Assumo aqui, como leitora assídua de Herberto
Helder, o meu direito à incompreensão – prerrogativa de que me invisto no rol das
turbulências a que fico exposta diante das inebriantes vertigens dessa obra errática,
escorregadia e encantadora. A simultânea legibilidade que oferece, na medida em
que se expande irrequieta e retorna sobre si mesma em mutáveis remissões, escapulindo
à apreensão nesse perpétuo refazimento de um mesmo poema ininterrupto e contínuo
– deixa saber que a unicidade de qualquer leitura para aqui não é bem-vinda, já
que não pode fazer senão… errar. Texto aliciador, medusante e múltiplo, escrito
com e contra todos, aterrador na sua sedução hipnótica, refratário à paráfrase e
à apropriação linguística alheia – ele desautoriza o comentário crítico e expatria
de seus domínios qualquer impulso decodificador. Parece regê-lo uma espécie de conflito
de interesses entre o que diz e o leitor, de modo que este ocupa sempre o lugar
de um não-estar no interior daquele – fato que testemunha, por outro lado, a irremediável
solidão desta obra. [1]
No que lhe concerne, nós, os críticos, somos
ditos “abutres (…) entusiastas de cadáveres”, “marabundas da interpretação esfaimada”,
“estrangeiros” à obra, gente tagarela e coscuvilheira, fomentadora tanto do “falatório
cultural suplementar” quanto de “outros empreendimentos tribais”… Numa mais recente
versão (a que nos chega neste ano, via Servidões),
somos também ditos “bárbaros” avançando sobre a Alexandria, prontos a “devastar
a terra”, a desentranhar do texto “Deus” ou “qualquer espectáculo com cristos nus
e saltimbancos de feira”. Alçados já agora a prestidigitadores, temos acrescentado
à nossa atividade o epíteto de “burrocratas”, ao sabor da aversão momentânea da
obra pelos contemporâneos (mas para si sempre anacrônicos) sistemas literários e
instituições. [2]
Veja-se, no entanto, que, no esforço de apontar
para vocês o que nos diz respeito, faço-me presa das teias dessa linguagem. Acabo
me acomodando no molde que ela me destina, procedendo da forma como ela me induz.
Reparem que estou cedendo à tentação mimética da glosa e que me apego empaticamente
ao texto, tomando como confiável o seu parecer a nosso respeito – o que põe em causa
a minha competência hermenêutica, já que não guardo, entre mim e ele, a conveniente
e objetiva distância crítica. Ao contrário: curvo-me à sua vontade autobibliográfica,
que me guia pela soberania autárquica do universo paralelo que cria, e me boto à
mercê das leis que, periclitantemente, ele vai formulando ou desmanchando a seu
bel prazer.
Mas tiro disso uma lição. Por mais desavindo
que seja, o leitor é, para este texto, sempre a força marginal, parergonal, com
que precisa contar para fazer confluir para si (e como seu próprio) qualquer equívoco
alheio. Pois a obra de Herberto Helder não se ufana de, errando, nunca deixar de
acertar consigo mesma? Esboço, ao menos desse modo, o torturante contraditório que
esse texto institui, o regime de caos movediço em que nos submete por mero contato.
Pois foi nessa trilha incerta e derrapante
que (temerariamente) defendi em 1979 um trabalho que buscava conhecer as maneiras
como até aquela altura essa obra ia ganhando o silêncio que hoje conquistou. [3] A partir do exame de suas catorze primeiras
manifestações, naquela altura momentaneamente encerradas por Cobra (exemplo do livro em suspensão em que
toda a obra de Herberto Helder se converteria depois), me pareceu que essa escrita
brotava, por fim, duma operação alquímica sobre a linguagem, dum processo de depuração
e de esvaziamento dos signos que, dissolvendo e coagulando continuamente o poema,
conferiam-lhe a feição de algo intérmino e incontestável. Constelação movente de
palavras marcadas (sempre na iminência de serem), figurações pirilampas em incessante
reajuste, a obra de Herberto
Helder não deixava sequer vislumbrar (nessa então derradeira fase do seu processo)
o que subjazia ao que se cala e tem sentido, pois que se decantara a ponto de apenas
indiciar aquilo que a levava a tal mudez – sempre desarrumando-a de novo e de novo,
imparável. Ao longo desse ofício poético, o texto forçara a língua-mãe e cavara
nela a sua própria – esculpindo aí o seu território particular, o seu nicho.
Tal travessia se tornara possível porque essa
obra acionara aplicadamente o desmanche gradativo tanto da língua quanto da tradição
literária. Húmus, O Bebedor Nocturno, A Máquina de Emaranhar Paisagens encarnavam bem esse olhar diante do
passado literário. Da mesma forma, a partir pelo menos de Comunicação acadêmica, Kodak, Cinco canções lacunares e Os brancos arquipélagos, o empenho se dava
sobre a desconstrução da gramática, da sintaxe (que subtraía seus laços com a lógica),
do vocábulo, e até mesmo do alfabeto, numa ação contestatória que não se continha
nem mesmo sobre as letras, subvertendo também os sinais gráficos. De modo que, por
último, o poema se transformara em linhas, em climas, em partituras, em gás rarefeito,
mapas, intensidades, temperaturas, solicitando do leitor tão-só a sua companhia
e cumplicidade tácitas: uma espécie de quieta confraternização no mutismo.
Assim se, até aquela altura, o texto de Helder
comunicava algo, essa mensagem não passava, ao fim e ao cabo, da produção de alguns
vestígios sobre o funcionamento de suas formas de escrita impossível, de sua trégua
de vazio, dessa sua maneira específica de ficar quieto – inaugurando uma era de
descoberta de um novo mundo verbal (tenho vontade de dizer “atípico Lusíadas em registro mudo”), que não tinha
peso e nem nome. [4]
Tal linguagem encantatória, que contava apenas
com as propriedades rítmicas, sonoras e melódicas do significante, não se mostrava,
entretanto, ungida do luto ou do ofício fúnebre que a morte dos signos poderia porventura
lhe emprestar. Ao contrário: exultava de alegria, cumprindo-se como um canto de
regozijo próprio das grandes proezas. Afinal, ela coroava a vitória de Orpheu –
e a poética de Helder reencontrava, por essa via, o mítico, exatamente no limiar
da utopia que estivera todo tempo engendrando para si.
O retorcimento da linguagem (e, consequentemente,
do real que, intermitente, vai se apagando esmagado por esse mundo virtual), a prática
de tais crimes de lesa-escritura – cunhavam então, com o selo da “crueldade”, essa
contra-escrita já muito próxima do “idioma demoníaco” que Helder praticaria a partir
das décadas seguintes. [5] Por sua vez,
o Autor já há tempos desaparecera (como diz Fiama) “nos precipícios que são os textos”,
tendo morrido “imensamente a(ssa)ssinado”, ele próprio um assíduo “assassino assimétrico”
[6] – claro, com a contribuição direta
ou não da sua perene leitura de Camões, [7]
de Rimbaud, Artaud, Jarry, Nietzsche, por exemplo, e apadrinhado por um certo romantismo
alemão via Hölderlin. A lógica aristotélica, o racionalismo cartesiano ficavam agora
obnubilados por um diapasão de teor paleológico, que introduzia definitivamente
nessa obra o descentramento e a catástrofe. E a poesia de Herberto Helder ingressava,
pois, na sua decisiva “radicalização lírica”, abolindo a verossimilhança, o espelho
refletor, o mimetismo, os mecanismos argumentativos, a dialética, como também os
traços típicos do discurso: a ordenação temporal e espacial, a lógica sintática.
Ela se guia então pela contradição, pelos tropeços inesperados e súbitos, pela simultaneidade
de respostas, pela produção do múltiplo, pela concomitância de opostos – que, aliás,
jamais se socorrem da síntese dialética. Move-se no campo do acaso e das metamorfoses
arbitrárias, em pleno regime “demoníaco” – daquilo que é da ordem do excesso e do
entusiasmo, do ultrapassamento do que limita ou interdita, recolocando, através
do vazio e dos rearranjos sobre ele, tanto o pathos do terror quanto um novo sublime, recolhido no inaproximável,
no inacessível, no impensável, no indizível. Entre o mistério tremendo e o mistério
fascinante, ela se deleita com o impossível. Porque o poema, dúbio, propositadamente
afásico e claudicante, não se pronuncia sobre nada e, na língua que usa (e que desnaturaliza
a língua-mãe testando suas fronteiras, abalando os alicerces dela e ocupando seus
baldios) – ninguém ainda fala.
De maneira que ele despreza qualquer rentabilidade
cultural e sequer procura algum tipo de salvação. Aliás, tais horizontes nem lhe
são colocados, uma vez que a categoria sacrificial está extinta, e que os valores
e as hierarquias que antes porventura o norteavam não mais vigoram nessa nova constelação.
O texto de Helder quer tão-só expor o seu próprio desequilíbrio: confrontar-se com
o vazio, com o terror, mesmo sabendo que deles não pode escapar. Busca ser apenas
um lugar de linguagem, de ressonância, um espaço verbal onde o mundo acaba, renasce
e acaba de novo; onde a morte e a vida e a morte ocorrem sem nunca cessar. Nada
empreende demonstrar, nem conhecer, nem provar: quer apenas interrogar o silêncio,
fazer-se sede de agenciamentos e de metamorfoses – garantir sua existência coruscante.
Nem relativa nem absoluta, a língua em que
fala-não-falando é alterante, performática. E o texto anda à deriva, guiado por
mão canhestra, ao sabor de deslocações, permutas, modulações, analogias, desdobramentos
relacionais e seriais, num rigoroso turbilhonamento sem síntese, sem fim. Nele,
as palavras são só corredores circulatórios disponíveis para outra e outra palavra,
enquanto a figuralidade é um coletivo imagético que permite, numa escala mais ampliada,
tal expansão interminável, contínua, abrindo-se numa ventilação sígnica por todos
os cômodos e interstícios do poema. Esse o seu diafragma, a sua respiração – sua
ameaçada e relampejante existência.
Situei aqui esta pequena síntese sobre a obra
de Herberto Helder [8] para poder introduzir,
neste contexto, algumas cogitações acerca da sua mais recente produção – o volume
Servidões, editado em maio deste ano de
2013. [9]
Pra já, o fato de ter vindo à luz com a indicação
expressa de “única publicação” toma vários contornos. Tal decisão é semelhante,
neste aspecto, à da obra imediatamente anterior, A faca não corta o fogo que, depois de publicada uma única vez, em setembro
de 2008 e imediatamente esgotada, passa a integrar em 2009 (e provisoriamente, aliás,
como todos os volumes da obra helderiana) o Ofício
Cantante. Poesia completa. Ou seja:
a reescrita ou a revisita dos poemas de Herberto Helder por ele mesmo. [10]
Como já mencionei, a obra de Herberto se aplica
em apagar de si os traços de seu Autor: seja por meio da figuração que lhe oferece,
seja através da dramatização de outras autorias nela exibidas. Aliás, para uma língua
que não quer falar, não há sujeito (muito menos com nome ou figura civil) que ela
possa admitir como enunciador desse discurso situado em grau nulo. Da mesma forma,
e fiel a seu ofício, o cidadão Herberto Helder vive (em sintonia com o que produz)
ausente da cena pública literária, recusando (como é notório) prêmios e louvores.
Em suas raríssimas aparições, nunca de cunho pessoal mas sempre de lavra escrita
– como na Carta de Abril, por exemplo,
ou nas infrequentes entrevistas – é sempre a obra que fala nele, dissolvida a biografia,
que nunca é para ali chamada. Aliás, os únicos traços que dela vigoram se assentam
em sua escrita como insolventes, nela enraizados só enquanto formulação gramatical.
Nesse sentido, é provável que os pareceres críticos que constataram em Apresentação do rosto uma “autobiografia”
tivessem contribuído para a recusa deste livro no rol das obras do Autor. [12]
De resto, o perene apagamento autoral implica,
da parte de Herberto, não só uma fuga às estratégias do marketing mas também outras recusas: a de auxiliar a venda do seu produto,
a de se deixar manipular como autoridade diante da sua obra. Por isso mesmo, a decisão
declarada de uma “única edição” desse derradeiro livro aparecia aos olhos da crítica
atenta como uma heroica façanha contemporânea de reposição, sobre a sua poesia,
da aura perdida. Esforço baldado, no entanto. Esforço frustrado pateticamente pelo
cinismo da indústria editorial diante da obra, visto que, com exímia rapidez, ela
se apropria do livro, capturando-o como objeto de posse, fazendo triunfar nele o
seu valor de troca, de cota mercadológica. De maneira que essa desafiante edição
se esgota quase de imediato, consumida não só por leitores, mas pela pura especulação
comercial em torno da sua unicidade. E o mercado cultural sai vencedor, mostrando
aí, mais uma vez, a sua face mais perversa. [13]
Diante disso, julgo lícito perguntar se, dentre
as “servidões” sugeridas pelo título deste derradeiro livro, não estaria também
prevista essa. Quero dizer: há certamente embutida neste livro uma acepção concernente
a um serviço perene à poesia. Há também outra: a servidão camoniana da “tão curta
vida”, a da vassalagem à Dona, na tradição medieval, que é, aliás, um serviço de
amor – amor, palavra cuja emblemática se ostenta como a mais expansiva da poética
de Herberto. E há também a servidão “lenta” aos “episódios dessa guerra”, da qual
também se morre, como atenta Servidões.
[14]
Ora, o cativeiro a que nos submete o mercado
cultural (e sem o qual nenhum livro entra em circulação de leitura) – não estaria,
por antecipação, incrustado no vaticínio camoniano (aqui também implícito) “de servir
a quem vence, o vencedor”? [15] Não teria
o nosso Autor topado direta e duramente com esse “Senhor”, aquando da edição de
A faca não corta o fogo? E não estaria
ele agora, nesta última publicação, alertando-nos (desde o título) para essa insana
e inescapável “servidão”?
Notem que a epígrafe do livro parece insinuar
(tácita e decassilabicamente) essa desconcertante constatação acerca do mundo –
dos
trabalhos do mundo corrompida
que
servidões carrega a minha vida
?!
O fato é que Servidões revisita textos próprios, reapropria-se deles, dialoga com
eles e também com uma série de outras referências alheias, citadas ou sugeridas.
Procede assim com Edoi Lelia Doura, com
Cobra, com A máquina de emaranhar paisagens, com Apresentação do rosto, com Photomaton
& vozes, por exemplo. Também com Camões, Dante, Villon, Verlaine, Cesare
Pavese, Rimbaud, Goethe, Von Kleist, Cavafis, Issa etc. E, nesse diapasão, um dos
poemas chega mesmo a indicar “uma bibliografia dispensável” que envolve a obra de
Anthony Grafton, numa específica tradução: a de Antoine Fabre – Les origines tragiques de l’érudition. Une histoire
de la note en bas de page. O que puxa a atenção do leitor, de novo, para o limiar
da poética de Helder, para aquela zona dúbia onde se deposita o parergon, ou seja,
para aquilo que, estando no limite exterior, se encontra permanentemente em falta
no interior. [16] E, segundo creio, este
desenho, que desloca as hierarquias, não diz apenas respeito ao descentramento dos
poemas, mas também ao da própria obra. Segundo se lê na introdução em prosa de Servidões, é numa “espécie de nota que se
capta a razão inteira, no centro” e que todo “o livro vai sendo o seu prefácio,
e o posfácio, a inacessível e prontamente acessível evidência”. É provável que suas
razões estejam, pois, nesse entre-estar, na prega, no enxerto, no seu cólofon.
E os temas obsediantes da obra de Helder reaparecem
também aqui: a cabeça, o espelho, o amor, a mulher, o sangue, a morte, o leitor,
as cenas da escrita, bem como as marcadas palavras “ar” e “fogo”. Talvez estas últimas
insinuem, na fluidez e na combustão instantânea que atiçam, o sentido de urgência
que atravessa este livro, a sublinhada carência de tempo que, por vezes, esboça
uma poética do pouco, da carência, da economia, do espaço apertado, da míngua –
da “tão curta vida” camoniana.
Escritos “com sangue na esferográfica”, estes
textos, que se querem ora curtos ora longos, perfazem um livro de limiar, do agora,
do aqui, do tempo presente, expresso com uma intenção testamentária de “morte no
gerúndio”, de fim iminente, onde a “dor” comparece vigiada (ou administrada?) pela
ironia e pelo humor negro. O que ajuda a supor que estamos diante de uma obra escatológica
– tanto de fim dos tempos quanto na sua versão de emprego do obsceno e da auto-execração.
Leio um poema capaz de resvalar o que digo,
em que há um bizarro e mordaz ritual (talvez de purificação), uma liturgia mista
composta de extrema-unção, epitáfio, cremação e batismo, permeada pelo fogo e também
pelas águas: pelas imundas águas do esgoto que se misturam com as sagradas e primordiais
águas bíblicas –
cheirava
mal, a morto, até me purificarem pelo fogo:
e
alguém pegou nas cinzas e deitou-as na retrete e puxou o autoclismo,
resquiescat
in pace,
e
eu não descanso em paz nas retretes eternas,
a
água puxaram-na talvez para inspirar o epitáfio,
como
quem diz:
aqui
vai mais um poeta antigo, já defunto, é certo, mas em vernáculo e tudo,
que
Deus o receba como ambrosia sutilíssima nas profundas dos esgotos merda perpétua,
e
fique enfim liberto do peso e agrura do seu nome:
vita
nuova para este rouxinol dos desvãos do mundo,
passarão
a quem aos poucos foi falhando o sopro
até
a noite desfazer o canto,
errático
canto e errado no coração da garganta,
canto
que o traspassava pela metade das músicas
-
e ao toque no autoclismo ascendia a golfada de merda enquanto as turvas águas últimas
se
misturavam com as águas primeiras
O autor aqui dramatizado não se poupa, revisitando-se
amargamente como “sobrevivente ao desastre das artes”, num olhar angustiante sobre
si mesmo (matizado de azedume), embora trabalhe, assiduamente, um “esperançoso esperanto”
em “língua inexpugnável”, em “verbo arcaico indefectível cerrado”. Mas isso não
evita o movimento mais perceptível do livro, que é o de uma catábase, de descida
aos Infernos, que marca o seu feitio de une
saison en enfer pendendo já agora para
o silêncio de Harrar. É mesmo como se, no dizer de Manuel Gusmão, Helder ousasse
se despedir da língua; [17] ou como se
nela tecesse para si um ninho, um refúgio, trabalhando ali um lugar em que se possa
morrer. Que se possa morrer ou nascer, morrer e nascer: não esquecer que o cordão
umbilical, tão emblemático desta poética, é também aqui (oh Villon!) o “cordão de
sangue à volta do pescoço”, o que torna o poeta definitivamente disposto, “iminente”
– tanto para o nascimento quanto para a morte. [18]
Para além dos textos em prosa que abrem o
volume, comparecem, em Servidões, 73 poemas
que se seguem um no outro, no rumo do interminável e do incontestável (atributos
helderianos já anotados), e que também incluem aquela consabida sabotagem no interior
da língua. Misturam francês, inglês, italiano, alemão, brasileirismos; fazem passagens
abruptas de contextos discursivos e lingüísticos alterando a hierarquia da fala;
empregam graficamente o código espanhol para a interrogação; usam acentos diferenciais
para os vocábulos, como se inventassem para uso particular um acordo-ortográfico-do-eu-próprio.
Há, na interlocução interna desse livro, um
enlace maior com Apresentação do rosto.
Lá, celebravam-se os oito anos; aqui, celebram-se os 80. Lá, a ilha que mais tarde
conheceríamos como aquela “em forma de cão sentado” de Photomaton & vox [19]
(e que aqui, neste contexto, parece ser já a de Cérbero) – reaparece num retorno
em que tudo é outra coisa não reconhecível – mas onde, por fim, se identifica “a
vida subtil, unida e invisível (…) compacta e limpa. Gramatical”. A mulher, a mãe,
o inexorável, o não haver e haver remissão, a sobrevida, a inutilidade de tudo,
a representação do mundo como figura (como “tinta” camoniana), o presente, o futuro,
o morrer e o desmorrer, o balanço da vida, as determinações testamentárias, a vida
a partir do próprio esquecimento, o lavrar um livro – são motivos muito palpitantes
neste livro.
E faz espécie, em Servidões, o aparecimento de uma nova dramatização de persona. Segundo se constata no poema que
acabei de ler, Helder parece ter criado aqui, para enfrentar tais questões da auto-ironia,
da auto-depreciação, da aridez interior, da angústia, da paralisia da ação – uma
voz que lembra, em muito, a de um ácido Álvaro de Campos, o da última fase, aquele
para quem “a única conclusão é morrer”. [20]
Claro que se trata (para dizer o óbvio!) de uma versão absolutamente helderiana
e pós-moderna do heterônimo pessoano, composta num diapasão específico, ao sabor
de entrecortes, de saltos de registros, cunhada pelo idioma demoníaco de Helder
– mas cuja ressonância lembra muito a dicção e até uma certa prosódia de Campos.
É como se Helder tivesse encontrado, num disponível Campos, um outronímico de reserva
que, reatualizado na sua contemporaneidade e contingenciado com suas próprias feições,
pudesse cumprir agora a impossível missão de se defrontar sarcástica (e comovidamente!)
com a morte aos 80 anos.
No poema que leio, este Campos helderiano
procede como se invocasse as musas de Camões, cuja fórmula lingüística já comparecera,
aliás, em O amor em visita. Mas se, neste
livro inaugural invocavam a mulher (“Dai-me
uma jovem mulher com sua harpa de sombra”), no poema deste derradeiro livro, invoca-se,
por meio dela, o êxtase infernal e, como em Os
Lusíadas, não bem a inspiração, mas a “força” infernal e o “ofício” dos idiomas
na sua própria glória. Porque se faz aqui, num flash, a revisita e a atualização
(para a pós-modernidade) da Divina Comédia,
poupando o leitor dos seus “tantos capítulos”, e situando num outro registro, poético
e maldito, as estanques divisões do post mortem:
pensam:
é melhor ter o inferno a não ter coisa nenhuma
-
como a tantos tanto o nada os apavora!
eu
acho que o gênio da doutrina está nessa promessa exímia:
ninguém
que espere a eternidade
espera
o paraíso:
provavelmente
o paraíso é improvável como imagem, dêem-nos
algum
pouco do inferno, o bastante para
ocupações
gerais,
trabalhos
breves,
jogos
da mente,
jogos
distraídos,
jogos
eróticos talvez, os muçulmanos tiveram palpite disso,
e
os cristãos que receberam formação comercial, penso:
ia
pôr a mão no fogo, ia cortar uma orelha,
eu
que em mim sou obscuro, não, não,
então
recebe lá a minha prece quotidiana:
dá-me
o êxtase infernal de Santa Teresa De Ávila
arrebatada
ar acima num orgasmo anarquista,
a
idéia de paraíso é apenas um apoio
para
o salto soberano,
não
um inferninho brasileiro com menininhas de programa,
púberes
putinhas das favelas,
mas
o inferno completo onde passeia a Beatriz das drogas duras,
um
inferno à medida de cada qual dificílimo,
onde
se é evasivo,
subtilezas
desde o xadrez à física quântica,
à
poesia pura,
aos
fundamentos da levitação xamânica,
ao
sufismo,
ao
surfismo
?a
metáfora do fogo, de que argúcias e astúcias é ela rarefeita?
?e
a metáfora da água?
a
idéia de paraíso é muito brutal e louca,
e
o purgatório como purga é tão torpe, tão terrestre, tão trivial e trôpego,
tão
político,
tão
tenebroso!
não
resulta,
dá-me
esse inferno oh quanta força e ofício nos idiomas:
formar
uma estrutura estritamente poética
na
sua glória mesma,
só
com uma inteligência de duplos sentidos,
o
poema que pede mais que dez dedos,
nem
os braços lhe bastam e o coração ao meio,
e
os cinco litros de sangue com que se abraça tudo e se abusa do mundo,
e
o político e o cívico e o administrativo e o econômico-financeiro,
enfim
o ínvio,
para
que tantos capítulos?
oh
claros corredores ao longo das vozes a capella,
sim
sim, organizam a morte,
e
depois quem tem sorte entra pelo inferno dentro,
fulgurante,
poemático,
edições
os trabalhos do diabo,
post-scriptum:
meu
amor, o inferno é o teu corpo foda a foda alcançado,
e
lá fora eles cantando, os castrati, a capella, vozes
furiosamente
frias,
limpas,
devastadoras,
oh
maldita cocaína, musa minha, droga pura,
minha
aranha idiomática,
estrela
de cinco pontas, o fundo do ar ardendo,
e
os já ditos braços meus muito abertos,
e
entre os braços o já dito coração aos pedaços
always
toujours sempre
oh
pulsando
pulsando!
Os poemas que convivem com o fantasma de Campos,
os das edições “os trabalhos do diabo”, são menos curtos. Se pudéssemos reuni-los,
quem sabe poderiam compor uma grande ode à saturação diante dos desmandos do mundo,
numa escrita que nunca falece porque atravessa seus infernos próprios e seus íntimos
demônios, deles se alimentando. Tais poemas adotam, por vezes, uma fala cotidiana,
transportada, de súbito, para outros patamares que lhes transmutam por completo
a natureza. Há o uso, por vezes, de uma escrita desfavorecida que se embrenha neles
e os assalta, de repente, dessacralizando quaisquer laivos formais; por vezes surgem
estilhaços de odes, um tanto grandiloquentes, que se esfumam entremeados por uma
baixa expressão ridicularizante; por vezes deparamo-nos com fakes de odes, que fazem o elogio ao contrário
e cantam o desprazer e o aborrecimento, derivando para o calão. Se, por ventura,
se eleva súbito o tom do poema é para que se contraste com uma sórdida sublimidade
oriunda do baixo mundo, capaz de introduzir o insulto. [21] Tudo isso convive ao mesmo tempo nessa escrita. O que dá a impressão
de que, em algum momento desses poemas, brota de chofre uma flor monstruosa e aterradora
– talvez a welwitschia mirabilis do poema
48 – benéfica apenas aos escorpiões do deserto. [22]
Assim, num texto, o poeta almeja ficar amarrado
dentro de um “saco sem qualquer salvação nos armazéns obscuros”. Noutro, ele está
“mal, obrigado – e o sangue corre e escorre dentro e fora”. Noutro, “tudo acaba:
canção, talento, alento, papel, esferográfica”; noutro, “esta cabeça não é minha,
dizia o amigo, que me disse,/esta morte não me pertence”; noutro, ele segue “rumo
ao inferno que já em vida conhecera”; noutro, conclui-se que o mundo é “pequeno,/
mais pequeno com certeza que um poema de um verso único,/ universo”; noutro, ele
morrerá do seu “muito terror e da nenhuma salvação da” sua vida; noutro, pede que
deixem passar o cadáver pois que “a portagem foi já paga”; noutro, exige que não
nos esqueçamos apenas dele, mas de toda a sua geração, da “geração inteira/inclitamente
vergonhosa,/que em testamento vos deixou esta montanha de merda”, essa “merda eminentíssima”;
noutro, “nada tem retorno e tudo é dificílimo/(não só o máximo mas também o mínimo)”
– e daí por diante.
Há ainda muito, muito ainda para pensar e
escrever sobre este livro, compreendendo-o ou não. Mas, por ora, me despeço dele
e de vocês com este poema 65, que nos reenvia para um tanto do que tenho mencionado:
daqui
a uns tempos acho que vou arvoar
através
dos temas ar e fogo,
a
mim já me foram contando umas histórias que me deixaram meio louco furioso:
um
bando de bêbados entrou num velório e pôs-se à bofetada no morto,
e
riram-se todos muitíssimo,
que
lavre então a loucura, disse eu, e toda a gente se ria, até a família,
tudo
tão contra a criatura ali parada em tudo,
equânime,
nenhuma,
contudo,
bem, talvez, quem sabe?
talvez
se lhe devesse a honra de uma pergunta imóvel, uma nova inclinação de cabeça
-
à bofetada! –
fiquei
passado mas,
pensando
durante duas insônias seguidas,
pedi:
metam-me,
mal comece a arvoar,
directo,
roupas e tudo, no fogo
e
quem sabe?
talvez
assim as mãos violentas se não atrevam por causa da abrasadura,
porém
enquanto vim por aqui linhas abaixo:
ora,
estou-me nas tintas:
pior
que apanhar bofetadas depois de morto é apanhá-las vivo ainda,
e
se me entram portas adentro!
?Eli,
Eli?
um
tipo de oitentas está fodido,
morto
ou vivo,
e
os truques: não batam mais no velhinho,
olhem
que eu chamo a polícia, etc. – já não faíscam nas abóbodas do mundo:
vou
comprar uma pistola,
ou
mato-os a eles ou mato-me a mim mesmo,
para
resgatar uns poemas que tenho ali na gaveta,
nunca
pensei viver tanto, e sempre e tanto
no
meio de medos e pesadelos e poemas inacabados,
e
sem ter lido todos os livros que, de intuição, teria lido e relido, e treslido num
alumbramento,
e
é pior que bofetadas, vivo ou morto, pior que o mundo,
e
o pior de tudo é mesmo não ter escrito o poema soberbo acerca do fim da inocência,
da
aguda urgência do mal:
em
todos os sítios de todos os dias pela idade fora como uma ferida,
arvoar
para o nada de nada se faz favor, e muito, e o mais depressa impossível,
e
com menos anos, mais nu, mais lavado de biografia e de estudos
da
puta que os pariu
NOTAS
1. DIOGO, Américo
António Lindeza – Herberto Helder: texto,
metáfora, metáfora do texto. Coimbra: Almedina, 1990. Lindeza Diogo refere justamente
que o leitor parece ser o “nome” que o autor dá ao “não estar” (como completude)
na inteireza do texto (p. 61).
2. Respectivamente
em Nova, em Photomaton & Vox, em Carta
de Abril e em Servidões. Convencionou-se
chamar Carta de Abril à carta que Herberto
Helder escreve para Eduardo do Prado Coelho, datada de “Cascais, 6 de Outubro de
1977”, a propósito das alterações, quase individuais, efetuadas pela mão do Poeta
sobre os volumes publicados de Cobra – o
que o tornava “um livro em suspensão”, como bem o definiu e esclareceu Herberto
então. A carta foi publicada em 1978 pela Abril
n. 1.
3. Trata-se
da minha tese de doutorado defendida na Universidade de São Paulo em setembro de
1979, e publicada em 1986 pela Imprensa Nacional/Casa da Moeda de Lisboa, com o
mesmo título: A alquimia da linguagem. Leitura
da cosmogonia poética de Herberto Helder.
4. Estou me
referindo ao trabalho gradativo sobre a linguagem que o montante inicial da obra
poética de Herberto Helder até, pelo menos, 1977, vinha elaborando desde O amor em visita (1958): A colher na boca (1961), Poemacto (1961), Lugar (1962), A máquina de emaranhar
paisagens (1964), Comunicação académica
(1965), Retrato em movimento (1967), Húmus (1967), O bebedor nocturno (1968), Kodak
(1968), Cinco canções lacunares (1969),
Os brancos arquipélagos (1970), Antropofagias (1971) até Cobra (1977).
5. Sigo, aqui,
a acepção do “demoníaco” em Goethe, visto enquanto “energia positiva” em “absoluta
superioridade de potência”. O “demoníaco” se distingue “da negatividade do diabólico
e o concebe como qualquer coisa que não se manifestava senão através de contradições
e que não se podia, por conseqüência, traduzir, nem mais ou menos em palavra” (cit.
por LOPES, Silvina Rodrigues – A Inocência
do devir, p. 26). Acompanho também o conceito a partir da visão que Kierdegaard
lhe confere, visto que aqui se liga ao mutismo, à perda da palavra, ao silêncio,
à reticência, à sujeição voluntária à afasia, à falta de continuidade (muito embora
aparentando o contrário), à aparição do “súbito” como corte da mesmice contínua
– como o trata Chrétien (CHRÉTIEN, Jean-Louis – “Perdre la parole”). Segundo Sophie
Houdard, o “demoníaco” comanda, desse modo, “todos os caminhos do equívoco, da dúvida
e do erro”. (HOUDARD, Sophie – Les sciences du diable. Quatre discours sur la sorcellerie, p. 222.)
6. Verso citado
do poema de BRANDÃO, Fiama Hasse Pais – “Autor fragmento”. O texto de João Zorro. Porto: Inova, 1974. Em seguida, citação do
poema de HELDER, Herberto – “Retratíssimo ou Narração de um homem depois de maio”.
Lugar. Poesia Toda 1. Lisboa: Plátano
Editora, fevereiro de 1973, p.206. Em seguida, menção ao poema de HELDER, Herberto
– “Vocação animal VI”. Retrato em movimento.
Poesia Toda 2. Lisboa: Plátano Editora, 1973, p. 149, onde se encontra formulado
como “talento assimétrico de assassino” . Este texto integrara anteriormente “As
festas do crime”, de Vocação animal (Lisboa:
Dom Quixote, maio de 1971) às pp. 69- 71, e, antes ainda, “As palavras” de Apresentação do rosto, (Lisboa: Ulisseia,
Maio de 1968), às pp. 190-191.
7. Cf. o meu
“Herberto Helder leitor de Camões”. Revista
Camoniana 2ª. série, vol. 1. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
da Universidade de São Paulo, 1978, pp. 67-90.
8. Tenho me
referido, nessa rápida síntese, ao montante da obra poética de Helder posterior
a 1979: Photomaton & Vox (1979), Flash (1980), A cabeça entre as mãos (1982), As
magias (1987), Última ciência (1988),
Os selos (1990), Os selos, outros, últimos (1990), Do mundo (1994), A faca não corta
o fogo (2008), obras que fazem parte da edição de Ofício cantante. poesia completa (janeiro de 2009).
9. HELDER,
Herberto – Servidões. Porto: Assírio &
Alvim (Porto Editora Ltda), “edição única em Maio de 2013”.
10. HELDER,
Herberto – Ofício Cantante. Poesia completa.
Lisboa: Assírio & Alvim, Janeiro de 2009.
11. Helder
refere “insolvência biográfica”, na apresentação
em prosa de Servidões, à p. 12.
12. João Palma-Ferreira,
em “Os Passos em Volta, 3ª. ed., 1970”, na Colóquio/Letras
n. às pp. 92-93, refere Apresentação do rosto
como uma “autobiografia romanceada”, como “uma das mais corajosas e terríveis confissões
autobiográficos da literatura portuguesa”. Não só Palma-Ferreira, mas outros pares
também demonstraram igual opinião.
13. Antonio
Guerreiro, em “Herberto Helder poeta da aura”, em Ípsilon. Lisboa, 14 de junho de 2013, p. 10, reflete sobre essa questão
em termos semelhantes.
14. Doravante,
quando citar Servidões, indico apenas
as páginas respectivas entre parênteses.
15. Refiro-me
aqui a dois sonetos camonianos: primeiro, a “Sete anos de pastor Jacob servia”; e, agora, a “Amor é fogo que arde sem se ver”.
16. Cf. DERRIDA, Jacques – La dissémination. Paris: Seuil, 1972.
17. A frase
toda de Manuel Gusmão, citada por Luís Miguel Queirós em “Herberto Helder. A arte
de ser único” (Ípsilon de 14/06/2013)
é: “É como se Herberto Helder tivesse a audácia de se despedir de uma língua como
quem se despede de uma vida, num momento em que estamos sob ocupação política”.
18. Gastão Cruz refere, em
Última ciência, a “cristalização do cordão
umbilical” em “Leva um braço às costas” (p.251). CRUZ, Gastão – A vida da poesia, p. 251.
Além disso, refiro-me à “Balada
dos enforcados” de Villon.
19. Trata-se
do texto “(uma ilha em sketches)”. Photomaton
& vox. Lisboa: Assírio & Alvim, 1979, pp. 15-25.
20. O verso
pertence à “Lisbon revisited”, de 1923. Só para ficarmos à roda do Orpheu, lembro que, em Última Ciência, Gastão Cruz repara que a
essência barroca daquela poesia de então remetia à poética de Mário de Sá-Carneiro,
no seu “tão ostensivo culto da sumptuosidade das imagens: flores, animais, pedras
preciosas, tecidos, astros, percorrem esta poesia numa apoteose ininterrupta de
brilhos e de prodígios” CRUZ, Gastão – A vida
da poesia, p.252.
21. Os poemas
mais marcados por essa presença seriam os de número 11, 12, 13, 16, 17, 29, 32,
46, 47, 49, 50, 56, 57, 62, 63, 64, 65, 68, 71, por exemplo.
22. A tumboa
ou welwitshia mirabibilis, nativa do deserto de Nanibe, remete à Angola. Sua longevidade
atinge mais de mil anos; é unissexual; abre-se à noite respirando o orvalho e o
carbono que a alimentam, e fecha-se durante o dia. Transforma, assim, o carbono
(que asfixia) e a aridez (inóspita) em vida longeva; suas folhas atingem mais de
dois metros.
*****
MARIA LÚCIA DAL FARRA
(Brasil,
1944). Poeta e ensaísta. Autora de livros como Livro de auras (1994), Livro
de possuídos (2002) e Alumbramentos (2012). Página ilustrada com obras de Ana Mendoza (Venezuela), artista convidada
desta edição de ARC.
*****
Agulha Revista de Cultura
Fase II | Número 26 |
Abril de 2017
editor geral | FLORIANO MARTINS |
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editor assistente | MÁRCIO SIMÕES
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revisão de textos & difusão |
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ALLAN VIDIGAL | ECLAIR ANTONIO ALMEIDA FILHO | FEDERICO RIVERO SCARANI | MILENE MORAES
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