Presentemente o Surrealismo acha-se em destaque em
toda a parte, principalmente nos Estados Unidos. Breton em 1914 definiu o surrealismo
como sendo automatismo psíquico puro pelo qual se exprime verbalmente ou por escrito
ou de qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento. É um ditado do
pensamento na ausência de todo o controle exercido pelo raciocínio e fora de toda
a preocupação estética ou moral.
Os surrealistas se ligam
as dois fantasmas do passado, os literatos Rimbaud e o conde de Lautréamont, este
último uruguaio, antepassados comuns do grupo, espantalhos derrotistas que movem
as manias presentes do grupo. O surrealismo é um dos movimentos mais interessantes
e mais sugestivos que tem havido na história da arte.
Os principais elementos do
começo do surrealismo são: Aragon, Baron, Boiffard, Breton, Carrive, Crevel, Delteil,
Desnos, Éluard, Gé- rard, Limbour, Malkine, Morise, Naville, Noll, Peret, Picon,
Soupault, Vitrac, e mais tarde os pintores Salvador Dali, Yves Tanguy, Valentine
Hugo. O surrealismo sofreu duas dissidências: uma dissidência de direita com tendências
a um plano artístico literário movido por Artaud, Desnos, Ribemont, Dessaignes,
e uma dissidência de esquerda com as exigências de um militantismo político e movida
por Aragon e Naville.
O surrealismo que ficou com
Aragon e Breton quer e espera a liberação do homem pela revolução. Breton estudou
medicina e psiquiatria e em 1918 desenvolveu esforços literários dirigindo as revistas
O surrealismo a serviço da revolução, A revolução surrealista, Literatura, e escreveu
diversos livros.
"O Surrealismo no começo
foi poético e artístico e tornou-se depois psicológico. Nós achamos que o surrealismo
é um processo de conhecimento. De 1919 a 1924 o lado social foi pouco desenvolvido
como mostram as publicações surrealistas".
Pedi a Breton falar sobre
a arte negra.
"A arte negra é uma
coisa que eleva.., nós já a encontramos altamente colocada em certos artistas. Ultimamente
insistimos sobretudo no lado poético da arte oceânica, mexicana, etc. O nosso interesse
dirigiu-se mais sobre as artes da Nova Guiné, Nova Irlanda, Ilha da Páscoa, etc.
muito devido ao caráter simbólico e poético dessas artes, o que as distingue da
arte realista e material, da arte africana. A arte africana procura dar à maternidade
uma colocação muito alta enquanto que a arte oceânica se utiliza de símbolos muito
gerais."
E a arte dos loucos e das
crianças?
"A arte dos loucos e
das crianças nos interessa porque ela não se submete a nenhuma disciplina moral
nem intelectual.., vem do inconsciente."
Falou-se em censura, na atitude
do poeta em face da revolução...
"A censura faz com que
as pessoas não compreendam o que fazem os artistas... a arte super-realista é puramente
automática, vem das camadas profundas do inconsciente.
O problema do conhecimento
é um problema independente do problema da ação e da propaganda social em geral.
Estou de acordo com o que disse Malraux no Congresso dos escritores soviéticos.
Não acho que a poesia deva se consagrar na hora atual a exprimir palavra de ordem
política.
O poeta pode militar numa
organização revolucionária, mas a expressão da palavra de ordem política é coisa
indefensável. Como vivemos numa sociedade burguesa é piada querer poesia proletária
porque a arte é afinal função do meio.
A arte automática fornece
uma grande documentação que pode ser útil à psicanálise.
Gostamos da arte automática,
não porque a achamos particularmente bela, mas porque fornece uma interpretação
psicanalítica que em si é bela."
Perguntei a Breton se achava
alguma relação entre as artes do negro, da criança, do louco e dos modernos...
"Existe uma relação
entre as artes do negro, da criança, do louco e dos modernos.., todos são privados
de censura."
Interroguei sobre o desaparecimento
da arte...
"Após a realização da
arte inconsciente teremos a crítica. As artes realistas têm uma tendência a desaparecer,
a poesia e a pintura estão em relação direta com a afetividade e não poderão desaparecer.
Uma das grandes razões que explica porque as massas não compreendem a arte moderna
é porque a arte moderna utiliza da sua faculdade de negação e não da sua faculdade
de invenção. O ciclo simbolismo, classicismo, romantismo se repete, o superrealismo
está localizado na parte romântica (ciclo de Hegel)."
Perguntei a sua opinião sobre
a arte abstrata.
"Sempre combati violentamente
os esforços do grupo abstração, acho que são incompreensíveis, e em contradição
total com tudo quanto sustento — a arte abstrata é mais uma coisa arquitetônica.
A arquitetura é uma das formas de expressão menos evoluída e significativa. Para
que se preocupar com arquitetura no momento em que o mundo começa apenas a mexer.
O surrealismo tem uma atitude antirreligiosa forte, as principais criações são produzidas
por pessoas anormais.., o mecanismo artístico é um de compensação."
(BRETON, André — "Surrealismo.
Entrevista a Flávio de Carvalho" — Cultura, a. 1, n? 5, São Paulo, fev.-mar.
1939, p. 9.)
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