quarta-feira, 27 de maio de 2020

LAURA MULVEY | Cosméticos e abjeção: feminismo e fetichismo na fotografia de Cindy Sherman


Os trabalhos de Cindy Sherman são fotografias. Ela não é uma fotógrafa, mas uma artista que usa a fotografia. Cada imagem é construída em torno da representação fotográfica de uma mulher. E cada uma dessas mulheres é a própria Sherman, simultaneamente artista e modelo, transformada, camaleonicamente, em um glossário de poses, gestos e expressões faciais. Na medida em que seu trabalho se desenvolveu, entre 1977 e 1987, um estranho processo de metamorfose ocorreu. Pastiches pós-modernos aparentemente fáceis e acessíveis se transformaram gradualmente em imagens difíceis, porém ainda acessíveis, que traziam questões sérias e desafiadoras para as estéticas feministas contemporâneas. E essa metamorfose provê uma nova perspectiva que então altera, retrospectivamente, a significância de seu trabalho inicial. De forma a compreender as implicações críticas dessa perspectiva alterada, é necessário contestar com veemência sua postura expressamente não-teórica, ou mesmo anti-teórica.
Paradoxalmente, é porque não há citação teórica explícita em seu trabalho, nenhuma palavra explicativa, nenhuma indicação linguística, que a teoria pode então por si só se constituir. A obra de Sherman continua sendo afeita ao enigma, mas como um desafio crítico, e não como um mistério insolúvel. Solucionar o enigma, decifrar suas pistas pictográficas, aplicar as ferramentas teóricas associadas à estética feminista, é, para usar uma de suas palavras favoritas, divertido. E chama atenção para a forma como, a partir de estéticas feministas, a teoria, a decifração e o prazer da resolução de um enigma ou de um quebra-cabeça podem estar conectados.
Durante os anos 1970, estéticas feministas e mulheres artistas contribuíram fortemente ao questionamento de duas grandes divisões culturais. Ao longo do século 20, inexoravelmente, mas de forma descontínua, constituiu-se uma pressão contra a separação entre teoria de arte e prática artística, por um lado, e entre alta e baixa cultura por outro. O colapso dessas divisões foi crucial para os vários e variados componentes da pós-modernidade, e também para a arte feminista. Mulheres artistas fizeram uso tanto da teoria quanto da cultura popular a partir de referências e citações. Cindy Sherman, apresentando seu trabalho pela primeira vez no final dos anos 1970, usou a cultura popular como sua fonte material sem fazer uso da teoria como um dispositivo de comentário e de distanciamento. Quando suas fotografias foram exibidas pela primeira vez, sua reiteração insistente de representações do feminino, e o uso pela artista de si mesma enquanto modelo, em infinitas variações de máscaras, imediatamente chamou a atenção dos críticos que a acolheram como um contraponto à arte feminista teórica e conceitual. O sucesso de seu trabalho inicial, sua aceitação pelo centro (mercado e instituições de arte) em um momento em que diversos artistas defendiam uma política marginal, contribuiu para obscurecer o fato de que seu trabalho tinha interesse intrínseco para estéticas feministas, bem como que as ideias criadas pelo seu trabalho não poderiam ter sido formuladas sem uma pré-história do feminismo e de teorizações feministas do corpo e da representação. Sua chegada à cena artística certamente marcou o começo do fim da era em que o corpo feminino tinha se tornado, se não irrepresentável, somente representável se refratado pela teoria. Mas em vez de se esquivar, Sherman reage e altera a teoria. Ela traz uma perspectiva diferente para a “questão das imagens de mulheres” e retoma uma política do corpo que tinha sido, talvez, perdida ou negligenciada pelas reviravoltas do feminismo dos anos 1970.
No início daquela década, o Women’s Movement [segunda onda do movimento feminista norte-americano] tomou o corpo feminino como um lócus de disputa política, mobilizando-se acima de tudo em torno do direito ao aborto, mas com outras questões suplementares se desenrolando na forma de uma agitação sobre a marginalização médica e a sexualidade em si como uma fonte de opressão sobre as mulheres. Uma política do corpo levou logicamente a uma política da representação do corpo. Foi necessário apenas um pequeno passo para incluir a questão das imagens de mulheres nos debates e nas campanhas em torno do corpo, mas foi esse pequeno passo que levou o feminismo para fora do terreno familiar da ação política e para dentro do terreno das estéticas políticas. E também este pequeno passo, de um terreno a outro, requereu um novo vocabulário conceitual, e abriu caminho para a influência que a semiótica e a psicanálise exerceram sobre a teoria feminista. A ideia inicial de que as imagens contribuíram para a alienação das mulheres de seus corpos e de suas sexualidades, com uma esperança concomitante de liberação e recuperação, foi substituída por teorias da representação como sintoma e significante da forma como problemas postos pela diferença sexual sob o patriarcado poderiam ser deslocados para o feminino.
Não surpreendentemente, esse tipo de estética teórica/política afetou também artistas trabalhando no ambiente do feminismo dos anos 1970, e a representabilidade do corpo feminino entrou em crise. Em um extremo, o diretor Peter Gidal disse em 1978: “Eu me recusei veementemente ao longo da década passada, tirando uma ou outra aberração menor, em permitir qualquer imagem de mulheres em meus filmes, já que não vejo como essas imagens possam ser separadas dos significados dominantes”. Artistas e diretoras mulheres, ao mesmo tempo em que rejeitavam esse banimento indiscriminado, foram extremamente cautelosas no investimento de “significados dominantes” em imagens de mulheres. Enquanto teóricas feministas focaram na cultura popular para analisar esses significados, artistas se voltaram à teoria, justapondo imagens e ideias para negar esses significados dominantes e, devagar e polemicamente, inventar outros. Apesar de, neste ambiente, o foco de Cindy Sherman no corpo feminino parecer quase chocante, suas representações de feminilidade não eram um sinal de regressão, mas uma re-representação, um tornar estranho.
Uma visitante de uma retrospectiva de Cindy Sherman, que caminha pelas suas obras em ordem cronológica, deve ficar quase tão impactada pela natureza dramática de seu desenvolvimento quanto pelas obras individuais, em si muito impactantes. Não é apenas uma questão de observar a crescente maturidade, o estilo que muda, ou as novas direções tomadas, mas de seguir uma certa narrativa do feminino de sua premissa inicial até o seu ponto final. E esse desenvolvimento ocorre ao longo de dez anos, entre 1978 e 1987. A jornada pelo tempo, pelo desenvolvimento cronológico da obra, é também uma jornada ao espaço. Sherman disseca o espaço fantasmagórico conjurado pelo corpo feminino, de sua exterioridade para sua interioridade. A visitante que chega às imagens finais e então retorna, invertendo a ordem, descobre que, sabendo-se já o que está por vir, as imagens iniciais são transformadas. O processo inicial de descoberta, diversão e admiração é complementado pela descoberta da curiosidade, do devaneio e da decifração. E então, uma vez que o processo de desintegração corpórea é estabelecido nas obras posteriores, as inocentes imagens anteriores adquirem uma estranheza retrospectiva.
A primeira série de fotografias, que também estabeleceram a reputação de Sherman, é chamada de Untitled film stills. Em cada fotografia, Sherman posa para a câmera como se estivesse em uma cena de filme. Cada fotografia tem sua própria mise-en-scène, evocando um estilo de filmagem que é altamente conotativo, porém elusivo. As fotografias em preto-e-branco parecem se referir aos anos 1950, à nouvelle vague, ao neorrealismo, a Hitchcock, ou a filmes B hollywoodianos. Esse uso de uma conotação amorfa as coloca no gênero da nostalgia, comparáveis aos filmes americanos dos anos 1980, que Fredric Jameson descreve como tendo a característica pós-moderna de evocar o passado ao mesmo tempo em que nega a referência da história. Elas têm a qualidade barthesiana cinquentista, aquela fantasia coletiva americana dos anos 1950 como o momento de juventude generalizada em um cenário de uma América branca e predominantemente de classe média, o último momento de calma antes das tempestades dos direitos civis, do Vietnã e finalmente do feminismo. Nostalgia é memória seletiva, e tem frequentemente como efeito dar atenção às suas repressões, ao fato de que sempre esconde mais do que registra. E os anos 1950 assistiram ao último desabrochar de uma cultura específica de aparências e, particularmente, da aparência feminina. Os apetrechos da luta feminina para se conformar à fachada de desejabilidade assombram a iconografia de Sherman. Maquiagem, saltos, cabelo armado, roupas respeitáveis, mas erotizadas, são todos cuidadosamente “colocados” e “feitos”. Sherman, a modelo, se veste a caráter enquanto Sherman, a artista, revela a máscara de sua personagem. A justaposição começa a denotar uma “superficialidade”, de forma que a nostalgia começa a se dissolver em desconforto. Sherman acentua esse desconforto ao inscrever uma vulnerabilidade tanto na mise-en-scène das fotografias quanto nas poses e expressões das mulheres.
Essas cenas dos Film stills ocorrem normalmente no exterior. Sua fascinação deriva de sua qualidade de trompe-l’oeil. A espectadora passa por uma série de estranhamentos, reconhecimentos e doubletakes [termo sem tradução direta para o português, significa algo como um “olhar de novo” reativo, uma segunda olhada mais atenta e imediatamente após o primeiro olhar]. A câmera olha; ela “captura” a personagem feminina em uma paródia de diferentes voyeurismos. Ela se intromete em momentos onde a personagem está desprotegida, às vezes despida, absorvida em seu próprio mundo na privacidade de seu próprio ambiente. Ou testemunha o momento em que ela inadvertidamente baixa a guarda ao se assustar com a presença, invisível e fora de cena, de alguém que a vê. Ou a câmera a observa composta, ao mesmo tempo recatada e sedutora, frente ao mundo exterior e seu olhar intrusivo. A espectadora é imediatamente atraída pelos voyeurismos apresentados. Mas o fato óbvio de que cada personagem é a própria Sherman, disfarçada, introduz um senso de encantamento em relação à ilusão e sua credibilidade. E, como é sabido, no cinema qualquer momento de admiração de uma ilusão imediatamente destrói sua credibilidade. A atração do voyeurismo se volta como uma armadilha, e a espectadora acaba consciente de que Sherman, a artista, montou uma máquina para fazer o olhar se materializar desconfortavelmente em uma aliança com Sherman, a modelo. E então a curiosidade da espectadora pode ser atraída para a narrativa adjacente. Mas, qualquer especulação em torno de uma história, em torno de eventos reais e da personagem representada, rapidamente encontra um beco sem saída. A visitante de um vernissage de Cindy Sherman deve estar bastante consciente que a série Film stills é construída em torno de uma única imagem. E que nada existe, seja antes ou depois do momento mostrado. Cada momento significante é um recorte, um tableau sugerindo e negando a presença de uma história. Na medida em que elas aparentam ser algo a mais, as fotografias de Film stills parodiam a imobilidade da fotografia e performam ironicamente a pungência de um “momento congelado”. As mulheres nas fotografias estão quase sempre em estase, paralisadas por algo além da fotografia, como surpresa, devaneio, decoro, ansiedade ou apenas esperando por algo.
O voyeurismo da espectadora é desconfortável. Não há um exibicionismo complementar da parte das figuras femininas e a sensação de estar as observando, sem ser visto, provoca uma mistura de curiosidade e ansiedade. As imagens são, contudo, eróticas. Sexualidade permeia as figuras e suas narrativas implícitas. Sherman performa feminilidade como uma aparência, em que a insistente sexualização da mulher paira, oscilando com respeitabilidade. Porque Sherman usa cosméticos literalmente como uma máscara, ela torna visível o feminino como uma máscara. E é essa cultura de aparências, a homogeneidade do visual que caracteriza o cinquentismo, da qual Sherman se utiliza para adotar tal variedade de figurações similares, porém diferentes. Identidade, ela parece dizer, se encontra nos visuais da feminilidade branca do período. Mas justamente por ela ser artista e modelo, voyeur e objeto do olhar, ativa e passiva, sujeito e objeto, as fotografias configuram uma variedade comparável de posições e respostas para o espectador. Não há um sujeito estável em sua obra, nenhum ponto fixo que não se transforme rapidamente em outra coisa. Dessa forma, a sensação inicial de homogeneidade e credibilidade dos Film stills se fragmenta no tipo de heterogeneidade de posições subjetivas que estéticas feministas adotaram em antecipação ao pós-modernismo propriamente dito.
Em 1980, Sherman fez sua primeira série de fotografias coloridas, usando projeções de fundo de externas em vez de locações de fato, se aproximando para uma concentração maior no rosto, e achatando o espaço da fotografia. Então, em 1981, ela fez uma série de fotografias coloridas que começaram a sugerir uma interioridade à aparência exterior da figura. Essas fotografias dão início à sua exploração da máscara da oposição binária interior/exterior da feminilidade. Todas as fotografias têm o mesmo formato, horizontal como de uma tela de cinemascope. Portanto, boa parte das figuras aparece deitada, em sofás ou camas ou no chão. Como a série se originou como imagens de duas páginas para a [revista] Artforum, elas parodiam um pastiche soft-core. Essas fotografias se concentram na esfera das emoções, desejos e devaneios femininos, e são realizadas em espaços privados que reduplicam a privacidade das emoções. Mas, mais uma vez, uma sensação exata é impossível de ser definida. As jovens mulheres que Sherman personifica podem estar sonhando acordadas sobre um futuro romance ou podem estar de luto por um. Elas podem estar esperando, em uma passividade forçada, por uma carta ou telefonema. Seus olhos contemplam a distância. Elas não parecem se importar com suas roupas, que às vezes se encontram amarrotadas, de forma que, seguras e sozinhas com seus pensamentos, seus corpos ficam levemente à mostra ao espectador. Elas emanam vulnerabilidade e disponibilidade sexual como heroínas/vítimas apaixonadas em um melodrama açucarado. Existem alguns precedentes para essa série em Untitled film stills, mas o uso da cor, do formato horizontal e da pose repetida criam um duplo tema de espaço interno e devaneio. O espaço íntimo de um quarto propicia o cenário apropriado para um sonhar acordado ou um devaneio, que combina com as poses sugestivas e eróticas de Sherman em um acúmulo de conotações de sexualidade. Essas fotografias reiteram o caráter “para-ser-olhada” da feminilidade. A Untitled film stills falseia uma narrativa em torno das fotografias para que a câmera não atraia indevida atenção à sua presença, o caráter “para-ser-olhada” sendo assim uma questão de conformidade social e cultural. As imagens da série Untitleds de 1981, por sua vez, se anunciam enquanto fotografias e, assim como em uma pin-up, o erotismo da modelo, e sua pose, são direcionadas para a câmera, e em última análise para a espectadora.
Em boa parte das Untitled film stills, as figuras femininas se destacam de seu entorno, exagerando a sua vulnerabilidade em um mundo exterior. Em algumas, contudo, um granulado visível mescla a figura com a textura e o material da fotografia. Na série de 1981, o uso de Sherman da cor, da luz e da sombra mistura a figura feminina e seus entornos em um contínuo, sem bordas definidas. Focos de luz iluminam partes da pele ou banham a imagem com um brilho suave. Acima de tudo, as fotografias têm um acabamento lustroso e de alta qualidade, condizente com os códigos e convenções da fotografia comercial. Enquanto as poses são suaves e relaxadas, antitéticas à ideia popular de feminilidade fetichizada (de salto alto e corpete, ereta, extravagante e exibicionista), o fetichismo retorna nas qualidades formais da fotografia. A sensação de superfície reside agora não na tentativa da figura feminina de manter as aparências com a máscara da feminilidade, mas na subordinação e imbricação da modelo com a textura do meio fotográfico em si.
A próxima fase importante de Sherman, a série Untitleds de 1983, começa a manifestar o humor sombrio que vai, a partir daqui, cada vez mais dominar suas obras. Essa virada foi, em primeiro lugar, uma reação contra a indústria da moda que havia a convidado para realizar ensaios fotográficos e, posteriormente, tentado modificar e suavizar os resultados: “Desde o começo havia alguma coisa que não funcionava para mim, como se tivesse alguma fricção. Eu selecionei algumas roupas que queria usar. Enviaram-me roupas completamente diferentes, todas enfadonhas. Aí eu realmente comecei a tirar sarro, não das roupas, mas muito mais da moda. Eu comecei a colocar tecidos e cicatrizes no meu rosto para ficar bem feia” [Cindy Sherman, citada no livro The state of the art: Ideas and images in the 1980s, de Sandy Nairne].
Essas fotografias usam iluminação forte e brilhante e cores de alto contraste. As personagens são teatrais e exageram seus papéis. O novo corpo de Sherman começa a emergir. Ela parodia grotescamente o tipo de imagem feminina orientada para o consumo erótico, e inverte os códigos convencionais de atração e elegância femininas. Enquanto a linguagem da fotografia de moda dá grande ênfase à leveza, de forma que as modelos parecem desafiar a gravidade, as figuras de Sherman são pesadas em corpo, aterradas ao solo. Sua falta de autoconsciência beira ao exibicionismo. E elas fazem poses profissionais para mostrar roupas que exageram seus físicos desajeitados, que são exagerados mais uma vez pela iluminação e o ângulo da câmera. Não há absolutamente nada de natureza ou natural nessa resposta à esbelteza cosmética da moda. Ao contrário, as imagens sugerem que a oposição binária ao corpo perfeito da manequim é o grotesco, e que o corpo suave e liso, polido pela fotografia, é uma defesa contra um corpo estranho, inquietante e desconfortável. A partir dessa perspectiva, a superfície do corpo, tão cuidadosamente apresentada nas fotografias iniciais, parece se dissolver para revelar uma monstruosa alteridade por trás da fachada cosmética. Um “alguém” que parecia espreitar em algum lugar na topografia fantasmática da feminilidade começa, por assim dizer, a se solidificar.
Após as Untitleds de 1983, a série anti-moda, as metamorfoses se tornam mais agudas e perturbadoras. A série Untitled 1984 é como que o reverso de Dorian Gray, como se a dor, a raiva e a estupidez da natureza humana deixassem seus traços claramente nas feições humanas, como se a superfície estivesse falhando em sua tarefa de mascarar. Na série seguinte, inspirada nos monstros de contos de fada, as figuras se tornam sobrenaturais e, quase como personificações animistas, pairam sobre ou retornam aos princípios elementares. Desta vez as figuras parecem emanações de medos irracionais, beirando o terror, relíquias de pesadelos infantis. Se a série de 1981 apresentava, a partir de expressão facial e pose, a interioridade de pensamentos secretos, Sherman agora parece personificar as coisas do inconsciente em si. Enquanto que a interioridade anterior sugeria devaneios leves e eróticos, essas são materializações de ansiedade e pavor. Sherman parece ter passado da sugestão da presença de uma alteridade escondida para a representação de seus habitantes. Uma maquiagem crescentemente grotesca e deformadora borra identidades de gênero, e algumas figuras possuem chifres ou focinhos, como horripilantes híbridos mitológicos. Se a iconografia anterior sugeria um desejo passivo por agradar, a deformação e a distorção parecem emergir em alguma proporção com a repressão. Essas figuras são ativas e ameaçadoras.
Finalmente, na última fase, as figuras desaparecem completamente. Às vezes partes do corpo são substituídas por próteses, como seios ou nádegas falsos, mas, em última análise, nada sobra além da repugnância; a repugnância de resíduos sexuais, comida apodrecida, vômito, gosma, sangue menstrual, cabelo. Esses traços representam o fim da linha, a substância secreta dos fluidos sexuais que os cosméticos foram criados para esconder. A topografia do exterior/interior está esgotada. Previamente, toda obra de Sherman havia se focado e se estruturado ao redor do retrato, para que a figura individual provesse o foco do olhar do espectador. A mise-en-scène do entorno havia gradualmente desaparecido como se Sherman estivesse negando ao espectador qualquer distração ou mitigação das figuras em si, na medida em que elas se tornavam gradualmente mais e mais grotescas. Por volta de 1985, cenários voltaram às fotografias, mas difusos em texturas. Elementos naturais, pedras, areia ou terra, por exemplo, desenvolvem conotações expressivas e ameaçadoras. Cor, iluminação e a textura das figuras as fazem se fundir visualmente com seus cenários. O ângulo da câmera aponta agora para o chão onde as figuras se encontram sem vida ou, talvez, presas em suas próprias materialidades.
A mudança de perspectiva para um plongée prenuncia a última fase de Sherman. Quando o corpo, em qualquer forma homogênea ou coesa, desaparece de cena, seus traços e detritos são espalhados pelo chão, em pedras ou areia ou submersos na água. Com a desintegração do corpo, as fotografias perdem também qualquer organização formal homogênea ou coesa, e a sensação de fragmentação física ecoa na fragmentação das imagens. Agora a borda da imagem pode ser tão significativa quanto qualquer outra parte dela. Ao mesmo tempo, as fotografias foram enormemente aumentadas. A série inicial, Untitled film stills, era toda de imagens de 20x25cm, enquanto que as fotografias da última série aumentaram para, por exemplo, 1,83×1,24m. A espectadora podia assimilar as obras iniciais com um olhar e com uma sensação de comando sobre a imagem; já as fotografias posteriores confundem a espectadora e forçam o olhar a escanear a superfície, procurando por uma figura ou padrão específico que possa oferecer alguma garantia formal diante de um conteúdo perturbador.
Essa narrativa de desintegração, horror e finalmente repulsa levanta, primeiramente, a questão da fonte, ou origem, dessa fantasmagoria do corpo feminino, e, em segundo lugar, suas possibilidades de análise. Uma mulher se torna “o veículo favorito da metáfora” uma vez que ela é inscrita no regime do complexo de castração, então a questão da origem retorna, mais uma vez, para a questão do inconsciente masculino. Uma superfície cosmética e artificial cobre, como uma carapuça, a ferida ou vazio deixado pela psique masculina quando esta percebe a marca da diferença sexual no corpo feminino como uma ausência, um vazio, uma castração. Neste sentido, a topografia da máscara feminina ecoa a topografia do fetiche em si. Mas enquanto que, por exemplo, o fenômeno da Pandora permanece, em último recurso, um sintoma dessas ansiedades e recusas, Sherman lentamente livrou o sintoma de seus mecanismos de recusa, ao mesmo tempo revelando os mecanismos em sua essência. O irônico “desvelar” de Sherman também “desvela” o uso do corpo feminino como uma metáfora da divisão entre a atração da superfície e a decadência oculta, como se aquilo que tivesse sido projetado por tanto tempo no espaço mítico “atrás” da máscara da feminilidade tivesse subitamente sido quebrado através do véu delicadamente pintado. As metamorfoses do corpo feminino, na “trajetória narrativa” de Sherman, traçam o gradual colapso da superfície. Parodiando a metáfora, ela retorna ao “literal”, aos fluidos corporais e restos que se tornam inseparáveis do corpo castrado na iconografia da misoginia. Mas ela dramaticamente chama a atenção também ao regime do representacional e da contradição mitológica vivida pelas mulheres sob o patriarcado. Apesar de a imagem poder ter se originado no inconsciente, e apesar dela poder ser um fantasma, essas fantasias coletivas têm um impacto também na realidade, e produzem sintomas que mediam entre os dois. As fotografias dessa fase são um lembrete de que a psique feminina pode muito bem se identificar com a repulsa misógina contra o corpo feminino, e tentar apagar os sinais que a marcam fisicamente como feminina. As imagens de comida apodrecendo e vômito evocam o espectro da garota anoréxica, que tragicamente encarna o fetiche da moda do feminino como uma construção eviscerada, cosmética e artificial, projetada para repelir a “alteridade” escondida no “interior”.
É difícil de traçar o colapso do corpo feminino enquanto fetiche bem-sucedido sem re-representar as ansiedades e pavores que dão origem ao fetiche em primeiro lugar, e Sherman pode estar sujeita à acusação de que reproduz a narrativa sem um contexto suficientemente crítico. É aqui que a série Untitled film stills pode ser relida retrospectivamente com o desenvolvimento futuro da obra de Sherman em mente. Retornar às fotografias anteriores, retrospectivamente, é ver como o corpo feminino pode se tornar um condutor para diferentes ideias condensadas em uma única imagem. Por exemplo, a estranheza das personagens femininas, por trás de suas fachadas cosméticas, começa a se fundir com a instabilidade da fotografia enquanto objeto de crença. A estrutura do fetichismo indica uma homologia entre essas diferentes ideias, e a teoria do fetichismo ajuda a desvendar o processo de condensação.
Para Freud, o fetichismo (para além de seu entendimento de que ele “confirmava o complexo da castração”) demonstra que a psique pode sustentar ideias incomparáveis de uma só vez a partir do processo de recusa. A recusa fetichista reconhece a castração da mulher e simultaneamente constrói um substituto para negá-la e repor o objeto que falta. Freud via a coexistência dessas duas ideias contraditórias, mantidas em uma só psique, como um modelo para a relação do ego com a realidade, a “divisão do ego”, que permitia que duas atitudes paralelas, porém contraditórias, fossem mantidas em um equilíbrio vacilante. Alternando entre ilusão visual e a percepção do mecanismo de ilusão, uma consciente suspensão de descrédito seguida de uma onda de desilusão, “eu sei… mas ainda assim”, a espectadora dos Film stills de Sherman pode sentir quase que fisicamente, e quase se deleitar com, a ruptura entre conhecimento e crença.
Um “efeito de oscilação” contribui para a estética pós-moderna. O espectador olha, reconhece um estilo ou tópos, duvida, olha de novo, reconhece a citação; e significados se deslocam e mudam suas referências, como percepções cambiantes de perspectiva de uma ilusão de ótica. O efeito é, talvez, particularmente excitante porque ele joga com a credibilidade do fetiche. Neste sentido, Cindy Sherman leva o jogo pós-moderno ao seu limite no terreno contestado do corpo feminino. Quando a espectadora chega às fotografias finais de desintegração e apenas relutantemente reconhece o conteúdo pelo que é, o aspecto artístico da obra de Sherman volta à tona. Não é tanto que as cores das imagens dos detritos sejam mais afeitas ao universo da pintura e suas referências mais a forma das bordas do que da figura, mas sim que seu lugar na parede de uma galeria afirma o seu status, no mesmo momento em que a espectadora está prestes a dar as costas em uma incredulidade revoltada. Neste sentido, elas, também, criam um “efeito de oscilação”, desta vez entre reverência e repulsa. Este tipo de tema está presente nos trabalhos tardios de Sherman, que se encontram fora da “narrativa” 1977-87, e retornam à figuração do corpo humano, refratado agora pela arte em si. Ela reproduz os grandes mestres, se colocando no papel da figura central, ou personificando um retrato. Novamente, ela distorce o corpo com falsas adições, como um seio em uma Virgem e seu Filho. Apesar de faltar nessas imagens a inexorabilidade e complexidade de sua fase prévia, ela ainda brinca com as estruturas da recusa e chama atenção para a fetichização das grandes obras e seu valor pela história da arte.
Para Freud, a estrutura do fetichismo não é a mesma que a estrutura da repressão. Ao mesmo tempo em que provê um substituto, uma reposição, e literalmente um anteparo à memória traumática, o fetiche é também uma lembrança de perda e substituição. E nessas circunstâncias, a representação do corpo feminino, o provocador original do complexo da castração, pode ser sintomática e reveladora. Quando Sherman retrata a feminilidade como uma máscara em sua sucessão de “fantasias”, o corpo feminino se afirma como um lócus de ansiedade que deve, a todo custo, esconder. E ele adquire uma vulnerabilidade autoconsciente que parece emanar uma tensão entre a aparência exterior e sua interioridade. Dessa forma, Sherman brinca com a “topografia” do corpo feminino. Mas suas fotografias iniciais ilustram em que medida essa “topografia” foi integrada na cultura do feminino. No intuito de criar um corpo “cosmético”, uma indústria cosmética foi criada, para que o investimento psíquico que o patriarcado faz na aparência feminina seja ecoado por um investimento por parte do capitalismo. E cosméticos são também, é claro, as ferramentas do ofício de Sherman.
Fetichismo depende de uma topografia fantasmática, instalando um anteparo e um escudo, intimamente ligados ao mecanismo de defesa do ego, como Freud apontou. Ao mesmo tempo, fetichismo é a mais semiótica das perversões, blindando e protegendo por meio de um objeto que é, inevitavelmente, também um símbolo de perda e substituição. Mas este empreendimento semiótico é investido em um reconhecimento do artifício. O fetichismo é, como Nietzsche disse da mulher, “tão artístico”. Nas representações de mulheres por Godard, por exemplo, o corpo feminino reduplica a superfície que cobre um vazio misterioso, mas que pode encarnar o objeto do fetiche em si. Essa síndrome veio a si no star system de Hollywood, na produção em massa de pin-ups, e na equação, na cultura consumista contemporânea, entre feminino e glamour.
Cindy Sherman delineia o abismo ou atoleiro que sobrecarrega o corpo desfetichizado, privado da semiótica do fetiche, reduzido a ser “inexprimível” e desprovido de significância. Seu trabalho posterior, como eu sugeri no mito de Pandora, levanta a questão do conceito do abjeto de Julia Kristeva. O argumento de Barbara Creed que o abjeto é central na imagem recorrente do “feminino monstruoso” nos filmes de horror é também aplicável ao monstruoso em Sherman. Apesar de suas figuras materializarem os elementos do terror irracional, elas também possuem pathos e poderiam facilmente ser compreendidas em termos de “o monstro como vítima”. Suas fotografias de figuras atrofiadas, por exemplo, o corpo que se assemelha a um trabalho de cera sujo, olhos abertos e se misturando cromaticamente à grama, poderiam fazer parte de um léxico do horror e do estranho, assim como as Untitled film stills são como um léxico de poses e gestos típicos de uma feminilidade respeitável, porém ainda estranha. Assim como o desenvolvimento da subjetividade individual depende da demarcação da fronteira entre o eu, a mãe e subsequentemente qualquer reminiscência da falta dessa fronteira na infância, as fotografias de Sherman também trabalham inversamente. Começando com Untitled film stills, montadas dentro de uma borda branca e envoltas em uma moldura preta, as imagens gradualmente perdem seus contornos definidos, tanto em relação à moldura quanto à representação das próprias figuras.
Ao se referir aos anos 1950 em seu trabalho inicial, Sherman se junta a muitos outros em identificar a América de Eisenhower como o local mítico do nascimento da cultura pós-moderna. Referências aos anos 1950 invocam as consequências da Guerra na Coreia e o sucesso do Plano Marshall, o consumo em massa americano, a “sociedade do espetáculo” e, é claro, o melodrama hollywoodiano. Foi uma época em que, no contexto da Guerra Fria, a publicidade, o cinema e a própria embalagem e sedução das mercadorias comercializavam glamour. O glamour proclamava a desejabilidade do capitalismo americano ao mundo exterior e, internamente, assegurava uma americanidade como aspiração à população branca recentemente suburbanizada, ao mesmo tempo em que enterrava memórias incompatíveis de suas origens imigrantes. No trabalho inicial de Sherman, conotações de vulnerabilidade e instabilidade fluem para a construção e credibilidade da máscara social geral. As imagens cinquentistas como um emblema particular de americanidade também mascaram o fato que esta foi uma década de repressão política e social na medida em que profundas mudanças se acumulavam no horizonte, a transição de Joe McCarthy para James Dean, do governador Maddox para Martin Luther King. Em vez de simplesmente se referir ao “cinquentismo” de modo nostálgico, Sherman insinua um mundo ingerindo as sementes de sua própria decadência.
Em 1982, Cindy Sherman apareceu na capa da revista anglo-americana de vanguarda ZG. Ela está imediatamente reconhecível como Marilyn Monroe em uma pose de garota da capa. Ela não é a Marilyn de luzes brilhantes e diamantes, mas a outra, igualmente familiar, Marilyn de calça e camisa, ainda a epítome do glamour do período, a mão segurando a cabeça jogada para trás, os olhos semicerrados, os lábios abertos. Mas refratada pela máscara de Sherman, a máscara de Marilyn falha em esconder sua ansiedade interior, e sua infelicidade parece escapar pelas frestas. O fetiche favorito da América nunca conseguiu esconder completamente sua interioridade, e o véu de atração sexual agora parece, em retrospecto, ser assombrado pela morte. Enquanto que a pós-modernidade americana cita os anos 1950, Marilyn Monroe é o seu emblema, como um ícone em seu próprio direito, e como fonte de toda a subsequente iconografia de Marilyn, mantida viva pela cultura gay, ressurgindo com Debbie Harry no fim dos anos 1970 e reciclada por Madonna nos anos 1980.
As personificações de Cindy Sherman precedem, e em certo sentido prefiguram, as de Madonna. As performances da Madonna fazem pleno uso do potencial dos cosméticos. Assim como rapidamente transforma sua aparência camaleônica diariamente, ela performa homenagens à perfeição cosmética dos astros do cinema e também integra o “efeito de oscilação” ao ritmo de seus vídeos, sincronizando a montagem, a mudança de personalidade e as reversões de papeis sexuais. Apesar de Madonna, obviamente, não seguir a narrativa de desintegração de Cindy Sherman, sua consciência desse outro lado da topografia da máscara feminina é evidenciada em sua bem-conhecida admiração por Frida Kahlo. Frida retratava seu rosto como uma máscara em um grande número de autorretratos, e velava seu corpo em elaborados vestidos tehuana. Às vezes seu véu caía, e seu corpo machucado era trazido à superfície, condensando seus ferimentos físicos reais com o ferimento imaginário da castração e com o espaço interior literal do corpo feminino, o ventre que sangra, em suas pinturas autobiográficas, por conta de um aborto. A máscara de Frida Kahlo foi sempre sua. A de Marilyn era como uma marca registrada. Enquanto Cindy Sherman e Madonna mudam suas aparências em fascinantes desmascaramentos de uma identidade estável, a máscara de Marilyn tinha sempre que ser absolutamente idêntica. Sua aparência podia aceitar um modelamento cosmético que a tornasse instantaneamente reconhecível como sendo de Marilyn. Mas aqui, também, a máscara é tensa, ameaçada pela lacuna entre estrelato público e pressões privadas (como era o caso de todos presos na moral dupla da Babilônia Hollywoodiana do studio system) e também pela lógica da própria topografia.
Ao recusar a justaposição entre palavra e imagem, tão prevalecente na arte dos anos 1970 e 1980, Sherman pode estar sujeita a acusação de que ela mesma está presa no impasse topográfico do fetiche e o seu colapso. Ela estaria então incapaz de inscrever os meios da decifração em seu próprio trabalho. Seu uso de “sem título” para descrever seus trabalhos transforma inabilidade em recusa. Sua obra vividamente ilustra a maneira como imagens são capazes de se endereçar ao seu espectador, e são completamente disponíveis ao processo de decifração, por meio de mise-en-scène, conotações, justaposições e assim por diante. Neste sentido, a iconicidade de uma fotografia, seu significado por meio da semelhança com o que representa, pode ser uma ilusão. Como imagens de quebra-cabeça de crianças, que contém objetos escondidos em outros objetos, como o duplo sentido de um trompe-l’oeil, como o ajuste da visão necessário para ver uma imagem holográfica, a obra de Sherman é testemunha da habilidade da fotografia de significar mais do que parece representar.
Ademais, a psique humana prospera na divisão entre superfície e segredo, que, enquanto metáfora da repressão de todos os tipos, não pode ser varrida para longe. Topografias do corpo feminino são formadas pela incerteza inscrita na feminilidade pela cultura misógina, e essa forma de imbricação entre ordem psíquica (social) e a cultura que a reflete irá necessariamente existir. Mas a mudez e o desespero dos trabalhos de Sherman representam a mudez e o desespero que se sucedem quando uma estrutura fetichista, os meios de apagar a história e a memória, entram em colapso, seja como resultado de trauma pessoal ou repressão social. O fetiche necessariamente quer que a história seja negligenciada; esta é a sua função. O fetiche é também sintoma e, enquanto tal, possui uma história a ser decifrada, mas apenas ao se recusar sua topografia fantasmática. Freud descreve seu primeiro conceito do inconsciente como uma topografia que apresenta a ação de enterrar da repressão, mas ele analisou a linguagem do inconsciente, sua expressão formal em condensação e deslocamento, em termos de significação e decifração. Como último recurso, a decifração é dependente da linguagem e exegese do analisado, que transforma o sintoma em linguagem e traça sua história deslocada. A completa falta de pistas verbais e significantes na obra de Cindy Sherman chama atenção à semiótica que precede uma bem-sucedida tradução do sintoma em linguagem, a semiótica de deslocamentos e fetichismo, desesperadamente tentando disfarçar ideias inconscientes da mente consciente. Ela usa iconografia, conotação ou o deslizar do significante em uma trajetória que termina arrancando todo significado acumulado no limite da matéria corpórea. Contudo, mesmo este fundamento, o vômito e o sangue, por exemplo, retorna ao significado cultural, ou seja, à dificuldade do corpo, e acima de tudo o corpo feminino, enquanto ele é sujeito aos ícones e narrativas do fetichismo.

NOTA
Tradução de Giancarlo Casellato Gozzi. Esta tradução se encontra originalmente publicada na página web do Instituo Moreira Sales. Laura Mulvey (1941) é crítica cinematográfica e feminista inglesa, autora de diversos livros e ensaios sobre cinema e psicanálise, entre eles Cidadão Kane (1992), Visual Pleasure and Narrative Cinema (1975) e Death 24x a second (2005).

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Agulha Revista de Cultura
UMA AGULHA NO MUNDO INTEIRO
Número 151 | Março de 2020
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