O triunfo da Revolução Cubana,
em janeiro de 1959, marcou o início de um processo de transformações em todos os
âmbitos da sociedade, inclusive no campo cultural. Entre os anos de 1959 a 1961,
momento de definição do caráter socialista da Revolução, um intenso debate ocorreu
em Cuba entre a intelectualidade e líderes políticos sobre a definição do caráter
da arte revolucionária, a liberdade de produção e expressão e o papel dos intelectuais
na sociedade.
O livro Cultura ilhada: imprensa
e Revolução Cubana relata a história do suplemento cultural Lunes de Revolución,
que surgiu em 23 de março de 1959, quase quatro meses depois do triunfo da Revolução.
Lunes, que significa segunda-feira em espanhol, era distribuído neste dia da semana
como encarte do jornal Revolución, do Movimento Revolucionário 26 de Julho, uma
das principais organizações que garantiu a guerrilha na Sierra Maestra. O suplemento
contou com os escritores Guillermo Cabrera Infante (recém falecido em Londres, em
2005) e Pablo Armando Fernández como diretor e subdiretor da publicação.
Marcante no perfil de Lunes
de Revolución era a pluralidade temática do suplemento em refletir uma grande abertura
dos seus editores às diferentes tendências culturais e correntes do pensamento cubano
e mundial. Muitos números apresentaram temas relacionados à Revolução Cubana e o
suplemento defendeu Cuba diante dos ataques, sabotagens e tentativas de invasão
por parte dos Estados Unidos. Questões políticas internacionais foram debatidas
também em diversas edições, que demonstravam a preocupação do suplemento em solidarizar-se
com as lutas de libertação, anticoloniais e antiimperialistas, em andamento na América
Latina, África e Ásia.
Contribuições de intelectuais
estrangeiros também estiveram presentes em muitos números, como Ernest Hemingway,
Federico García Lorca, Cervantes, Albert Camus, Pablo Picasso e Jorge Luis Borges,
entre outros. Jean-Paul Sartre, Simone de Beauvoir e Pablo Neruda estiveram em Cuba,
no ano de 1960, convidados pelo jornal Revolución e por Lunes de Revolución, na
ocasião em que o suplemento editou números especiais, divulgou suas obras e ressaltou
a importância destas visitas para fortalecer a Revolução Cubana.
O espaço aberto na publicação
para o surrealismo, a literatura do absurdo, a arte moderna e abstrata e os beatniks,
era visto como uma provocação pelos setores intelectuais ligados ao Partido Socialista
Popular (PSP), denominação na época do Partido Comunista, que defendiam o realismo
socialista e acreditavam que as manifestações culturais editadas em Lunes não estavam
de acordo com as exigências do momento revolucionário. Para os editores do suplemento,
sua proposta não era incompatível à perspectiva de se desenvolver a cultura cubana,
que deveria responder às questões colocadas pela realidade nacional, sem se fechar
às obras de arte e literárias que estavam sendo elaboradas no mundo.
Entretanto, a política cultural
foi estabelecida pelo governo cubano em 1961. O discurso Palavras aos intelectuais
de Fidel Castro, de junho de 1961, definiu os direitos e deveres dos intelectuais
e do governo. O Primeiro Congresso Nacional de Escritores e Artistas realizado em
agosto de 1961, aprovou as diretrizes estabelecidas por Fidel e surgiu a União de
Escritores e Artistas de Cuba (Uneac), presidida pelo poeta Nicolás Guillén. As
resoluções do Congresso definiam como objetivo primordial para as atividades dos
intelectuais a “elaboração sobre a cultura nacional cubana”, supostamente vinculada
às “preocupações do povo cubano”.
Lunes foi excluído desta
política cultural aprovada neste evento. Duas novas revistas foram criadas no Congresso,
que acabou por decidir o fechamento de Lunes de Revolución.
A prioridade de se desenvolver
obras que dialogassem com a tradição nacional cubana entrava em choque com um dos
aspectos bastante significativos da linha editorial de Lunes: o grande espaço que
o suplemento abria para as correntes e intelectuais estrangeiros. A visão cosmopolita
e internacionalista de Lunes entrava em contradição com a política cultural do governo,
centrada no resgate dos elementos nacionais da cultura cubana. Estes episódios ocorriam
pouco depois da definição do caráter socialista da Revolução, declarado por Fidel
Castro em abril de 1961.
O fechamento de Lunes, que
editou seu último número dedicado a Pablo Picasso, em 6 de novembro de 1961, significou
um controle da produção e expressão artística em Cuba, um ato de censura do governo,
que visava dispersar o grupo de escritores que se reunia ao redor do suplemento.
Os intelectuais que participaram de Lunes eram favoráveis à Revolução, mas propunham
no suplemento uma política cultural eclética, não dogmática, com perspectivas internacionais,
e o governo não permitiu que um grupo com tais contornos continuasse a ter repercussão
e influência na vida cultural cubana. O motivo oficial do fechamento foi falta de
papel, mas as razões da extinção de Lunes foram mais profundas e complexas do que
a divulgada pelo governo e se relacionavam com a adoção de uma política cultural
que se aproximava bastante dos parâmetros do realismo socialista.
O realismo socialista soviético
também rechaçou as influências das vanguardas, a experimentação estética, o cosmopolitismo,
a arte abstrata e somente incentivou obras de arte didáticas, compreensíveis para
o povo e comprometidas explicitamente com a Revolução. Estes elementos estavam presentes
nos discursos de Fidel Castro e nos informes do Congresso, que estabeleceram os
parâmetros da política cultural cubana. A formulação desta política cultural ocorria
justamente quando Cuba firmava acordos políticos e comerciais com a União Soviética
e o governo cubano organizava internamente a centralização política e cultural das
instituições de poder. Os dirigentes do PSP assumiram um espaço maior na direção
do governo e ocuparam postos que no início da Revolução estavam nas mãos do Movimento
26 de Julho.
A burocratização do governo
cubano começou a se efetivar, além dos primeiros atos de censura à liberdade de
criação e expressão, o que era contrário a defesa da arte revolucionária livre e
independente, tão bem elaborada por Leon Trotski, André Breton e Diego Rivera, em
manifesto de 1938, que foi publicado em Lunes de Revolución. O “Manifesto por uma
arte revolucionária independente” defendia a necessidade de se fortalecer uma oposição
artística frente ao stalinismo e ao nazismo, cujos regimes totalitários e repressivos
impunham normas à atividade intelectual e à criação artística, elaboradas pelos
Estados. Não se tratava de defender a “arte pura”, que negava qualquer vínculo com
a sociedade, mas pelo contrário, o manifesto afirmava que arte tinha uma função
de participar socialmente em prol da Revolução, mas que os escritores e artistas
deveriam desenvolvê-la livremente, da maneira que eles achassem mais conveniente.
As concepções do manifesto de Trotski, Breton e Rivera eram defendidas pelos editores
de Lunes como alternativa de política cultural para a Revolução, mas não foram aceitas
pelo governo cubano, pois se tratavam de um contraponto ao realismo socialista que
era instaurado na ilha.
LA LABOR
EDITORIAL DE JOSÉ MARIO EN EL PUENTE | He estudiado la historia cubana de los años '60 y mi
primer contacto con la obra de José Mario ocurrió cuando hice mis cursos para la
Maestría en Historia en la Universidad de São Paulo, Brasil. En esa ocación, investigué el semanario Lunes
de Revolución y el modo en que el establecimiento de la política cultural oficial
había dado lugar al cierre de esa publicación en 1961. La lectura de los textos de Pío Serrano (1999)
y Jesús Barquet (1994) me revelaron entonces
la existencia de las Ediciones El Puente y la labor editorial que José Mario
había realizado en Cuba en los '60.
La importancia de las Ediciones El Puente en
la conformación de un espacio de publicación para los poetas y los escritores jóvenes
después del triunfo de la revolución me llevó a elegir las Ediciones El
Puente como tema de mi investigación para el Doctorado. En esa investigación
intentaré comprender el proceso de formación de la editorial, su carácter independiente
en el contexto del campo intelectual cubano de la época, y la razón del cierre de
El Puente por el gobierno en 1965.
Estoy investigando también el surgimiento de El Caimán Barbudo en
1966, la publicación de la Unión de Jóvenes Comunistas que sería una contraposición
al trabajo autónomo de las Ediciones. El
director de El Caimán Barbudo, Jesús Díaz (1966), atacó muy fuertemente a
El Puente en las páginas de La Gaceta de Cuba, como “ la fracción más disoluta
y negativa de la generación actuante”, en momentos en que el cierre de El Puente
ya era una realidad, intentando de ese modo lograr que su propia publicación llenara
el vacío dejado en el medio cultural de la juventud por la clausura de las Ediciones.
El surgimiento de la editorial fue una iniciativa de
José Mario, quien percibió la necesidad de un espacio para los jóvenes escritores
que jamás habían publicado antes del triunfo de la Revolución y que además tenían
textos inéditos. Antes de la creación de El Puente, José Mario empezó su
labor como editor publicando su libro El grito, conjuntamente con La marcha de los
hurones, de Isel Rivero. Publicado por la
Imprenta de la Confederación de Trabajadores de Cuba Revolucionaria (CTC-R), El
grito fue considerado la primera manifestación del grupo de jóvenes poetas que se
reunirían posteriormente alrededor de las Ediciones. En la solapa de su libro
Clamor Agudo, José Mario reconoció que El grito “es un libro molesto para muchas
gentes, menos para mí”, lo cual revela el carácter polémico que desde el principio
tuvieron sus publicaciones. La labor de José Mario en El Puente permitió
que numerosos jóvenes, mujeres y negros publicasen sus libros de poesía, cuentos
o teatro por primera vez. La creación de la editorial posibilitó también a José
Mario publicar sus propios libros de poesía y teatro infantil. Muchos de los escritores
publicados en El Puente tenían un origen social humilde y no habían tenido
oportunidad de dar a conocer sus obras antes de la labor de José Mario.
La publicación de la antología Novísima poesía cubana
en 1962, realizada por Ana María Simo y Reinaldo Felipe, tuvo extrema importancia
para los doce poetas incluidos, todos los cuales habían nacido alrededor de 1940.
En el prólogo, esos autores fueron denominados los "novísimos" de la literatura
cubana. El prólogo se caracteriza, primero, por criticar la poética de Lezama Lima
y de los origenistas, muy volcados hacia sí mismos y, por otro lado, rechazar la
poesía de propaganda, como dos vertientes que deberían ser superadas en la literatura
cubana. Se expresó la intención de formar un
movimiento poético que buscara una poesía preocupada por el ser humano, sus contradicciones y su existencia. Mucho después, esa poesía fue denominada por Jorge Luis Arcos (1999) “la veta existencialista del efímero grupo El Puente”. Posteriormente, Guillermo Rodríguez Rivera (1984), escritor que participó en la primera época de El Caimán Barbudo, clasificó la poesía del grupo El Puente como intimista y hermética, puesto que ignoraba la existencia del momento revolucionario. Algunos poemas de El Puente trataban temas íntimos, pero había poetas que hacían referencias explícitas a la revolución.
movimiento poético que buscara una poesía preocupada por el ser humano, sus contradicciones y su existencia. Mucho después, esa poesía fue denominada por Jorge Luis Arcos (1999) “la veta existencialista del efímero grupo El Puente”. Posteriormente, Guillermo Rodríguez Rivera (1984), escritor que participó en la primera época de El Caimán Barbudo, clasificó la poesía del grupo El Puente como intimista y hermética, puesto que ignoraba la existencia del momento revolucionario. Algunos poemas de El Puente trataban temas íntimos, pero había poetas que hacían referencias explícitas a la revolución.
La aparición de la Novísima marcó definitivamente la
entrada del grupo en el campo cultural cubano. La publicación de poemas de Isel
Rivero y Mercedes Cortázar, autoras que ya se habían exiliado, fue muy criticada,
como reconoció algún tiempo después el propio José Mario en la revista Mundo
Nuevo (1969). La importancia dada en el prólogo al poema de Isel, La marcha
de los hurones, como expresión de un sentimiento colectivo de impotencia, fue también
cuestionada por José Mario (1969) como una exageración de Ana María Simo y Reinado
Felipe, pues era el sentimiento de una parte del grupo, y no de todos. El hecho de publicar poetas exiliadas revela en
qué medida El Puente intentó luchar por la libertad de creación y por la
innovación.
Tras la repercusión alcanzada por la Novísima, las Ediciones
pasaron a ser distribuídas y, posteriormente, editadas bajo el patrocinio de la
Unión de Escritores y Artistas de Cuba (UNEAC).
Fue también el poeta Nicolás Guillén, Presidente de la UNEAC, quien después
comunicó a José Mario que no se permitiría que la editorial continuara sus actividades.
Las razones del cierre de la editorial están muy relacionadas con su carácter independiente,
pero lo que detonó el conflicto fue la visita
a La Habana en 1965 del poeta norteameriano Allen Ginsberg, quien había sido invitado
a participar en el jurado del Concurso de la Casa de las Américas. En esos meses,
José Mario estaba preparando la publicación de una revista, el Resumen Literario
El Puente, y tenía intenciones de que se tradujera el poema Howl (Aullido) de
Ginsberg para que apareciera en la nueva publicación. Las relaciones que establecieron
José Mario, Manuel Ballagas y otros escritores de El Puente con Ginsberg
y las declaraciones de éste contra las depuraciones y las persecuciones de homosexuales
en Cuba constituyeronn el punto final de las Ediciones y también provocaron
la expulsión de Ginsberg de la isla. José Mario se vio imposibilitado de sacar los
libros que ya se encontraban en la imprenta, como la Segunda Novísima de Poesía
Cubana, con selección y prólogo suyos. Según dijo José Mario (2000) muchos años
después, habían surgido rumores acerca de la homosexualidad de varios escritores
del grupo El Puente y también sobre la supuesta creación de un movimiento
Black Power, debido a la presencia de muchos negros en ese grupo. Esos rumores
contribuyeron al cierre de la editorial.
Lo que siguió fue la persecusión y la prisión de José
Mario, Ana María Simo, Manuel Ballagas y otros miembors del grupo. José Mario (2000)
ha narrado cómo fue detenido 17 veces y permaneció nueve meses en uno de los campamentos
de las Unidades Militares de Ayuda a la Producción (UMAP) en Camagüey, hasta que
logró irse del país y establecerse en Madrid. Las UMAPS fueron campos de trabajo
forzado que el gobierno utilizó para detener a los que eran considerados disidentes
y homosexuales. La conducta sexual impropia era una de las razones que dieron lugar
al encarcelamiento de miles de jóvenes en las UMAPS. En el documental Conducta
impropia, de Néstor Almendros y Orlando Jimenez Leal (1984), José Mario y Ana
María Simo, ya en el exilio, presentaron impresionantes testimonios sobre la represión
de la que habían sido víctimas y afirmaron que esa represión se había debido a sus
preferencias sexuales y al papel que habían desempeñado en la dirección de El
Puente.
Los relatos y las reflexiones sobre la política cultural
cubana analizan, en general, los años '60 en Cuba como una época de amplias libertades
y pluralidades en el campo intelectual. Por otro lado, con relación a los años '70,
los críticos son unánimes en demostrar el endurecimiento y la rigidez de la censura
de los años grises, sobre todo después del Congreso de Educación y Cultura de 1971.
El caso del cierre de Lunes de Revolución y de las Ediciones El Puente,
y la existencia de las UMAPS, demuestran que la libertad de expresión no fue tan
amplia en los '60 como se afirma y que la censura y la persecución de los homosexuales
ya estaban inscritas en la política cultural oficial cubana desde los primeros años
de la Revolución.
La decisión de guardar silencio sobre las Ediciones
El Puente en Cuba es un hecho que pude constatar en la isla en 2002, cuando
traté de llevar a cabo mi investigación para el doctorado. Apenas se escribe ni
se habla de la existencia de dichas Ediciones en la cultura cubana de los '60 y
el tema constituye, hasta hoy en día, un tabú. Ciertos escritores importantes, que
permanecieron en la isla, no siempre reconocen públicamente que sus primeros libros
salieron por El Puente. Por otra parte, Nancy Morejón (2002), que obtuvo
el Premio Nacional de Literatura en Cuba en 2001, ya ha hablado de su participación
en las Ediciones y del estigma que le quedó por muchos años: “Yo viví acomplejada
muchos años… (…) porque éramos considerados algo así como seres endiablados. Te
digo que a mí todavía en un Consejo Nacional de la UNEAC me da trabajo levantar
la mano para decir algo, porque me parece que va a salir alguien y me va a decir:
´Cállese usted, porque los de El Puente`… Ahora te lo puedo contar,
pero antes no se hablaba de esas cosas…”
He sentido mucho en Brasil el fallecimiento de José
Mario hace unos días, en Madrid, que constituye una gran pérdida para la cultura
cubana y también para mí, quien admiraba su obra sin haberlo conocido personalmente. Ojalá algún día su labor editorial, dentro y fuera
de Cuba, y su obra escrita, sean reconocidas en la isla como importantes contribuciones
al desarollo de la literatura cubana.
Edição preparada por Floriano
Martins. Página ilustrada com obras de Arshile Gorky (Armênia, 1904-1948), artista
convidado da presente edição.
*****
Agulha Revista de Cultura
Número 124 | Dezembro de
2018
editor geral | FLORIANO MARTINS
| floriano.agulha@gmail.com
editor assistente | MÁRCIO
SIMÕES | mxsimoes@hotmail.com
logo & design | FLORIANO
MARTINS
revisão de textos & difusão
| FLORIANO MARTINS | MÁRCIO SIMÕES
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