∞ editorial | As
metáforas migratórias da existência
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EL CORAZÓN INCONTENIBLE DE LAS NOCHES Juana M. Ramos & Floriano Martins
LETRAS DEL FUEGO Susana Wald & Floriano
Martins
MEMORIAL DE LOS ABISMOS César Bisso & Floriano
Martins
HUESOS DE LOS PRESAGIOS Luis Fernando Cuartas
& Floriano Martins
LE MUSEE DU
VISIONNAIRE Berta Lucía Estrada & Floriano Martins
ENDECHAS DEL ÚLTIMO FUNÁMBULO Berta Lucía
Estrada
02 | 2024 é o ano em que se comemora a publicação do
Primeiro Manifesto do Surrealismo. Boa oportunidade para recordar muitas
coisas, a começar por algo que até hoje nos aflige e André Breton chamava a
atenção em seu texto: a ordem artificial
das ideias. O que talvez em 1924 fosse apenas o prenúncio de perigosa
configuração social, antevista por Breton, acabou se tornando o abrigo sinistro
do poder em todas as suas ramificações. Ele nos adverte que havia um imperativo
a ser seguido, o de remontar às fontes de
imaginação poética, como essencial defesa para se evitar o risco de uma
tragédia maior. O Surrealismo adentrou todas as cavernas, mesmo considerando
poucas ressalvas em relação a algumas delas, em especial o ambiente político,
mas de algum modo a imaginação poética não floresceu o suficiente para ir além
de simples diagnóstico da barbárie. É verdade que o verbo nos chega de muitas
vertentes, e que ainda hoje repercute na vidraça daqueles mais atentos a imagem
que tanto impacto provocou em Breton, a de um
homem cortado em dois pela janela. Graças a ela é que se manteve resistindo
aos estados debilitados da realidade a linguagem poética e seus incessantes
afluentes.
O Surrealismo atravessou a linha
demarcatória da geografia e da história, percorreu os mais intrigantes recantos
do tempo e do espaço. Até onde Breton, a princípio, não esperava, ou mesmo
permitia, que fosse, o movimento se tornou inesperado e mesmo avantajado,
vencendo resistências estéticas, ideológicas, morais. Esteve na Austrália, em
uma cultura atomizada por certo comedimento, onde causa polêmica a entrada em
cena de Max Harris que, em
1941, cria a revista Angry Penguins, de capital importância para a
entrada do país na modernidade e consequente difusão do Surrealismo na Oceania.
Antes disto esteve em Praga, primeiramente através de Josef
Šima, quando este, em 1921, teria passado a morar em Paris, seis anos depois
conhecendo alguns surrealistas, em especial René Daumal, no momento em que se
afastam do grupo em torno de André Breton envolvidos em uma polêmica que daria
por fruto a criação de Le Grand Jeu, disposto a manter vivo o Surrealismo o
mais longe possível da sombra do dogma que eles acreditavam ter sido estimulado
por Breton. E esteve também em terras chilenas, através do surgimento do grupo Mandrágora,
que manteve firme diálogo com as origens do movimento, e defendia a preeminência do Sonho sobre a realidade e
a transcendente realidade do Sonho. A rigor, hoje se pode montar um atlas
surrealista, acompanhando historicamente seus deslocamentos por todo o planeta,
desde que não nos limitemos ao balbucio daqueles que se empenharam em engessar
o movimento em algum bem travado escaninho do tempo.
Ao
comentar, no Primeiro Manifesto do Surrealismo, acerca de sua primeira
impressão lendo os manuscritos de Os
vasos comunicantes, essa experiência do que Breton designou como pensamento falado, ele nos revela uma
prioridade intensa que o texto sanciona, a de dar lugar a tudo que há de admissível, de legítimo no mundo: a
divulgação de certo número de propriedades e de fatos não menos objetivos, em
suma, que os outros. As perspectivas de um mundo marcado pelos excessos
racionalistas naturalmente levaram a muitas recusas do que os surrealistas
apresentavam em relação ao sonho, à liberdade total na criação, as experiências
com hipnose, o amor incondicional etc. Em 100 anos o planeta enfrentou as mais
graves crises, sem perder a obsessão pelas guerras, até a ameaça de extinção
provocada pelos danos climáticos. Tudo, no entanto, de modo muito lento, por mais
que a mídia, com seu circo de horrores, tenha se esmerado em dar mais
velocidade ao tempo. A tecnologia também acrescentou sua dose impecável, ao
mesmo tempo que ambígua, de celeridade. O pensamento, no entanto, este foi
freado, travado, de modo criminal, ao contrário do que tanto almejava Breton, e
a Robert Desnos se referia, encantado, como alguém que lê em si como em livro aberto, e nada faz para reter as folhas que se
desvanecem no vento de sua vida.
Eu
recordo Paul McCartney contando a gênese de sua canção Yesterday, escrita em
sonho. Ao acordar ele foi ao piano, e logo lhe veio a dúvida se aquela melodia
era mesmo sua. Mostrou a muitos, na expectativa de que alguém a identificasse,
até dizer a si mesmo: Então é minha, sem
nenhuma interferência do pensamento, eu pensei que isto não fosse possível.
A escrita automática nada mais é do que a criação em seu mais alto grau de
espontaneidade, o que os tempos sombrios ou acentuadamente mecânicos – quando a
alma se deixa aprisionar por um dogma, seja de ordem religioso, ideológico,
estético – impedem sua fluidez natural. Como bem recorda Breton, em outra
passagem de seu Manifesto, o surrealismo
poético dedicou-se até agora a restabelecer o diálogo em sua verdade absoluta,
isentando os dois interlocutores das obrigações de cortesia. Era preciso,
no entanto, dar esse escoamento mágico a toda a realidade, que os homens
aprendessem a libertar o espírito até a mais íntima expressão de uma verdade
que nos deveria irmanar a todos.
03 | Ilca Barcellos (Brasil, 1955) | Artista Visual, Graduada em Ciências Biológicas pela
Universidade Federal de Santa Catarina e mestre em Biologia Vegetal pela
Université Pierre et Marie Curie – Paris VI, por muitos anos foi professora de
biologia no Colégio de Aplicação da UFSC onde já recorria aos desenhos e às
formas orgânicas tridimensionais de seres vivos – representando organelas,
sistemas e organismos, em massa de modelagem – como recurso didático. Em 2006,
ingressou no campo artístico por meio da cerâmica, participando de exposições
coletivas nacionais e internacionais. Ampliando sua produção artística, explora
atualmente outros materiais – tecidos, espuma expansiva de poliuretano, EVA,
madeira, metal – e diversas linguagens – instalação, pintura, desenho,
fotografia, vídeo. Em seu processo investiga as possibilidades conceituais que tangem
um duplo percurso: científico e artístico; e busca indagar através de sua
produção a poética do pulsar, do devir. Participa de salões nacionais e
internacionais desde 2007. Em 2008 através do Salão dos Jovens Artistas de
Santa Catarina ganhou o Prêmio Aquisição do Museu de Arte de Santa Catarina –
MASC e em 2016 ganhou terceiro lugar do 1º Salão de Artes Visuais de
Navegantes, SC. Participou de residências artísticas no Canadá e Cuba.
A
intensa relação entre a criação artística e a biologia vegetal tem sido a
expressão estética levada por Ilca Barcellos a uma relevante perspectiva de
novos modos de percepção do objeto e da própria vida. Ao escrever sobre duas de
suas séries a própria artista nos deixa pistas suficientes para viajarmos com
ela: 1. LUDO TRANSGENIA Busca estabelecer uma primeira ponte entre a
arte e a ciência. Trata de apropriar-se de forma lúdica do conceito de
transgenia: mostra uma miríade de seres imaginários – cerâmicas escultóricas
resultantes da permuta de genes entre espécies diferentes. Estes seres híbridos
foram nomeados ludicamente de acordo com os preceitos da nomenclatura
científica. Cada indivíduo foi, portanto, classificado pelo binômio relativo ao
gênero e à espécie, escritos em latim. Por exemplo, Hippocampus saurus, Felix
crotallium, Papillyonida arboreum são os nomes científicos para: cavalo
marinho-lagarto, gato-cobra e mariposa-árvore, respectivamente. 2. ECOS DA PELE Propõe explorar o conceito de pele como metáfora da criação que emerge
da epiderme dos seres. Os trabalhos reunidos nesta série exploram, portanto, a
ideia de que da pele de um ser matricial – superfície da argila –, ecoam e
brotam embriões. Entre fissuras, ranhuras e circunvoluções, vislumbram-se novos
seres. Evoca-se, no fazer-se, desfazer-se e refazer-se, o processo dinâmico do
ciclo da vida. A pele surge como lócus de possibilidades que muda continuamente
a sua plasticidade.
Os Editores
∞ índice
ADELTO GONÇALVES | C. R. Boxer, um historiador como poucos
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/adelto-goncalves-c-r-boxer-um.html
ADRIANO
CORRALES ARIAS | Poesía y humanismo
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/adriano-corrales-arias-poesia-y.html
CLAUDIO
WILLER Por onde passamos é Brasil o que se mostra, III
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/claudio-willer-por-onde-passamos-e.html
ELYS REGINA ZILS &
FLORIANO MARTINS | No palco nu, com Antônio Cunha
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/elys-regina-zils-floriano-martins-no.html
FLORIANO MARTINS | Muy breve
conversación con Julia Otxoa
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/floriano-martins-muy-breve-conversacion.html
IRENE ANDRÉS- SUÁREZ | Esperpento
redivivo en la obra de Julia Otxoa
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/irene-andres-suarez-esperpento-redivivo.html
LUIS CARLOS MUÑOZ SARMIENTO | La
Fábrica de Sueños: Los siete samurais (1954), de Akira Kurosawa
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/luis-carlos-munoz-sarmiento-la-fabrica.html
MARIA LÚCIA DAL FARRA | Uma via feminina: Florbela,
Judith, Ada Negri e Marie Bashkirtseff
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/maria-lucia-dal-farra-uma-via-feminina.html
MÓNICA ZEPEDA | Sobre la
desesperación de Rilke
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/monica-zepeda-sobre-la-desesperacion-de.html
YULEISY CRUZ
LEZCANO | Tito Balestra, un poeta que donó pequeñas y perfectas flores poéticas
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/yuleisy-cruz-lezcano-tito-balestra-un.html
AS RESENHAS DA AGULHA | Libreto # 3
CLAUDIA VILA | Comentario crítico al libro Barajar la poesía, de
Alfonso Peña
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/claudia-vila-comentario-critico-al.html
MÓNICA ZEPEDA |
Susi Bentzulul. Cada vez estamos más cerca de ese día
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/monica-zepeda-susi-bentzulul-cada-vez.html
ALEJANDRA NANDAYAPA | Apuntes sobre
Al amor también lo devoró la luz, de César Trujillo
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/alejandra-nandayapa-apuntes-sobre-al.html
ADELTO GONÇALVES | Floriano Martins: a
prosa poética à flor da pele
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/adelto-goncalves-floriano-martins-prosa.html
LIZETTE ESPINOSA | Ejercicios de escritura, de Harold Alva. Un acto de fe
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2024/06/lizette-espinosa-ejercicios-de.html
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Agulha Revista de Cultura
Número 252 | junho de 2024
Artista convidada: Ilca Barcellos (Brasil, 1955)
Editores:
Floriano Martins | floriano.agulha@gmail.com
Elys Regina Zils | elysre@gmail.com
ARC Edições © 2024
∞ contatos
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