Em 1984, logo após publicar Uivo, Kaddish e outros poemas de Allen
Ginsberg, fiz o prefácio da edição brasileira de Os Subterrâneos de Kerouac
(editora Brasiliense, tradução de Paulo Henriques de Britto). A intenção era colocar
alguns pingos nos ii, diante dos evidentes equívocos na recepção das traduções
de autores beat no Brasil. Mas o texto vai além, e dá um perfil de Kerouac.
Continua valendo. Por isso, digito-o e o torno disponível através de Agulha
Revista de Cultura. O que vem a seguir é, quase tudo, reprodução integral.
As alterações mais importantes se referem ao verdadeiro lugar de ação de Os Subterrâneos
(em Nova York, e não em San Francisco, onde Kerouac havia situado esta narrativaà
clef), e a estudos biográficos sobre ele, posteriores à escrita deste prefácio
(mas que corroboram minhas hipóteses e interpretações).
*****
Para muitos comentaristas,
Os Subterrâneos é a narrativa mais tipicamente beat de Kerouac. Seria
a melhor descrição de como foi a vida daqueles marginais, poetas e poetas-marginais
do final da década de 1940 e início dos anos 50, em Nova York e, logo em seguida,
em San Francisco e pelo mundo afora.
Era uma vida subterrânea mesmo, pois ainda não havia acontecido o “estouro”
da beat, sua transformação em fenômeno literário e comportamental, abrindo
caminho para a contracultura e as rebeliões juvenis da década de 1960, e convertendo
seus escritores em personagens públicos. Isso só ocorreria mais tarde, depois da
publicação de Howl and other poems (Uivo e outros poemas) de Ginsberg
(em 1956) e de On the Road (Pé na Estrada) de Kerouac (em 1957). A
ação antecede, portanto, em alguns anos a entronização e coroação de Kerouac como
“rei dos beats”, honraria que ele nunca quis, conferindo-lhe uma fama que
não havia pedido, e um tipo de notoriedade que só contribuiu para sufocar seu talento
e destruí-lo psicologicamente.
Kerouac foi realmente um beat? Ele mesmo manifestou dúvidas a respeito,
em seu período de reclusão que durou de sua crise em 1961 até sua morte em 1969.
Certamente, tinha divergências de fundo, no plano da política e da moral, com Ginsberg
e outros de seus companheiros. Além disso, sua literatura “de estrada” – On the
Road, Os Subterrâneos, Tristessa, The Dharma Bums, Big
Sur, Desolation Angels, Lonesome Traveller – corresponde a um
dos aspectos de sua obra, a uma das facetas de seu enorme talento como narrador
e renovador da prosódia. Na mesma medida, sua atuação como participante da geração
beat equivale a uma fase da sua vida e a um dos aspectos de sua complexa,
múltipla e contraditória personalidade. Passou pela beat, deixando sua marca,
como etapa da aventura que foi sua vida, um dos momentos de sua trajetória pessoal,
talvez um dos passos de sua via crucis.
Kerouac foi, na verdade, um romântico extremado e radical; e sua vida, um
percurso em busca do impossível: a concretização de seus ideais, de uma ética da
pureza, a ressurreição de seus personagens queridos, a recuperação do tempo perdido,
da infância idílica, da inocência original do ser humano, da vitória sobre a morte.
Nesse percurso, viajou por seu país e por outros lugares do mundo, viveu e atuou
intensamente, para, ao fim, fechar-se em copas, recolher-se até morrer, isolado
e incompreendido, aos 47 anos de idade.
A publicação de On the Road no Brasil suscitou a previsível polêmica
sobre seu valor literário e sua importância. Chegou-se a falar em modismo e volta
aos anos 50. E até mesmo em “inútil exumação”, em um de nossos suplementos literários.
Nada a estranhar: a polêmica o acompanhou por sua vida, e continuou depois dela.
Mas é importante assinalar que o reconhecimento da contribuição de Kerouac e a atenção
dada à sua obra só têm crescido, desde sua morte. Hoje, nos Estados Unidos e em
outros lugares, Kerouc é mais lido e melhor lido. Contribuiu para isso a publicação
póstuma de sua mais extensa e inspirada obra, Visions of Cody, em 1972. E
a maior atenção à sua obra evocativa, em que fala da infância e juventude: Doctor
Sax, Maggie Cassidy e Vanity of Duluoz.
Tais livros não nos revelam “outro” Kerouac. Apenas ampliam a compreensão
de sua obra e sua personalidade. O destaque dado a Kerouac como “beatnik” talvez
tenha algo de um modismo ultrapassado; mas não o interesse pelo Kerouac escritor.
Este continua e permanecerá. Tanto assim, que a bibliografia a seu respeito, os
estudos dedicados à sua vida e obra, tem aumentado do começo dos anos de 1970 até
hoje. A biografia pioneira por Ann Charters é de 1973; do mesmo ano, Kerouac’s
Town de Barry Gifford e Visions of Kerouac de Charles E. Jarvis. Há outro
Visions of Kerouac, por Martins Duberman, de 1977. Allen Ginsberg escreveu
sobre ele Visions of the Great Rememberer, de 1974, e em inúmeras outras
ocasiões. De 1976 é The Naked Angels de John Tytell, sobre o trio constituído
por Kerouac, Ginsberg e Burroughs. De 1978, o interessantíssimo Jack’s Book,
de Barry Gifford e Lawrence Lee, um livro-colagem de depoimentos a seu respeito.
E há muito mais. Entre outros títulos mais recentes, Memory Babe de
Gerard Nicosia, de 1883, para William Burroughs (e para mim) a mais completa das
biografias de Kerouac. O volumoso Subterranean Kerouac, de Ellis Amburn,
é de 1998, e faz incidir o foco sobre a vida sexual de Jack, sobre sua homossexualidade,
em uma interpretação logo contestada pela escritora Joyce Johnson, por sua vez ex-namorada
de Kerouac. Há ainda o depoimento de Carolyn Cassady, Off the Road, e sua
participação em biografias de Allen Ginsberg, como a de Barry Miles, e de William
Burroughs, como a de Ted Morgan. Já houve filmes. Vem aí mais um, por ninguém menos
que Coppola. Etc.
Foi o biografável por excelência. Personagem de si mesmo. Atrai-me, dessas
biografias, Visions of Kerouac de Charles E. Jarvis. É uma obra oportunista.
Aproveitando a estada de Jack em Lowell, sua cidade natal, pouco antes de morrer
na Flórida com um buraco no estômago de tanto beber, bem como o fato de serem conterrâneose
terem sido colegas, Jarvis se pôs a transcrever os delírios do alcoólatra terminal.
Registrou uma voz crepuscular, literalmente vinda das sombras, pois Kerouac, metáfora
viva, já não suportava a luz e preferia ficar na penumbra de uma sala com venezianas
cerradas. O segmento final da hipérbole traçada por sua vida é mostrado com lente
de aumento, na plenitude do que contém de trágico e de patético. Jarvis e Kerouac
caminhando à noite por Lowell, reencontrando lugares da infância e juventude: duas
assombrações percorrendo uma cidade fantasma.
Tudo isso também favoreceu a recepção de Kerouac, como escritor e não apenas
como protagonista de um enredo que tem algo de folclórico e circunstancial. Contribuiu
para o exame do valor e importância de Os Subterrâneos dentro do conjunto
de sua obra. Sabe-se que seu caso amoroso com “Mardou Fox”, que se transformou em
triângulo envolvendo Gregory Corso (Yuri Gligoric no livro), tendo ainda como participantes
da história Allen Ginsberg (Adam Moorad) e Lawrence Ferlinghetti (Larry O’Hara),
ocorreu no ápice do período mais agitado e criativo de sua vida, de 1951 a 1955,
quando, além de viajar sem parar, escreveu onze de seus livros. Segundo a lenda
criada ao redor da rapidez de Kerouac para escrever, este teria sido o mais espontâneo
de seus textos: logo após terminar o caso com Mardou, mandou-se para Long Island,
onde morava “Memère”, sua idolatrada mãe, trancou-se no sótão da casa, e escreveu
suas 111 páginas “em três noites de lua cheia, em outubro de 1953”.
Há exagero nessa história da velocidade de Kerouac para escrever. Sabe-se
que On the Road não foi feito apenas em três semanas, mas sim em duas etapas,
com boa parte refeita depois, em uma sucessão de copidesques para atender editores.
Chegou-se a sugerir que o verdadeiro On the Road, em sua integridade, seria
Visions of Cody. Mas, de qualquer modo, Os Subterrâneos está em primeiro
lugar na escala da rapidez. E, por isso, como obra especialmente representativa
de sua “prosódia bop”, do estilo criado por ele. São jorros de linguagem, blocos
compactos de texto misturando relato, evocação e reflexão, indo e vindo no tempo,
dentro dos mesmos longos parágrafos. Valendo o paralelo com o jazz, este é um livro
com uma batida acelerada e muito “swing”. E um exemplo bem-sucedido do que buscava:
levar para o papel o fluxo da consciência, a sucessão de imagens e idéias. E, principalmente,
fruir o som e o ritmo das palavras, os valores fonéticos e prosódicos da língua
falada. Procurou criar uma literatura orgânica e animada, um texto sobre a vida
que, por sua vez, fosse vivo e pulsante.
Ginsberg tinha razão ao falar em “ioga da palavra” ao referir-se a essa fruição
das palavras como ritmo e sonoridade, desligadas de seu sentido imediato. E também
estava correto ao mostrar como Kerouac trazia, integralmente, sua “pessoa” para
o texto. Não só a mente pensante, a consciência reflexiva, mas a pessoa como totalidade:
suas paixões, emoções, nervos e carne. E Kerouac tinha plena consciência disso.
No começo de Os Subterrâneos, fala de sua “egomania” como dificuldade para
narrar (em uma narrativa escrita em três noites...), assim ironizando a idéia de
uma literatura “impessoal”, derivada de Eliot e dominante entre os formalistas da
época. Sua contribuição foi decisiva para recuperar o sujeito, a fala do narrador,
a primeira pessoa na criação literárias, com reflexos não só na ficção moderna,
mas no jornalismo participante praticado a partir dos anos 60, com Tom Wolfe e outros.
Por restaurar o sujeito em sua integridade, Os Subterrâneos é um livro
que tematiza o amor e no qual está bem presente o erotismo. É coerente a inclusão
de uma homenagem a Wilhelm Reich e sua teoria do orgasmo, na época, uma proposta
avançada. Junto com Tristessa (escrito em 1955/56) e Visions of Cody
(de 1951), é um dos seus livros mais ousados no tema. Tristessa é a história
de um caso amoroso com uma moça mexicana, traficante, “contato” de seu amigo Bill
Garver em Cidade do México. Visions of Cody tem como núcleo narrativo a famosa
relação a três envolvendo Jack, Neal Cassady e sua mulher Carolyn. Em Os Subterrâneos,
o caso é com Mardou Fox, negra, pirada e drogada, ex-internada, sob tratamento,
desorganizada, caótica. Nesses dois livros – Os Subterrâneos e Tristessa
– entra fundo no tema das drogas. Seus personagens tomam benzedrina e anfetamina,
puxam fumo e, como pano de fundo, comparece um drogado ilustre, William Burroughs
(Frank Carmody), além de ser evocada sua mulher, Joan (Jane), viciada em benzedrina,
morta acidentalmente (ou não?) pelo marido com um tiro na testa, no México, em 1951.
Drogas atraíam Kerouac mais como tema que como material de consumo. Exceto ocasionais
fumadas (como as deste livro e do final de On the Road) e a benzedrina como
estimulante, preferia mesmo a bebida, principalmente vinho licoroso, que acabou
por destruí-lo, transformado em alcoólatra irrecuperável, e provocando a hemorragia
no estômago que o mataria em 1969, na Flórida, aos 49 anos.
Kerouac foi uma personalidade dividida, e isso se reflete em sua relação
com as mulheres. Só conseguia ter dois tipos de relação. Um deles, breve, intenso,
sensual, com figuras atípicas, excêntricas, marginalizadas, discriminadas, como
Mardou, Tristessa e a mexicana Terry de On the Road. Outra, com alguém que
fosse um prolongamento de sua mãe e de sua família, como Stella Sampas, que foi
sua namorada de juventude em Lowell, com quem se casou em 1962 e viveu até o fim,
ambos cuidando de “memère” Gabrielle. Seus dois casamentos anteriores não duraram,
juntos, mais que um ano; o primeiro, de 1945, com Edie Parker, dois meses.
A mesma divisão aparece em outros aspectos e momentos de sua vida. Sempre
escolhia os extremos. De duas uma: ou a agitação das festas e reuniões beat
de Nova York e San Francisco, as viagens frenéticas pelo país em companhia do loquaz
e acelerado Neal Cassady; ou então, a reclusão e o silêncio, como no final de Dharma
Bums(1957), relato de seu retiro como eremita por dois meses em Desolation Peak
(Pico da Desolação – quem trabalhou lá como guarda florestal foi Gary Snider). O
tema é retomado em Desolation Angels, escrito antes de Dharma Bums,
porém relatando fatos posteriores, na sequência da mesma peregrinação budista. Foi
mesmo um solitário, e não por acaso um de seus livros se chama Lonesome Traveller,
viajante solitário. A fama, depois de 1957, com o sucesso de On the Road,
o perturbava tremendamente. Não se sentia ajustado à imagem de arauto beat,
ao que as pessoas esperavam dele, a começar pelo fato de não ser mais o rapaz retratado
em On the Road, cuja ação transcorrera dez anos antes (o livro bateu um recorde
de fila de espera em editoras – sete anos, do término até sair). A vida como marginal
inédito se adequava mais a ele: na condição de escritor famoso, era obrigado a conviver
com uma sociedade com a qual pouco tinha a ver.
Dois níveis de incompreensão o incomodavam e confundiam. Um, a mitificação
do escritor-viajante, esquecendo que, ao mesmo tempo, também escrevera sua obra
evocativa (o “ciclo de Lowell”), além de seus poemas (Mexico City Blues e
San Francisco Blues), além de um texto budista, The Scripture of the Golden
Eternity, e doBook of Dreams, transcrição de sonhos. Outro, da crítica:
como On the Road teve uma acolhida triunfal e se tornou um best-seller, resenhistas
e críticos sentiram-se na obrigação de abordar suas obras seguintes com especial
rigor, apontando defeitos, mostrando o quanto eram inferiores, mais fracas que a
primeira. Esteve entre dois fogos: aquele da criação de um mito Kerouac, por alguns,
e a tentativa de destruição desse mito, por outros.
Seu último livro da fase “de estrada”, Big Sur, é o relato dessa crise.
Mais uma vez, tenta isolar-se, na casa de praia de Lawrence Ferlinghetti. Ao chegar
lá, a solidão o incomoda; tem um ataque de delirium tremens, alucinações
nas quais combate demônios, e o livro termina com a visão de uma cruz aparecendo
no oceano, sua reconciliação com o catolicismo. Mas a crise já vinha de antes. Sua
ida a Tanger e à Europa em 1957, relatada em Desolation Angels, só lhe provocou
tédio e sensações de vazio. Em The Dharma Bums, tentou mudar o estilo, passando
a usar frases curtas, com mais ênfase no relato dos acontecimentos, e menos no seu
fluxo de consciência. Por isso, é o livro preferido por muitos: trata-se de sua
obra mais “fácil”, linear e discursiva. Suas viagens depois de 1956 foram uma busca
cada vez mais errática, cujos objetivos iam se distanciando.
Seu biógrafo Charles E. Jarvis achou que Os Subterrâneos constar como
seu relato mais fiel e confessional, e ao mesmo tempo o mais beat, não passava
de “uma monumental ironia”. A fidelidade é relativa, como aliás em toda a criação
literária. Há um depoimento de Gregory Corso (para Jarvis), segundo o qual Mardou
Fox não tivera tanta importância assim: havia sido mais uma transa, uma eventual
companheira de cama de Kerouac. O testemunho ajuda a entender o processo criativo
de Kerouac. Mardou foi protagonista de Os Subterrâneos, não por sua importância
como caso amoroso, mas como símbolo.
Dostoievskiano, Kerouac procurou a santidade no submundo. Seu uso recorrente
das expressões “santo”, “santidade” e “celestial” não é apenas um recurso literário,
mas a expressão de sua obsessão. Proustiano, queria recuperar o passado, transformar
suas memórias em algo mais concreto, através de textos que foram uma invocação ou
um exorcismo. Leitor de Céline, sabia ser preciso mergulhar fundo em seu tempo,
para descrevê-lo com traços precisos. Fascinado por Whitman e Rimbaud, queria a
amplidão das viagens e aventuras. Herdeiro da tradição de Jack London e Melville,
sentia a atração pelo infinito mar. Por isso, foi trabalhar na Marinha Mercante
em 1943, e escreveu relatos melvillianos de viagem. Assim como os personagens de
Melville, ou de Kafka, sentia-se oprimido pela burocracia e pela vida regrada: não
aguentou o Exército (foi dispensado como paranóico) nem a disciplina da universidade
(foi expulso de Columbia). Queria outra realidade: mas, ao contrário de seus antecessores
do século XIX, não a encontrou nas viagens. Não havia mais paraísos idílicos a serem
descobertos. Buscou o Outro, mas sempre acabava se defrontando com a máscara imutável
do Mesmo.
Jack Kerouac reviveu um dos mitos fundadores da literatura: a volta às origens,
a reconquista do tempo primordial. Para entender melhor sua busca, bem como a constelação
simbólica sobre a qual repousa sua obra, é preciso voltar à sua infância em uma
comunidade de “canuks”, franco-canadenses católicos radicados em Massachusets. Este
era seu verdadeiro mundo, que idealizava e procurava recuperar. Tanto é, que, dentre
seus romances, seu preferido era Visions of Gérard, onde foi mais longe na
evocação e busca do que perdera. Assim como, para muitos comentaristas, sua obra
mais interessante é Doctor Sax, igualmente evocativo, mas alegórico, desdobramento
de um sonho relatado em On the Road, o combate de um mago, inspirado em William
Burroughs, contra a serpente mítica do Mal.
A vida de Jack Kerouac transcorreu sob o signo da perda e da solidão. Perda
de seu irmão Gérard, morto aos quatro anos de idade, e, em sua obra, símbolo da
inocência, paradoxalmente projetada em Neal Cassady, delinqüente e devasso, mas
que, para Jack, era um santo. Perda de sua língua natal, o dialeto franco-canadense
(só foi falar inglês na escola). Na década de 1930, seu pai Leo perdeu sua gráfica
e suas posses me uma inundação. Seu melhor amigo de infância, George Sampas (irmão
de sua mulher Stella) morreu na guerra. É como se a inundação do rio Merrimack em
1936 fosse, simbolicamente, uma correnteza levando embora seus entes queridos, sua
língua natal, seus amigos e seus laços comunitários. Sua obra foi uma tentativa
de nadar contra essa correnteza, contra o Tempo. Uma viagem impossível, que o consumiu
e esgotou. A correnteza acabou jogando-o na margem. A crônica de seus últimos anos
é patética: sempre bêbado, dialogando com fantasmas, repetindo variações do mesmo
monólogo.
Jean-Louis Lébris de Kerouac, Jack para o mundo, não foi o único derrotado
na vida e vitorioso na criação literária. Essas contradições, impasses e paradoxos
não são apenas um drama pessoal. Sua obra, por mais particular que fosse, também
é universal, espelho de todos nós. Em cada um de seus leitores está, talvez adormecido,
o beat aventureiro e o adulto que deseja recuperar a infância. A luta e derrota
contra o Tempo, a contradição entre o sujeito e seu mundo: aí estão temas que não
são exclusivos de Kerouac, porém o fermento da criação literária, aspectos dessa
coisa contraditória que é a própria condição humana.
*****
Aline Daka é artista visual, ilustradora
e quadrinista. Formada em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da UFRGS com passagem
pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, em Portugal. É ilustradora
da (n.t.) Revista Literária em Tradução,
curadora do Suplemento de Arte e atualmente
publica em parceria com Vicente Pietroforte a HQ Eunice mora no penúltimo andar na página web da Pararraios Comics.
*****
Organização a cargo de Floriano
Martins © 2016 ARC Edições
Artista convidado | Aline
Daka
Imagens © Acervo Resto do
Mundo
Esta edição integra o projeto de séries especiais
da Agulha Revista de Cultura, assim
estruturado:
S1 | PRIMEIRA ANTOLOGIA ARC
FASE I (1999-2009)
S2 | VIAGENS DO SURREALISMO
S3 | O RIO DA MEMÓRIA
A Agulha Revista de Cultura teve em sua primeira fase a coordenação editorial
de Floriano Martins e Claudio Willer, tendo sido hospedada no portal Jornal de Poesia.
No biênio 2010-2011 restringiu seu ambiente ao mundo de língua espanhola, sob o
título de Agulha Hispânica, sob a coordenação editorial apenas de Floriano Martins.
Desde 2012 retoma seu projeto original, desta vez sob a coordenação editorial de
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