Pequenos poemas entre prosa e poesia
Petits poèmes en prose é título de
um volume póstumo de Baudelaire (1869). Este pequeno ensaio poderia chamar-se igualmente
“pequenos poemas entre prosa e poesia”. Tínhamos pensado inicialmente abordar, aqui,
dois poemas breves, bastante misteriosos à primeira vista, da primeira fase de Aimé
Césaire, dita surrealista, a respeito dos quais a crítica não diz grande coisa e
dos quais o aparato crítico revela-se bastante característico.
Césaire
escreveu-os ainda nos anos 40 do século passado e publicou-os, e depois reescreveu-os,
como sempre, no sentido da contenção e da síntese. Fala, neles, de uns animais muito
estranhos que lembram a fauna dos contos infantis: uma andorinha que fuma e uma
serpente que canta e faz cantar, ou uma maneira de caçar o cervo (invisível no texto)
à distância. Que o leitor perceba o seu sentido por intuição ou decifre, aos poucos,
por analogia ou pela intratextualidade do poeta, a massa folhada dos significados
que se superpõem, é tarefa do leitor. Este, como sempre, deve estar disposto a divertir-se,
arriscar e jogar, partindo à caça da fábrica surrealista.
Algo
já se publicou sobre Aimé Césaire, em português, no Brasil e em Portugal. No Brasil,
sobretudo sobre o seu teatro histórico, em especial as peças sobre o Rei Christophe
[1] (do Haiti) e Patrice Lumumba [2] (sobre a sua morte logo depois da Independência
do Congo belga), e em Portugal, em particular do ponto de vista político e ideológico,
abordando quase sempre dois dos seus ensaios, acompanhados de citações de trechos
do seu Cahier d’un retour au pays natal
– os mais simples e transparentes [3]
do seu grande poema, que os há. No caso português, os ensaios são: Discours sur le colonialisme, traduzido por
Mário Pinto de Andrade (o angolano) [4]
e Discours sur la négritude (Présence
Africaine, 2004). Os dois títulos, no entanto, não esgotam os ensaios de Césaire,
na verdade, mais numerosos. [5]
Entretanto,
entre ensaio e teatro, é necessário reafirmar com força que Césaire é sobretudo
poeta, um dos maiores do século XX e que a crítica deveria concentrar-se na sua
poesia, inclusive na sua tradução para o português. A tradução do seu poema Cahier d’un retour au pays natal /Diário de um retorno ao país natal (1939-1956),
publicada pela EDUSP em 2012, e hoje, ao que parece, esgotada, foi bastante tardia
entre nós. Mais de 50 anos de distância, se pensarmos apenas na última versão do
poema, de 1956, dita definitiva.
Voltando
ao nosso propósito inicial. Como a decifração do primeiro texto escolhido não só
puxou outros temas como nos fez dar algumas voltas e tomar certos atalhos, e a Agulha Revista de Cultura tinha proposto,
aos seus colaboradores, uma determinada extensão de texto a não ser ultrapassada
de muito, decidimos concentrarmo-nos num único poema, indicando, em nota, duas ou
três leituras, já publicadas, sobre o segundo, examinado, neste pequeno ensaio,
mais por alto. Trata-se portanto, aqui, de microanálise atenta, tentando ultrapassar
o preconceito ainda frequente, entre nós, de que um poema de inspiração surrealista
significa qualquer coisa, ou então, um amontoado caótico de imagens estranhas ou
delirantes, à livre escolha do leitor. Ou ainda, certamente muito mais grave: aceita-se
facilmente que Nerval (com os cinco sonetos do volume Les Chimères, por exemplo) ou Mallarmé (com Le sonnet en X, por exemplo) tenham escrito curtos poemas ainda hoje
misteriosos, temas de incontáveis ensaios de prospecção, mas por quê razão um negro
antilhano escreveria poemas absconsos, de tão difícil leitura? Devia falar claro
e chão sobre escravidão…
Apresentemos
os dois poemas, cheios de humor e de leveza, mesmo quando se trata de um pântano
(aqui positivo, é claro, no jogo continuado da inversão), ambos ainda da primeira
fase marcada pelo surrealismo, em que o poeta Césaire responde/reage a sugestões
vindas dos quatro cantos do horizonte, no desfiar e embaralhar das suas leituras,
encontros e lembranças, e ainda emoções.
Os
dois poemas não são, de modo nenhum, obras menores e a prova disso é justamente
o fato de terem sido reescritos e republicados uma dezena de anos mais tarde no
volume Cadastre, de 1961 (Seuil). Acrescentamos
ainda uma tradução em português para que o leitor possa melhor acompanhar a nossa
leitura e confrontar, com calma, o texto original em francês e a tradução em português.
O
primeiro poema é inicialmente uma resposta pessoal, entre irônica e séria, ao volume
lírico e esotérico de Arcane 17, [6] de André Breton, recém saído no editor
comum, Brentano’s, de Nova York. Sobre este, sobretudo, concentraremos a nossa atenção.
O
segundo seria um “topos” clássico, poético e pictural: um “artista” (poeta ou pintor)
[7] se inspira ao ver um camponês a trabalhar
a terra, numa paisagem (no caso de Césaire, um cortador de cana no meio do canavial).
Deste segundo texto, Césaire modificará o título inicial ao encontrar, provavelmente,
por acaso, numa velha enciclopédia, uma expressão francesa arcaica que articula
um antigo método de cifrar uma mensagem a uma forma de caçar, à distância, um cervo.
E o cervo a caçar ao longe é a oralidade tradicional (conto e/ou adivinhação).
Fazer
de um poema um enigma a ser descodificado aos poucos pelo leitor é uma poética das
profundezas que liga a poesia à decifração do mundo e do ser. O leitor faz de Édipo
diante da Esfinge, antes de poder entrar na cidade de Tebas e encontrar o seu destino.
Nos
dois poemas, há igualmente referências (ocultas) a obras plásticas: gravura de Matta
que ilustrava Arcane 17 e uma publicidade
de tabaco para cachimbo, muito popular no Canadá para o primeiro, e sem dúvida,
um quadro de Brughel, o Velho, para o segundo. Neste, numa bela e tranquila paisagem
pintada “en plongée”, um camponês empurra o arado no seu campo enquanto um Ícaro
minúsculo, quase invisível, em baixo à direita, cai e afoga-se no mar, em punição
à sua hybris. Vêem-se apenas os seus pés
rodeados de um círculo de espuma branca que esguicha. Em suma: o trágico é muita
vez invisível e a placidez de escuras águas paradas pode abrir o caminho para a
descoberta do prazer e da iluminação.
Os
dois poemas se intitulam respectivamente “Marais”
(= Pântano), mais tarde “Marais nocturne”
(o que aparentemente reforça-lhe o caráter soturno, o que, no entanto, é falso,
avisa-se logo o leitor apressado), do volume Soleil cou coupé [8] (Sol pescoço cortado, de 1948) e “Au large” (= Ao largo), título mais tarde
modificado para “De forlonge” (= antiga
expressão cinegética [9] que poderia
ser traduzida por “Perseguindo a caça de muito longe” ou apenas “De muito longe”)
do volume Corps perdu (= Corpo perdido),
de 1949. Assim um poema, só recentemente
explorado pela crítica, composto em 1949, recebe novo título, a partir de 1961:
“De forlonge”. [10]
Em
1961, igualmente, Césaire reúne os dois volumes marcados pelo surrealismo sob o
título bastante neutro de Cadastre. A
edição, considerada definitiva, divide-se em duas partes, os volumes anteriores
conservando os seus títulos originais: Soleil
cou coupé e Corps perdu. [11] Os subtítulos, nitidamente surrealistas,
são enfeixados, agora, num novo título geral, deliberadamente prosaico e não-poético.
Cadastre, como se sabe,
é o registo público/oficial de uma cidade ou região onde figuram as informações
sobre a metragem e o valor de propriedades imóveis, e também a administração fiscal
dos documentos precedentes. Por outras palavras: Cadastre, título de cartório e de inventário, apresenta, de forma sibilina,
o poeta, o seu país natal e as experiências coletivas de vida nas Antilhas.
Qual
o critério para escolher entre os dois poemas, inicialmente, previstos? Como escolher
entre o mergulho num pântano ou um cortador de cana num canavial? Escolheu-se simplesmente
o poema mais antigo e o mais curto, e igualmente o menos estudado, deixando no entanto
a sugestão, ao leitor, porventura interessado, de consultar outras leituras já publicadas
sobre o cortador de cana. [12]
Andorinha que
fuma e serpente que faz cantar
Os poemas mais
breves de Césaire evocam frequentemente um espaço indefinido, primitivo e noturno,
habitado por um bestiário inquietante ou francamente alucinante.
O
nosso primeiro esforço de decifração do poema “Marais nocturne” é simples e puramente
semântico. É preciso saber o que significam certas palavras desconhecidas ou totalmente
exóticas.
No
primeiro poema, um par serpente-pássaro constituiria, talvez, para o leitor latino-americano,
nascido na Meso-América, uma possível referência ao conhecido par da mitologia asteca
(o Quetzalcoátl, a serpente com plumas) mas trata-se de um falso caminho. Ou por
outra: é somente uma intertextualidade que se dá, apenas no nível da recepção, possível
até de ser justificada do ponto de vista teórico, mas que, infelizmente, não abre
caminho para a leitura do texto. As principais referências, na produção do nosso
texto, nascem da fusão da oralidade tradicional francesa e da Kundalinî hindu (sic).
Aliás,
um par semelhante de serpente-pássaro que liberta enfim o canto, aparecia já no
final do Cahier, desde a primeira versão
do poema, ainda de 1939. Com maior espaço, deveríamos, assim, trabalhar com a intra-textualidade
de Césaire. Destaquemos apenas as diferentes camadas de significação desse breve
poema que são, pelo menos, quatro:
a)
a figura da Kundalinî que remete ao texto
sagrado hindu, o Bhagavata gita; [13]
b)
a referência a um geógrafo grego do século II, Pausânias, [14] dito o Periegeta, que narra a punição imposta pelos deuses a quem
não os acolhe dignamente: os Dióscoros – os gêmeos Castor e Pólux, filhos de Zeus
e de Leda – raptam sua única filha ainda virgem, a um homem que não soube recebê-los
condignamente em sua casa, deixando ao pai, no lugar da jovem, uma flor;
c)
uma alusão humorística ao livro recente de Breton, Arcane 17, em que o poeta francês descreve um périplo amoroso pela Gaspésie
[15] (península do Quebeque, no Canadá
francês) e cita uma publicidade de tabaco para cachimbo cujo refrão é “Alouette, gentille alouette, je te fumerai”
[16] no lugar de “je te plumerai” e
d)
outra alusão discreta a uma gravura de Matta, o grande pintor surrealista chileno,
que ilustrou o livro de Breton, usando a imagem de um escafandrista que sobe, enfim,
à tona, depois de um mergulho nas profundezas.
Citemos
o poema na sua versão definitiva, a mais elíptica, verdadeiro enigma à primeira
vista:
MARAIS NOCTURNE
Le marais déroulant son lasso jusque-là lové autour de son nombril
Et me voilà installé par les soins obligeants de l’enlisement au fond du marais
et fumant
le tabac le plus rare qu’aucune alouette ait jamais fumé
Miasme on m’avait dit que ce ne pouvait être que le règne du crépuscule. Je
te donne acte que l’on m’avait trompé. De l’autre côté de la vie, de la mort, montent
des bulles. Elles éclatent à la surface avec un bruit d’ampoules brisées. Ce sont
les scaphandriers de la réclusion qui reviennent à la surface remiser leur tête
de plomb et de verre, leur tendresse.
Tout animal m’est agami-chien de garde.
Toute plante silphium-lascinatum, parole aveugle du Nord et du Sud.
Pourtant alerte.
Ce sont les serpents.
L’un d’eux siffle le long de ma colonne vertébrale, puis s’enroulant au plus
bas de ma cage
thoracique, lance sa tête jusqu’à ma gorge spasmodique.
À la fin l’occlusion en est douce et j’entonne sous le sable
L’HYMNE AU SERPENT LOMBAIRE (In La Poésie.
Seuil) [17]
Antes
que o leitor se sinta completamente perdido e atolado nesse pântano noturno, aparentemente
ameaçador e traumático, cheio de animais peçonhentos, seria talvez útil ler uma
proposta de tradução em português:
PÂNTANO
NOTURNO
O pântano desenrolando
o seu laço até então enrodilhado em torno do seu umbigo
Eis-me instalado
pelos atenciosos cuidados do atolamento no fundo do pântano e fumando o melhor tabaco
de cachimbo que uma andorinha já fumou
Miasma tinham-me
dito que só podia ser o reino do crepúsculo. Asseguro-te que me enganaram. Do outro
lado da vida, da morte, sobem bolhas. Elas estouram à superfície com um barulho
de ampolas quebradas. São os escafandristas da reclusão que retornam à superfície
repondo a sua cabeça de chumbo e de vidro, a sua ternura.
Todo animal é para mim
agami-cão de guarda.
Toda planta silphium-lascinatum,
palavra cega do Norte e do Sul.
No entanto alerta.
São as serpentes.
Uma delas assobia
ao longo da minha coluna vertebral, depois enrolando-se na base da minha caixa torácica,
lança a sua cabeça até a minha garganta em espasmos.
No fim a oclusão me
é doce e entoo sob a areia
O HINO À SERPENTE
LOMBAR
O
poema é uma pequena missiva de um poeta a um outro poeta, nenhum dos dois nomeados,
de um eu (Césaire) que responde a um tu (Breton): “eis-me instalado… fumando”, “tinham-me
dito que”…, “todo animal é para mim”…,
“minha coluna vertebral”…, “minha caixa torácica”…, “a oclusão me é doce”…, “entoo… o hino”. Esse eu fez uma outra viagem, muito diferente
da viagem do seu interlocutor: “asseguro-te
que me enganaram…”
Breton
narra, em Arcane 17, uma viagem iniciática,
feita em companhia da nova mulher amada, a um finis terrae, uma longa excursão por uma península selvagem, batida
pelos ventos do Atlântico norte, entre o mar e o rio Saint-Laurent. Césaire mergulha, solitário, até ao fundo
de um pântano, noite fechada ainda por cima, e termina por viajar no seu próprio
corpo telúrico. E os seus espasmos são igualmente uma experiência de fusão eufórica/prazer
sexual. O seu mergulho o faz enterrar-se na areia molhada.
O
contexto é conhecido: André Breton (que vem de ser abandonado, ao chegar aos Estados
Unidos e durante a guerra, por sua mulher, Jacqueline Lamba) e a chilena Elisa Claro
se encontram em Nova York e visitam juntos o Canadá francês em 1944. Arcane 17 foi escrito em dois meses (de 20
de agosto a 20 de outubro). Narrativa de um novo encontro amoroso e ensaio, Arcane 17 está prenhe de alusões poéticas,
políticas e esotéricas. O título faz alusão à 17ª carta do tarot de Marselha, usado para a divinação. A lâmina em questão faz
parte dos Arcanos maiores e representa a Estrela e também a 17ª letra do alfabeto
hebraico (o peh). O peh este evoca, como signo, a língua na boca.
É questão portanto de comunicação profunda e de novo amour fou.
A
edição original do volume foi realizada em dezembro de 1944, com apenas 325 exemplares
e ilustrações de Roberto Matta, [20]
saindo por Brentano’s, editora da 5ª avenida em Nova York.
A
evocação do Canadá francês por Breton é reveladora. O poeta traça o retrato de uma
região isolada e selvagem, protegida e arcaizante sob a influência “obscurantista”
da Igreja católica. Ora, uma marca de tabaco para cachimbo, chamava-se, então no
Canadá, “Alouette” (= Andorinha). Encontram-se,
ainda hoje e facilmente, imagens desse tabaco numa publicidade dos anos 40: o refrão
era então “Alouette, gentille Alouette/ Alouette
je te fumerai.
Em
resumo: Breton recita uma publicidade contemporânea e conhecida do Canadá francês,
que transforma “e pisa o velho Valais de Nerval”.
Césaire, no seu poema, em resposta, reutiliza o achado do amigo, modificando-o.
O narrador, na primeira pessoa e só, instala-se, em imaginação, confortavelmente
na areia molhada do fundo de um pântano e se põe a fumar o tabaco Andorinha, identificando-se
com a marca de tabaco. Por outras palavras: aquilo que se fuma torna-se sujeito
que fuma. Um feitiço acontece: o que se fuma torna-se fumante e nas volutas da fumaça
que sobe do cachimbo, o pântano que tem a forma de uma grande serpente enrodilhada,
se transforma. O objeto torna-se sujeito ativo, bruxo ainda por cima, e fonte de
metamorfose.
As
crianças brincando de roda podem encenar o arrancar das penas da Alouette/Andorinha,
o valente Colibri pode ser morto e despedaçado no muito conhecido conto antilhano
em crioulo, mas a nova Andorinha, a que fuma cachimbo no fundo do pântano, torna-se
seu duplo vitorioso e adjuvante do poeta. Avançamos de saída uma leitura ainda obscura
para o nosso leitor brasileiro. Mas chegaremos lá.
No
poema, o narrador “fumando o melhor tabaco
de cachimbo que uma andorinha já fumou”, abre a porta à descoberta das serpentes
(benéficas, claro) do pântano. E no final, igualmente à sua serpente interior que,
despertando, sobe ao longo da sua coluna vertebral provocando-lhe êxtase sexual.
Resta
ainda um outro animal, totalmente desconhecido, o “agami”. O narrador afirma, no meio do poema “todo animal é para mim agami-cão de guarda”. O cão é de tal modo maléfico
e negativo em Césaire, que colore de conotações negativas qualquer outro animal
a ele associado, até mesmo uma ave.
A
mesma estranha palavra “agami” aparecia,
aliás, em “Le Grand Midi”, outro longo poema épico da primeira fase, de 1941:
Arums d’amour
Me bercerez-vous plus docile que l’agami
Mes lèpres et mes ennuis? (In La Poésie). [21]
No
poema épico “Le Grand Midi”, [22] o agami, ave pesada, de voo rasante e curto,
consolida no espírito do leitor, a ideia de não-elevação, de servidão ou de inconsciente
colaboração com o inimigo. O seu sentido disfórico, mais discreto no caso, é confirmado
por “adormecer” mansamente, embalando o narrador. Inútil procurar em dicionários
ou enciclopédias: nenhum deles nos dirá porquê uma grande ave americana ganha, na
poesia de Césaire, conotação tão negativa, ao mesmo tempo de guardar (como um cão)
e de embalar e fazer adormecer a consciência das suas lepras e dos seus tormentos.
É
um comentário do naturalista francês do século XVIII, Buffon (1707-1788), que nos
dará a primeira chave do mistério: resumimos rapidamente a sua apresentação da grande
ave desconhecidade. Agami. Zool. Palavra
da Guiana francesa designando uma ave pernalta de plumagem negra, chamada igualmente
“oiseau-trompette” pelo grito estridente;
pode ser domesticada para guardar galinheiros. E Buffon acrescenta literalmente:
“Não apenas o agami pode ser domesticado muito
facilmente, mas ele se liga até mesmo a quem o trata, com tanta facilidade e fidelidade,
como o cão”. [23] Negro, fiel, serviçal,
domesticável como um cão, ave que guarda, no galinheiro, outras aves: tudo prepara
o agami para ser o símbolo negativo por
excelência. O infame, ou inconsciente, colaborador negro, na sua dupla face: a masculina,
do capataz de cor que controla e guarda escravos numa plantation ou a feminina, da doce negra-mãe de leite, a da antilhana. [24]
Consideremos
agora a planta misteriosa com sua dupla denominação latina, silphium-lascinatum. Ela possui uma longa
tradição literária entre os Antigos.
A
consulta ao Glossaire de René Hénane (Jean-Michel
Place, 2004) e ao Lexique, publicado em
anexo ao livro de Papa Samba Diop, La poésie
d’Aimé Césaire. Propositions de lecture (Champion, 2010) não dá nenhuma indicação
que permita a leitura da passagem e sobretudo justifique a conotação negativa de
uma flor.
Papa
Samba Diop, no seu léxico fornece, no entanto, uma sugestão que poderia ser aproveitada
indiretamente: a tal planta de duplo nome latino tem flores amarelas ou esbranquiçadas
que lembram vagamente o girassol:
Silphium-lascinatum ou Silphium lancinatum
Planta vivaz podendo atingir dois metros de
altura, com flores amarelas ou esbranquiçadas comparáveis às do girassol. Corrente
no Maryland e na Flórida (USA), mas apresenta algumas espécies nas Antilhas (ibid.)
A
espécie teria sido descrita por Carl Linnaeus, em 1753. Se a flor é semelhante à
do girassol, voltando-se para o sol – daí o seu outro nome popular de “planta-bússola”
–, o que explica a sua “surdez” diante do Norte e do Sul. Mas falta ainda algo:
por quê o silphium é tão negativo?
Os
dicionários, mesmo altamente especializados, só dão o que podem dar: uma lista aberta
de significações. Consultemos ainda a intra-textualidade do poeta: ela, infelizmente,
não nos oferece outra pista e a dupla denominação em latim de uma flor misteriosa
só aparece neste poema sobre o pântano noturno. Sabemos ainda que a semente do silphium lembra um coração e era largamente
utilizada como contraceptivo, na Antiguidade. A planta é mencionada no sétimo poema
de Catulo, que é uma declaração de amor a Lésbia: o quarto verso significa “Cirene onde cresce o sílfio”. Tudo isso cria
um espaço, meio vago mas amplo, de conotações ligadas não só à paixão como à esterilidade.
Uma
passagem do grego Pausânias [27] nos
fornece uma pista mais interessante. Na sua descrição da Grécia, o geógrafo antigo
narra uma história que deve ter chamado a atenção de Césaire. Os Dióscuros (par
de gêmeos, filhos de Zeus) que lembram aliás os Marassa, no vodu ou os Ibeji
no candomblé brasileiro, se apresentam, um dia, como viajantes estrangeiros, a um
homem, chamado Formium, pedindo-lhe hospitalidade. No dia seguinte, os Dióscuros,
insatisfeitos por não terem recebido o quarto que desejavam, ao deixarem a casa,
raptam a filha virgem do hospedeiro, deixando no seu lugar o silphium lascinatum. A história é a seguinte:
Près de là est une maison qu’habitaient
jadis, dit-on, les fils de Tyndarée, et qui appartint dans la suite à un Spartiate
nommé Phormion. Les Dioscures, s'étant présentés chez ce Phormion comme des étrangers,
lui demandèrent l’hospitalité en disant qu’ils venaient de Cyrène, et ils prièrent
qu’on leur donnât la chambre qui leur plaisait le plus lorsqu’ils étaient parmi
les hommes. Phormion leur répondit que tout le reste de la maison était à leur disposition,
excepté la chambre qu’ils demandaient, parce qu’elle était occupée par sa fille
qui n’était pas encore mariée. Le lendemain, la jeune fille avait disparu ainsi
que toutes celles qui la servaient, et on trouva dans la chambre les statues des
Dioscures et une table sur laquelle il y avait du silphium. (Perigenèse,
I, III, cap. XVI) [28]
Para
Césaire, do ponto de vista mítico, a flor misteriosa, além de não mais indicar o
Norte e o Sul, impede um pai de ter uma descendência, que o faria viver depois da
sua morte. O Silphium interrompe o fluxo
das gerações dentro de uma linhagem. Ao perder a sua única filha, o pai perde a
sua descendência vindoura. A planta, simbolicamente, traz a morte do futuro para
um homem. No fundo, ela é a negação mesma do ciclo vital de vida-morte-renascimento.
Em resumo: a recusa total do homem e da cultura “etíopes”, segundo a concepção de
Frobenius
Se
a ave agami liga-se à servidão, por ser
facilmente domesticável, a flor misteriosa liga-se à esterilidade e à morte em vida,
além da perda da bússola natural que procurava o Sol, fonte de vida. Os dois – ave
e planta – são negativos. No caso da flor dita também “planta bússola”, sua agulha
imobilizou-se para sempre. Ela está cega e surda ao Norte e ao Sul.
Mas
é no fundo de um pântano noturno que se dá a transformação do negativo em positivo.
Identificamos
de saída o tema da Kundalinî: não voltaremos
a ela por ora. O último verso transcrito em letras capitais não deixa dúvidas. A
ascensão da serpente que poderíamos caracterizar como cósmica no Cahier, tem lugar, aqui, do ponto de vista
pessoal e no microcosmo de um corpo humano.
Terminamos
aqui a introdução sobre a semântica do poema. Podemos começar a lê-lo. E a apreciá-lo
como leitores.
Um espaço simbólico
Ultrapassados
os problemas de vocabulário, note-se que, felizmente aqui, a já muita denunciada
“perversidade sintática” [29] de Césaire
não cria outras armadilhas para a compreensão do seu poema pelo leitor.
1. No
pântano, a serpente que sustenta o mundo
O pântano, em
Césaire, é a matéria primordial, indiferenciada, prenhe de todas as virtualidades
e germinações invisíveis. Essa matéria dos inícios pode aparecer, na sua poesia,
como marais (pântano), mangrove (mangue) ou ainda marigot (pequeno charco fluvial). [30] Todos, de águas escuras, paradas e pesadas,
da terra firme ou da fronteira incerta entre terra e mar, nada têm de maléfico,
muito pelo contrário. Na versão inicial do poema – um pouco mais longa e que não
analisamos aqui – o pântano era ainda um lugar de maturação, protegendo o narrador
contra o “mau olhado” (mauvais oeil).
“Miasma”, disseram ao narrador, mas é falso:
“me enganaram”, confirma o poeta a Breton,
seu interlocutor. Miasma é a emanação pútrida de corpos e substâncias em decomposição.
Lá, no pântano, estão as serpentes, todas: a primordial que se enrola em torno do
omphalos e as outras, múltiplas, até a
Kundalinî dos hindus. Lá ainda “os escafandristas da reclusão […] retornam à superfície repondo a sua cabeça de chumbo e de vidro, a sua
ternura”. Note-se inversão: normalmente os escafandristas mergulham num meio
perigoso, aqui, eles voltam à tona e trazem a “sua ternura”. E é à tona que os escafandristas repõem a sua proteção
de chumbo e de vidro. Outra inversão ou descoberta: o pântano, “do outro lado da vida, da morte”, não é o
reino do crepúsculo. Segundo a etimologia,
crepúsculo é o duvidoso, o incerto, o
lugar da falsa luz do sol, que já desceu no horizonte. Da mesma forma, também não
é o reino do “miasma”.
Um
escafandrista aparece na gravura de Matta, em Arcane 17. No poema de Césaire, a figura se desdobra ou se multiplica
em vários, graças ao plural.
No
primeiro verso, percebe-se que o pântano é também o reino da grande serpente primordial
que se põe em movimento: o pântano desenrolando
o seu laço até então enrodilhado em torno do seu umbigo. Esta serpente corresponde,
ao mesmo tempo, ao Dan africano ou ainda,
para mantermos a camada significante hindu particularmente importante neste curto
poema, a Ananda que encerra, nos seus
anéis, a base do eixo do mundo. A Ananda
carrega o mundo do qual assegura a estabilidade.
Há
duas maneiras, do ponto de vista simbólico, de carregar o mundo: a) pode ser levando-o
às costas ou sobre os ombros (como o gigante Atlas para os gregos ou o São Cristóvão
no cristianismo primitivo), ou ainda, como o elefante com as suas quatro patas poderosas
ou b) pode ser abraçando o “criado” com um círculo contínuo, que o impede de se
desintegrar. É o que faz a serpente “enrolada
em torno do seu umbigo”. No início do poema, o ofídio primordial – a Ananta – se põe em movimento “desenrolando o seu laço”.
A Ananta
é uma serpente (nagâ) da mitologia hindu que forma, aliás, um par com a nossa já
conhecida Kundalinî. Seu nome, em sânscrito,
significa sem fim ou sem limite, eterno e infinito. Repousando sobre as águas primordiais,
Ananta, a serpente cósmica, serve de leito
para o deus Visnhu enquanto este descansa, depois da dissolução (pralaya) de um universo antigo, à espera
que o deus criador, Brahma, renasça do seu umbigo e crie um universo novo. No Baghavad gîta (Canto X), Khrisna se define
assim “eu sou Ananta entre as nagâs”.
[31] Césaire resume portanto, no seu
curto poema, uma leitura pessoal do grande poema espiritual hindu. O espantoso é
que a sua data de composição, na primeira versão publicada, por Édition Fragance
de 1949, seja tão precoce, o que sugere o conhecimento prévio da tradição hindu
ou antes do seu retorno à Martinica às vésperas da II Guerra ou pouco depois do
seu retorno à França como deputado eleito na Assembleia Nacional. [32]
Enfim,
note-se o interesse sempre presente do poeta por narrativas de cosmogonias por ensaios
sucessivos, o que acontecerá, uma vez mais, com a criação do mundo segundo a epopeia
maya-quiché, o Popol-vuh, que aparecerá
em outros poemas mais tardios.
2. A lembrança
da conjunção dos andróginos
Duas observações
se impõem ainda para além da pluralidade das serpentes no pântano.
A
primeira é o “sifflement” (assobio) que
acompanha a ascensão da Kundalinî pela
coluna lombar do narrador. Mas ao contrário do horror que vive Orestes, no momento
em que se lança para a morte em Racine (pour
qui sont ces serpents qui sifflent sur vos
têtes?), [33] o narrador alcança,
com a serpente, um êxtase sensual/sexual. Césaire conhece bem demais os clássicos
franceses para que a lembrança da famosa aliteração de Andromaque não esteja aí subjacente, com inversão de conotação.
A
segunda observação relaciona-se com a lembrança do andrógino. A subida da Kundalinî, figura e força femininas, permite
a junção feliz do masculino e do feminino. Mas essa conjunção, fortemente erótica,
nasce, no poema, de outra inversão: a força feminina é fálica (lança a sua cabeça) e a garganta do narrador,
em espasmos, corresponde, de certo modo, a um útero masculino, onde nascem sucessivamente
o prazer e o canto.
Como
sempre, em Césaire, a união amorosa corresponde à conjunção de dois andróginos.
O narrador pode enfim cantar. Sua língua – não esqueçamos o peh do alfabeto hebraico - se destrava na
boca e se liberta na alegria. Essa mesma língua luta, no Cahier, contra “a imóvel verrição”
e essa conjunção dos andróginos está claramente no mesmo poema, desde a sua primeira
versão, na cosmogonia sonhada. [34]
3. O cachimbo fumador ou a Andorinha, novo avatar
de Colibri
La publicité est la fleur de la vie contemporaine,
elle touche à la poésie.
CENDRARS, Blaise. Aujourd’hui, 1927.
A
segunda estrofe do nosso poema é inicialmente um piscar de olhos ao texto de Breton,
Arcane 17. Já referimos por alto o contexto
inicial, a viagem de um novo casal (Breton-Elisa Claro) pelo Canadá francês (Québec)
[35] e pela Gaspésie. Sobre a publicidade
do tabaco para cachimbo seria, talvez, útil, ler um pouco mais o texto de Breton.
Como Arcane 17 nunca foi traduzido para
o português, cita-se uma passagem talvez um pouco longa para que se possa ter uma
ideia da sua visão sobre a província no Norte da América, fundada pelos franceses
no início do século XVII.
Situemos
o texto de Arcane 17 no tempo da Guerra.
Breton escreve, logo depois do desembarque das tropas aliadas na Normandia, começado
a 6 de junho de 1944. A sua análise revela a superposição de colonizações diferentes,
a não integração da comunidade francófona que linguisticamente parece anacrônica
e à margem da História, sobretudo a alienação coletiva, expressada pela publicidade
que pisoteia a região cantada liricamente por Gérard de Nerval, ao Sul de Senlis,
na sua novela Sylvie (1853):
L’isolement, sur cette côte de la Gaspésie, aujourd’hui, est aussi inespéré
et aussi grand qu’il se puisse. Cette région du Canada vit, en effet, sur un statut
particulier et malgré tout un peu en marge de l’Histoire, du fait qu’incorporée
à un dominion anglais elle a gardé de la France, non seulement la langue où se sont
établis toutes sortes d’anachronismes, mais aussi l’empreinte profonde des moeurs.
Peut-être, pour dramatique qu’il soit, le débarquement actuel de nombreux Canadiens
français sur la côte normande aidera-t-il au rétablissement d’un contact vital,
manquant depuis près de deux siècles. Mais ceux qui sont demeurés ici montrent par
leurs gestes et leurs propos qu’ils n’ont jamais pu dépasser tout à fait un stade
où leur aventure propre, en tant que groupe, se brouille pour se confondre tant
bien que mal avec une autre. Si, de leur part, toute rancœur a probablement disparu,
leur intégration au sein de la communauté anglaise se montre des plus illusoires.
L’Eglise catholique, fidèle à ses méthodes d’obscurcissements, use ici de sa toute
puissance influence pour prévenir la diffusion de ce qui n’est pas littérature édifiante
(le théâtre classique est pratiquement réduit à Esther et à Polyeucte qui s’offrent
en hautes piles dans les librairies de Québec, le dix-huitième semble ne pas avoir
lieu, Hugo est introuvable) […..] Tout cela compose, dans l’air admirablement limpide,
un écran de protection très efficace contre la folie de l’heure, comme d’une vapeur
qui, certains matins, s’étend à tout l’horizon (“Alouette, tabac à fumer naturel”,
dit candidement ce paquet, à l’image d’un oiseau chantant dans les herbes et, dans
ce début de chanson qu’il piétine, tout le vieux Valois de Nerval rejaillit pour
s’épuiser aussi vite “Alouette, gentille alouette, Alouette je te fumerai”). [36]
Se
a Andorinha, no texto de Breton é o triste epítome da profunda alienação do Québec,
a Andorinha que fuma, no fundo do pântano, no poema de Césaire, é o pássaro com
o qual se identifica o narrador, provocando, em si próprio enquanto indivíduo, a
sua transformação. E a libertação do narrador, pelo menos no seu corpo, ao entoar
o “hino à serpente lombar”.
Du miel aux cendres, o segundo
tomo das Mythologiques, [37] de Claude Lévi-Strauss, publicado em
1977, partindo da oposição entre o mel
e as cinzas do tabaco, explora através
de mitos americanos, dois itinerários complementares. O mel exprime a força sedutora
da natureza enquanto a fumaça do tabaco elevando-se em direção aos seres sobrenaturais,
retém o homem na via que o afasta da cultura. Antes do texto erudito do antropólogo,
a intuição poética de Césaire parece ter visto certo.
A
fumaça da Andorinha abre as portas, como vimos, à descoberta das serpentes benéficas
do fundo do pântano.
Consideremos
ainda, por um instante, a gravura de Matta. O Escafandrista, na gravura que ilustrou
o Arcane 17, é, na verdade, uma mulher
com o rosto semioculto pelo capacete mas de seios nus e estes identificam o feminino,
claro. É ela que parece fazer sair o fogo de um poço e três sóis estão, no alto,
no céu: são as Estrelas. E o nome do Arcano 17 é A Estrela (L’Etoile). Para Breton, para Matta e para
Césaire, a salvação toma a forma de um corpo feminino.
Césaire, no seu poema, põe a figura da escafandrista
de Matta no plural, com múltiplas inversões, pois ao subirem à tona e ao colocarem,
só no espaço exterior e não no fundo do pântano, o capacete protetor contra o miasma,
está a requalificar o par baixo/alto, profundo/elevado. É quase inútil lembrar que
a Kundalinî é força feminina assim como
a pequena Alouette/Andorinha.
A
leitura de Césaire deve ser tentada sempre a partir da sua intratextualidade, ou
seja, a partir de outros textos seus que se iluminam uns aos outros. Aí estão as
pistas a seguir, de perto ou de longe. Por outras palavras, um poema pode contradizer,
transformar, dialectizar as significações propostas pelos dicionários, inclusive
de símbolos. O poeta cria as suas próprias estruturas antropológicas a partir da
fusão de diferentes mitos, colhidos aqui ou ali, na sua paisagem insular inclusive
ou na oralidade tradicional em crioulo. O poema, relido em voz alta, tem ainda uma
coloração humorística que aumenta o seu encanto.
Césaire
alarga a sua intertextualidade fazendo entrar mitos sagrados da Índia e ainda uma
resposta ao livro recém-publicado de Breton assim como uma referência à gravura
de Matta. [38]
Mas
a nossa Andorinha pode ser vista, igualmente, no espelho trágico de Colibri, personagem
do folclore popular da Martinica assim como a sua vigança contra os seus inimigos
poderosos. E partimos para um novo atalho ou desvio (Glissant diria “un Détour”): a oralidade tradicional em crioulo.
O
que é um avatar? No hinduísmo, é a descida de um ser divino à terra, em forma materializada;
em linguagem figurada, uma nova ou cada uma das fases de uma entidade sobrenatural
sujeita a transformações, ou ainda, simplesmente, metamorfose, mutação.
No
quarto número da revista Tropiques, de
janeiro de 1942, o primeiro texto, assinado em parceria por Aimé Césaire e René
Ménil, é fundamental: com pouco mais de quatro páginas, o artigo, intitulado “Introduction au folclore martiniquais”, coloca
a problemática da literatura oral em crioulo, modo de expressão alusivo e metafórico
de “um povo que tem fome” e que diz o
seu “medo” através da figura do “zumbi” (haitiano). As duas últimas partes
do ensaio abordam o “tambor” e a derrota
de Colibri, personagem popular tradicional, morto depois de lutar contra vários
animais enviados pelo Bom Deus: Cavalo, Boi, Peixe-Armado. Última frase: “Era uma vez um homem negro agarrado à sua terra”.
O
artigo seguinte, no mesmo número de Tropiques,
é a transcrição, na sua dupla versão (francês-crioulo), feita ainda no final do
século XIX, por Lafcadio Hearn do famoso “Conte
Colibri”. [39]
Resumo
do conto: o pequeno Colibri tinha um grande tambor que tocava sempre. Deus queria
fazer uma estrada mas os negros diziam que só sabiam trabalhar ao som do tambor.
O Bom Deus envia então Cavalo para tomar à força o tambor de Colibri. Este recusa
entregar o seu tambor e ao lutar contra Cavalo, Colibri perde algumas penas mas
fura os olhos a Cavalo. O Bom Deus chama então o Boi que tem chifres. Colibri luta
uma vez mais e apesar de ferido, ganha de novo a luta. O Bom Deus envia então Peixe
Armado (Poisson Armé) e Colibri cai morto,
perdendo todas as suas penas. Peixe-Armado corta-lhe a cabeça e toma-lhe o tambor.
Fim do conto.
De
certa forma, a nossa pequena Andorinha/Alouette é a revanche de Colibri assassinado
pelos seus inimigos enviados pelo Bom Deus. E não se trata de simples suposição
nossa uma vez que um outro poema de Césaire, muito elíptico, e do mesmo período
(Ferrements, 1960), recria, de forma sibilina,
o conto popular, muitas vezes ouvido, na sua infância e nas infâncias de todos,
na Martinica. Transcrevemos abaixo o poema ainda mais curto e secreto, sobre a morte
de Colibri, seguido de um ensaio de tradução, em português. Creio que o leitor não
terá, agora, nenhuma dificuldade na sua leitura uma vez que já conhece as estruturas
antropológicas profundas de “Pântano noturno”.
O
novo poema tem oito versos, dos quais apenas dois fazem um dístico. Todos os outros
seis versos aparecem isolados, separados ao mesmo tempo do anterior e do seguinte,
sem maiúsculas nem qualquer pontuação. O texto, composto por imagens, verdadeiros
flashes, sem articulação lógica, tem apenas dois verbos conjugados: a aurora […] sobre a sua corrente morde feroz e o pássaro[…] exige a conta das
suas penas dispersadas. “Morder” e “exigir”: na natureza e no céu, a luz do
Sol acorrentado e o pequeno Colibri, na terra, resistem. Assim como o Cahier começa com imagem da manhãzinha (“au bout du petit matin”), aqui a aurora esforça-se
por nascer num espaço quebrado em que o sol não mais se levanta.
Assim,
esperamos que o leitor não se sinta muito defraudado por termos abandonado o poema
“De forlonge” pois acabará por ter lido dois poemas surrealistas da primeira fase
de Césaire.
BEAU SANG GICLE
tête trophée membres lacérés
dard assassin beau sang giclé
enfances enfances conte trop remué
l’aube sur sa chaîne mord féroce à naître
ô assassin attardé
l’oiseau aux plumes jadis plus belles que le passé
exige le compte de ses plumes dispersées
(in Ferrements, in La Poésie) [40]
Segue-se
uma tentativa de tradução. Note-se que o título (Belo sangue esguichado) volta no segundo verso, como leitmotif central,
o do sangue que jorra quando Colibri tem a cabeça cortada:
BELO SANGUE
ESGUICHADO
cabeça troféu membros
lacerados
dardo assassino belo
sangue esguichado
infâncias infâncias
conto por demais remexido
a aurora a nascer sobre
a sua corrente morde feroz
ó assassino atrasado
o pássaro de penas outrora
mais belas que o passado
exige a conta das suas
penas dispersadas
Conclusão aberta e provisória
A poética de Césaire está entre o oral e o escrito, entre o dito e o edito,
entre a memória da oralidade (memória de uma canção infantil retomada por Nerval
como símbolo do seu Valois natal, mais tarde transformada, por uma publicidade contemporânea
do Canadá francês, comentada por Breton como reveladora da alienação coletiva de
uma região francófona na América) e memória do escrito (densa e erudita intertextualidade
que retoma e transforma, sem cessar, uma longa tradição literária desde os Gregos
com Pausânias ou a epopeia hindu de Bhagavata gita até aos poetas
vanguardistas contemporâneos). No nosso primeiro poema sobre um pântano, há também
a memória, de novo transformada, de uma gravura de Matta: para descobri-lo basta
comparar os escafandristas que sobem em lugar de mergulharem, no texto, remetendo
ao longe (“de forlonge”) à imagem do Arcano
Maior 17 (a Estrela) no tarot de Marseille, segundo a versão do artista surrealista
chileno que ilustra uma obra de Breton.
O poema “Beau sang giclé”, enfim, como uma pequena coda
sobre a morte de Colibri, em Ferrements,
nasce de uma experiência, histórica e linguística, coletiva e individual, literalmente
ancestral pois ligada ao tempo da longa duração, em que o leitor deve aprender a
ler o texto composto de palavras soltas e enigmáticas, como Édipo diante da Esfinge.
Para o nosso eventual leitor: este pequeno ensaio, numa
tentativa de exploração metódica de um imaginário e de uma poética, brinca com dois
passarinhos – uma Andorinha mágica e um Colibri combatente –, sem falar em algumas
serpentes benéficas, recriados pelo poeta da Martinica. O texto poderia chamar-se
igualmente A revanche de Colibri graças à Andorinha.
NOTAS
Os poemas estão traduzidos ao português por Lilian Pestre de Almeida.
1. La Tragédie du Roi Christophe.
Présence Africaine, 1963.
2. Une saison au Cong. Présence Africaine, 1966.
3. Criou-se, assim,
de certa forma, uma outra narrativa, mais linear e simples, accessível ao
grande público, evitando-se as passagens mais obscuras, sobretudo dos
movimentos centrais do poema.
4. Lisboa, Sá da
Costa, 1ª edição 1978. Além da tradução, Mário de Andrade assina o Prefácio.
5. Ver ainda, em particular, os ensaios publicados em Tropiques (1941-1945), Lettre
à Maurice Thorez (Présence Africaine, 1956) e o grande ensaio histórico Toussaint
Louverture, la Révolution française et le problème colonial (Présence
Africaine, 1962).
6. Arcane 17 é um texto poético de Breton,
escrito de 20 de agosto a 20 de outubro de 1944, durante uma viagem na Gaspésie
(na província do Québec), na costa leste do Canadá, em companhia da chilena
Elisa Claro, sua nova musa e futura mulher. Faz alusão à 17ª lâmina do tarot. A edição original foi publicada
por Brentano’s em março de 1945, com quatro ilustrações de Matta.
7. Ut pictura poesis, a expressão de
Horácio, na sua Arte poética (c. 20
a.C.), está no cerne de inúmeros pequenos poemas de Césaire.
8. O título Soleil cou coupé é tomado de empréstimo
ao último verso do poema “Zone” do volume Alcools
(1913), de Guillaume Apollinaire. No entanto, o personagem do “degolado” (le cou coupé) aparece em alguns poemas
de Césaire: corresponde a Boukman (no Haiti) e a Zumbi dos Palmares (no
Brasil).
9. Ver o dicionário
Littré: Terme de
chasse. Il va de forlonge, il chasse le forlonge, se dit d'un
chien qui suit de loin, qui chasse de loin.
10. O poema fora
publicado, pela primeira vez, em edição de luxo para colecionadores (Fragance
éditeur), ilustrada com 32 águas-fortes de Picasso.
11. Cadastre. Seuil, 1961.
12. As leituras
são: a) PESTRE
DE ALMEIDA, Lilian. “De forlonge ou à partir de l’oralité traditionnelle”, in Samia Kassab-Charfi (dir.), Altérité et mutations dans la langue.
Pour une stylistique des littératures francophones. Bruxelles, Academia
Bruylant, 2010, texto desenvolvido in
Césaire hors frontières. Poétique, intertextualité et littérature comparée.
Köningshausen & Neumann, 2015) CORINUS, Véronine. “Césaire à l’écoute de la voix majolè”,
in Carnets : revue électronique d’études françaises. Série II, nº 13, mai 2018.
13. A Kundalinî deriva de uma palavra em sânscrito significando, ipsis litteris, “enrolada como uma serpente” ou “a
que tem a forma de uma serpente”: é a força física ou espiritual
(dependendo da linhagem esotérica ser naturalista ou espiritualista), que jaz,
adormecida, no primeiro chakra, o
centro de força situado na base da coluna vertebral dos homens. Ao acordar, a
sua ascensão é a energia que passa entre os chakras ou centros de energia no corpo físico. Despertada, a Kundalinî percorre igualmente todo o
corpo espiritual, equilibrando os canais energéticos e centros de energia. Ao
subir ao longo da coluna vertebral, a Kundalinî
chega ao sétimo chakra, o da garganta, desembocando para o discípulo, ora na
iluminação que o põe em comunicação com o cosmos, ora na ativação da glândula
pineal e na liberação das endorfinas, provocando intensa euforia.
14. Pausânias,
geógrafo e viajante grego do segundo século (c.115-180), é o autor
da Descrição da Grécia (em grego clássico: Periegesis Hellados), obra consultada por Césaire
que aí bebe o seu conhecimento físico da Grécia
Antiga, graças às suas descrições de
localidades da Grécia central e do Peloponeso, assim como algumas lendas. É uma das fontes clássicas do
poeta da Martinica.
15. É o berço do
Canadá francês, espécie de finis terrae
onde desembarcou Jacques Cartier em 1534.
16. A publicidade
do Canadá francês transforma uma canção tradicional francesa, para crianças,
com refrão e várias repetições: Alouette,
gentillle alouette, je te plumerai la tête, … je te plumerai les ailes; … je te
plumerai les pattes etc. (Andorinha, gentil andorinha, eu te arrancarei as
penas da cabeça, … das asas, … das patas etc.)
17. O último verso,
transcrito em maiúsculas, corresponde à subida da Kundalinî ao longo da coluna vertebral. Utilizamos aqui a edição Aimé
Césaire. La Poésie. Edition établie par Daniel Maximin et Gilles
Carpentier. Seuil, 1994: todas as nossas indicações de página a
ela se referem, precedidas por La Poésie.
18. “Uraniano” e “ctônico”, adjetivos utilizados por Gilbert Durand,
opõem-se como “do céu” (de Uranos) e “da terra ou dos subterrâneos infernais”
(lugar das divindades como Hades, Deméter etc.)
19. Agami (Agamia agami, subfamília
dos Tigrisomatinae) é o termo crioulo, bastante popular na Guiana francesa, para designar
uma grande ave pernalta chamada, no Brasil, “garça da mata” ou “socó-beija-flor”.
20. Roberto Matta,
pintor surrealista chileno (Santiago do Chile, 1911 - Cività Vecchia, Itália,
2002).
21. Amorosos lírios de árum/ mais docemente que
o agami embalareis/ minhas lepras e meus tormentos? Árum é um gênero botânico da família das aráceas,
nativas na Europa, Magrebe, Oriente Médio, com a maior diversidade na região do
Mediterrâneo. Todas as partes da planta são venenosas, contendo uma
significante quantidade de oxalato de cálcio. Na classificação de Jussieu
(1789) é um gênero botânico, ordem Aroideae.
22. A primeira
versão do poema “Le Grand Midi” aparece no segundo número de Tropiques, julho de 1941. Do longo
poema, propomos uma leitura no volume, Mémoire
et métamorphose. Aimé Césaire entre l’oral et l’écrit. Königshausen &neumann,
2010.
23. Ver HÉNANE, René. Glossaire des
termes rares dans l’oeuvre d’Aimé Césaire. J.-M. Place,
2004, p. 14. A referência seria BUFFON, T. VI, Oiseaux.
24. A da das Antilhas francesas corresponde à babá, mãe de leite brasileira.
25. O poema de
Vigny, narrativa de uma outra caçada, esta coletiva, foi publicado, pela
primeira vez, em Paris, na Revue des Deux
Mondes, em 1843. Faz parte posteriormente do volume Les Destinées, de 1864.
26. Vigny opõe dois
canídeos (cão x lobo), um domesticado, outro selvagem; Césaire duas aves (agami x andorinha, que remete a
Colibri). Ver mais adiante a relação com Colibri, personagem de contos orais
nas Antilhas.
27. Césaire conhece
perfeitamente Pausânias: é uma das suas leituras clássicas e uma das suas
fontes. Ver, in Mémoire et métamorphose,
no capítulo sobre os poemas “túmulos”, o texto dedicado a Saint-John Perse e ao
rio Orontes. Por outro lado, Césaire conhece igualmente o livro de Frazer,
James George sobre o geógrafo grego.
28. Perto dali, há
uma casa habitada outrora pelos filhos de Tindaréu, pertencente a seguir a um
cidadão espartano chamado Formion. Os Dióscuros, apresentaram-se em casa desse
Formion como estrangeiros, pedindo hospitalidade dizendo que vinham de Cirene,
e pediram que lhes fosse dada o quarto que mais lhes agradava quando estavam
entre os homens. Formion lhes respondeu que toda a sua casa estava à disposição,
exceto o quarto pedido, ocupado pela sua filha ainda não casada. No dia
seguinte, a jovem tinha desaparecido assim como todas as suas criadas e
encontraram, no quarto, duas estátuas dos Dióscutos e sobre uma mesa havia um
ramo de silphium.
29. A expressão é
de uma outra tradutora de Césaire para o inglês: Annette Smith.
30. O tema do
mangue é ainda mais frequente, em Césaire, do que o do pântano.
31. O número de
serpentes, com seus nomes crioulos populares (fer de lance, couresse, minute) e seus nomes eruditos (trigonocéphale, bothrops lancéolé) é
bastante elevado na poesia de Césaire. Elas aparecem no grande oratório Et les chiens se taisaient.., assim como
em vários poemas de diferentes fases (“crevasses”, “avis de tirs”, “soleil
serpent”, “sentiments et ressentiments des mots”, “internonce” etc.).
32. A dupla
atividade política de Césaire, a partir de 1945, como “maire” de Fort-de-France
e deputado na Assembleia Nacional em Paris, não parece ter prejudicado a sua
enorme capacidade de leitura. E a sua atuação política no executivo local e no
legislativo em Paris, vai perdurar até à sua velhice. Césaire deixa de ser
deputado em 1993 e “maire” da sua cidade só em 2001.
33. O verso, além
da aliteração, lembra a cabeça mortífera da Medusa. Andromaque, V, 5.
34. Ver, a
respeito, o artigo “La cosmogonie césairienne, fête d’Eros”, in Actes du Congrès mondial des littératures de langue
francaise négro-africaine, nord-africaine et québécoise en Méditerranée. Université de Padoue, 1984, texto resumido, em parte, no posfácio à
tradução do Cahier/Diário, publicado
pela EDUSP.
35. Québec é
a mesmo tempo capital de província e nome de província: é a maior província do país em extensão territorial e a
segunda maior divisão administrativa do Canadá, que se estende ao longo do rio
Saint Laurent, e, também, a mais antiga cidade francesa da América, fundada em
junho de 1608, por Samuel de Champlain.
36. O isolamento,
nesta costa da Gaspésie, hoje, é tão inesperado e igualmente tão grande quanto
se possa imaginar. Esta região do Canadá vive, efetivamente, sob um estatuto
particular e apesar de tudo, um pouco à margem da História, pelo fato que,
incorporada a um dominion inglês ter
conservado da França, não somente a língua em que se estabeleceram todos os
tipos de anacronismos, mas também a marca profunda dos costumes. Talvez, por
dramático que seja, o desembarque atual de numerosos Canadenses franceses na
costa normanda ajude ao restabelecimento de um contato vital que falta há quase
dois séculos. Mas aqueles que permaneceram aqui mostram, pelos seus gestos e
conversas, que nunca puderam ultrapassar completamente um estágio em que a sua
aventura própria, enquanto grupo, se desvanece para confundir-se, bem ou mal,
com uma outra. Se, da sua parte, qualquer rancor desapareceu, a sua integração
no seio da comunidade inglesa se revela das mais ilusórias. A igreja católica,
fiel aos seus métodos obscurantistas, usa aqui da sua toda poderosa influência
para prevenir a difusão do que não for literatura edificante (o teatro clássico
está praticamente reduzido a Esther e
Polyeucte que se oferecem em altas
pilhas nas livrarias de Québec, o século XVIII parece não ter havido, Hugo não
se encontra. […] Tudo isso compõe, no ar admiravelmente límpido, um ecrã
protetor muito eficaz contra a loucura do momento, como um vapor que certas
manhãs se estende por todo o horizonte (Andorinha,
tabaco natural para fumar, diz candidamente o maço, com a imagem de um
pássaro cantando no meio das ervas e, neste início de canção que destruindo
todo o antigo Valois de Nerval, alça voo para esgotar-se rápido: Andorinha, gentil andorinha. Andorinha, eu
te fumarei)
37. Nenhum dos dois
textos foi traduzido para o português, ao que me parece, as editoras, no
Brasil, recuando diante de ensaios longos, o que deixa o público, que não lê
mais francês, sem acesso aos textos mais importantes provavelmente.
38. Lembramos ao
leitor que pode ainda apreciar as gravuras do artista chileno consultando, pela
Internet, o site André Breton da Bibliothèque Jacques Doucet, de Paris.
39. Lafcadio Hearn
(Grécia, 1850-Tóquio, 1904), escritor de origem irlandesa (pelo pai) e grega
(pela mãe). Lafcadio, antes de viajar para o Japão, onde se fixa adotando o
nome de Yakumo Koizumi, passou pelas Antilhas, recolhendo contos orais.
40. Volume de poemas publicado, em 1960, por Seuil. No ano seguinte, 1961, Césaire retoma e funde dois volumes anteriores, sob o título geral de Cadastre.
LILIAN PESTRE DE ALMEIDA | Romanista de formação, ensaísta e tradutora, publica em francês e/ou português sobre literaturas francófonas, literatura comparada, iconografia e iconologia. O nº 115 da Agulha Revista de Cultura, de julho de 2018, publicou uma edição especial sobre o seu trabalho, sob o titulo “Entre o Mediterrâneo e as Caraíbas”. Últimas publicações: Vampire liminaire: de Lautréamont aux Césaire. Königshausen & Neumann, 2019, e os posfácios às traduções de Suzanne Césaire: Escritos de Dissidência (Papéis selvagens, 2021) e Sony Labou Tansi. O ato de respirar (Cultura e Barbárie, 2021).
FLORIANO MARTINS | Poeta, editor, ensaísta, artista plástico e tradutor. Criou em 1999 a Agulha Revista de Cultura. Curador dos projetos Atlas Lírico da América Hispânica, da revista Acrobata, e Conexão Hispânica, da Agulha Revista de Cultura. Realizou inúmeras capas de livros. Curador da Bienal Internacional do Livro do Ceará (Brasil, 2008), e membro do júri do Prêmio Casa das Américas (Cuba, 2009), Concurso Nacional de Poesia (Venezuela, 2010) e Prêmio Anual da Fundação Biblioteca Nacional (Brasil, 2015). Professor convidado da Universidade de Cincinnati (Ohio, Estados Unidos, 2010). Tradutor de livros de César Moro, Federico García Lorca, Guillermo Cabrera Infante, Vicente Huidobro, Hans Arp, Alfonso Peña, Juan Calzadilla, Enrique Molina, Jorge Luis Borges, Aldo Pellegrini e Pablo Antonio Cuadra. Entre seus livros mais recentes se destacam Antes que a árvore se feche (poesia completa, Brasil, 2020), 120 noites de Eros - Mulheres surrealistas (ensaio, Brasil, 2020), Naufrágios do tempo (novela, com Berta Lucía Estrada, 2020), Las mujeres desaparecidas (poesia, Venezuela, 2021), e Un día fui Aurora Leonardos (poesia, Ecuador, 2022).
Agulha Revista de Cultura
Série SURREALISMO SURREALISTAS # 09
Número 208 | maio de 2022
Artista convidado: Floriano Martins (Brasil, 1957)
editor geral | FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
editor assistente | MÁRCIO SIMÕES | mxsimoes@hotmail.com
concepção editorial, logo, design, revisão de textos & difusão | FLORIANO MARTINS
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