FM | Depois de um
século de purificação do surrealismo, registando a sua recusa em ser confundido
com uma escola ou apenas com um ismo, é impossível descartar a propriedade estética
de qualquer obra criativa. Qual é a tua compreensão de um ideal estético do surrealismo?
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ | Purificação?
Detesto a noção de pureza. Em nome da pureza – religiosa, étnica, ideológica ou
sexual – foram cometidos os piores crimes contra a humanidade. O surrealismo surgiu
como uma rebelião visceral contra a barbárie da guerra e contra os nacionalismos,
quando os ideais do humanismo foram massacrados nas trincheiras da Europa, supostamente
o berço da civilização. Não acredito na existência de um ideal estético do surrealismo.
Em primeiro lugar, porque o surrealismo é contemporâneo da explosão da estética
tradicional, nas artes plásticas e na literatura, no teatro e nas artes visuais.
Os surrealistas tiveram uma participação decisiva nessa revolução da modernidade
que acabou com as regras acadêmicas. Além disso, o surrealismo se expressou numa
multiplicidade de formas e experiências que descartam qualquer modelo. Qualquer
antologia literária ou exposição de artes plásticas de obras surrealistas mostram
a inexistência de um padrão. Seria absurdo almejar um ideal ou modelo. O que desejo
é ser surpreendido, descobrir algo diferente do existente. Apesar do imenso e inesgotável
prazer em rever ou reler as obras apreciadas.
LEONARDO FROES | Creio que o
ideal estético do surrealismo tornou-se por fim o próprio espírito de toda a arte
moderna ou modernista. Ou seja, a ingerência de um controle racional sobre a criação
artística acabou por se dissolver no horizonte, assim como acabou ficando claro
que o chamado realismo, que chegou ao auge na prosa do século XIX, era apenas um
estilo como outro qualquer. Como tantos outros movimentos do começo do século XX,
o surrealismo nos levou a uma liberdade mais plena e praticável.
VIVIANE DE SANTANA
PAULO
| Compreendo que toda arte se baseia em um ideal estético, mesmo sendo uma estética
que não se orienta nos padrões de “beleza” que uma determinada camada da sociedade
ou da crítica deseja. O surrealismo, neste sentido, oferece uma possibilidade quase
ilimitada de criação, devido à espontaneidade e a sua fonte no inconsciente. Sendo
assim, eu diria que o surrealismo é a origem de toda a arte, porque a criação surge,
primeiramente, no inconsciente, para depois ser “trabalhada” pelo consciente. A
criação do mundo encontrada, por exemplo, nas mitologias das diversas etnias, são
narrações advindas do subconsciente. As mitologias adotam diversos símbolos, imagens
e metáforas, às vezes, bizarras e desconexas, para explicar o mundo e as relações
humanas. Minerva nasce da cabeça de Zeus, já adulta e armada. Dentes são jogados
no solo de onde nascem monstros cegos e assassinos. Na mitologia dos indígenas desanos,
a deusa Yebá Bëló criou os seres humanos do ipadu, da folha da coca que ela mascava.
E assim por diante! Temos então, vários elementos do surrealismo na narração da
origem do mundo e das relações humanas. Na minha opinião, o surrealismo lida com
aspectos que não são apreendidos na realidade cotidiana, aspectos ocultos, submersos
e que vêm à tona em forma de metáforas, símbolos e imagens, como no sonho. O surrealismo
possui esta origem no inconsciente, no sonho, e creio que é o estilo que mais liberta
o artista das convenções sociais. As distorções, as disfunções de imagens, as anomalias
e associações aparentemente desconexas, bizarras que se encontram no surrealismo,
penso que devam prevalecer.
FM | As expulsões
clássicas de surrealistas realizadas na formação original parisiense foram de natureza
comportamental. A má qualidade de uma obra nunca foi um aspecto levado a julgamento.
Ainda hoje, embora as expulsões já não sejam uma ocorrência comum, quando comentam
acerca de seus pares, fazem-no considerando simpatias e adesões, o que acentua a
existência de uma irmandade. Até que ponto este clube de amigos distorce a compreensão
que se poderia ter da revolução cultural mais relevante do século XX?
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ | Na história
do surrealismo procuro diferenciar o anedotário ou conjuntural daquilo que é essencial
e permanente. Antonin Artaud recebeu uma homenagem merecida quando saiu do asilo
psiquiátrico depois da Segunda Guerra Mundial, com a participação destacada de André
Breton. A distância passageira entre ambos não tem mais importância numa perspectiva
histórica. O grupo de Paris assumiu um papel predominante devido à própria aparição
do movimento na França, num contexto conturbado pelo auge dos totalitarismos. Mas
a difusão das ideias surrealistas pelo mundo afora propiciou uma diversidade natural,
devido às diferenças de cada cultura. Mesmo o grupo surrealista belga, próximo pela
comunidade linguística e existencial, tinha uma maneira de declinar o surrealismo
diferente do grupo parisiense. Uma historiografia discutível, baseada numa ortodoxia
ambivalente, reduziu o impacto internacional do surrealismo às relações pessoais
com os franceses, como se estes fossem profetas à procura de correligionários ou
discípulos.
LEONARDO FROES | É importante
entender que em todo grupo ou movimento as discórdias e dissensões são comuns e
às vezes inevitáveis. No segundo manifesto do surrealismo, o de 1929, André Breton
se mostra muito magoado e ressentido com os que, por diferentes razões, foram se
afastando do grupo original. Mas esse fato não impediu que as colocações iniciais
da década de 1920 se mantivessem, para ter tanta repercussão nos tempos conturbados
que vieram depois.
VIVIANE DE SANTANA
PAULO
| Percebo, infelizmente, que no Brasil as relações são quase estritamente pessoais,
em todos os âmbitos. É difícil separar a relação pessoal da profissional ou da artística.
Os críticos deixam-se seduzir pela pessoa do artista e não pela obra, pela proposta,
pela representatividade e importância da obra. E confunde-se crítica com elogio
ou falar mal da obra. Quando a avaliação crítica é baseada na subjetividade e nessa irmandade, isso prejudica a qualidade da arte.
Na literatura brasileira, há diferentes irmandades e sinto que elas não se comunicam, não se apoiam, pelo contrário, se repudiam. É contraproducente!
Autores falam mal de outros autores, também de autores clássicos já consagrados,
sempre tentando diminuir a importância destes autores na tentativa de assim, poder
se autopromover. Por outro lado, autores levam a crítica para o lado pessoal. Enfim,
é um círculo vicioso! Não vejo isso na Europa, na Alemanha, por exemplo, onde resido
há vários anos. Talvez eu seja ingênua, mas a minha impressão é a de que os autores
alemães procuram promover outros autores, porque assim estarão promovendo a literatura
e a venda de livros em geral. E isso é bom para todos os escritores. Um escritor
ou escritora na Alemanha não critica um autor ou autora de sucesso, como acontece
no Brasil, no caso de Paulo Coelho e outros. E os seus poetas e artistas clássicos
são cultuados. A merda de Joseph Beuys nunca foi criticada por outros artistas
alemães. Eles entendem que as críticas devam partir dos críticos e cada artista
possui a sua proposta artística que será aceita ou não pelo público e pela crítica.
Um bom crítico nunca é um escritor, um artista. Escritor não sabe ser crítico. Ele
pode criticar, mas não está livre de sua subjetividade e vaidade. Um crítico literário
competente é aquele que não é autor, aquele que almeja ser autor, mas não consegue,
justamente porque é crítico. Ele ou ela analisa a obra de um ângulo diferente de
um escritor ou escritora. Seria mais profícuo se a cena institucional literária
brasileira fosse imparcial e objetiva. E incluísse as diversas tendências literárias
brasileiras que permanecem à margem, mas que abordam, com autenticidade, temas internacionais,
como o colonialismo, o racismo, a comunidade LGBT, a ecologia… Falta objetividade,
maior competência na arte de criticar. A crítica também é um gênero, também é uma
arte. Falta mais solidariedade entre os artistas de diferentes tendências e mais
respeito à arte em si. E o Brasil deveria saber olhar para dentro e reconhecer o
seu grande potencial.
LEONARDO FROES | É tolice
rejeitar qualquer coisa que tenha existência comprovada. Mas todo mundo é livre
para formar opiniões a favor ou contra as diferentes manifestações culturais.
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ | O surrealismo
do século XX não foi uma igreja ou capela, como diziam e ainda dizem seus inimigos.
Portanto a pretensão a uma ortodoxia ou dogma é antinômica com o projeto surrealista.
Os textos autorreflexivos do próprio André Breton, um poeta sempre em movimento,
inspirado pelas suas viagens, encontros, experiências, afetos e diálogos, é a melhor
comprovação disso. Sua prosa poética é ao mesmo tempo uma narrativa existencial
e um exercício de autoconhecimento e lucidez sobre o seu tempo. Não houve dogmatismo
quando Breton procurou lembrar as fases sucessivas do movimento surrealista, numa
série de entrevistas à Radio França que foram publicadas em livro (Entretiens,
1952) e incluídas na magnifica edição das Obras completas organizada por
Marguerite Bonnet para a coleção La Pléiade (Gallimard, vol. III, 1999). As revistas
foram de fato fundamentais, mas foram também diversas, adaptadas às circunstâncias
nacionais, políticas, culturais, editoriais. As revistas francesas, as únicas que
tiveram continuidade, correspondem a ciclos diferentes da evolução do surrealismo.
Essas publicações expressavam a natureza coletiva da atividade surrealista, que
procurava interagir com artistas e intelectuais de outros grupos, setores e países.
Porém, a leitura, a percepção, a interpretação e a avaliação das obras são subjetivas,
variam com cada um. A exploração da subjetividade é uma questão fundamental da revolução
surrealista: a modificação da relação entre sujeito e objeto sugere uma atitude
mais ativa, participante, intima, de cada um de nós, sem ficar preso a uma norma
ou cânon acadêmico.
VIVIANE DE SANTANA
PAULO
| Bem, a transformação é a única constância na vida, para mencionar Heráclito. As
coisas mudam, então é difícil manter um estilo ou um movimento exatamente com as
mesmas características iniciais. Certamente, o surrealismo de hoje não é igual ao
dos anos vinte, iniciado na Europa. Aliás, há atualmente muito mais surrealistas
na América Latina do que na Europa. São quatro décadas de surrealismo e suas influências
continuam inspirando grandes artistas até hoje. A meu ver, a rejeição ao surrealismo
vem por causa da falta de informação do que ele representava e continua representando.
As revistas dedicadas ao surrealismo devem abrir espaço para outros experimentos
semelhantes a este estilo. Necessário seria uma melhor divulgação e a conscientização
de como este estilo está vivo em muitas obras de artistas e autores que não são
enquadrados como exclusivamente surrealistas, como Kafka, ou Celan, mas até que
ponto suas obras apresentam elementos surrealistas. De qualquer forma, a rejeição
leva à limitação. Penso em mais curiosidade e conhecimento das técnicas de interpretação.
Neste sentido, o ensino de arte nas escolas é fundamental.
FM | Duas denominações
sempre me chamaram a atenção, dentro do ambiente surrealista, não porque me pareçam
inadequadas, mas sim pela divisão entre elas de elogio e rejeição: movimento surrealista
e civilização surrealista. Até que ponto estas denominações diferem e o que representam
à beira de parecerem antípodas?
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ | O movimento
descreve a etapa de expansão do surrealismo, sua projeção em diversas latitudes
e gerações, bem como a vocação coletiva da sua ação. A civilização surrealista
é uma expressão que surge num momento mais exclusivamente reflexivo, devido à divisão
dos franceses depois de Maio de 1968 e à clandestinidade forçada dos tchecoslovacos
depois da invasão soviética de 1968. O principal elo entre uns e outros, Vincent
Bounoure, poeta e antropólogo, sugeriu assim a possibilidade de uma alternativa
utópica às sociedades de consumo ou burocráticas, numa época caracterizada pela
busca de respostas à globalização. Mas o surrealismo já questionara os totalitarismos
e sempre propiciou a rejeição do conformismo. Apesar do recuo da ideia de revolução,
traída pelo comunismo, o surrealismo é um movimento de ruptura, tanto individual
quanto coletiva. Como movimento organizado, os surrealistas têm uma trajetória com
eclipses, com maior ou menor intensidade dependendo dos países. Porém, o surrealismo
permanece vivo, nem que seja em estado latente, pois encarna uma tendência ou aspiração
humana que se expressou inclusive antes do Manifesto de 1924, como escreveu
Breton.
LEONARDO FROES | Talvez uma
característica do surrealismo histórico tenha sido ir além da esfera literária e
artística para lançar-se a uma ambição bem maior, transformar o mundo e mudar a
vida, lema no qual André Breton sempre fez questão de insistir nos seus escritos.
Mesmo que o mundo se transforme sozinho e a vida, queiramos ou não, nunca deixe
de passar por mudanças, esse lema de Breton, fusão de ideias oriundas de Marx e
Rimbaud, continuou a ser válido para as inúmeras gerações de insatisfeitos que se
manifestaram depois.
FM | É comum evocar
no surrealismo o seu poder imaginativo e o seu carácter experimental, aspectos estritamente
complementares. Porém, na inquestionável impossibilidade de uma renovação perene
no ambiente de criação artística, em muitos casos, o que se verifica no surrealismo
é uma repetição de recursos, modos de ser e truques de linguagem. Como lidar com
essas oscilações tão comuns em qualquer território criativo?
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ | O inconsciente
como conceito é uma invenção de Freud, mas isso não significa que era inexistente
até então. O poder da imaginação propiciado pelos surrealistas é quase uma dedução
desse descobrimento. O surrealismo nasceu como movimento experimental estimulado
por essa revelação. Sem experimentação, não existe renovação. Sem experimentação,
a repetição leva à mera retórica. Sem imaginação, não existe reflexão fértil. Sem
reflexão, a imaginação é incapaz de desembocar numa utopia. A originalidade do surrealismo
foi unir no mesmo movimento a imaginação criativa e a utopia social.
LEONARDO FROES | Não querer
repetir recursos nem truques de linguagem é sempre uma postura saudável para quem
se aventura à escrita. De quando em quando surgem bons autores que, tentando chegar
ao máximo de autenticidade possível, criam obras de cunho bastante original.
VIVIANE DE SANTANA
PAULO
| Experimentando, sempre experimentando e criando. Algumas tendências e estilos
possuem os seus limites. E penso que isso não é necessariamente ruim. E trabalhar
com esse limite não significa falta de criatividade, mas variações dentro de um
limite estético. Creio que há a possibilidade de criar algo novo dentro deste limite.
Importante ampliar o leque de associações, de temática, de metáforas.
FM | O argentino
Aldo Pellegrini foi um dos raros estudiosos do surrealismo que tratou especificamente
de seu ambiente poético. Numa bibliografia surrealista, o tom reforça a relevância
da imagem plástica. Tal adjetivo sempre me pareceu uma falha crítica, pois a essência
renovadora, já no início do século XX, refere-se à própria imagem e às suas múltiplas
perspectivas. Será esta uma das inúmeras adulterações dos princípios surrealistas
ou mesmo entre elas, percebeu-se a falta de distinção – exceto meramente técnica
– entre imagem plástica e imagem poética?
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ | Não sei. Aldo
Pellegrini merece ser mais conhecido e lido. O mexicano Octavio Paz integrou o surrealismo
à sua poética, nos ensaios O arco e a lira (1956) e Estrela de três pontas
(1996). Escrevi sobre “Octavio Paz, o Surrealismo e Luis Buñuel” na revista [o
que nos faz pensar] dedicada ao centenário de Paz (n° 37, PUC-Rio, setembro
de 2015). Desde uma perspectiva diferente, a imagem foi estudada em vários ensaios
do poeta cubano José Lezama Lima.
LEONARDO FROES | Pode ser
que sim, mas eu mesmo nunca pensei nisso. A palavra imagem, sem que seja preciso
adjetivá-la, já e si mesma me abre para um sem-fim de significados.
VIVIANE DE SANTANA
PAULO
| Confesso que, lamentavelmente, ainda não li Aldo Pellegrini. Só posso dizer que
nestas nomenclaturas e definições há margem para interpretações diferentes. Tenho
dificuldade em pensar nisso como adulteração dos princípios de qualquer estilo literário
ou artístico. As discussões sobre diferentes interpretações são importantes e profícuas,
e fazem parte da arte de criticar. Através delas, uma nova visão pode surgir, outra
perspectiva do mesmo tema e assim por diante.
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ | O capitalismo
é o pior modo de produção, à exceção de todos os demais: nem o feudalismo nem o
comunismo foram melhores. O tal do mercado não derrotou nada, foram as próprias
revoluções que cavaram suas fossas. Mas essa tragédia não acabou nem com o inconsciente
e a sexualidade, nem com o sonho de uma vida melhor ou uma utopia. Essas pulsões
vitais favorecem a permanência do surrealismo no coração e nas mentes mais inconformistas
e esclarecidas.
LEONARDO FROES | Raciocínios
sobre questões sociais não são exatamente o meu forte. Mas comprovo que o chamado
mercado, com seu “absolutismo virulento”, costuma ser um obstáculo forte para a
liberdade de criação e os avanços de todo tipo que a própria vida sugere, em suas
irrupções tão naturais.
VIVIANE DE SANTANA PAULO | Para mim, é a ironia do destino! É o Absurdo da vida humana, como bem definiu Camus. Os idealistas não imaginavam que o comunismo, que partiu de princípios humanitários e de solidariedade, se transformasse em uma ditadura, em uma matança de pessoas através da fome ou da violência do estado, como na Rússia stalinista e na China maoísta. Certamente, Karl Marx estaria horrorizado com isso, como os poderosos usaram a sua ideologia para criar um regime de repressão, censura e perseguição. Também do lado do capitalismo são cometidos muitos crimes contra a humanidade, gerando guerras, perseguições e explorações. Também o capitalismo falha. Neste sentido, eu seria por uma mescla do lado bom do capitalismo e do comunismo, à la Joseph Stiglitz, um capitalismo progressista, uma democracia socialista. Porém, não culpo o mercado. O mercado é algo manipulável e criado pelo ser humano. As atrocidades causadas pelos seres humanos, na minha opinião, não resultam do capitalismo ou do socialismo em si, mas de determinados grupos de seres humanos gananciosos de poder e riqueza. Estes grupos sempre utilizaram as ideologias para alcançarem os seus objetivos que é: poder e riqueza. E sempre se utilizarão de qualquer sistema econômico ou social, de qualquer regime político ou ideologia para imporem e alcançarem – riqueza e poder. Deturpam qualquer ideologia para que possa se transformar em um instrumento que os auxiliem nesta empreitada. Portanto, para mim, os Direitos Humanos são a máxima a serem defendidos. Os Direitos Humanos e a Democracia. Infelizmente, tenho a forte impressão que estamos caminhando para uma era sombria. As catástrofes climáticas e o avanço da extrema-direita são duas combinações que levam à formação de regimes ditatoriais. A propagação de fake news, que colabora para desorientar as pessoas, cria um cenário de confusão e insegurança, facilitando a crença nos populistas, a crença em soluções rápidas e fáceis para problemas complexos. O desenvolvimento célere da internet e da IA conduz a transformações também rápidas no modo de vida e de pensar, sem proporcionar tempo para analisarmos essas mudanças mais profundamente. Nestes regimes ditatoriais, a arte e a imprensa livre são as primeiras a serem perseguidas, amaldiçoadas e banidas. Precisamos da arte, porque ela nos auxilia a desenvolver um julgamento cognitivo em relação à realidade, aos acontecimentos, e porque, “A arte existe para que a realidade não nos destrua”. A vida humana sempre foi repleta de conflitos bélicos. O ser humano é um ser conflitivo por natureza. Mesmo sozinho, ele pode encarar a si mesmo como inimigo. Há quem diga que a guerra pertença ao humano. Ao ser humano masculino, acredito eu! Sou idealista e imagino que possamos amadurecer a ponto de nos relacionarmos uns com os outros de forma pacífica, com discórdias e brigas, mas sem guerras. Toda guerra é um ganho econômico para a indústria bélica, e cresce o seu poder. Por outro lado, “o mundo não é ameaçado apenas por pessoas que são más, mas também por aquelas que permitem o mal”, para mencionar Einstein. Portanto, temos que combater e resistir, e criar arte e defendê-la. Hoje em dia, os desafios gerados pelo aquecimento global exigem soluções globais. Portanto, o mais lógico seria nos unirmos. Mas o ser humano não é um ser totalmente lógico! Freud explica! E o surrealismo ilustra e poetiza!
PAULO ANTONIO PARANAGUÁ (Brasil, 1948). Cresceu no Rio de Janeiro onde estudou arte e história, embora quando criança tenha vivido algum tempo em Madrid. Em 1967 ingressou no movimento cinematográfico surrealista, junto com Sérgio e Leila Lima. Em 1975, ele fugiu com sua esposa para Buenos Aires do regime de tortura no Brasil. De maio de 1975 a janeiro de 1976, ele e sua esposa María Regina Pilla foram sequestrados pelos serviços de inteligência como parte da Operação Condor. Foram libertados através dos contatos políticos de seu pai. No final da década de 1970 mudou-se para Barcelona e estudou cinema com Roman Gubern. Em 1982 mudou-se para Paris, onde reside desde então. Lá trabalhou como jornalista cultural, organizador de festivais e curador de exposições e retrospectivas. Ele recebeu seu doutorado em História do Cinema pela Sorbonne em Paris. Autor de uma dezena de livros, é um dos mais importantes historiadores do cinema latino-americano. Sua abordagem à necessidade de estudar o cinema latino-americano através de uma abordagem comparativa tem sido fundamental para a história do cinema contemporâneo.
LEONARDO FROES (Brasil, 1941). É um dos principais defensores da ecologia no Brasil. Atuou no Jornal do Brasil, entre 1971 e 1983, com a coluna “Natureza”, e no Jornal da Tarde, com a coluna “A arte de plantar”. Nesse espaço defendeu a ecologia e o ambientalismo. É um conhecido tradutor do inglês, francês e alemão, tendo traduzido obras de Shelley, Goethe, Swift, Choisy, Faulkner, Woolf, Eliot e Lowry. Por sua produção poética recebeu o Prêmio Jabuti de Poesia, de 1996, pela obra Argumentos Invisíveis, e o Prêmio Alceu Amoroso Lima – Poesia e Liberdade, em 2016. Em 1998 recebeu o prêmio de tradução de Fundação Biblioteca Nacional. Sua obra foi publicada no volume Poesia Reunida (1968 - 2021), pela Editora 34. Dentre seus livros de poesia podemos citar: Língua franca (1968), A vida em comum (1969), Esqueci de avisar que estou vivo (1973), Anjo tigrado (1975), Sibilitz (1981), Assim (1986), Argumentos invisíveis (1995), Um mosaico chamado a paz do fogo (1997), Quatorze quadros redondos (1998), Chinês com sono (2005) e A pandemônia e outros poemas (2021).
VIVIANE DE SANTANA PAULO (Brasil, 1966). Poeta, romacista, tradutora e ensaísta. Estudou filologia germânica e românica na universidade de Bonn. É autora dos livros, lebendiges wensen namens gedicht – vom satelliten aus gesehen / ser vivo chamado poema – visto do sattélite (coletânea de poesia bilíngue – Engelsdorf Verlag, Leipzig, 2023); Viver em outra língua (romance, Solid Earth, Berlim 2017), Depois do canto do gurinhatã, (Multifoco, Rio de Janeiro, 2011), Estrangeiro de Mim (Gardez! Verlag, Alemanha, 2005) e Passeio ao Longo do Reno (Gardez! Verlag, Alemanha, 2002). Em parceria com Floriano Martins, Em silêncio (Fortaleza, CE: ARC Edições, 2014) e Abismanto (Sol Negro Edições, Natal/RN, 2012). Foi membro da equipe editorial da ila-latina, revista de cunho social-político com sede em Bonn (Informationsstelle Lateinamerika e.V.). Seus textos foram publicados em revistas e antologias na Europa e América Latina. Traduziu diversos poetas alemães, incluindo Jan Wagner, Nora Bossong, Ron Winkler, Josef Kafka, Sarah Kirch, Paul Celan, Gottfried Benn.
FLORIANO MARTINS (Brasil, 1957). Poeta, editor, dramaturgo, ensaísta, artista plástico e tradutor. Criou em 1999 a Agulha Revista de Cultura. Coordenou (2005-2010) a coleção “Ponte Velha” de autores portugueses da Escrituras Editora (São Paulo). Curador do projeto “Atlas Lírico da América Hispânica”, da revista Acrobata. Esteve presente em festivais de poesia realizados em países como Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana, El Salvador, Equador, Espanha, México, Nicarágua, Panamá, Portugal e Venezuela. Curador da Bienal Internacional do Livro do Ceará (Brasil, 2008), e membro do júri do Prêmio Casa das Américas (Cuba, 2009), foi professor convidado da Universidade de Cincinnati (Ohio, Estados Unidos, 2010). Tradutor de livros de César Moro, Federico García Lorca, Guillermo Cabrera Infante, Vicente Huidobro, Hans Arp, Juan Calzadilla, Enrique Molina, Jorge Luis Borges, Aldo Pellegrini e Pablo Antonio Cuadra. Entre seus livros mais recentes se destacam Un poco más de surrealismo no hará ningún daño a la realidad (ensaio, México, 2015), O iluminismo é uma baleia (teatro, Brasil, em parceria com Zuca Sardan, 2016), Antes que a árvore se feche (poesia completa, Brasil, 2020), Naufrágios do tempo (novela, com Berta Lucía Estrada, 2020), Las mujeres desaparecidas (poesia, Chile, 2022) e Sombras no jardim (prosa poética, Brasil, 2023).
SUZANNE VAN DAMME (Bélgica, 1901-1986). Pintora posimpresionista belga que evolucionó hacia el surrealismo en la década de 1940. Se formó en las Academias de Bruselas y Gante y en el Studio L’Effort de Bruselas. Durante su estancia en Ostende, recibió la influencia de James Ensor. A principios de la década de 1930, Van Damme se mudó a París, donde conoció al pintor y poeta italiano Bruno Capacci, quien se convirtió en su marido. Ella pasó mucho tiempo en París, el sur de Francia, Londres y Florencia. En 1941 entró en contacto con los surrealistas y participó en la Exposición Internacional Surrealista de 1947 en París, organizada por Breton y Duchamp. Sus obras de los años 1940 hacen claramente referencia a Picasso, De Chirico, Seligmann y también a Toyen. Expuso en la Bienal de Venecia en 1935, 1954 y 1962 y en la Bienal de São Paulo en 1953. Cuando más tarde se mudó a Florencia, comenzó a crear obras más abstractas antes de desarrollar un lenguaje muy personal lleno de signos y símbolos. Sus obras se convirtieron entonces en conjuntos de ideogramas compuestos por minipinturas con elementos abstractos y figurativos. Es de lamentar, sin embargo, que su obra surrealista de pinturas haya sido comprada por coleccionistas y rara vez aparezca en colecciones públicas. Suzanne van Damme es la artista invitada en esta edición de Agulha Revista de Cultura.
Agulha Revista de Cultura
Número 257 | novembro de 2024
Artista convidada: Suzanne van Damme (Bélgica, 1901-1986)
Editores:
Floriano Martins | floriano.agulha@gmail.com
Elys Regina Zils | elysre@gmail.com
ARC Edições © 2024
∞ contatos
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http://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/
FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
ELYS REGINA ZILS | elysre@gmail.com
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