CLAUDIO
WILLER | A
discussão do surrealismo hoje convida
a rever cronologias. A presença surrealista não é compatível com uma história
da literatura, das artes plásticas e do pensamento que descreva o século XX literário
e artístico como série cronológica, uma sucessão de movimentos e tendências
artísticas. Aliás, o modo como o século XX é descrito nos manuais acaba por
desembocar em aporias, absurdos lógicos. Aceita a ideia de uma série de
vanguardas (cubismo, simultaneísmo, futurismo, dadá, surrealismo, etc),
chega-se a categorias inconsistentes, como a de pós-modernidade, e a uma
intensa discussão ao redor de falsas questões. O mercado de arte acreditou
nessas séries, adotou-as e acelerou seu andamento, engendrando modismos,
prejudicando a recepção de obras de qualidade, e acabando por imitar o
marketing dos produtos de consumo e seu fetichismo da inovação.
Pode ser mais produtivo
entender que, ao longo do século XX, houve (ao menos em literatura) duas vigas
mestras, surrealismo e formalismo, em uma polaridade que apresenta semelhanças
com outras, anteriores: simbolismo e parnasianismo na segunda metade do século
XIX, românticos e clássicos no início daquele século, e talvez os barrocos e
clássicos nos dois séculos anteriores (por mais que ambos, formalismo e
surrealismo, houvessem nascido no mesmo solo simbolista). Muito
aproximativamente, seriam variantes do apolíneo e dionisíaco? Ou de
racionalismo e misticismo?
A partir do agora, do
que vemos hoje (se quisermos prestar atenção, é claro), mudam as noções do que
é passado e presente. Já observei isso em outras ocasiões: no plano da
história, dez, vinte anos, um quarto de século, equivalem a quase nada ou a bem
pouco. Esclareço: se periodizarmos o século XIX desse jeito, como série
cronológica de movimentos, então o simbolismo teria que ser datado de 1883, com
o manifesto de Moréas. Rimbaud, o Rimbaud hermético e inovador de 1871-73,
estaria fora, seria quando muito um precursor; igualmente, a poesia de Tristan
Corbière e de Laforgue. E uma parte importante da obra de Mallarmé, inclusive Um lance de dados, corresponderia a um
simbolismo tardio, ou tardo-simbolismo. Portanto, na periodização estreita,
análoga ao modo como são descritos movimentos artísticos do século XX,
simbolismo teria tido uma duração de no máximo uns quinze anos, até a morte de
Mallarmé. Na outra, iria desde a adoção das correspondências baudelairianas por
Verlaine e Mallarmé, na década de 1860, até a década de 1930, com Rilke e
Yeats; portanto, com setenta anos de existência, e isso, sem contar o modo como
o surrealismo, de um lado, e o formalismo de Pound e Eliot, de outro,
absorveram e incorporaram o simbolismo.
Voltando ao surrealismo,
e tocando no meu caso específico, e de alguns amigos e contemporâneos: ao
promovermos reuniões surrealistas em 1963, e até antes disso, e ao escrever
textos com afinidade ou identidade com surrealismo (é importante frisar:
reuniões, grupo, são algo complementar, o que importa é a produção, a poesia de
cada um), estávamos sintonizados com manifestações contemporâneas. São do mesmo
período, em termos históricos, o surrealismo português, que teve Mário Cesariny
como principal animador e vai de 1947 a 1963 (ou até hoje, se levarmos em conta
a significativa produção afim ao surrealismo em Portugal); movimentos
hispano-americanos, principalmente o Techo
de la Ballena venezuelano, de 1963; e o grupo surrealista norte-americano
com Franklin Rosemont, também iniciado na década de 60. Um poeta surrealista da
melhor qualidade, como Raúl Henao, nascido em 1944, é rigorosamente nosso
contemporâneo. E há outros mais recentes ainda, cronologicamente.
Tudo isso desmonta
esquemas, diagramas, séries cronológicas, tentativas de circunscrever
surrealismo a uma duração temporal determinada, bem como a idéia de um
surrealismo tardio ou tardo-surrealismo. Por isso, a duração ou extensão
temporal do surrealismo sempre acaba por ser revista pela crítica: primeiro, ia
até a década de 30; depois, até o final da Segunda Guerra Mundial (é a
cronologia de Maurice Nadeau, por exemplo); em seguida, até a morte de André
Breton em 1966 e a auto-dissolução do grupo ou movimento surrealista francês em
1969 (sustentada, entre outros, por Jean-Pierre Schuster, legatário de Breton).
E o presente, o surrealismo vivo e atuante, acaba por ser negado, por não se
ajustar a essas periodizações.
Essa revisão cronológica
e, principalmente, de categorias, também leva a rejeitar a ideia, apresentada
por Schuster, Courtot e outros, de um surrealismo eterno versus surrealismo histórico, supostamente encerrado. [1] Se algo é “eterno”, não pode ter
começo, marco inicial. E o surrealismo tem um início cronológico, que pode ser
localizado entre 1916, quando Breton conheceu Jacques Vaché, e em seguida
Aragon e Soupault, 1919, com a eclosão da escrita automática, e 1924, com o
primeiro Manifesto do surrealismo. Em
outras palavras: xamãs e construtores de totens em sociedades tribais, gregos
participantes de rituais iniciáticos e subterrâneos, gnósticos licenciosos e adamitas,
líricos trovadorescos, visionários da renascença, românticos místicos e
exaltados, simbolistas herméticos, surrealistas, são o que são. Têm sua
especificidade, embora haja afinidades, analogias, possíveis continuidades.
Relacionam-se com contextos distintos. Falar em “surrealismo eterno” equivale a
afirmar que é tudo a mesma coisa, em uma generalização redutora.
No período mais recente,
de 1969 até hoje, há tendências e manifestações ligadas ao surrealismo que
merecem atenção. Uma delas corresponde ao que eu chamaria de surrealismo
universitário. Um dos marcos pode ser o estudo de Michel Rifaterre, aplicando
semiótica ao surrealismo. O maior interesse por surrealismo no ambiente
universitário, entre pesquisadores e teóricos da literatura, tem relações com a
atuação de um Centre de Recherche sur le Surréalisme, dirigido por Henri Béhar,
do C. N. R. S. Personalidades que faziam parte do grupo ou movimento encabeçado
por Breton, e que se institucionalizaram, passando a dedicar-se à ensaística e
pesquisa acadêmica. Não por acaso, dos 44 redatores do substancioso Dictionnaire général du Surréalisme et de ses
environs, [2] a grande maioria foi
de professores universitários, e nove pertenciam ao C. N. R. S.
Ao mesmo tempo, há um
surrealismo militante, a apresentar-se como Movimento Surrealista
Internacional, constituído por grupos e núcleos em diversos lugares. E, pelo
que consegui entender da leitura do recente A
estrela da manhã – surrealismo e
marxismo de Michel Löwy, [3] um
porta-voz desse surrealismo militante, inclusive de suas entrelinhas, a relação
entre ambos, surrealismo militante e universitário, é idiossincrática.
Pessoalmente, não vejo
razão de ser para esse antagonismo. Estudos mais técnicos e acadêmicos sobre a
obra de Breton, Desnos, Péret, Cesariny etc., podem ser parciais, unilaterais,
por vezes redutores. Mas também podem mostrar a riqueza dessas obras, sugerindo
o quanto ainda há para ser lido, interpretado, entendido. É a impressão que
tive ao ler um ensaio como Les surprises
de L’Amour Fou, de Jean-Luc Steinmetz. [4] É um trabalho tipicamente universitário, de um scholar, utilizando um instrumental da
teoria literária que inclui noções como a de intertextualidade e inconsciente
do texto, mas que me expôs algumas camadas a mais de sentido e algumas
possibilidades adicionais de interpretação de uma obra como O Amor Louco de Breton. O mesmo vale
para o que li de outros pesquisadores e estudiosos acadêmicos: Jacqueline
Chénieux-Gendron, Anna Balakian, Mary-Ann MacCaw, Michel Rifaterre etc. E também
o trabalho monumental de Marguerite Bonnet, inclusive na preparação da Oeuvre Complète de Breton para a coleção
Pléiade da Gallimard, e que começa na universidade (seu André Breton –
Naissance de l’aventure surréaliste [5]
foi inicialmente apresentado como tese). Mas isso, observando que também há
crítica e pesquisa de qualidade sobre surrealismo não necessariamente vinculada
à universidade.
Quanto ao surrealismo
militante, por mais que se concorde com a precedência da relação com o mundo,
da visão de mundo e do homem, de um pensamento especificamente surrealista, não
o reduzindo a uma “estética”, a uma doutrina da arte, mesmo assim, não adianta:
tem que haver criação, produção artística, literária, até mesmo ensaística, que
seja de qualidade, original, e não recaia na repetição, no mero chavão. Não
havendo, é inútil proclamar-se surrealista, apenas para repetir as idéias e
propostas de Breton e de outros dos seus pensadores e ideólogos.
Mas, ao lado disso, além
disso, há tanta coisa... Há essa quantidade de obras e seus autores que
dialogam, é certo que com diferentes graus de aproximação e intimidade, com
surrealismo. Isso, em escala mundial. Minha impressão é que o mapeamento do
surrealismo, o levantamento de sua presença e produção ao longo do século XX,
nessa escala mundial, mal começa a ser feito. É o que sugere algo como o Dictionnaire Général du Surréalisme et de
ses environs, de Biro e Passéron: enorme, múltiplo, e ainda assim
incompleto, com lacunas evidentes, além de chegar apenas até 1980. Desde então,
aconteceu tanta coisa… Trabalhos teus, inclusive as antologias O Começo da Busca [6] e Un Nuevo Continente,
[7] são passos nessa direção. Idem,
os levantamentos recentes sobre surrealismo em Portugal, como os de Maria de
Fátima Marinho [8] e de Perfecto
Cuadrado, [9] e em outras
literaturas. Mas ainda há muito chão a percorrer. Muita coisa a ser pesquisada
e mostrada.
Enfim, surrealismo não é
capítulo encerrado, porém, antes, algo em aberto.
FLORIANO
MARTINS | A
presença do deslumbrante ou do desconcertante no tratamento dado à imagem
poética é certamente um componente a ser mencionado no que diz respeito à
atualidade do surrealismo. Contudo, há que saber distinguir quando esse
componente está a serviço unicamente de uma retórica. O próprio Breton já havia
mencionado que a imagem mais forte é justamente aquela “que apresenta o grau de
arbitrariedade mais elevado, a que leva mais tempo a ser traduzida à linguagem
prática”, ou seja, a que se arrisca mais, aquela que não compactua com as
facilidades de uma linguagem cotidiana, linguagem esta cada vez mais
condicionada por uma sociedade que busca erradicar qualquer mínimo sinal de
sensibilidade, que tem na individuação seu mais ostensivo inimigo. René
Magritte já chamava a atenção para o fato de que “uma imagem não pode se fazer
sem a orientação do pensamento pela liberdade”. Há mais justificativa formal do
que sinceridade vertiginosa nas imagens que se produzem atualmente, seja na
poesia ou nas artes plásticas, de maneira tal que aspectos como onirismo, analogia,
inconsciente etc., requerem ainda – creio que o requerem sempre – uma maior
atenção, considerando que atitude ou visão de mundo implica estar
permanentemente atento aos pequenos vícios de linguagem que acabam por reduzir
o espaço de ação do surrealismo.
Observando, por exemplo,
o que se dispõe em termos de Internet para consulta hoje, surrealismo vive
demasiado em função de repetições de lugares-comuns, aderências excessivas à
pele dos manifestos – cadáveres-esquisitos raramente surpreendem, parecem
sempre cópias distorcidas –, reflexo irrefletido dos mergulhos paradigmáticos
de Magritte e Dalí – o que seguramente faz o cadáver de Breton retorcer-se todo
–, rara poesia que vá além do que se havia proposto. Ora, e a proposição maior
era exatamente a de que não se poderia cessar a imaginação, jamais. O que nos
individua é justamente a capacidade de imaginar. A arte se justifica por
essa afirmação de um imaginário intransferível. Torna-se valiosa na medida da
identificação, mas nunca na inclinação para um clichê. Os clichês ligados ao
surrealismo não são distintos daqueles que conformam o grande equívoco do que
se poderia chamar de arte contemporânea. Nenhuma esquisitice por si só pode ser
convertida em surrealismo. Magritte tinha uma observação valiosa que se aplica
aos dias de hoje: a de que “o mistério é uma das possibilidades do real”,
confirmando: “o mistério é o que é absolutamente necessário para que exista o
real”. Ora, uma coisa é o mistério e outra é a estripulia em torno do insólito.
Aberração não é sinônimo de mistério. E o surrealismo acabou se confundindo com
uma leitura aberrante da realidade, a ponto de muitos simpatizantes não irem
muito além desse entendimento.
Em tese, seria muito fácil invalidar toda
atualidade no surrealismo considerando a maneira fácil com que qualquer
estranheza se apresenta como surrealista. Qualquer coisa que haja de
estranho na existência de um poema ou de uma pessoa, isto não terá importância
alguma se não for o suficiente para mudar a vida dessa pessoa ou desse poema.
Aí se distingue o mistério da retórica. Neste último caso, a mudança é apenas
aparente, um colorido dado à vida ou ao poema. A ação proposta pelo surrealismo
deve ir ainda além desse ambiente. O que o poema pode propor, em termos de
virada substanciosa, à vida de alguém? Um dilema complexo em uma atualidade que
se mostra inteiramente manipulável por mecanismos ativados justamente para
criar certa, e decisiva, ambiguidade.
Mencionei aqui aspectos em um plano mais amplo.
Estariam na raiz do assunto. Caberia rever alguns pontos, pesando inflexão dos
mesmos no que temos pela frente. A perspectiva cronológica requer
distanciamento, e muita coisa ainda está se processando, a ponto de tornar
confusas certas leituras que temos dos desdobramentos do surrealismo em
diversas instâncias. Pensemos que na Argentina, por exemplo, onde foi
fortíssima e renovadora a sua presença, somente agora se está cuidando da
edição de obras fundamentais, e aqui vale mencionar o importante trabalho
editorial de Mario Pellegrini através da Editorial Argonauta, por onde vem
sendo publicada a obra de poetas como Aldo Pellegrini, Enrique Molina,
Francisco Madariaga. [10] Também no
Chile, outro grande foco de ação surrealista, se está tratando de recuperar
documentos referentes ao grupo Mandrágora. [11] Publica-se agora, neste 2004, coincidindo com o centenário de
seu nascimento, a Obra Completa do peruano César Moro. Persiste uma carência,
no entanto, no que diz respeito a uma perspectiva crítica do surrealismo em
âmbito latino-americano, ou seja, uma melhor compreensão de sua atuação em tal
instância. Os poucos referenciais existentes não possuem ainda uma afluência
continental [12] que permita
desativar equívocos firmados pelo trabalho de um Stefan Baciu, por exemplo.
Este crítico inclinou-se por uma ortodoxia que recusava desdobramentos bastante
significativos em termos de aclimatação do surrealismo no continente americano.
Estabeleceu uma falsa pista a que intitulou de “para-surrealismo”, onde
toda estranheza não declaradamente surrealista poderia receber a insígnia do clã.
[13]
Tal referência nos conduz ao domínio das falsas
questões, considerando por base as contradições teimosamente evocadas em
nome do que chamas de “duas grandes vigas mestras: surrealismo e formalismo”.
Com acentuada irresponsabilidade, uma instância acabou se intrometendo em
território alheio, quase sempre na tentativa de miná-lo, confundi-lo,
desautorizá-lo. Um imenso equívoco, se considerarmos que não há criação
artística sem os seus correspondentes aspectos formais, no próprio sentido de
uma afirmação de linguagem. É curioso observar a pouca atenção dada à forma
surrealista. O que acaso teria proposto o surrealismo seria uma rejeição de
toda perspectiva formal? E de que maneira então declarar um gemido que seja, senão
através de uma forma? Onde quer que soe o corpo, um testemunho de voz sangrada,
a imagem no espelho se desfazendo a cada frase, o dorso cravejado por mil furos
da jovem mulher encontrada e que teria sido a voz, ah a voz, alguém que
finalmente denunciaria tantas atrocidades… Onde quer que seja, qual a forma? De
nada adianta que um homem esteja partido ao meio por uma janela. O espaço que
há entre o que sou e o que desejo ser não pode ser convertido em dádiva se não
o experimento em sua inteireza. A metáfora aconselha que cada homem aprenda a
morrer consigo. Qual a matéria, qual o objeto, desse interlúdio que ninguém se
atreve a revelar? Indaguemos com todas as letras: quem sabe o que significa ser
surrealista hoje em dia?
Claro que tua referência ao formalismo assume
outra consonância, mas cabe lembrar aqui a maneira como o parnasianismo se
sobrepôs ao simbolismo no Brasil, o mesmo acento com que se mantém até hoje uma
corrente parnasiana em nossa tradição lírica, quando menos criando obstáculos
para esse sentido de liberdade evocado por Magritte. O regime de falsas
questões extrapola qualquer âmbito a ser considerado. Cabe aqui mencionar,
por exemplo, os estudos de Perfecto Cuadrado e Cyril Brian Morris acerca,
respectivamente, do surrealismo em Portugal e Espanha. [14] São dois livros fundamentais, indiscutivelmente, ao mesmo tempo
em que tocam no assunto com olhos de quem está dissecando um cadáver. Não há
disposição para conferir atualidade ao surrealismo nos dois estudiosos. Em seu
estudo, o inglês Morris diz que “o surrealismo na Espanha carecia das
coordenadas teóricas que permitiram falar de um movimento”. Por sua vez, o
espanhol Cuadrado revela que “o surrealismo português afirmou-se, estruturou-se
e desenvolveu-se como um autêntico movimento, um movimento de
vanguarda”, embora o enclausure cronologicamente, sem perceber sua vibrante
atualidade. No caso brasileiro, para outro exemplo, não dispomos entre nós de
absolutamente ninguém que tenha se dedicado a um estudo sério, despojado de
todos os preconceitos de turno. São falsas questões, no geral, onde se
desconhece, sobretudo, o que principia o surrealismo, o que propõe em suas
raízes, o que renova, o que afirma.
Haveria que tentar entender o que se passou com
a Escuela de Vallecas ou atentar para a presença atual do Grupo Surrealista de
Madrid e a publicação da revista Salamandra. No caso português, ainda
hoje se está descobrindo perspectivas novas ou confirmações a partir de
recuperação da obra plástica de Risques Pereira ou poética de Cruzeiro Seixas.
Também caberia maior atenção ao espólio de Luís Miguel Nava (1957-1995) e Mário
Botas (1952-1983). O Brasil, por sua vez, ainda teima em não se orgulhar da
obra de uma Maria Martins, ao mesmo tempo em que se vive aqui uma contradição
das mais simplórias: recusa-se o surrealismo por ortodoxia ou defasagem, e
diz-se amém a toda forma de defasagem e ortodoxia que venha de instâncias
exacerbadamente formalistas. Ao se apresentar como uma não-escola, o
surrealismo dá um cheque-mate nessa cronologia corrente das classificações.
Evidente que não propõe que a partir daí tudo passe a girar em torno de si.
Vale aqui menção à atenção destacada por Jean Schuster (1929-1995) no sentido
de que é preciso evitar a “degradação da surpresa em vulgaridade”, da
“esclerose do princípio em dogma”.
Dentre as grandes falsas questões se
encontra essa tentativa de construção de um tecnosurrealismo, recorrendo
ao termo empregado por Richard Coyne, onde se estabelece uma contradição entre
realidade desejada e realidade permitida, repetindo o mesmo encantamento vazio
diante das miríades tecnológicas. É evidente que um cyborg somente
poderia ingressar no universo surrealista se acaso fosse convertido em um
modelo de Belmer, de maneira que tentar uma aproximação entre Primeiro
Manifesto do surrealismo e Manifesto Cyborg (Haraway), como insiste
o português José Augusto Mourão, chega a soar como um artificialismo
dedicado a desterrar o surrealismo, uma primazia da tecnologia sobre o que
Enrique Molina chamava de “humanismo poético”. [15] A realidade reconfigura-se, não há dúvida, porém segue sendo o
mesmo biombo, como a compreendia René Crevel, onde qualquer um pode
esconder-se, ignorando todos os planos da existência humana. Há que observar
aspectos distintos em sua atuação em cada circunstância. Exemplo disto é a
afirmação de Deleuze & Guattari de que a “transcendência é uma doença
especificamente européia”. Imaginemos uma inversão igualmente irresponsável de
valores que afirme que a imanência é uma doença especificamente americana. Ah,
como a realidade torna tão vigentes todos os postulados dos manifestos
surrealistas!
A presença dos dicionários temáticos é outra
grande fonte de equívocos, por mais que atendam aos interesses do mercado
editorial. Em grande parte, tendem a uma visão historicista. E, curiosamente,
são inconclusos, incompletos. Aqueles que são regidos por uma aceitação total
da cartilha Breton, por exemplo, deixam de fora discussões essenciais que
tornam o surrealismo mais real, que o aparentam a este sentido de mais
realidade que tanto buscou. Por que Ángel Pariente evitou tocar, em seu Diccionario
temático del surrealismo (Alianza Editorial, 1996), em verbetes que
evidenciariam as contradições radicais de Breton? É preciso discutir em aberto
todas as dissonâncias, compreender equívocos do surrealismo, realçar suas
contribuições valiosas, enfim, desmitificar o tema.
Sua presença no Brasil, por exemplo, tem sido
traçada sempre no sentido de um exagero, seja da parte de quem o defende ou de
quem o ataca. Seja pela idiossincrasia – aceito teu eufemismo – sustentada por
Michel Löwy ou pela simplificação esquemática de Sérgio Lima, o fato é que o
assunto anda pendente, entre nós, para uma leitura recorrente de natureza
historicista, em termos gerais, o que reduz a quase nada a presença de
surrealismo no Brasil, dada a gama de equívocos gerada, dentre outras coisas,
pelas articulações quando menos impúberes da Semana de Arte Moderna. Não
tivemos surrealismo aqui em um sentido de declaração formal, exceto naquelas
instâncias em que tal afirmação esperava poder trazer a lume quando menos uma
discussão preciosa sobre o que se passava então – situação hoje bastante
piorada – com a arte contemporânea. As instâncias formais valem o registro, mas
rigorosamente não interferiram onde teriam que fazê-lo. Não tínhamos o sentido
de uma história a ser recuperada e/ou de uma atualidade a ser questionada. O
país segue até hoje enfrentando aí seu maior dilema: não há perspectiva
sistemática para um conhecimento mínimo de nossas raízes culturais. É um grande
dilema (de)formador de toda a cultura no Brasil, não resta dúvida, e não
confrontá-lo foi a ruína de qualquer perspectiva de afirmação do surrealismo
entre nós.
A grande atualidade do surrealismo está em não
torná-lo uma lembrança. Estamos diante dos mesmos sintomas decorrentes do
descrédito da imaginação, de anulação do pensamento mágico, de embrutecimento
de qualquer forma de sensibilidade, de tal maneira que a vigília requer mais
atenção, sobretudo considerando que todos os postulados dos anos 20, por
exemplo, já foram absorvidos pela indústria do entretenimento, o que faz com
que as posturas matrizes do surrealismo permaneçam ainda mais vigorosas. As
sociedades contemporâneas não mudaram radicalmente em nada, foram apenas
agravando os mesmos dilemas que já encontramos denunciados tanto por um Artaud
quanto por um Ginsberg. A arbitrariedade defendida por Breton, no que respeita
à imagem, não se limita a um jogo de combinações, mas antes de tudo a uma
afirmação de caráter.
CLAUDIO
WILLER |
Há muito a ser comentado e observado na questão da imagem, entendida como
aproximação de realidades diferentes e distantes. Breton (comento isso em meu
ensaio sobre poesia e poética no surrealismo, nesta edição) acabou por deixar
claro que não se trata de qualquer aproximação
de realidades, ao expor o que entendia por signo ascendente. De um dos termos
da imagem para outro, haveria uma direção: a imagem aponta para o alto. É a
pimenta com asas transformada em libélula, e não a libélula sem asas
transformada em pimenta. Portanto, equipara a criação à sublimação. Ao ver a
imagem desse modo, é coerente com sua formação e fundamentação esotérica,
hermética, especialmente de alquimia, rica em metáforas da sublimação (e em
operações efetivas de sublimação, até no sentido originário da palavra): são as
etapas do nigredo até a pedra
filosofal, as operações de destilação, purificação pelo fogo, branqueamento,
etc. As idéias de alto e baixo, de um eixo do mundo e um movimento ao redor
desse eixo (representado pela árvore iniciática invertida, a torre, etc) são
imemoriais.
Assim, é estabelecida uma diferenciação clara
com relação, entre outras coisas, à criação combinatória, de empreendimentos
como o OuLiPo, e seus desdobramentos e extensões pelo mundo digital, onde, em
princípio, vale o que vier, ou o que for gerado pela aplicação de um programa
ou um algoritmo. Observaria – e em teu comentário o assunto já é examinado –
que haveria uma distinção adicional: na criação não apenas surreal, porém
romântica, há duas instâncias: uma delas, a subjetividade; outra, o mundo das
coisas; e um choque entre ambos. Filósofos já chegaram a observar que essa
perspectiva, ao questionar o cogito
cartesiano em sua relação antagônica com a res
extensa, também o perpetua, ou lhe confere definitivamente um estatuto
ontológico. Os procedimentos do tipo combinatório suprimem uma dessas
instâncias, a do sujeito. Pode-se observar uma des-dialetização, a supressão de
um dos pólos de uma contradição fundamental; e uma conseqüente despolitização:
no fundo, é suprimida a rebelião individual contra o que está aí, a ordem
estabelecida. Ou então, a desordem, o des-ordenamento do que está aí, é deixada
por conta de um programa e não de um sujeito.
Contudo, a defesa bretoniana do movimento
ascendente está sujeita a outras observações. Aceita incondicionalmente,
excluiria de vez do âmbito surreal o pensamento e a obra de Antonin Artaud,
cuja crítica radical não comporta as noções de alto e baixo, e de Georges
Bataille, cujo movimento, nessa ótica, seria diametralmente oposto: seus signos
são descendentes, e esse movimento descendente equivale a aprofundar-se, pela
via da transgressão, até chegar a um conhecimento e aos domínios do Outro. Mas
torna-se algo estranha, nessa perspectiva, a presença de autores cujo surrealismo
é declarado e cuja catalogação como surrealista não é mais posta em dúvida. Um
deles, Mário Cesariny. Algo como O Virgem
Negra, a sátira demolidora, nem tanto a Fernando Pessoa, mas a pessoanos, a
rigor não teria lugar no surrealismo.
A polaridade, tão bem exposta por Octavio Paz em
Os Filhos do Barro, entre analogia e
ironia, torna possível expor mais claramente meu raciocínio, mostrando onde
quero chegar. Aceita essa polaridade, vê-se que a ironia já está presente no
surrealismo francês, o mais bretoniano, digamos assim. No entanto, o
surrealismo português, em geral, e a obra de Cesariny, em especial, pendem
muito mais fortemente para o pólo da ironia, pois nele a escrita satírica e
paródica tem importância e presença maior.
Penso em uma discussão focalizando a criação
artística e literária que, tomada em sua escala mundial, ultrapasse algumas das
balizas e limites propostos ou sustentados por Breton e alguns seguidores
diretos. Sua viabilidade se torna evidente ao examinarmos o surrealismo
norte-americano, do grupo de Chicago encabeçado por Franklin Rosemont.
Contrapondo-se à histórica surdez musical de Breton, e por extensão do
surrealismo, adotaram o blues como
música surreal. Além disso, incorporaram ícones e conteúdos de uma cultura pop
– o mais invocado, o Coelho Pernalonga, é erigido a ícone, mito ou herói – de
um modo inovador, estranho ao surrealismo francês, assim como seria estranha a
idéia de continuidade ou conexão com relação à geração beat (bem herética no âmbito parisiense, a julgar pelo bate-boca a
respeito que tive em 1968 com Vincent Bounure).
Enfim, esses exemplos, dentre muitos outros
possíveis, mostram que o surrealismo se expande, se refaz, sem com isso
diluir-se ou perder a identidade e especificidade. Contudo, os problemas e
dúvidas suscitadas pela idéia do signo ascendente vão mais longe. Cabe indagar
como fica, afinal de contas, a questão da transgressão, até mesmo nos termos
postos por Breton. Humor negro, categoria fundamental no surrealismo, nada tem
a ver com sublimação. É, antes, des-sublimação, uma negatividade extrema que
não poupa nada e não deixa pedra sobre pedra.
E toda a apologia surrealista da perversão,
especialmente a admiração pelo Marquês de Sade, assim como por Lautréamont,
fica mal explicada. Em seus Entrétiens,
[16] Breton tenta uma explicação
dialética dessa admiração, a meu ver fraca, ao afirmar que a devassidão do
Marquês de Sade é como um pano de fundo negro, contra o qual brilha com mais
força ainda a chama do amor único.
A defesa incondicional do amor único, tal como a
encontramos em Breton ou em Péret, apresentada de um modo tão dogmático, exclui
a libertinagem, ou a aceita apenas como etapa ou contraponto. Pode acabar
derivando para uma espécie de defesa do perfeito casamento surrealista,
preservando a instituição da família. Aí está um tipo de suspeita que poderia
ser lançada contra o surrealismo, porém nunca contra a geração beat.
O ensaio O
nó do cometa de Péret [17]
apresenta uma visão distorcida, a meu ver, do tema do amor e da sublimação em
Baudelaire. Deixa de lado sua ambivalência e suas contradições. É possível
apresentá-lo como exemplo do amor sublime; e também do contrário, tomando as
passagens nas quais a mulher é vista como assombração, e o amor como afundar-se
no abismo e no inferno (em passagens do texto e em episódios da sua vida).
Péret, nisto dando continuidade ao pensamento de
Breton, sugere, nesse ensaio, que recuperar o amor cortês e romântico é uma
resposta a um tempo de maior liberdade, menor repressão da vida sexual. É o
mesmo raciocínio desenvolvido por Octavio Paz em A Dupla Chama, [18] em
sua defesa do amor cortês e romântico. Entendo, em primeiro lugar, que ver
nossa época como liberada é um equívoco. Do que temos hoje até a vigência de
Eros ainda vai uma enorme distância. Além disso, se o surrealismo propõe a
superação das antinomias, então tem que propor algo que vá além da dicotomia de
amor único versus devassidão. E como
é possível, pergunto, ao mesmo tempo apresentar-se como continuador do
gnosticismo, obviamente na vertente licenciosa e não naquela do maniqueísmo,
bem como do paganismo?
Além disso, é contraditório com relação à defesa
do Eros, e com a idéia do desejo como força motriz do mundo. E mais, também
diante da própria noção surrealista do outro, de uma alteridade encarnada em
sociedades tribais, nos povos primitivos e em civilizações pré-cristãs.
Iniciações tribais – estou justamente a ler um livro de Mircea Eliade a
respeito [19] – podem incluir uma
extrema licenciosidade, uma intensa atividade sexual. E temos alguma noção do
que ocorria nos cultos subterrâneos, como o de Dionísio, bem como nas práticas
dos gnósticos dissolutos, e naquelas dos tantristas. Sem dúvida, é sublime o
poeta, em um encontro ou relação amorosa, reviver ou reencarnar a relação de
Novalis com Sophia Von Kuhn, de Hölderlin com sua Diotima, de Nerval e sua
Aurélia. Excluir essa relação, ao menos como possibilidade, como aspiração,
algo no horizonte de cada um, seria niilismo. Contudo, nos domínios de Eros, do
dionisíaco, da realização do desejo, há muito mais, pois o desejo, e nisso
concordo com argumentações como as de Lacan e de Deleuze e Guattari, é maior
que seu objeto e sempre procurará ultrapassá-lo.
Isso não chega a ser uma crítica. Estou apenas
apontando para questões que não fecham
no surrealismo, ou, ao menos, que não podem ser dadas como encerradas com o que
disseram e propuseram Breton ou Péret ou seus legatários e continuadores
imediatos. E que, no contexto dessa ampliação, ou dessa visão mais ampla de
surrealismo que é possível hoje, podem ou poderão ser reabertas e reexaminadas.
Breton já observava que surrealismo é sistema aberto, e não uma doutrina
fechada. E Anna Balakian comenta, com razão, que poder-se apontar aparentes
inconsistências em diferentes passagens e etapas da obra de Breton não é um
defeito, porém uma qualidade do surrealismo. [20]
Há outras questões abertas no surrealismo, a meu
ver. Uma delas, a da relação com a ação política. Espanta-me, nesta altura dos
acontecimentos, grupos e intelectuais defenderem a adesão do surrealismo à
Quarta Internacional. Isso me parece regressivo, a negação ou desconhecimento
do que ocorreu, no âmbito do surrealismo e no restante do mundo, de 1940 para
cá.
O que é central ou fundamental no surrealismo?
Descartada a idéia da “estética” ou “estilo” surrealista, insustentável ao se
examinar a produção em artes visuais, tanto histórica quanto contemporânea,
permanece como essência aquilo que já havia sido apontado em tua intervenção
neste diálogo: o deslumbramento, o maravilhar-se, o êxtase, que se traduz ou
projeta na criação automática ou visionária. Acho que, com isso, temos algumas
coordenadas para uma melhor discussão do surrealismo hoje (e do surrealismo
sempre, é claro). E para responder a algumas questões que volta e meia nos são
apresentadas. Por exemplo, à pergunta de se as cenas das batalhas dos clones em
Guerra dos Planetas, parte II, são ou
não surreais. Não são, por isso: falta-lhes esse fundamento, essa experiência
do maravilhar-se. Não estão associadas a alguém romper e ultrapassar limites.
FLORIANO MARTINS | Retomemos essa questão pelo silêncio, ou seja,
pela perfeita observação de Leon Botstein de que John Cage e René Magritte
“tentaram penetrar a essência do silêncio de uma maneira revolucionária”.
Recordemos antes que Hans Arp, já em 1946, preconizara que “logo se falará do
silêncio como de uma lenda”. Por que não somente Breton, mas a quase totalidade
de seus seguidores e comentaristas se recusara a sequer perceber a presença de
um segmento artístico que curiosamente buscava nos postulados surrealistas
aproximações para vencer um dilema que se apresentava na música idêntico ao
denunciado pelo surrealismo na poesia e nas artes plásticas? Mesmo considerando
no surrealismo apenas uma tendência à emancipação do homem no que respeita ao
canônico, por que pensar como distinta a ruptura levada a termos por
compositores como o belga André Souris (1899-1970) e os franceses Charles
Koechlin (1867-1950) e Francis Poulenc (1899-1963), dentre outros? Um pouco
antes deles se poderia mencionar Erik Satie (1866-1925). A obra desses
compositores está repleta de associações, collages, fragmentações, aspectos que
unem maravilhoso e cotidiano, a ponto de Botstein referir-se à construção de
“uma narrativa musical surrealista”.
Mencionas a aproximação do Grupo Surrealista de
Chicago ao blues, e também se poderia pensar na relação íntima estabelecida
pela Beat Generation com o jazz. Esse aspecto de uma narrativa musical
transfigurada pode ser encontrado em compositores como Keith Jarrett ou Hermeto
Pascoal, com um acento cosmogônico impressionante. E em todos eles está bem
colocada a cilada a que chegamos por conta de nossa ausência de percepção do
silêncio, ou seja, vivemos em uma sociedade pautada pelo ruído extremo, um
ruído que aniquila todos os sentidos, dominada pelos tais monstros da razão
alertados por Goya. Magritte não era o único a perceber essa grande contradição
do surrealismo, basta pensar na referência a Arp. Contudo, havia nele uma
expressão dialética que possibilitava saber que nem sempre o maravilhoso é
belo, ou seja, o maravilhar-se deveria fundar a beleza e não ser refém da
mesma. Breton defendia, ao contrário, que o maravilhoso é sempre belo, qualquer
que seja o maravilhoso. Mas por que não entender o silêncio como um ritmo, uma
pausa, uma nuança, uma dança? Por que razão temer o maravilhoso do ritmo
entrando e saindo pela imaginação melódica, a palpitação da existência humana
desfiada em uma escala harmônica?
Em quantas questões essenciais ao surrealismo –
Sexualidade, Religião, Juventude, Loucura – não ficaram faltando pedaços pela
ausência da compreensão na influência da música no desdobramento de seus
mecanismos vitais? John Cage dizia que nos afastávamos da vida na medida em que
desconhecíamos os rudimentos. Somos demasiado simétricos para perceber nossas
ações dissociadas do hábito. Naturalmente o surrealismo chamou a atenção sobre
isto, de maneira que também eu insisto que a crítica que aqui faço tem a mesma
conotação defendida por Anna Balakian, ou seja, estamos a ampliar um campo de
entendimento que previa mesmo uma abertura, um desdobramento. Mesmo assim, a
ideia de ritmo ficou tão quebrada quanto o que mencionas sobre o dionisíaco.
Restringiu-se ao plano do sublime. A licenciosidade está ligada diretamente à
música. O monoteísmo estaria assim vinculado à ausência de ritmo? Sem ritmo não
há mistura. Sem mistura, como saber que algo é realmente delicioso? A
experiência da delícia é a de uma confrontação. Contrapor amor único e
devassidão é descartar um abismo inesgotável de possibilidades harmônicas,
musicalmente falando, que fazem o corpo dos amantes ser, de fato, um altar
dedicado à imensidão. É quando menos ingênuo achar que não vivemos ainda sob o
legado de uma repressão sexual, por exemplo. Repressão transfigurada ou
simplesmente disfarçada em certas regras mínimas de tolerância.
Isto nos leva de volta ao plano cartesiano em
que situas um conceito como o de literatura potencial defendido pelo OuLiPo.
Ora, o fogo pode ter uma conotação de combustão ou iluminação, porém jamais
existirá sem atrito. Leio um Daniel Gomes dizer que “seja através de caminhos
mais racionais e estruturados, seja através de escolhas arbitrárias, percebe-se
que a teoria da composição caminha sempre em torno de um método definido, que
cada vez mais procura inserir o leitor no processo criativo”. [21] Há uma teoria da composição, quando
eu pensei que houvesse apenas uma teoria da conspiração. O fato é que autores
como Georges Pérec, Jacques Roubaud ou Italo Calvino, por mais interessantes
que sejam, não constituem aqui um caso de desdobramento ou atualização do
surrealismo. De volta a Magritte, quando dizia que “o que é preciso pintar é a
imagem da semelhança – se o pensamento deve tornar-se visível no mundo”. Que
método aplicar para fazer alguém se desfazer de toda sensibilidade? Até que
ponto a sensibilidade faz planos ou considera o passado? Apostar no
enciclopédico ou no combinatório, assimilando-o a Jorge Luís Borges ou Ítalo
Calvino ou Peter Greenaway, pode interessar em plano algorítmico, mas não cria
uma nervura dialética que permita inclusive perceber que a obra desses autores
mencionados não tem um caráter tão restritivo. Teríamos aí uma obra em completa
dissociação com o criador, isto sim. Basta pensar em Calvino, por exemplo, que
via o homem como “uma combinatória de experiências”, “uma amostragem de
estilos”.
Esta mesma situação nós a encontramos hoje nos
artifícios tecnológicos que fazem constantemente com que confundamos sujeito e
objeto, ou seja, projetamos no recurso a essência, no método a existência. Uma
questão de estilo, pois não? O homem é uma questão de estilo, a despeito do
surrealismo? Quando mencionas que uma das questões abertas diz respeito à ação
política, eu volto a pensar neste abismo entre o falante e a fala. Ora, onde
difere o político do poético, o ruído do silêncio, a imagem da semelhança?
Sinceramente, a mim não espantam em nada manifestações de declarados
surrealistas em favor de sistemas totalitários atuantes, ou mesmo simpatizantes
de um saudosismo comunista. Creio que isto faz parte do grande ramo de
equívocos propiciado pelo surrealismo em raiz. Considere-se ainda um império
que hoje assume proporções as mais virulentas, que é a presença da mídia nas
sociedades contemporâneas. Observemos os centros de estudos surrealistas localizados
em alguns países, sobretudo na Europa. Em grande parte são estações
retransmissoras das mesmas ortodoxias que até aqui questionamos. E há aquelas
catalogações infames, dentre as quais o surgimento, nos Estados Unidos, de
livros destacando a presença da mulher no surrealismo. Observar qualquer
questão por um prisma da exclusão ou da minoria é sempre uma forma de desprover
o assunto de real argumentação. Setorizar uma questão como essa é contribuir
para o empobrecimento de seu entendimento.
Mencionas uma relação entre criação artística e
literária, mas particularmente já não vejo sentido para essa quase
dicotomia. Ao romper com estética e estilo, não mais caberia ao surrealismo se
preocupar com essa distinção. Relacionemos quantos nomes estiveram ligados à
poesia e às artes plásticas, simultaneamente. Pensar em uma escala mundial,
isto me parece um tanto arriscado, pelo simples fato de que a ideia que temos
da escala mundial seja propiciada pela mídia. Não haveria hoje
acaso mais dificuldade em compreender o que se passa em escala mundial
do que no momento em que surrealistas aderiram ao comunismo? Matutemos sobre
uma ideia enfocada por ti a princípio: a sublimação da realidade. A primazia midiática
descarta toda ontologia. Somos induzidos a uma opção sem a mínima coerência:
catalogar ou descartar. Música, literatura, artes
plásticas, nada tem escapado a esta voragem que ultrapassa todos os limites. Acaso não haveria mais espaço para analogia ou ironia? A cultura pop que tenta satirizar o grupo surrealista de Chicago de alguma maneira bate no vazio, pois seus referenciais já foram completamente absorvidos pela indústria cinematográfica e da propaganda. O Brasil, por exemplo, aposta pobres fichas no mercado cinematográfico, ao mesmo tempo em que desprestigia sua inclinação natural para a música. Questão de estilo? Dilema estético?
plásticas, nada tem escapado a esta voragem que ultrapassa todos os limites. Acaso não haveria mais espaço para analogia ou ironia? A cultura pop que tenta satirizar o grupo surrealista de Chicago de alguma maneira bate no vazio, pois seus referenciais já foram completamente absorvidos pela indústria cinematográfica e da propaganda. O Brasil, por exemplo, aposta pobres fichas no mercado cinematográfico, ao mesmo tempo em que desprestigia sua inclinação natural para a música. Questão de estilo? Dilema estético?
CLAUDIO WILLER | Queria retornar ao tema da presença evidente do
surrealismo, aqui e agora. Manifesta-se através de obras poéticas, inclusive de
autores novos, até estreantes, com o predomínio da imagem poética, ou seja, da
imagética surrealista. São obras oníricas, regidas pelo pensamento analógico. E
estão associadas a um efetivo interesse, a um diálogo com o surrealismo, e
mais, à identidade ou afinidade com aquilo que eu chamaria de atitude ou de
visão de mundo surrealista. A separação que faço entre artes plásticas e poesia
é um viés meu. É que, simplesmente, estou mais a par do que se passa em um
campo do que em outro. Mas, nas artes visuais, parece-me que ocorre o mesmo. Nesse
sentido, o surrealismo está aí. Ou aqui. Chega-me o original de um estreante,
com uma poesia em prosa admirável, toda de imagens poéticas. Há diversos poetas
jovens escrevendo assim, e essa retomada de uma dicção surreal me entusiasma,
não só pela qualidade, mas por contrariar expectativas, subverter conceitos e
categorias já estabelecidas pela crítica. Genericamente (e ainda detalharei,
examinarei isso de modo menos genérico e vago) “geração 90” da poesia
brasileira, ou boa parte dela, dialoga com surrealismo – alguns, nossos amigos
do DeCollage, prepararam algo para os 80 anos do primeiro Manifesto bretoniano [22] – e isso, quando a crítica
universitária e jornalística já dava como definitivamente excluída qualquer
chance de uma presença do surrealismo entre nós. Suponho que o mesmo aconteça
na produção visual (acontece – saio hoje para ir à mostra de uma talentosa
aluna brasileira de Víctor Chab), e gostaria que fosse possível a prospecção
disso em nível mundial. Enfim, tudo isso me entusiasma, pela minha própria
vocação surrealista, e por espírito de provocação (que não deixa de ser uma das
dimensões disso que chamei de vocação surrealista).
FLORIANO MARTINS | Tuas expectativas são, de fato, compartilhadas
por mim, não resta dúvida, muito embora eu tenha certa parcela de desconfiança
não somente aos rumos tomados pela arte em si como, sobretudo, pela
interferência de crítica e mercado, em muitos casos agentes alinhados em uma
consonância a que vem se juntar a pobre alma do artista demasiado ansioso por um
lugar ao sol; o sol artificial das lâmpadas da mídia, bem entendido. Vejamos o
caso dessa artista que mencionas, a carioca Gilce Velasco, que tem mesmo uma
obra substanciosa, repleta de uma sugestibilidade intensa em termos de imagens
que seguramente a conectariam com o surrealismo. Há, no entanto, uma
dificuldade da crítica – pensemos em Edla van Steen ou Alberto Beuttenmüller,
em apreciações críticas ventiladas no site da artista – em situá-la
dentro de uma tradição surrealista. Fala-se em invenção ou visão
contemporânea, mas em momento algum se toca na perspectiva – ainda que mínima –
de um diálogo com o surrealismo. A própria artista diz que, ao pintar, “mais do
que expressar o meu universo de emoções através das cores, exerço diariamente a
minha grande paixão: a liberdade de ser na criação – o verdadeiro poder pessoal
do artista”. Gosto muito da obra da Gilce, mas me parece que todos os poderes
constituídos que envolvem produção e difusão artística não estão (mais)
interessados no assunto. A atualidade da imagem necessita ser enfocada como uma
invenção perpétua, onde ridiculamente a cumplicidade com a tradição soa
desconexa, de tal maneira que a sensação de déjà vu é o que há de mais
presente em qualquer exposição que se vá nos dias de hoje.
Pensemos em dois outros
exemplos atuais: a retrospectiva do argentino Víctor Chab e a mostra da coleção
particular do português Cruzeiro Seixas. [23]
São dois momentos de uma afirmação do surrealismo. Muito bem, se poderia dizer
que a instância é distinta, porque são nomes já de todo vinculados ao
movimento. Mas acaso não poderiam hoje estar dizendo os dois artistas que sua
obra busca uma perspectiva outra do moderno e que o surrealismo foi apenas uma
sinalização inaugural? Não poderiam acaso dizer que defendem a máxima expressão
da liberdade em um meio que bem o sabemos é quase em sua totalidade determinado
pelos agentes produtores? O que quero dizer com isto é que segue vigente uma
questão colocada pelo surrealismo: a afirmação do caráter. Não nos contagiam as
falsas aparências, o jogo de luzes, porque sabemos muito bem perceber onde e
quando fracassa o essencial. Isto me lembra o Luis Buñuel quando disse que “o
surrealismo triunfou no acessório e fracassou no essencial”. Esta é a grande
pergunta que nos fazemos todos agora: como distinguir o acessório do essencial?
Breton referiu-se a obras que não sendo
exatamente surrealistas seriam assim identificadas por uma afinação de
espírito. Mas quem determina essa afinação, qual seu diapasão? A imagem, pura e
simplesmente? Até que ponto um artista quer hoje ter seu trabalho aproximado do
surrealismo? E que percepção crítica acaso terá esse mesmo artista acerca dessa
hipotética aproximação? De volta a Buñuel, que dizia que Rafael Alberti e
Vicente Aleixandre, por exemplo, podiam muito bem parecer surrealistas, mas não
o eram, e por uma simples razão: o surrealismo “é uma moral”. (Minha grande
preocupação hoje não é a de manter um princípio moral – ainda que defenda o que
tenho como sensível e substancioso –, mas a de não entender (sim, não entender)
como se pode levar os dias adiante em uma sociedade como a brasileira em que
não se tem a menor preocupação com o fato de que estamos a descoberto no
preparo para o dia de amanhã.) Buñuel tinha razão? Em grande parte, a chamada
geração do 27, espanhola, possuía um viés formalista bem acentuado. Por outro
lado, o próprio Buñuel não avançou muito em uma estética cinematográfica que
conseguisse se livrar das teias do inusitado.
Posso me referir a mais exemplos em termos de
artes plásticas, mas creio que caberia observar o mesmo em relação à publicação
de livros de poetas, ensaios etc. Chegaríamos à mesma dúvida: por mais que
imaginemos desdobramentos todos do surrealismo, mesmo pensando naquela leitura
deliciosa de Jacques Sénelier, de que o primeiro desejo do surrealismo indica
que “é necessário desmoralizar” (e está bem em itálico, porque a recusa
a uma moral é sempre uma nova moral; bom, pois que surjam novas recusas), a meu
ver, caímos na vulgaridade, na mais torpe falta de princípio. Queremos apostar
em quem nos sucede, mas não há pontos com os quais nos pegarmos. Sim, o grupo
DeCollage é uma perspectiva. São bem jovens, e com uma disposição rara entre
nós, a da afirmação de caráter. Boa expectativa. Mas não se pode esquecer que
no Brasil, por exemplo, desprezamos reincidentemente o diálogo, desconfiamos da
tradição e apostamos em uma cultura fashion, desprovida, dentre outras
coisas, de qualquer componente ontológico, em face do cabe aqui ressaltar uma
leitura inicial tua, a de que estaríamos a cunhar duplicatas do “marketing dos
produtos de consumo e seu fetichismo da inovação.”
De qualquer maneira, já de muito não cabe
discutir filiações surrealistas, mas sim afinidades, considerações em torno de
novas maneiras de lidar com a imagem, percepção do entrelaçamento entre vida e
obra, articulações entre as figuras mais esquisitas que se possa imaginar, com
mil diabos, afinal o que distingue do surrealismo qualquer borrão encontrado
com frequência em galerias e museus por toda parte do mundo, um borrão que a
curadoria afirma tratar-se de arte contemporânea? Com isto não quero dizer que
tudo seja surrealismo ou que em nada mais importa sê-lo. A evidência a ser
posta em destaque é que há uma confusão geral no que diz respeito ao que
esperar da arte em nosso tempo. Há um esgotamento que não traduz propriamente
falta de impulso criativo, mas antes uma ação sanguessuga do mercado. Evidente
que os artistas são cúmplices disto, eternos deslumbrados pelos efeitos
primários do tempo sobre as suas pretensas aventuras estéticas.
Gosto de uma declaração do português Cruzeiro
Seixas, nas notas autobiográficas do catálogo já aqui referido: “Dizem alguns
que sou um surrealista ortodoxo na obra que vou realizando; aproveito no
entanto a ocasião para esclarecer a quem queira ser esclarecido que o serei,
mas tão só enquanto não descobrir uma outra porta, que me leve a um outro
espaço. É isso o que mais desejo, é nisso que se consomem todos os meus dias.”
Eis aí uma defesa brilhante da contra-ortodoxia a que nos deve levar o
surrealismo, considerando o entendimento de Breton de um “livre pensamento
integral”. E o Aldo Pellegrini observa ainda que “a poesia não é distinta da
natureza, pareceria melhor como sua própria essência, como o sentido secreto
que se oculta por trás da muda aparência das coisas”. Enfim, não se projetou o
surrealismo como uma escola, disto já o sabemos, embora a todo momento as
reações deem prova em contrário. O surrealismo confunde-se com a própria
entrega à vida, ou seja, reflete um estado de espírito de quem se dispõe a
arriscar-se ao conhecimento de si sem as algemas do hábito, dos vícios
cortantes que confundem repulsões e preconceitos, e, a rigor, nem precisaríamos
mesmo escrever poemas, compor músicas, pintar telas. A baliza mais sensível seria
aquela que permitiria denunciar oscilações entre valores constituídos e
espírito humano.
Ao princípio sugerimos aqui como essencial rever
cronologias. A edição do volume em que se insere este ensaio já é um valioso
aceno neste sentido. Há evidências evocadas, pistas sugeridas, enfim, este
livro constitui-se como uma baliza empenhada no desenho geral das áreas
frutíferas de ação do surrealismo. Sua atualidade está ligada diretamente ao
absurdo que possa haver entre uma lógica e sua perpetuidade, ou seja, o
surrealismo lida acentuadamente com extravios, e os extravios parecem não ter
fim. Quem se sentiria feliz sendo surrealista a qualquer tempo? Mas como
evitá-lo?
NOTAS
1. Didaticamente exposta por Claude Courtot em L’Être ou le paraître surréaliste, em Organon 22, Aspectos do surrealismo,
Revista do Instituto de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Volume 8, número 22, 1994, organizada por Robert Ponge.
2. Office du Livre, Fribourg, 1982, dirigido por
Adam Biro e René Passeron.
3. A estrela
da manhã – surrealismo e marxismo, de Michael Löwy, Editora Civilização
Brasileira, Rio de Janeiro, 2002.
4. Steinmetz,
Jean-Luc, André Breton et les surprises
de l’amour fou, Presses Universitaires de France, Paris, 1994
5, Marguerite
Bonnet, André Breton – Naissance de l’aventure surréaliste, Librairie
José Corti, Paris, 1988.
6. Floriano Martins, O Começo da Busca (O
surrealismo na poesia da América Latina). Escrituras Editora. São Paulo.
2001.
7. Floriano Martins,
Un nuevo continente
– Antologia del Surrealismo en la Poesía de Nuestra América. Ediciones
Andrómeda, San José, Costa Rica, 2004
8. Maria de Fátima Marinho, O surrealismo em
Portugal, Imprensa Nacional, Casa da Moeda, 1987.
9. A única
real tradição viva – Antologia da poesia surrealista portuguesa, organizada
e prefaciada por Perfecto E. Cuadrado. Assírio & Alvim, Lisboa, 1998.
10. No catálogo da Editorial Argonauta é
possível encontrar tanto uma edição completa dos Manifestos do surrealismo,
como livros de Antonin Artaud, Paul Éluard, Lautréamont, Sade, Rimbaud, e até
mesmo uma tradução de Los arcanos mayores de la poesia surrealista (org.
por José Pierre e Jean Schuster). Por esta editora se tem publicado toda a obra
de Aldo Pellegrini – La valija de fuego (poesia completa) e La
conquista del maravilloso (ensaios completos) –, bem como livros de
Francisco Madariaga (Criollo del universo e País garza real) e
Enrique Molina (Hacia una isla incierta). Vale também mencionar o
trabalho de recuperação levado a termo por Javier Cófreces, seja na reedição da
poesia de Carlos Latorre (Los móviles secretos, Ediciones em Danza,
Buenos Aires, 2001) ou na recente organização da antologia Siete
surrealistas argentinos (Leviatan, Buenos Aires, s/d).
11. Fundamental, neste sentido, o empenho de
Luis G. de Mussy, não somente pela substanciosa publicação de Mandrágora. La
raiz de la protesta o el refugio inconcluso (Universidad Finis Terrae,
Santiago de Chile, 2001) – edição fac-similar de todas as revistas publicadas
pelo grupo surrealista chileno –, como também por uma série extensa de
entrevistas realizadas com poetas chilenos ligados ao surrealismo.
12. A publicação de Un nuevo Continente
(Ediciones Andrômeda, San José, 2004) é única até o momento, se pensarmos em
uma percepção do surrealismo em âmbito continental, uma vez que este livro
aborda o que há de mais expressivo na poesia vinculada ao surrealismo em todo o
continente americano, na extensão dos quatro idiomas aí falados: português,
espanhol, francês e inglês.
13. Baciu,
Stefan. Antologia de la poesia surrealista latinoamericana. Ediciones
Universitárias de Valparaiso. Chile. 1981.
14. No caso de Perfecto Cuadrado, além da
referência que já fizeste à Antologia da poesia surrealista portuguesa,
cabe mencionar todo o trabalho de criação de um acervo de obras surrealistas
através da Fundação Cupertino de Miranda, em Vila nova de Famalicão, Portugal.
Quanto ao inglês C. B. Morris, mereceria já publicação no Brasil o largo volume
Surrealism and Spain 1920-1936 (1972).
15. Referências a Richard Coyne e D. J. Haraway
encontramos no ensaio “surrealismo e tecnosurrealidade: rotas convergentes?”,
de José Augusto Mourão, revista Atalaia-Intermundos # 10/11 (Lisboa,
2002), dossier dedicado ao surrealismo, organizado por Maria Estela Guedes e
Floriano Martins.
16. El
surrealismo – Puntos de Vista y Manifestaciones, Barral Editores,
Barcelona, 1977, edição espanhola de Entrétiens,
as entrevistas radiofônicas de Breton.
17. Na edição brasileira de Benjamin Péret, Amor Sublime – Ensaio e poesia, 1985,
organização de Jean Puyade, tradução de Sérgio Lima e Pierre Clemens,
Brasiliense, São Paulo.
18. Octavio Paz, A dupla chama – Amor e Erotismo,
tradução de Wladyr Dupont, Editora Siciliano, São Paulo, 1993.
19. Mircea Eliade, Initiation, rites, societés secretes, Folio, Gallimard, Paris,
1992.
20. Na introdução de André Breton today, coletânea organizada por Anna Balakian e Rudolf
E. Kuenzli, Willis, Locker & Owens, New York, 1989.
21. “A favor do método”. Rev. Bizarrona #
19, publicação virtual, s/d.
22.
Refiro-me à mostra e ciclo de palestras
Convocação de cúmplices pelo Grupo Surrealista Decollage, na AAMAM,
Associação dos Amigos do Museu de Arte Moderna de São Paulo, em outubro de
2004.
23. Embora já tenha registrado aqui menção à
exposição O surrealismo abrangente,
que exibe o acervo particular de Cruzeiro Seixas (1920), cabe ressaltar a
publicação de um extenso catálogo de obras do artista português, por ocasião da
recepção do prêmio Soctip (Portugal, 1989), volume em que se encontra
expressiva cronologia e uma seleção rara de textos críticos a seu respeito. E o
mesmo em relação ao argentino Victor Chab (1930), que teve um igualmente largo
catálogo de obras editado por ocasião da retrospectiva no Palais de Glacê
(Buenos Aires, 2002). Cruzeiro Seixas e Víctor Chab são possivelmente os mais
influentes artistas ligados ao surrealismo em toda a tradição pictórica
portuguesa e argentina.
*****
EDIÇÃO
COMEMORATIVA | CENTENÁRIO DO SURREALISMO 1919-2019
Artista
convidado: Jan Dočekal (República Checa, 1943)
Agulha Revista de
Cultura
20 ANOS O MUNDO CONOSCO
Número 134 | Maio de
2019
editor geral | FLORIANO
MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
editor assistente |
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FLORIANO MARTINS
revisão de textos &
difusão | FLORIANO MARTINS | MÁRCIO SIMÕES
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