Formada essencialmente de músculo esquelético com arquitetura tri-direcional que permite sua mobilidade
para todos os lados, a língua encontra-se ligada ao crânio através dos músculos extrínsecos, enquanto os músculos
intrínsecos, que formam a própria língua, respondem pelo movimento e pelas alterações
de forma da língua durante a mastigação e deglutição.
Coberto de 200 a 450 000 células de degustação, esse órgão maravilhoso distingue
em cooperação com o olfato e através da recombinação quase ilimitada de qualidades
e intensidades de sabor – do doce, do azedo, do salgado, do unami, da gordura, de
nuances metálicas, alcalinas e aquáticas – uma infinitude de percepções degustatórias,
dando assim sabor ao mundo.
Gatos e cachorros e com eles a maioria dos mamíferos, por mais que não saibam
falar nem português nem alemão, possuem conhecimento íntimo das delícias conferidas
pela língua materna no processo de sua higiene corporal. O próprio animal humano
sabe, cada exemplar à sua maneira, dos efeitos singulares do toque da língua. Nosso
mais sensível órgão de tato desperta – na prática dos beijos na boca ou em outras
áreas corporais, dignificados por denominação científica como cunilingus e anilingus
– a ativação cerebral, derramando, via hipófise, uma enxurrada hormonal na circulação
sanguínea.
A adrenalina liberada pelos rins enfurece o corpo, a respiração acelera, vagina
e pênis incham e umedecem, atestando o papel primordial da língua não somente no
processamento alimentício, mas também no prazer erótico e na procriação. Além de
suas incontestáveis e multifacetadas capacidades no tato, na alimentação, na interação
afetiva e sexual e, mais recentemente, como veículo da percepção espacial de cegos,
a língua possui, não por acaso, uma localização extraordinária: bem na boca, como
se sabe, evidenciando mais uma vez sua conexão particular com o mundo dos orifícios.
A língua está situada na zona liminar entre dois domínios, a saber: a caverna
abissal e invisível que preenche o interior de nosso corpo e a exterioridade infinita
e somente parcialmente visível do mundo ao nosso redor. De certa forma, a língua
divide com o olho essa tarefa de intermediação entre essas duas esferas. Sua localização
bucal, lhe confere o status de uma instância reguladora que experimenta, prova,
aceita ou rejeita, encarregada do metabolismo material e informacional entre o corpo
e o mundo.
Apesar e sua presença inegável, a língua sofre certo tabu. Sua exposição está condicionada a circunstâncias
específicas, nem sempre públicas. Mostrar a língua remove a máscara social, revela
a visceralidade e o informe. O rosto estoico, apolíneo e identificável se transfigura
em careta, signo do ridículo, da idiotice, da feiúra, da volúpia. Exposta, a língua
oscila entre a cumplicidade do humor anárquico – basta lembrar a cara icônica de
Einstein com a língua de fora, tirando sarro e subvertendo o demasiado sério e a
híbris racional – e o terror das carrancas selvagens que repelem a entrada dos impuros
nas entradas de templos e igrejas do mundo inteiro, e até mesmo nas residências
burguesas particulares sob o lema “Cão bravo”. Feições ferozes expondo a língua
evocam espanto, identificando a língua física à língua mitológica através da metáfora
da chama e do fogo, com seu poder ilimitado de criação e de destruição.
É sedutor especular sobre eventuais afinidades entre palavras como língua
e linga (que denota o falo) – ambas associadas ao poder de criação
e do conhecimento ou sobre a relação dos termos fala e falo, equiparando a expulsão da palavra à ejaculação do sêmen,
aludindo à idéia talvez demasiado masculina de que tanto a língua quanto o
linga sejam órgãos de copula não somente interpessoais mas com o mundo. Conhecemos ainda a duplicidade do verbo comer
que demonstra o quanto as línguas latinas preservaram um agudo sentido fisiológico
da palavra. Mais adiante, veremos que a compreensão das linguagens de uma cultura
e de seus efeitos sobre o corpo é indissociável do entendimento de sua gênese corporal-ambiental.
De todo modo, já notamos que o órgão da língua exerce funções não somente motores
em processos de comunicação, [1] a própria língua também é leitora, por exemplo, de uma linguagem de sabores e integra em sua mobilidade
diversos sistemas corporais e de signos linguísticos.
Vale lembrar que a língua portuguesa diferencia entre
língua e linguagem. O termo língua refere-se principalmente aos idiomas,
ou seja, às línguas maternas com suas respectivas palavras, expressões bem como
suas estruturas e regras gramaticais. [2] Linguagens são sistemas de signos corporalmente perceptíveis
em forma de gestos, sinais, sons, símbolos, palavras etc. para transmitir idéias,
significados e pensamentos.
A linguagem verbal, falada ou escrita, é organizada
de forma hierárquica e composta por fonemas, morfemas, palavras e frases. Opera
por vias acústicas, visual-espaciais e de toque, e tornou-se, ao lado dos modos
não-verbais de interação, a forma de comunicação mais exitosa. [3] Entre muitas outras
tentativas, foi definida como sistema de signos, como instrumento da ação comunicacional,
órgão biológico ou como mídia de formação de pensamentos. Similar a qualquer outra
mídia é caracterizada por potencialidades e limitações. Entre as virtudes da linguagem
encontram-se sua codificabilidade, a possibilidade de armazenamento e de transmissibilidade
através do espaço e do tempo e suas múltiplas funções, a saber: a função emotiva
ou expressiva, a apelativa e imperativa, a metalingüística, a informativa, referencial
e representativa, a fática e a função poética.
A diversidade desse conjunto funcional sublinha que a linguagem não se restringe
à mera transmissão de informações racionais, mas que uma de suas mais importantes dimensões é a diferenciada interação afetiva. Isso aponta para
a ideia de que língua e linguagem não sejam somente instrumentos de veiculação de representações
pré-existentes a favor de finalidades futuras, reduzindo a interação a uma dimensão
instrumental, mas que os processos de interação lingüística constituem campos atuais
de vivência em direito próprio.
No início o verbo
A questão da representação do mundo e do conhecimento por meio da língua e da
linguagem ocupa as cabeças pensantes desde os tempos bíblicos: “No início era o
verbo, e o verbo estava com Deus, e Deus era o verbo” afirma João na abertura de
seu Evangelho revelando sua versão do platonismo cristão. Palavra e Deus são idênticos.
O orador – Cristo – encarna o corpo-palavra de cada dia e compartilha-o com seus
apóstolos que, no ato da incorporação da palavra, vivenciam um eterno regresso mnemotécnico
de volta à divina verdade inicial.
Essa teoria de conhecimento já encontra expressão no mito da linguagem paradisíaca.
Adão, ainda no paraíso, dizia palavras que expressavam a própria essência das coisas.
Sua expulsão corresponde, neste sentido, a um exílio do reino das idéias e do jardim da verdade revelada.
O contra-modelo desta pureza idealista do Éden, até hoje presente em concepções
e propostas de linguagens universais, transmissoras de uma verdade unívoca, foi
a escandalosa orgia lingüística de Babel. Mas tanto na verdade monogâmica de Adão, quanto nas verdades promiscuas babilônicas, língua e linguagem são
caracterizadas por potência criadora.
Numa determinada vertente de pensadores alemães, influenciados pela
filosofia transcendental de Immanuel Kant (1724 a 1804), a necessidade de formas
apriorísticas da percepção como condições da possibilidade da experiência e do conhecimento,
foi reformulada. As concepções desenvolvidas por Herder, Haman e Humboldt, posteriormente
chamadas por Apel [4] de Teoria de
linguagem transcendental-hermenêutica, supõem que experiência somente seja possível
em função da existência apriori da linguagem.
O erudito, estadista e co-fundador da universidade de Berlim, Wilhelm von Humboldt
(1767 a 1835) argumentava que a linguagem – dotada de dimensões estéticas e racionais
e ao diferenciar entre o sujeito da cognição e seu ambiente – constituía realidade
e que nossa visão de mundo é fundada na linguagem: cada linguagem cria um mundo
específico.
Dessa premissa podemos deduzir que o desenvolvimento e o aprendizado de línguas
e linguagens permitem a geração e o conhecimento de outros, novos mundos, sendo
que a própria transformação de uma língua ou linguagem implica a transformação de
mundos por elas constituídos. Por outro lado, a concepção de Humboldt leva à conclusão
que a extinção de uma língua – cada uma em estreita conexão com sua cultura – elimina
também uma visão de mundo. Com cada dialeto que deixa de ser falado desaparece uma
variação de uma concepção de vida.
De acordo com a Sociedade de Línguas Ameaçadas, estima-se que 50% das
6500 línguas atualmente existentes estarão sujeitas à extinção ao longo dos próximos
100 anos. A preservação e expansão de uma língua é atribuível à potência numérica
e econômica de seus falantes e à coesão interna e à capacidade de resistência externa
desse grupo. Dentro da lógica de Humboldt, o avanço e predomínio globais de determinadas
línguas vem acompanhado por um linguicídio em escala planetária, ou seja,
pela morte de milhares de perspectivas de mundos possíveis.
A linguagem concebida por Humboldt, não como descobridora de verdades pré-existentes,
mas como criadora de realidade, enfatiza o valor produtivo da diversidade cultural
e do papel gerador da subjetividade. Essa apreciação positiva da potência criadora
da linguagem foi posteriormente contrastada por diversas abordagens.
O filósofo Friedrich Nietzsche (1844 a 1900) abriu novas perspectivas à reflexão
crítica da linguagem ao dizer que a linguagem se destinava originalmente à auto-preservação
e à sobrevivência. A palavra, de início, não passava de um estímulo nervoso em forma
de sons, e em seu desenvolvimento lingüístico servia no rebanho humano à evitação
de conflitos e à criação de consenso. Sofrendo um processo de amnésia irreversível
e confiando cegamente na metaforicidade da palavra e no valor da razão, os seres
humanos se esqueceram desta origem e finalidade da linguagem, destinada a favor
da vida. No lugar disso, chegaram erroneamente à idéia de que linguagem servia à
descoberta da verdade. De acordo com Nietzsche, essa falsa crença se tornou uma
das maiores forças de dominação no processo civilizatório.
Para Nietzsche, a existência da verdade, das essências, substâncias, identidades,
ordens, das coisas e classes de coisas com suas qualidades, das finalidades, dos
conceitos morais, de leis como o da causalidade ou do Eu como causa do pensamento
não passam de ficção. Tomar esses conceitos como reais, deve-se ao engano de supor que a estrutura da linguagem esteja espelhando
a realidade: a ordem gramatical sugere uma ordem de mundo.
Através da idéia da identidade que estabelece uma ilha imutável no eterno fluxo
do devir, a caótica diversidade fenomenal do mundo é simplificada e ordenada. A
linguagem, ao denominar e mediar, torna tudo mediano; generaliza e vulgariza a singularidade
de cada evento da natureza, inclusive o próprio falante que denomina as coisas.
A natureza parece dominada sob a força sepulcral dos conceitos.
Porém, segundo Nietzsche, tudo isso não passa de ilusão, auto-engano. O mundo
petrificou na linguagem, entorpeceu. No verbo, o fluxo vital secou, atomizado como
fato. Mas linguagem não espelha fatos, fatos não existem. O que existe, diz Nietzsche,
são interpretações. Por outro lado, a análise linguistica não levou o autor do Zaratustra a um silêncio resignado. No lugar de um sujeito reativo e calado,
Nietzsche imaginou uma forma revolucionada de ser humano. Uma maneira cantante,
intuitiva, criativa e subversiva de ser. Um ser humano desconstrutor e reinventor
de uma linguagem ressecada em sua ossatura gramatical pelo uso poético da palavra.
Fritz Mauthner (1849 a 1923), escritor, filósofo e contemporâneo de Nietzsche, rejeitava
a possibilidade do uso adequado ou verdadeiro da linguagem, discutido posteriormente
por Wittgenstein em seu Tractatus logico-philosophicus. [5] Mauthner afirmava a origem social e até
mesmo “socialista” da linguagem, o que, aos seus olhos, assegurava à linguagem uma proximidade com a fofoca, o blablabla.
Linguagem, diz Mauthner, é uso de linguagem. Ela não existe por si mesma, mas
somente em suas atualizações concretas. Enquanto modo de ação, integra a realidade,
mas ela não possibilita o conhecimento do mundo e muito menos leva à comunicação
e ao entendimento mútuo. Pelo contrário, a linguagem isola e aprisiona o ser
humano pois não é o falante que faz uso da linguagem, é a linguagem
que domina o falante através de seus elementos, suas estruturas e regras. O próprio
Eu é ficção de linguagem e o reconhecimento desta ficção leva ao naufrágio de todos
os modelos de conhecimento baseados em relações entre sujeito e objeto. A crítica
mauthneriana não visa à reforma ou melhoria da linguagem, mas propõe o seu suicídio.
Como a linguagem perdeu sua função primordial da compreensão, deve-se aprender a
ficar calado.
Com raras exceções, entre as quais a expansão dos escritos de Antonin Artaud
em direção à glossolalia, a crítica dos limites da linguagem não se desloca para
um plano de articulação extralinguístico. Por outro lado, uma crítica que respeita
a lógica de regras linguísticas incorre inevitavelmente numa auto-contradição quando
afirma que não existem verdades mas somente interpretações. Sob este aspecto, Nietzsche elucida melhor sua posição
quando sublinha o caráter perspectivista da verdade, isto é, ao dizer que proposições
não expressam verdades absolutas mas dizem respeito a um conhecimento referente
a uma relação corpo-meio ambiente específica.
A partir de disposições psicológicas e filosóficas distintas, a palavra poética
de Nietzsche e o ceticismo silencioso de Mauthner encontram-se equidistantes do
ingénuo uso quotidiano da linguagem. Aprender e utilizar línguas ou linguagens pressupõe confiança pragmática nas possibilidades de intercâmbio com outros falantes desta língua e em suas potencialidades de participação e interferência em outros mundos.
Naturalmente, os usuários comuns da linguagem estão mais interessados nas possibilidades por ela oferecidas do que em suas limitações. Por outro
lado, críticas de linguagem como de Nietzsche e outros autores merecem a atenção
e o respeito dos usuários da linguagem cotidiana justamente em função sua abordagem
propositiva. Trata-se de exploradores apaixonados das fronteiras do dizível que
contribuem para sua ampliação e redefinição.
Linguagem e corpo
Cada língua está caraterizada não somente por estruturas gramaticais e dinâmicas
idiomáticas, mas é também impregnada por tradições culturais, narrativas coletivas
e individuais e práticas afetivas. Ao absorver uma língua ou uma linguagem, estas se tornam
parte de nosso corpo e modulam nossas maneiras de percepção, experiência e interação
com o mundo. Corpo e linguagem são inseparáveis. Antes mesmo de chegarmos a participar
plenamente dos jogos de linguagem de nossas culturas, a língua materna nos lambe
da cabeça aos pés, ressoa em nossos corpos com seus estímulos sonoros, suas entonações,
e desperta nosso jogo de cintura com sua batida e sua jinga locais.
O ambiente geográfico-cultural rodeia nossos corpos e os invade e contagia por
todos os poros e orifícios com sua atmosfera saturada de cheiros, sabores, toques
e sons mas também de premissas epistémicas, éticas e económicas inseridas em determinadas
partituras e dramaturgias socioculturais e cultivadas por nossos contemporaneos
e ancestrais. Inicialmente, paisagem, povo, cultura e linguagem se
apropriam do corpo como ambientes sensoriais percebidos de modo pré-racional como
lugares e populações de pertencimento que tendem a modelar as emoções e os pensamentos
do corpo e a preparar nossos julgamentos e atos futuros. Só gradualmente são vistos
como sistemas de signos racionalmente legíveis, passíveis de crítica e transformação.
Frequentemente, à medida que a língua e a cultura se estabelecem, desenvolvem
uma actividade parasitária sistémica nos seus hospedeiros. A permeabilidade, a porosidade, a fluidez e a flexibilidade
iniciais dos corpos gradualmente dão lugar ao entopimento e à rigidez, chegando
por vezes à rejeição completa e totalitária de qualquer estímulo desconhecido, ou
seja, à negação das condições originais de génese da sua preciosa identidade: o
fora e a alteridade.
Quanta diferença um corpo aguenta? Em nome da preservação da sua identidade,
cultura e tradições, bem como dos seus valores e verdades, o corpo torna-se refém
das ordens e técnicas que o organizam e das quais tanto se orgulha. Repetição sistêmica, reforço dessas ordens. Os mesmos estímulos, as mesmas reações na tentativa
de instrumentalizar o mundo circundante em uma extensão de si.
Cultura como re-configuração do corpo-linguagem
O encontro com os outros e com diferentes paisagens, culturas e linguagens expõe
o corpo não somente a novas informações, narrativas alternativas e artefatos distintos
mas, sobretudo, o afeta de modo sensorial: estímulos estranhos despertam sensações
inéditas, ouvir e intonar a lingua estrangeira remodula a sensualidade e cognição
e à medida em que o corpo aceita a interação com o ambiente desconhecido ele se
reconfigura e diversifica, ingressando em um processo de flutuação identitária e
de mestiçagem cultural. Emerge um outro Eu.
Vivenciar a diversidade não somente altera a visão de nossa cultura de origem
e do mundo multiplicando nossas perspectivas mas ao transformar nosso corpo modifica
também os modos de expressão de nossas tradições. Dessa maneira, possibilita um
retorno ao sentido originário do conceito de cultura, entendida como processo de
transformação ativo. [6] Esse retorno
se mostra particularmente relevante sob condições sócio-políticas em que as conquistas
culturais do passado viraram um fardo e freio, uma segunda natureza morta. A identidade cultural como um processo dinâmico implica
um [re]conhecimento das tradições, porém, principalmente, não em termos de práticas
socioculturais de conservação, mas sim como uma interação afirmativa e crítico-criativa
com o passado e o presente através da invenção de novas formas de vida.
NOTAS
1. Desde já seja apenas recordado que a língua - que
ocupa uma função elementar nos processos de articulação e modulação - enquanto fala
e meio interpessoal de expressão e comunicação, depende na transmissão de sensação
e sentido fundamentalmente da interação da respiração, da dicção e da voz, isto
é de suas bases fisiológico-funcionais.
2. O termo língua natural distingue línguas faladas por seres humanos de linguagens formais (linguagens lógicas, matemáticas e de computação).
3. É estudada pelas mais diversas disciplinas como a lingüística, a análise
de conversação, pragmática, a teoria dos
actos de discurso, a retórica, as ciências de literatura, a etimologia
e a filosofia da linguagem, entre outras.
4. Karl-Otto Apel (* 1922 ) é filósofo alemão
e representante, ao lado de Habermas, da “ética discursiva” e de uma filosofia transcendental
intersubjetiva e fundada num pragmatismo da linguagem.
5. Uma das metas do Tractatus lógico-philosphicus
de Ludwig Wittgenstein é a distinção entre o uso e não-apropriado de linguagem. Wittgenstein via a tarefa da filosofia
na delimitação do território do dizível a partir de critérios lógicos. Do ponto
de vista lógico, não se pode dizer nada a respeito do indizível, sem incorrer em
tautologias. Já a filosofia tardia Wittgenstein sustenta que a observação dos modos de uso dos
jogos de linguagem no cotidiano evidencia seu uso adequado. Apesar de sua inquietude com relação ao indizível, o pensamento de Wittgenstein aponta para
uma avaliação positiva da potência e validade da linguagem como elemento indissociável
da práxis social e de modos de vida específicos.
6. Acerca da noção de cultura aqui referida, veja “Was ist Kultur?” (O que é cultura?),
artigo do filósofo
social Oskar Negt.
WOLFGANG PANNEK (Alemanha, 1964). Alemão radicado no Brasil desde 1992. Diretor teatral, produtor cultural, cineasta, ator, autor e tradutor. M.A. (filosofia, letras e psicologia) pela FernUniversität Hagen (Alemanha). Doutorando em filosofia na Academia de Artes de Leipzig. Ao lado de Maura Baiocchi, é diretor da Taanteatro Companhia (São Paulo) e co-autor e organizador de sete livros, publicados entre 2007 e 2022, sobre o taanteatro ou teatro coreográfico de tensões. Em 2021, publicou o livro Bilder der Macht. Das ikonoklastische Denken Gilles Deleuzes (Imagens do poder. O pensamento iconoclasta de Gilles Deleuze), Transcultura, SP, 2021. Publicou artigos em revistas acadêmicas e culturais no Brasil, na Argentina e na Alemanha. Concebeu e dirigiu espetáculos de autoria própria e a partir da obra e vida de autores como Tabori, Beckett, Pessoa, Nietzsche, Artaud, Deleuze e Guattari, entre os quais a trilogia cARTAUDgrafia e 1001 Platôs. Produziu e organizou múltiplos eventos internacionais em torno de Antonin Artaud e Gilles Deleuze. Em 2020, dirigiu o projeto cinematográfico Antonin Artaud’s The Theater and the Plague. Em 2021, dirigiu junto com Maura Baiocchi o filme APOKÁLYPSIS. Desde 2021, é diretor de produção do Festival Internacional de Ecoperformance.
JAROSLAV ŠERÝCH (República Tcheca, 1928-2014). Estudou na Escola Superior da Indústria da Arte em Jablonec nad Nisou, na Escola de Artes Aplicadas de Turnov e na Academia de Belas Artes de Praga. Dedicou-se à gráfica livre, pintura, mosaicos, criação de livros, ilustrações, bibliofilia e também criou placas de cobre em relevo. Na década de 1960, ele aderiu à abstração expressiva. Logo que a deixou, voltou a acreditar na nitidez da forma e do enredo da obra. Trabalha atualmente com uma metáfora artística cujo ponto de partida reside em uma ampla gama de imagens firmemente apoiadas na liberdade criativa. Em seus desenhos, pinturas e obra gráfica, compõe imagens simbólicas baseadas nos princípios da ética cristã, cuja ideia é a superfície combinada da humildade humana, da empatia e da crença na persistência da esperança. Do ponto de vista do método criativo, é a soma da linha sensível do desenho, da morfologia dinâmica e da cor enfatizada. As obras apresentam uma estilização figurativa descontraída, de forma alongada, e possuem uma estrutura visual distinta.
Agulha Revista de Cultura
Número 251 | maio de 2024
Artista convidado: Jaroslav Šerých (República Tcheca, 1928-2014)
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