não se pode repetir uma performance. Isto me lembra o que disse Viktor Mazin da dança de Maura Baiocchi, que ela é imprevisível, que a sua gramática nunca se enquadra em uma escritura coreográfica reconhecível. Qual a orientação da construção de enredos e personagens, e a sua dinâmica ao longo das apresentações de cada espetáculo? A repetição, na criação artística, pode vir a ser um truque estético ou deve ser sempre evitada?

 

MB | Desde minha infância, tenho uma ligação muito forte com a natureza. Onde moro tem um jardim natural muito grande, com plantas da Mata Atlântica e um córrego. Todos os dias caminho   por esse pequeno paraíso e o observo detalhadamente. Repito o mesmo trajeto duas a três vezes por dia. Nunca me canso, nunca enjoo, a cada incursão descubro novidades, me deparo com imprevistos. Na natureza, essa dinâmica jogo de forças se repete, mas as formas que produz nunca são as mesmas. Minha dança e meu trabalho coreográfico são, por assim dizer, naturalmente dionisíacos. Oriento-me pelas forças que são prenhas de formas que, por sua vez, são prenhas de novas forças, e assim sucessivamente, repetidamente. Quando crio uma obra, não inicio o trabalho atraída pela exploração de uma forma pré-existente, um padrão ou ritmo pré-estabelecido, mas motivada pelas energias que subjazem às formas, fenômemos ou problemas. A repetição, na criação artística, pode possibilitar deleite estético, mas, se mal-empregada, pode causar fastio e desinteresse. Penso que o uso criativo da repetição em coreografias pode ser tão surpreendente e estimulante como acontece na música, por exemplo. 

Na música, o recurso da repetição foi levado às últimas consequências no serialismo e no minimalismo, diz-se que ambos influenciaram a música eletrônica e até mesmo o punk-rock. O minimalismo se caracteriza pela repetição, com pequenas variações, de frases musicais ou pela execução de um mesmo tom por um longo tempo, o que acaba por produzir melodias e ritmos hipnotizantes. Algumas composições são capazes de desencadear estados meditativos no ouvinte e até mesmo estados alterados de consciência e transe. Mas isso é algo que nossos ancestrais ao redor do mundo já experimentavam durante festas rituais. E a música, tanto instrumental quanto cantada, era inseparável da dança e vice-versa. Desde tempos imemoriais conhecemos e exploramos o potencial que a repetição de passos, coreografias, cantos, ritmos e melodias tem em concentrar e transbordar energias e, consequentemente, transformar pessoas. E isso serve aos propósitos das artes em geral.

As observações do escritor Vitor Mazin referem-se ao meu solo TRANS, apresentado em 2014 no Museo Freud dos Sonhos, em São Petersburgo. Na época, Mazin era diretor do museu e fiz o solo em função de um congresso psicanalítico que abordava a "monstruosidade" na vida contemporânea. Para fazer esse trabalho, não me dediquei a estudar e imitar as formas de fenômenos sociais que consideramos monstruosos, mas investiguei os processos energéticos que originam o monstruoso em meu corpo. Da mesma maneira, não me aproximo de personagens históricos em meus trabalhos, entre os quais Frida Kahlo, Nietzsche, Artaud, tentando imitar sua aparência e suas condutas. Claro que estudo suas obras e biografias. Mas não me interessa a mimese dessas figuras e de suas vidas. O que me interessa, a priori, são as forças que as moviam e de que maneira suas energias se atualizam em meu corpo ou nos corpos dos performers com quem trabalho.

 

WP | Apesar de sua problematização filosófica, por exemplo, em A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, de Walter Benjamin, a repetição nas artes performativas parece ser debatida com maior ênfase do que nos âmbitos das artes visuais e da música. Suponho que essa acentuação maior é devida à centralidade do corpo vivo na dança, no teatro e na performance. De um lado, e do ponto de vista formal, institucional e tradicional, as artes performativas repetem, isto é, reapresentam e reencenam a mesma coreografia ou peça, a mesma encenação durante uma temporada ou encenações diversas da mesma obra ao longo de décadas ou séculos. Por outro lado, no sentido de cumprir sua função essencial, espera-se das artes performativas a vivência de uma experiência singular. Reconciliar essas duas dimensões é um de seus maiores desafios.

Os exemplos citados, ao mesmo tempo eruditos e populares, da música – Gismonti e Zappa, de um lado; Jarret, de outro – exemplificam possibilidades de abordagem da repetição. A meu ver, devemos evitar a entronização de modelos normativos gerais – sempre repetir, nunca repetir, sempre variar –, para, ao invés disso, encontrar estratégias que convêm para cada artista e obra em questão.

No taanteatro, a questão da repetição está vinculada à relação entre as forças e as formas mobilizadas numa apresentação. Para conferir à experiência do acontecimento performativo uma dimensão singular, é preciso que as formas empregadas estejam em contato vivo com as forças que motivam a performance. A ausência desse vínculo torna a apresentação mecânica e estéril. Quando forças e formas se manifestam e beneficiam de maneira interdependente, sentimos a necessidade interior da obra e de sua apresentação. Para proporcionar uma experiência singular, a repetição precisa ser percebida como necessária e justificada em termos dramatúrgicos e performativos. Do ponto de vista dramatúrgico, a repetição deve exercer uma função estrutural e dinâmica, e do ponto de vista performativo deve ser repetida com intensidade atualizada.

 

FM | E como falamos em música, como ela coabita o universo em expansão da Taanteatro Companhia?

 

MB | Dança e música sempre coabitam e não é diferente no taanteatro. Sempre gostei de colaborar com músicos e no início de minha carreira, em Brasília, tive a oportunidade de conviver  e trabalhar com compositores como Jorge Antunes, Conrado Silva, Emílio Terraza, Rodolfo Caesar, João Rochael, e também a banda Akneton, de Celso Araujo. Posteriormente, no período em que estudei dança Butoh com Kazuo Ohno e Min Tanaka no Japão, conheci o compositor Kazuo Uehara, com quem colaborei intensamente em Tóquio e em São Paulo.

O grande obstáculo à colaboração com músicos, sobretudo ao vivo, é financeiro. Em geral, o mundo das artes performativas não tem os recursos necessários para pagar pelo trabalho de composição e execução musicais. Na ausência desses recursos, é preciso recorrer a obras musicais existentes. Na Taanteatro Companhia fizemos isso amplamente sobretudo com foco em música erudita clássica e contemporânea. Trabalhamos com músicas de compositores muito diversos: Franz Schubert, Mozart, Bizet, Liszt, Richard Strauss, Satie, Shostakovich, para citar alguns dos clássicos, e Arvo Pärt, Krzysztof Penderecki, Giacinto Scelsi, Edgar Varèse e Philip Glass, entre os mais contemporâneos.

Nos últimos anos, tivemos novamente a oportunidade de trabalhar com músicas e trilhas compostas especialmente para nossos espetáculos. A música eletroacústica de Conrado Silva em nosso ciclo Matéria, as composições de Vinicius Fróes Fialho para DAN - devir ancestral (2010) e Danças [Im]Puras (2012) e o trabalho musical de Gustavo Lemos para o espetáculo Artaud - 50 desenhos para assassinar a magia (2014), incluindo a trilha para a trilogia cARTAUDgrafia (2015), para Artaud, le Momo (2016) e para 1001 Platôs (2017). Com o ingresso do dançarino moçambicano Jorge Ndlozy em nossa companhia, o canto e instrumentos musicais como timbila e tambores passaram a exercer um papel importante em nossas encenações. Em DAN eu já soltava a voz interpretando El Payande, uma canção do folclore peruano-colombiano. E a partir de 2014 o canto passou a ser mais explorado por nós e o canto-falado tem estado bastante presente no plano sonoro de nosso trabalho mais recente, o filme APOKÁLYPSIS (2021). [3]

 

FM | Em meio às turbulências que enfrentamos agora, em plano político, econômico e, sobretudo, sanitário (sem esquecer o quanto que os dois primeiros elementos ferem a saúde mental de nosso tempo), remeto à inquietude de Kristen Bateman, citada por ti em ensaio que publicamos na Agulha Revista de Cultura, e indago: o quanto ainda estamos longe de “um novo estado de sonho”?

 

WP | O Surrealismo despontou entre duas Guerras Mundiais, quer dizer, entre atrocidades de dimensões industriais nunca antes vistas na história humana. A experiência do massacre de dezassete milhões de vidas humanas durante a Primeira Guerra Mundial e das desgraças socioeconômicas subsequentes abalou profundamente a crença nos valores e nas instituições burgueses do início do século XX. Na juventude artística daquela época despertou um espírito de revolta e, no caso dos surrealistas, também a esperança por uma vida verdadeira, um conhecimento da realidade supra-sensível, transcendente à realidade histórica. Essa esperança, entretanto, foi violentada por uma carnificina ainda maior, a Segunda Guerra Mundial. Desde então, há 75 anos, vivemos em territórios ocidentais um período prolongado não de paz, mas de cessar-fogo. Não em função de uma transformação espiritual da humanidade, mas porque “não pode haver vencedores numa guerra nuclear”. [4] À paz aparente somou-se em décadas mais recentes o temor da destruição das condições de vida na Terra, prospecto decorrente da poluição ambiental e das mudanças climáticas.

A indagação de Bateman diz respeito às ressonâncias surrealistas no mundo fashion contemporâneo. Deixando de lado a problematização de um surrealismo haute couture, podemos nos perguntar de que tipo de sonho ela está falando e quais motivos justificariam a esperança por “um novo estado de sonho” diante de um horizonte de ameaças apocalípticas. Hoje, o desencanto com as instituições é novamente devastador. Mas, na atualidade, o furor da juventude se manifesta em favor de políticas e práticas concretas e materiais, não em nome do direito ao devaneio, mas, primeiramente, voltado à preservação da possibilidade da vida biológica em nosso planeta. Apesar de raramente compartilhar do otimismo da crença na possibilidade de definição do destino humano através da reafirmação dos ideais do Iluminismo, como em Steven Pinker, ou da fé em um novo estágio evolutivo com base na taxa exponencial de progresso tecnológico, proferida por Ray Kurzweil, a juventude crítica atual também sonha com uma vida verdadeira e baseia suas esperanças no poder da verdade, um poder menos da arte, mas da razão, da ciência e da militância ecopolítica.

 

NOTAS

1. Cf. o artigo publicado em 5 de novembro de 2021 na Agulha Revista de Cultura: https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/11/wolfgang-pannek-surrealismo-e-teatro.html\.

2. Confira o website do festival: https://taanteatro.wixsite.com/ecoperformance?lang=pt.

3. Veja o filme APOKÁLYPSIS no canal Youtube da Taanteatro Companhia: https://www.youtube.com/channel/UCztS0CowPKVkaCNm-2Xy40w.

4. Cf.: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2022/01/crise-entre-russia-e-otan-faz-potencias-prometerem-nao-travar-guerra-nuclear.shtml.

 

03 | CANDELARIA SILVESTRO | Artista argentina nacida en Córdoba, en 1977. Expone desde el año 1998 en salas de arte, galerías y Museos públicos y privados. Su obra forma parte de colecciones públicas y privadas, nacionales e internacionales de Argentina, Brasil, Holanda, Estados Unidos. Desde el año 2000 colabora con la Compañía Taanteatro de Sao Paulo en la realización de escenografía, vestuario, video animación, objeto escénico y performer. Sus trabajos más recientes son una participación en el film internacional La Peste de Antonin Artaud junto a la Compañía Taanteatro, en 2020; además de una participación especial en el Festival de Ecoperformance 2021 (Compañía Taanteatro); una exposición de pinturas de gran formato inspirada en el paisaje de la Mar Chiquita “Bandada de Flamencos”; la performance Ophelia de Ansenuza, concepción, dirección y coreografía de Maura Baiocchi (Compañía Taanteatro); y participación en el filme Apokalypsis, dirección de Maura Baiocchi y Wolfgang Pannek – todo esto en 2021.


Una muy breve conversa que tuve con ella, Candelaria me dijo: En mi creación mantengo relación con el surrealismo desde la realidad concreta, desde el cinismo de la realidad, de cómo en la vida se presenta al mismo tiempo las dualidades, dicotomías, contradicciones, desde lo absurdo que inunda la realidad, el humor, la violencia y más aún lo que más me interesa lo extraño de lo ya conocido, el extrañamiento de este mundo de lo más íntimo y de lo compartido. Y luego hablamos de su experiencia con Taanteatro Compañía que ella así recuerda: En el año 1999 fue mi primera experiencia con la Compañía Taanteatro. Como espectadora de la obra Sustracción de Ofelia de Maura Baiocchi. Mi impresión fue muy distinta a lo que estaba acostumbrada… se me presentó la artista como una verdadera presencia, un espíritu, un cuerpo que irradiaba energía y luz más allá de su corporalidad. Su figura mutaba permanentemente como la llama de una bela, crecía, se hacía alta, se transformaba de niña a mujer, a hombre, a samurái. Tal vez todo eso estaba presente en el escenario y la belleza, la poesía. Su presencia estaba imantada y era extraña, distinto a todo lo conocido. Fue una fortuna ir a ver esa obra, casualmente. ¿Cómo no iba a intentar conectarme con ella? ¿Con su obra? Y esa gran artista aceptó el contacto y se inició nuestra relación, inmediatamente lo conocí a Wolfgang Pannek y se inició mi colaboración con la Compañía. Han pasado 20 años que colaboro y aprendo de ellos. De distintas maneras he estado presente en muchas de sus obras. Ha sido siempre algo muy particular ya que la colaboración no es nunca utilitaria sino desde mi obra, con mi identidad lo cual luego de cada trabajo vuelvo enriquecida. Y hoy luego de muchas experiencias valoro algo más aun de la posibilidad de trabajar con la Compañía, cosas muy importantes para el quehacer artístico; la continuidad, la permanencia, la pasión, el concretar siempre cada proyecto, cada obra.

 

Floriano Martins 

 

 

∞ índice

 

ANTON BONNICI | Uma crítica da leitura cinematográfica de Antonin Artaud’s The Theatre and the Plague

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/anton-bonnici-uma-critica-da-leitura.html

 

CÉLIA MUSILLI | Artaud: a arte, a solidão e seu sapato

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/celia-musilli-artaud-arte-solidao-e-seu.html

 

CELSO ARAÚJO | Os voos de Maura por e sobre Brasília

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/celso-araujo-os-voos-de-maura-por-e.html

 

CLAUDIO WILLER | Falar sobre Taanteatro

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/claudio-willer-falar-sobre-taanteatro.html

 

HANS-THIES LEHMANN | Um teatro radicalmente "verde"

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/hans-thies-lehmann-um-teatro.html

 

NOURIT MASSON-SÉKINÉ | Para Maura, uma humanidade inteira

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/nourit-masson-sekine-para-maura-uma.html

 

RODRIGO MARCÓ DEL PONT | Maura Baiocchi, a Taanteatro Companhia e o trabalho com a mitologia [trans]pessoal

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/rodrigo-marco-del-pont-maura-baiocchi.html

 

ROLF GERSTLAUER | Ecoperformance em Filme – A Alquimia da Matéria Transmutante [Reflexões prolongadas sobre o 1º Festival Internacional de Ecoperformance 2021]

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/rolf-gerstlauer-ecoperformance-em-filme.html

 

SHANE PIKE | Capoeira, Coca e Cachaça: experimentando novas técnicas de criação teatral com a Taanteatro Companhia

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/shane-pike-capoeira-coca-e-cachaca.html

 

TAANTEATRO | Quatro críticas: TRANS no Museo dos Sonhos; Artaud le Mômo em Paris (Victor Mazin, Florence de Mèredieu, Philippe Person e Guillaume D’azémar de Fabregues)

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2022/02/tanteatro-quatro-criticas-trans-no.html 

 



Agulha Revista de Cultura

Série SURREALISMO SURREALISTAS # 03

Número 202 | fevereiro de 2022

Artista convidada: Candelaria Silvestro (Argentina, 1977)

Traduções de Wolfgang Pannek e Vadim Nikitin

editor geral | FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com

editor assistente | MÁRCIO SIMÕES | mxsimoes@hotmail.com

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