Depois das reflexões críticas de T. S. Eliot (1989)
e Octavio Paz (1984) acerca da permanência do discurso da tradição na
modernidade, ao lado do discurso da ruptura, não será necessário justificar o
fato de que este trabalho adota uma perspectiva de história não no sentido de
uma evolução linear em direção a um futuro, mas numa concepção em que os
caminhos do progresso, além de serem plurais não abdicam de uma permanência de
aspectos do passado, especialmente de algumas das principais propostas
simbolistas. Como salienta António Ramos Rosa, “O poema é a sua própria ficção
e desse modo supera as antinomias real-irreal, memória-presente, criação-expressão”
(1988).
Esta digressão inicial é importante para enfatizar
que a nossa proposta de analisar os reflexos das iluminações poéticas de Arthur
Rimbaud, na obra de Luís Miguel Nava, não se apoia em qualquer ideia de
influência. Não se parte da ideia de que um autor do passado tenha influenciado
um escritor que veio depois dele. Nosso ponto de partida é outro. Pensamos que
Rimbaud ainda está vivo e constatamos sua contemporaneidade ao verificar que
sua obra constitui um paradigma pelo qual se entende não somente a modernidade,
mas seus inúmeros desdobramentos. Nosso principal fundamento é a própria poesia
de Luís Miguel Nava e, principalmente, os ensaios críticos, reunidos e
organizados pelo escritor em 1994, em livro de publicação póstuma.
A morte precoce e trágica de Nava, em 1995, não o
impediu de deixar um testamento, que deu origem a uma Fundação, destinada à
publicação de uma revista e à criação de um prêmio para revelações poéticas. A
impressão que nos fica da leitura dos Ensaios Reunidos é que
estamos diante de outro testamento, no qual o poeta expressa um desejo muito
bem delineado de como gostaria que sua obra fosse lida.
O livro parece configurar uma espécie de manual de
leitura, uma vez que as reflexões críticas são permeadas por verdadeiras
instruções didáticas acerca da linguagem poética e, principalmente, do papel da
leitura na construção das obras. É significativo que o livro se inicie com um
texto dedicado a Arthur Rimbaud. O próprio prefaciador, Carlos Mendes de Sousa,
especialista na obra de Nava, aponta a intencionalidade que preside ao livro,
conferindo-lhe uma natureza especular. À medida que vai propondo uma forma de
ler as obras dos autores selecionados, Nava esboça uma linhagem para si
próprio, como poeta, e traça uma espécie de roteiro para compreensão de sua
arte poética.
Fazendo eco a T. S. Eliot e Jorge Luís Borges, dois
poetas que também se dedicaram às reflexões críticas acerca da poesia moderna e
suas relações com a tradição, Nava começa a configurar seus precursores e contemporâneos
desde o primeiro ensaio intitulado “Algumas notas a partir dum poema de
Rimbaud”, como se quisesse definir o que entende por modernidade e, ao mesmo
tempo, apontar seu lugar na tradição e no contexto da poesia moderna:
De Rimbaud pode, a meu ver, dizer-se que, melhor do
que qualquer outro escritor contemporâneo seu ou posterior, nos ensinou a ler,
por tal se traduzindo o que hoje designamos por modernidade. […] Procedendo, com efeito, à
reabilitação da componente sensual e afetiva da noção de sentido, em detrimento
da que, meramente intelectiva, as atrofiara até então, a obra de Rimbaud não só
nos alterou a percepção das que antes dele existiam já como, voltada para o
século XX, tem até hoje obrigado a medir-se por ela quem por idêntico domínio
tenha vindo a aventurar-se. (NAVA, 2004)
A apresentação do poeta francês é feita
inicialmente por meio de uma síntese das análises realizadas por Tzvetan
Todorov (1978 e 1980) acerca das estratégias de composição mobilizadas por
Rimbaud. Enfatizando o caráter apresentativo [1]da linguagem poética de
Rimbaud, Todorov afirma que a principal contribuição do poeta francês à lírica
moderna foi a descoberta de uma “linguagem no seu (des)funcionamento autônomo,
liberta das suas obrigações expressiva e representativa” (apud NAVA,
2004). Desse modo, Todorov conclui que a obra do simbolista francês exige uma
nova forma de leitura, que só poderia ser efetuada por um tipo de leitor que
não mais se preocupasse em buscar um sentido específico para o texto: “Querer
descobrir o que eles [os poemas] querem dizer é despojá-los da sua mensagem
essencial, que é precisamente a afirmação de uma impossibilidade de identificar
o referente e de compreender o sentido; que é maneira e não matéria – maneira
feita matéria (NAVA, 2004).
Nava não discorda de Todorov em nenhuma das
proposições contidas em seus pressupostos, além de acatar plenamente as
análises empreendidas pelo crítico acerca da linguagem de Rimbaud, reconhecendo
a importância dos procedimentos descritos. referentes às Iluminações, mas
se opõe à conclusão formulada pelo teórico russo, reavaliando as contribuições
do poeta francês para a poesia do século XX. Embora, como tenha assinalado
Todorov, Nava também concorda que a poesia de Rimbaud realmente tenha rompido
com qualquer ideia de representação, não sendo possível encontrar nenhum
sentido relativo a uma realidade anterior à criação dos poemas, o poeta é
crítico português expande o raciocínio enfatizando a relevância do ato de
leitura, que possibilita encontrar sentidos sempre novos.
Para Nava, Rimbaud inaugura um tipo de obra
literária que se tornou o principal paradigma da poesia moderna. Trata-se de
uma arte que visa à criação de uma realidade inteiramente outra, que apresenta
um mundo completamente desconhecido, cuja principal característica consiste no
fato de falar sempre da iminência de uma revelação que não se realiza. Diz
Nava: “Essa noção de que a especificidade do texto radica no fato de abrir
sobre inescrutáveis subterrâneos foi […] Rimbaud quem no-la impôs. Tal a
Feiticeira referida em ‘Après de déluge’ […], Rimbaud mantém-nos no
limiar dum modo misterioso, mágico, secreto” (NAVA, 2004).
Tal como Todorov, portanto, Nava também considera
que o rompimento com a função representativa da linguagem foi a principal
contribuição do poeta francês para a poesia moderna, lembrando que tal
contribuição precedeu uma das principais descobertas dos estudos linguísticos,
no século XX, segundo a qual “o objeto não existe senão enquanto efeito do
discurso” (NAVA, 2004). Mais do que isso, ao criar um texto que “semantiza a
fonologia, a rima, as consonâncias das palavras”, Rimbaud também contribuiu
para a compreensão de que “cada obra engendra a postura adequada à sua
percepção” (Id., Ibid.).
Em outras palavras, a obra de arte só se concretiza
efetivamente quando um leitor se debruça sobre os efeitos do discurso, em busca
de sentidos. Focando sua atenção no papel da recepção e não no intrincado do
texto, Nava formula sua recusa à conclusão de Todorov de que o leitor não
deveria buscar nenhum sentido nos textos de Rimbaud. Parece-lhe que uma
conclusão tão radical acaba por bloquear qualquer abordagem acerca das Iluminações. Partindo
de um pressuposto alternativo, de que literatura é um efeito da leitura, Nava
parece incentivar o leitor a rejeitar as teorias e os métodos críticos e buscar
a sua compreensão, pessoal e afetiva, da obra de Rimbaud, a partir de um
contato direto com os textos e da sua própria sensibilidade.
Como se quisesse exemplificar o procedimento
sugerido, ele próprio desenvolve, neste primeiro ensaio, sua leitura pessoal
das Iluminações. Partindo-se do princípio de que o poeta se
faz “vidente”, de acordo com as lições de Rimbaud, a partir de um
“desregramento” de “todos os sentidos” (VICENTE, 2010), nada mais natural que
este leitor especial do poeta francês, que é Luís Miguel Nava, principie sua
leitura por meio de uma reflexão acerca da palavra “sentido”:
na origem do sentido se entrelaçam noções de
natureza afetiva e sensorial do que ainda hoje a língua nos dá conta através de
certas homonímias. Sentido será, nesta perspectiva, tudo o que nós
percepcionamos, quer por via intelectual, quer através da pele ou através do
coração. É a meu ver, pelo que estes dois últimos metonímica e metaforicamente
recobrem que se afere a qualidade literária. (NAVA, 2004)
Desse modo, Nava se contrapõe a Todorov por meio de
uma expansão dos significados do termo “sentido”, o que aumenta as
potencialidades de compreensão dos múltiplos níveis de sentido que podem se
abrir para o leitor no contato direto com o objeto artístico. Para exemplificar
sua proposta de leitura, Nava analisa o poema “Depois do Dilúvio”. Seu método
configura uma leitura que vai seguindo as múltiplas associações desencadeadas
por todos os elementos que compõem o texto e que afetam as suas percepções
sensoriais, para além de qualquer lógica ou ordem racional, embora estas também
não sejam excluídas. Começa destacando a importância da posição inicial do
poema, na abertura do livro, e mostra que esta posição, associada com a
referência às Sagradas Escrituras, ressalta o papel matricial da água. Segundo
ele, esta referência temporal cria a atmosfera de um mundo misterioso e mágico,
que deverá surgir após o dilúvio. Aponta as inúmeras referências literárias que
criam intertextualidades significativas, a intenção satírica que transparece no
fato de a oração ser feita por uma lebre e ressalta a grande quantidade de
notações espaciais, bem como a presença de personagens e subjetividades humanas
convivendo com animais. Durante toda a análise enfatiza-se a relevância das
imagens e das relações entre elas na elaboração do texto, para a criação de um
mundo que se caracteriza inteiramente pela indeterminação, no qual são abolidas
todas as fronteiras, inclusive entre a ficção e a realidade. Por fim, Nava
ressalta que a ideia de violência, que subjaz a uma desordem de tal tamanho e
que se manifesta nas alusões aos matadouros e açougues.
Ao longo dos ensaios, Nava volta repetidas vezes a
Rimbaud, expandindo para todo o livro as reflexões iniciadas no texto de
abertura, que sugerem um modo de leitura fundamentado numa forma de olhar o
texto e de buscar os sentidos diante de uma obra constituída a partir dos
reflexos da poética de Rimbaud. Didaticamente, o crítico e professor Miguel
Nava vai expondo seu “método” de leitura e análise ao mesmo tempo que reflete
acerca de suas concepções em torno do processo de criação e da recepção da obra
literária.
Um dos principais objetivos do segundo ensaio,
“Gide e a Perpétua Novidade”, no qual Nava analisa o livro Les
nourritures terrestres (GIDE, 1980), é rejeitar a ideia de
objeto artístico como veículo de ideias, emoções ou qualquer outra coisa, para
conceituá-lo como uma realidade da qual o leitor também participa, tanto com
seu corpo quanto com “sua alma e seus nervos”. “É como se o importante em arte
fosse precisamente aquilo que não pode prescindir de quem o apreende”, conclui
Nava (2004). Esta frase é uma espécie de mote que atravessa todos os ensaios.
Nela se assenta tanto a conceituação que Nava faz da obra de arte, quanto sua
proposta de leitura.
Para enfatizar ainda mais a relevância da leitura
no processo de criação da obra, Nava recorre a uma citação de Clarice Lispector
(1980, p. 111), que reforça não somente o papel do leitor, mas também da
percepção sensorial, que, no caso, é o paladar: “O sabor de uma fruta está no
contato da fruta com o paladar e não na fruta mesmo” (NAVA, 2004).
Outro aspecto extremamente relevante para Nava, no
livro de Gide, é a valorização que apresenta da sensação e da emoção, em
detrimento do logos, e o consequente encarecimento da natureza
sobre a cultura. Inicialmente a análise recai sobre o narrador que o tempo todo
faz alusão a uma forma de conhecimento especial, por meio do contato direto com
os objetos. Podemos inferir destas colocações que também o contato direto com
as obras, é o mais relevante para a compreensão das mesmas.
Aqui, o ensaísta retoma a reflexão feita no
primeiro ensaio acerca da palavra “sentido”, levando-nos a entender que tais
considerações constituem ferramenta essencial em seu processo de leitura.
Novamente atribui ao termo três acepções – mental, sensorial e afetiva –, aos
quais acrescenta um quarto sentido, que é o de ordem espacial, já que a palavra
também é usada para indicar uma direção. Mencionando Roland Barthes (1981), que
diz algo parecido no livro O Grão da Voz, Nava aponta certa
semelhança entre a orientação no espaço, de quem caminha numa determinada
direção à procura de algo, e a primeira acepção, que se manifesta quando alguém
procura o sentido de um texto. E conclui que o livro de André Gide valoriza
mais as acepções sensorial e afetiva do que a mental, menosprezando a quarta,
já que expressa uma verdadeira apologia à errância, à deambulação, ao nomadismo
e rejeita qualquer tentativa de se dar à sua narrativa um sentido único.
A dimensão metalinguística, uma característica da
arte moderna que se irradia também nas produções contemporâneas, é outro
aspecto valorizado por Nava na obra analisada. Trata-se de uma obra que já traz
em si sua própria teoria, o que reforça a ideia de que basta um contato direto
com a mesma, para sua compreensão.
A consequência imediata de se valorizar mais a
natureza do que a cultura, na obra de Gide, é a sua aparente desordem. Em sua
abordagem sobre os procedimentos adotados por Rimbaud no processo de criação
poética, Todorov (1978) demonstra que o poeta francês faz da ausência de
organização um princípio organizador de seus textos, em todos os níveis da
composição. Nava também analisa a desordem que se irradia pela narrativa de
Gide, interpretando que ela se deve principalmente pelo fato de que se autor
buscou lhe dar “um efeito lírico de diário íntimo” (NAVA, 2004). Apóstrofes,
exclamações, rupturas de toda espécie denotam a busca de registrar a expressão
espontânea, direta, que caracteriza esse tipo de escrita. O livro é composto
por inúmeros episódios sem qualquer outra articulação a não ser o fato de serem
presenciados ou vividos em uma viagem.
Nava interpreta a viagem como sendo uma das
figurações possíveis do modo como o sujeito se relaciona com o mundo
circundante, enfatizando também seu papel essencial na estruturação da obra. A
viagem faz ressaltar a fugacidade do contato com as coisas, uma vez que permite
configurar o permanente movimento do sujeito, dos seres e dos objetos.
A imagem da água potencializa as ideias de
movimento e de fugacidade. Gide coloca em oposição à água em movimento, a água
estagnada dos reservatórios, morta, que ele compara a uma forma de conhecimento
repudiada em sua narrativa. As fontes, recorrentes no livro, configuram os
objetos sobre os quais incide com maior violência o desejo. Por trazer uma
conotação de perpétua novidade, as fontes favorecem a figuração do instante,
que se sobrepõe à figuração de um percurso, de uma cronologia. É como se a
cadeia temporal fosse quebrada, o que enfatiza a aproximação da escrita ao
gênero lírico.
Nava classifica o método de composição de Gide, que
supervaloriza o instante, como sendo simbolista. Trata-se de uma escrita que
suprime a história a favor de uma exploração das sensações, buscando imitar a
desordem criada pelo fluxo sensorial. A valorização do instante fortalece a ideia
de presente e de presença. Por isso, a escrita de Gide é parcimoniosa no uso de
verbos, recorrendo predominantemente às enumerações, às frases nominais e aos
fragmentos sem verbos. A ausência dos verbos favorece ainda mais a apreensão do
mundo pela via sensorial, em detrimento de uma apreensão intelectual. Longe de
conotar imobilização das coisas, a ausência de verbos potencializa a captação
das coisas de modo intenso e instantâneo.
A classe dos verbos, explica Nava, “implica uma
apreensão por via intelectual”, distante dos sentidos, o que redunda numa cisão
entre o sujeito e o objeto. Explorando uma escrita que faz uso parcimonioso de
verbos, Gide privilegia a percepção sensorial, em detrimento da compreensão
racional, o que potencializa a fulguração instantânea das coisas (2004). Os
objetos sobre os quais incide o desejo brilham intensamente, como
exteriorização tanto do desejo quanto da sua satisfação, ainda que fugaz.
O sujeito é configurado como um vazio que só
alcança a plenitude momentaneamente, por meio da posse dos objetos, com os
quais se funde. A apreensão instantânea das coisas faz proliferar a imagem da
fulguração, bastante recorrente, como se o sujeito estivesse em permanente
estado dionisíaco. O tema da embriaguez percorre toda a obra e se manifesta por
meio de todos os sentidos – tato, visão, ouvido, olfato e paladar – um podendo
intensificar a percepção do outro (NAVA, 2004).
Essa busca de uma plenitude, ainda que momentânea,
também se relaciona com a poética de Rimbaud:
A poesia da plenitude representa, no contexto da
poesia rimbaudiana, a aspiração idealista a uma experiência de felicidade
absoluta que o poeta jamais abandonará. Em parte, a revolta que começa a
crescer em seu espírito nasce dos limites que a sociedade e a própria vida impõem
ao pleno desenvolvimento desse ideal. […] A vidência não deixa de ser uma forma
de revolta, uma recusa da percepção convencional da realidade e da linguagem
poética que a expressa. […] Diferentemente das gerações passadas que “tinham
descoberto apenas a significação falsa do eu”, o poeta vidente descobre sob o
“eu” empírico um “outro”, que brota das “profundezes e traz consigo forças
criativas antes insuspeitadas pelo próprio poeta. (VICENTE, 2010)
A interpretação de Nava acerca das manifestações da
subjetividade no livro de André Gide também traz fortes ressonâncias da poética
de Rimbaud. Impossível não relacionar o clima de embriaguez, que contamina toda
a estruturação da obra, com “a imagem do barco que perde as amarras” e que
“remete, no plano simbólico, à busca da liberdade, da aventura, da descoberta,
de evasão e de errância” (VICENTE, 2010), do poema mais famoso de
Rimbaud, “Le bateau ivre”. Impossível não relacionar o
paradigma da viagem que estrutura a narrativa de Gide, cuja conotação de fluidez
é potencializada pela presença recorrente das águas, configurando um mundo
instável, movente, de percepções fulgurantes, que proporcionam estados intensos
de plenitude, com a ideia de uma viagem em ritmo “alucinatório”, empreendida
pelo “barco-poeta”, de Rimbaud, que, no seu esforço por atingir “um mundo
misterioso, desconhecido”, pode significar o próprio “ato de criação poética”
(VICENTE, 2010).
Outro texto essencial para se entender a poética de
Nava, bem como seu método crítico, que refletem, ambos, as ressonâncias da
poética de Rimbaud, é o terceiro do livro, intitulado “Artaud: tric trac du
ciel”. Neste ensaio, Nava analisa mais uma vez os principais aspectos da
linguagem simbolista, herdada via Rimbaud, que mobilizam o modo de leitura
proposto por ele. Segundo Nava, o livro de poemas de Antonin Artaud, Tric
trac du ciel, confirma a sua ideia de que “todo o acto poético é uma
cosmificação”, “que se opera a partir do caos”, promovido pela “destruição da
língua”:
Não por acaso o ato poético se chama de criação e a
etimologia aproxima a poesia do fazer.
Cada vez que se serve do verbo para criar, nesse mesmo acto recriando o próprio
verbo, o homem não só confere um sentido aleatório como o que dessa maneira
cria detém um estatuto ontologicamente superior ao do que lhe subjaz: a língua. (NAVA,
2004)
na poesia e na arte moderna, o processus criador liberta-se completamente
da regulação lógica, desenrolando-se através de estruturas próprias, que se
organizam não-racionalmente em ordem a uma nova realidade que se torna, assim,
fruto mais direto e mais fiel da inicial intuição criadora. […] Assim se entra
num mundo onde o real foi destruído, onde a única realidade é a própria
linguagem. O único conceito positivo que é possível extrair da poética de
Rimbaud é o da liberdade plena da imaginação, a demiurgia absoluta. O conteúdo
de um poema já não depende do assunto ou argumento que o estruturava, mas
confunde-se com todos os acidentes sonoros e semânticos que se integram na sua
verdadeira substância. (NAVA, 2004)
A dimensão demiúrgica da poética de Rimbaud também
se relaciona com a busca de atingir o desconhecido por meio de uma reinvenção
do mundo poeticamente. Há um paralelo entre as forças do inconsciente que movem
a criação do mundo pela linguagem e as forças cósmicas da natureza que
impulsionam a permanente recriação do universo. Daí a importância de mergulhar
no caos, que precede todo ato de criação. Daí a importância dada ao corpo e à
apreensão do mundo por via sensorial, tanto na criação da obra literária quanto
na sua recepção.
Desde que se formou a tradição simbolista, primeiro
com Baudelaire, depois com Rimbaud, a poesia se faz a partir de uma estrutura
imagética. Nava enfatiza que, no caso do livro de Artaud, a mesma estrutura vai
sendo reiterada a cada poema. Didaticamente, o crítico comenta os termos
adotados, como faz ao utilizar o verbo “parecer” para indicar que a organização
dos textos “parece” se dar em torno de um “fulcro de natureza cosmogônica”
(NAVA, 2004). Nava explica que a utilização deste verbo denota, em primeiro
lugar, respeito à natureza do “objeto literário” de modo geral, que se
concretiza no plano da aparência, da ambiguidade e da multiplicidade e, em
segundo lugar, em respeito à escrita de Artaud, que poderia ser classificada na
categoria denominada por Roland Barthes como “texto escriptível”, sobre o qual
se pode dizer que:
é um presente perpétuo, no qual não se vem
inscrever nenhuma palavra “consequente” (que
fatalmente, o transformaria em passado); o texto escriptível é a mão escrevendo, antes que o jogo infinito do mundo (o
mundo como jogo) seja cruzado, cortado, interrompido, plastificado por algum
sistema singular (Ideologia, Gênero, Crítica) que venha impedir, na pluralidade
dos acessos, a abertura das redes, o infinito das linguagens. (BARTHES, 1992)
Desse modo, o ato receptivo também não pode
consistir na busca de um sentido único, Ao contrário, mergulhando no âmago do
mundo mágico e desconhecido, concebido pela imaginação criadora do artista, que
mobiliza e organiza uma multiplicidade de recursos de linguagem, suprimindo as
relações lógicas entre os elementos do discurso, entre as referências de tempo
e espaço, entre seres de natureza diferente, entre ficção e realidade, e
gerando efeitos inusitados de fragmentação, condensação, contiguidade,
paralelismo, simultaneidade, pluralidade de sentidos, indeterminações e
paradoxos, entre outros efeitos alucinatórios, o leitor precisa comungar do
mesmo desejo de se desligar de tudo aquilo que conhece como sendo a realidade,
para encontrar novos sentidos, apreensíveis não pelo raciocínio lógico, mas
pela percepção sensorial e afetiva do texto.
Nava começa a análise dos poemas de Artaud pela
abordagem dos vários espaços que neles se manifestam, esclarecendo que o
conceito de espaço é tomado por ele no sentido que lhe dá A. D. Alexandrov,
citado por Iuri Lotman (1978), no livro A estrutura do texto artístico.
Nesta acepção, espaço refere-se a um conjunto de objetos homogêneos, tais
como fenômenos, estados, funções, figuras ou significações entre as quais
existem relações semelhantes às relações espaciais, como a continuidade e a
distância, entre outras.
Nava descreve uma série de espaços, mobilizadores
de uma multiplicidade de relações entre os signos, que ora remetem à ideia de
clausura, ora se expandem para a noção de cosmos. Explora com requinte os
detalhes relativos às relações metonímicas e metafóricas que enfatizam um
emaranhado jogo de reciprocidades entre os mais variados signos, símbolos,
imagens, fonemas, ritmos, rimas, enfim, todos os elementos mobilizados na
composição dos textos e na organização do livro em foco, ressaltando, por meio
da análise de tais elementos, a destruição da “imotivação do signo”, obtida
pelo processo de criação. Nava demonstra que os textos poéticos de Artaud
confirmam que a motivação dos significantes constitui uma das principais
características da linguagem poética.
O espaço da feira, que aparece num poema, é
interpretado como a imagem do cosmos, espaço de reatualização de acontecimentos
míticos. Esta perspectiva, por sua vez, gera um excesso que, quando associado à
música de um órgão, que ecoa no mesmo poema (NAVA, 2004) possibilita a criação
de novos espaços, concorrendo para certa desorganização e o estabelecimento de
um caos.
Nava vai demonstrando como o uso do vocabulário
possibilita uma série de jogos de sentidos, que concorrem para estabelecer o
clima de indefinição e a configuração de contexto difuso. A imagem do fogo –
Nava cita A psicanálise do fogo, de Gaston Bachelard (1972) –
remete a conteúdos simbólicos e acrescenta uma conotação de violência a esta
atmosfera espacial (NAVA, 2004). Mas a imagem da água, “símbolo do caos
original” – cita Le Sacré e Le Profane, de Mircea Eliade (1965) – é
ainda mais poderosa no papel de realçar a função estruturante que a música tem
na poesia de Artaud.
Desse modo, com base na obra de Eliade, Nava
interpreta a água como símbolo da “soma universal das virtualidades”. A água
constitui a origem e o reservatório de todas as possibilidades da existência,
precedendo e fundamentando qualquer criação. Tal como ocorre no batismo ou em
outros ritos de passagem, o contato com a água implica uma regeneração ou
alguma espécie de elevação a um estado superior (NAVA, 2004). Nava explora
todas as manifestações explícitas ou implícitas nos poemas de Artaud que
sugerem conotações relacionadas ao elemento água. Todos os espaços e todos os
elementos que compõem os poemas são contaminados pela fluidez da água. A
música, por sua vez, que perpassa tudo, condensando as imagens do fogo e da
água, transforma-se numa espécie de água-ardente, cujos efeitos dominam todos
os espaços (NAVA, 2004).
A valorização do espaço, enfatizada por Nava desde
o primeiro ensaio, é uma das principais heranças da poética de Rimbaud:
[…] a força da imagem não nasce mais do símile, da
comparação, da semelhança; ela provém agora da aproximação de duas realidades
longínquas. Sua força está justamente nesse poder de estabelecer relações novas
entre elementos aparentemente incompatíveis e de romper as conformações de
espaço e tempo. A emoção que a poesia quer despertar é fruto das aproximações
inusitadas, da copresença insólita, de uma estranheza profunda, pois agora a
imaginação poética força as portas da analogia. (VICENTE, 2010)
As inúmeras relações de reciprocidade entre os
espaços que se contêm entre si, formando círculos, remetem aos espaços privilegiados
da cosmogonia, relacionados aos mitos da criação da vida.
O livro prossegue com uma série de ensaios sobre
poetas portugueses. A ordem dos textos parece refletir o desejo de rastrear os
autores que foram importantes para a configuração de uma lírica moderna em
Portugal, desde os seus principais fundadores, Cesário Verde e Camilo Pessanha,
passando pelos modernistas, especialmente Fernando Pessoa e Mário de
Sá-Carneiro. Além do desejo de elencar poetas que colaboraram para o
desenvolvimento de uma poética moderna, percebe-se que Nava mantém uma relação
afetiva singular com os poetas selecionados, ficando clara sua intenção de
configurar um contexto no qual possa situar sua própria obra, apontando sua
contribuição para a tradição da ruptura (PAZ, 1984) em Portugal.
Não se pode concluir, porém, que esta reunião de
ensaios tenha por única motivação apontar caminhos para a leitura da obra
poética do seu autor. Depois de perceber as inúmeras ressonâncias rimbaudianas
ao longo das leituras realizadas por Nava, é necessário voltar à sua afirmação,
no texto de abertura, de que Rimbaud foi o escritor que melhor ensinou a ler o
que hoje se entende por “modernidade” (NAVA, 2004). A leitura dos textos de
Nava pode ampliar a percepção acerca dos aspectos da poesia moderna que
continuam relevantes na contemporaneidade.
Os ensaios críticos de Nava podem ser lidos como
ampla reflexão acerca da natureza da obra poética, cujo processo de criação e
cujos significados não podem ser compreendidos fora das relações de intertextualidade
que estabelece com a tradição e com a contemporaneidade e, principalmente, fora
do processo de sua recepção. É o leitor que vai permitir a permanente
atualização possibilitando que a obra de arte se apresente sempre como
inovadora. Quanto mais o poeta incorpora o leitor em sua produção, mais
inovadora irá se apresentar sua obra, aos seus pósteros.
O rompimento com a representação de uma realidade
exterior e a proposta de criar um mundo mágico e desconhecido, fundamentado na
imaginação e no trabalho com a linguagem, fazem proliferar, na poesia moderna,
as referências metalinguísticas e o diálogo com outros textos. Este aspecto é
analisado por Nava no ensaio intitulado “Intertextualidade na Poesia Portuguesa
Contemporânea”, estrategicamente apresentado no início dos textos que abordam
poetas que se destacaram após os anos 1960, em Portugal. Nava destaca três
pólos em que se concentram as referências intertextuais encontradas nestas
obras: a poesia quinhentista, com especial relevo para Camões e Sá-de-Miranda;
a poesia dos fundadores da modernidade, Cesário Verde e Camilo Pessanha; e a
obra dos próprios contemporâneos. Nava retorna a este tema no curioso ensaio
“Algumas Coincidências”, no qual vai analisar a presença da intertextualidade
na sua própria poesia.
Na sequência, Nava organiza uma série de textos nos
quais aborda uma grande quantidade de poetas contemporâneos. De todos analisa
algumas características singulares, fazendo aflorar em muitos momentos várias
referências a diversas tópicos valorizados nos três primeiros ensaios do livro.
Não há nenhuma tentativa de apontar qualquer influência de Rimbaud nas obras
abordadas, mas em todos os textos ressurgem ressonâncias da sua poética, que se
vão misturando a outros aspectos relacionados a questões privilegiadas na
contemporaneidade. É de se notar, por exemplo, na análise das poéticas de Luiza
Neto Jorge e Herberto Helder, a ênfase dada aos diferentes modos como o corpo
se insinua na escrita destes autores, principalmente quando a isso se articulam
os inúmeros procedimentos relativos ao ritmo:
A escrita de Luiza Neto Jorge, dada a força
vulcânica que a anima […] é, assim, nestes seus livros de finais dos anos 60, o
exemplo de uma escrita sem passado, onde as palavras fulgem num momento de
explosão […]. O ritmo é sincopado, entrecortado, reduzindo-se por vezes a
sintaxe quase a meras enumerações e exclamações, e o corpo insinua-se, com as
suas pulsões, o seu desejo, os seus espasmos, nesses espaços intersticiais onde
o sentido é curto-circuitado e onde se assiste, assim, a um
“curto-amor-coito-circuito […] Dir-se-ia que as palavras, jorrando em desordem
do fundo do poço […] se organizam, não em função de quaisquer sentidos
facilmente apreensíveis, mas segundo afinidades existentes entre si, como se o
sentido, um sentido sempre à beira da vertigem, fosse comandado pelo ritmo”. (NAVA, 2004)
Outro poeta tratado com especial relevo é Herberto
Helder. Em vários ensaios Nava retorna à sua poesia, insinuando mais de uma vez
que não estão equivocados os críticos que aproximam sua própria poesia da
escrita do autor de A colher na boca (1961). Em todos os
comentários avultam as ressonâncias rimbaudianas, ao lado de características
peculiares da escrita de Herberto Helder, que fazem dele um poeta singular.
Pelas análises de Nava, sem que ele mencione isso, pode-se inferir que Helder
seja um dos principais herdeiros da poética de Rimbaud. Em sua escrita
desenvolve-se, como em nenhuma outra, aquele impulso visionário e onírico, que
resulta de uma imaginação imperiosa, completamente livre, e de um trabalho de
desestruturação de todos os sistemas ideológicos e estéticos, a partir da
libertação da linguagem de suas funções expressiva e representativa. Pode-se
dizer que Helder ativa, ao longo de sua obra poética, aquele
“(des)funcionamento autônomo” que Nava (2004) havia apontado na poesia de
Rimbaud, no primeiro ensaio. Nava nos leva a concluir que a poesia de Helder
irradia e potencializa as dissonâncias da lírica rimbaudiana:
Assiste-se, com ela, a um esvaziamento psicológico
e biográfico do eu, cujos sentimentos são homologados a forças e energias que
dele fazem uma espécie de palco onde os fluxos vitais adquirem um sentido
cósmico. O corpo passa, assim, a ser predominantemente referido de maneira
fragmentária, onde ganham especial importância não só as suas partes mais
extremas – as mãos, os dedos e a cabeça –, mas também as vísceras e os pontos através
dos quais estas se abrem ao exterior, como a boca, o ânus, a vagina ou os
poros. Verbos como gravitar, pulsar ou palpitar [grifos
do autor] dão exemplarmente conta desse movimento que o irmana ao universo. Em
estreita relação com ele, os objetos que o rodeiam adquirem um estatuto mítico
[…]. (NAVA, 2004)
Há outro poeta ao qual Nava faz menção ao longo de
vários textos e que é abordado num curto ensaio, de nome sugestivo, “O Universo
Soberano de António Ramos Rosa”. O título aponta o relevo dado a esta obra no
contexto literário lusitano. Neste texto, Nava ressalta a presença da hipálage,
uma figura extremamente valorizada na poesia moderna e que constitui um dos
princípios estruturadores da obra de Rosa:
cada um dos seus versos é uma imagem do poema, cada
poema uma imagem do livro e o livro uma imagem da obra. Cada elemento contém
virtualmente o todo e […] se abre a todos os restantes, com eles intercambiando
as respectivas qualidades e instaurando assim uma permanente circulação de
atributos, uma “corrente sonâmbula” ou uma “corrente silenciosa”. (NAVA, 2004)
Os atributos que Nava encontra na obra de António
Ramos Rosa, com base na figura da hipálage, figura de natureza sintática ou
semântica, que funciona como agente de transposição das relações naturais entre
dois elementos, também servem para caracterizar o conjunto da obra poética e
crítica de Luís Miguel Nava. Nos ensaios, cada parte relaciona-se com as demais
ao mesmo tempo que remete ao todo. Mas é o leitor que precisa encontrar estas
relações aparentemente imotivadas, no emaranhado das múltiplas referências que
se cruzam entre os diversos textos. Entre as surpresas que o livro provoca no
leitor está a descoberta dos motivos que levam Nava a inserir o último o
ensaio, “Francis Bacon”, Uma Retrospectiva”.
A primeira reação que se tem ao chegar neste texto
é o estranhamento por ser o único que aborda a pintura, enquanto todos os
demais focalizam obras literárias. A leitura do ensaio, porém, vai desnudando a
intenção de enfatizar não somente os aspectos dos quadros de Bacon que mais
fascinam o próprio Nava, como também deixam ver um paralelo implícito entre os
aspectos enfatizados nos ensaios anteriores, acerca das principais propostas da
poesia de Rimbaud, e algumas das características percebidas na pintura de
Francis Bacon. Ao mesmo tempo, o ensaísta leva o leitor a perceber como ambos,
ele e o pintor, têm afinidades entre si e como tais afinidades, por sua vez,
remetem às ressonâncias rimbaudianas que ecoaram ao longo do livro.
Nesse ponto é possível propor uma dupla leitura
para o vocábulo “retrospectiva”, que tanto remete à exposição do pintor Francis
Bacon, na Tate Gallery, que motivou as anotações que constituem o último
ensaio, quanto pode se referir à retrospectiva como sugestão feita ao leitor
para que refaça o percurso percorrido desde o primeiro texto, para entender as
motivações do autor, tanto nos ensaios, quanto em sua poética.
Ao fazer uma retrospectiva dos ensaios anteriores,
o leitor poderá se lembrar, entre tantas coisas importantes, que, no segundo
texto, sobre a narrativa poética de André Gide, Nava havia sugerido um curioso
paralelismo entre o escritor francês e o pintor Henri Matisse (1869-1954).
Segundo Nava (2004), Matisse desejava pintar diretamente sobre a alma das
pessoas, o que lhe permite apontar uma homologia entre a concepção de criação
do pintor e a de André Gide, uma vez que ambos valorizavam a “intervenção do
receptor no facto estético”. Por uma coincidência interessante, também naquele
ensaio, havia a sugestão implícita de um paralelismo entre a concepção de
criação dos dois com a de Nava. Por outra coincidência, o processo de criação
adotado pelos três, articulava, num plano hipotético, o momento da produção e o
momento da recepção, no processo de criação.
No último ensaio, Nava sugere as limitações do
texto crítico. Sente-se desconfortável diante do fato de que as anotações
apresentadas, por obedecerem mais a uma apreensão intelectual, não conseguem
traduzir as percepções apreendidas no momento do contato direto com as obras de
Bacon, na exposição da Tate Gallery. Sente-se igualmente desconfortável com a
possibilidade de que os quadros de Bacon venham a ser entendidos como “objetos”
de uma abordagem crítica. Entre os motivos alegados está justamente o fato de
que a reflexão realizada posteriormente não dá conta das percepções que
penetraram nele pela “pele”, atingindo o coração. Na verdade, devemos nos
lembrar que as percepções entraram nele pelos olhos, com os quais a pele se relaciona
metonimicamente, por uma relação de contiguidade.
Ao se deparar com esta reflexão é impossível ao
leitor não se lembrar de outro ensaio, sobre Camilo Pessanha, no qual Nava
analisa uma imagem com a qual se deparou num poema deste escritor e que suscitou
nele uma série de outras imagens semelhantes, encontradas em muitos outros
poetas, que enfatizam a noção de que o mundo se prolonga pelo interior de quem
olha para ele. Na imagem de Pessanha, o que havia de perturbador é que as
estrelas do céu continuavam refletidas no olhar de uma jovem morta o que havia
levado Nava a desenvolver, no ensaio sobre Pessanha, uma intrincada reflexão.
No ensaio sobre a pintura de Bacon também se
desenvolve uma reflexão semelhante. Num primeiro momento Nava parece se referir
ao fato de que a linguagem lógica, própria destes seus apontamentos críticos,
não dá conta de tudo o que penetrou dentro de si e de toda perplexidade que
sentiu no contato, pelo olhar, com aquele excesso de corpos esquartejados,
aquela “estranha exposição das vísceras”, sugeridas pela recorrência, na
pintura de Bacon imagem de “carne pendurada em ganchos”. Entretanto, quando se
acompanha a reflexão acerca da perplexidade que tal imagem desencadeia em seu
espírito, percebe-se que há algo a mais na motivação desta perplexidade. Diz
Nava, sobre a imagem da carne pendurada, nos quadros de Bacon:
Eu aventuraria, para começar, que através dela se
pretendeu dar a ver o que no corpo humano confina com a animalidade. O que, ao
deformar ou esquartejar os corpos, antes de mais se está a fazer é libertar a
carne de qualquer espiritualidade, privando-a do que no homem é a sua evidência
soberana: a expressão, de que o rosto é o mais óbvio ponto de incidência. (NAVA, 2004)
A cena que se vislumbra na mente do leitor, na qual
Nava olha a pintura de Bacon está repetindo, no ato da recepção, a imagem
encontrada no poema de Pessanha. As imagens da carne humana despojadas de
qualquer transcendência, no nível da materialidade absoluta, remetem a uma
poética, inaugurada por Rimbaud, que também busca a completa destruição da
linguagem como fonte de significados que transcendem o texto. Os reflexos desta
poética, que motivam o modo de leitura proposto por Nava, podem ser encontrados
também em qualquer um dos seus poemas. Tal como Rimbaud, Nava adota um processo
de criação que não prescinde do ato de leitura. Recusando as funções expressiva
e representativa, sua linguagem mobiliza uma profusão de imagens que sugerem
uma infinidade de possibilidades de sentido, por meio de associações inusitadas
entre recursos sonoros, visuais, sintáticos, morfológicos, que apresentam um
mundo inteiramente mágico, desconhecido e estranho, cujos sentidos só o leitor
poderá intuir por meio de suas percepções, à medida que olha (e ouve) o texto,
sentindo sua energia, observando seus movimentos e o emaranhado de imagens.
Se tomarmos aleatoriamente qualquer poema de Nava,
do princípio ao fim de sua obra completa, encontraremos os reflexos das
iluminações rimbaudianas, herdadas pela poesia moderna. Vejamos o sugestivo
poema, cujo título pode remeter a estas ressonâncias simbolistas:
OS ECOS
A carne que os guindastes
suspendem, minha,
rente à fosforescência
no abismo dos dias,
a mesma onde a rasura
do tempo abre interstícios
estentendo-a no mármore,
as máquinas que os astros
perfuram erguem-na às alturas
do espaço ou das colunas
de que se nutre o tempo,
noite onde os astros
escondem as raízes
ou ramo de glicínias
em dedos sufocados, carne
onde inda vibram
do extinto amor os ecos.
O sentido do vocábulo “eco”, que aflora na primeira
leitura do poema, consiste na ideia de repetição de um som seco e forte, que
martela nos ouvidos do leitor, articulando-se com as imagens estranhas e
violentas – conotação sugerida pela carne pendurada lembrando um açougue e
trazendo referências a morte e esquartejamento. As imagens se tocam, se juntam
momentaneamente, como num caleidoscópio, e se irradiam pelo texto, criando
associações inusitadas entre vocábulos de campos semânticos muito distantes e
entre todos os elementos que estruturam o poema. A imagem nuclear, que
desencadeia as dissonâncias estruturantes (ou, ao contrário, desarticuladoras)
da escrita é a da carne pendurada, cujas conotações se disseminam pela
superfície do texto, como num “mármore”. A profusão de imagens cria um clima de
caos, onde aparentemente tudo está desarticulado.
Entretanto, à medida que se entrega às percepções
que emanam destas imagens, o leitor vai percebendo as inúmeras associações, os
inusitados paralelismos, a simultaneidade que permite aflorar uma pluralidade de
sentidos. As repetidas referências a uma carne pendurada, bem como som dos ecos
que perpassam todos os níveis do poema, além de conferir uma unidade à
composição, potencializam as conotações da imagem nuclear e aguçam as
percepções sensoriais e afetivas do leitor.
Abolindo as relações lógicas entre os elementos do
discurso, o poema apresenta uma paisagem desconhecida e estranha, que não
mostra qualquer semelhança com uma paisagem real. Os ecos criam o ritmo de uma
marcha, que confere movimento à paisagem. Mergulhada na noite, a paisagem
insólita aponta para uma realidade criada por uma imaginação inteiramente
liberta. Rompendo com o princípio representativo de um referente externo e com
a expressão de um “eu” psicológico ou biográfico, o poema joga o leitor no
âmago de um universo completamente desconhecido e perturbador, no qual fulgura
a imagem da carne pendurada, que se dissemina pelo poema, da mesma forma que os
ecos, promovendo uma correspondência entre os sentidos da visão, da audição e
do tato (dedos). A ideia de “repetição”, de algo que volta insistentemente,
trazendo uma espécie de rastro de memória longínqua prolifera por todo o poema,
potencializada pela correlação entre as percepções sensoriais.
A carne remete à voz que fala no poema, que ela mesma
informa pertencer a si. Por uma relação de contiguidade a carne remete ao corpo
do enunciador. Mas este corpo, além de se apresentar fragmentado, está
desfigurado, despojado de qualquer expressão ou configuração humana. Trata-se
de um corpo esvaziado de subjetividade, sem identidade e sem vida. O corpo se
resume a um pedaço de carne, que também não está onde deveria estar, que seria
no próprio corpo, mas está pendurado, num guindaste que o eleva acima do plano
comum da existência cotidiana, esta que se realiza “no abismo dos dias”. Abismo
que apresenta rente a si uma “fosforescência”, isto é, uma luz intensa.
Depressão natural no relevo de uma paisagem, o
vocábulo “abismo” também pode ter muitos outros sentidos. Pode remeter à ideia
de altura, de verticalidade, tal como o espaço criado pelo guindaste e pelas
colunas – enfim, são as “alturas do espaço” “ou das colunas / de que se nutre o
tempo”. Só que se trata de uma verticalidade oposta, que conduz para as regiões
inferiores. Este espaço vertical une a altura dos astros às regiões
subterrâneas, evocadas por dois vocábulos, “abismo” e “raízes”. Além de conotar
o espaço das profundezas geológicas, “abismo” também pode trazer o sentido
psicológico de depressão emocional, de inferno como um estado interno, além da
referência à ideia religiosa de danação. A paisagem é configurada, portanto,
por três espaços externos – o nível terreno, onde a carne está exposta, o nível
elevado dos astros e o inferior, com breve alusão a um espaço interno. Uma
luminosidade (fosforescência) resplandece à beira do abismo, refletindo a luz
dos astros. Mas há também uma clara referência a um espaço sagrado, mítico, que
remete à consciência de um espaço amplo, de natureza cósmica. A conotação de
abismo como escuridão interior pode se relacionar à ideia de escuridão, de
noite. O poema informa, na quarta estrofe, que é noite.
A ideia de algo que está pendurado nas alturas se
repete na imagem das glicínias, plantas cujas flores cor de púrpura caem,
penduradas em cachos compridos, que enfatizam ainda mais a verticalidade. Dois
focos de luz iluminam a carne exposta, reforçando a sua posição central no
sistema de signos do poema, a dos astros e a fosforescência à beira do abismo.
Há uma contaminação dos sentidos que se espalha por
todos os elementos que compõem o poema. A disposição dos versos e dos vocábulos
na quarta estrofe também permite uma dupla leitura. Na ordem direta, como a
frase aparece no poema, são os astros que fazem papel de sujeito, escondendo
“as raízes” ou o “ramo de glicínias”, “em dedos sufocados”, ou seja, por meio
de dedos que se fecham, sufocando. Na ordem inversa, que poderia configurar um
hipérbato, são “as raízes ou ramo de glicínias” que escondem os astros, por
meio de dedos sufocantes. A ideia de inversão é potencializada pelo sintagma
“em dedos sufocados”, no qual o resultado da ação sugerida – “sufocar” – é
transformada em atributo dos dedos, “sufocados”.
Glicínias são plantas da família das leguminosas,
muito usadas para fins ornamentais, trepadeiras rústicas, que crescem apoiadas
em outras plantas. Sua principal característica são os cachos imensos de flores
pendentes, roxas ou lilases, que exalam um forte perfume semelhante à uva. De
exuberante beleza, os cachos pendentes podem chegar a 28 cm de comprimento. São
plantas muito fortes, que sobrevivem bem até no mais rigoroso inverno.
A imagem dos cachos de flor remete, pela
semelhança, à carne pendurada. As duas imagens têm vários aspectos em comum. Em
primeiro lugar elemento espacial no qual se apresenta um objeto pendurado,
conotando altura e verticalidade; em segundo lugar, pela vibrante cor escura,
arroxeada, e pelo perfume ou aroma forte que exalam. Ambas são criações
singulares da natureza. Ambas remetem à imagem de seres fragmentados (a carne é
parte do corpo da mesma forma que o cacho é parte do arbusto), despojados de
qualquer transcendência, imersos no cosmos, integrados no universo, na sua
materialidade absoluta, bela e estranha. O clima de estranhamento é reforçado
pelos contrários que se fundam: flores com carne, mundo espiritual (astros) com
material (terreno) e até com as regiões inferiores (raízes, abismo), dia
(quarto verso da primeira estrofe) e noite (primeiro verso da quarta estrofe).
Entre o pedaço de carne pendurado e as glicínias há
uma relação espacial de semelhança: os cachos de flores, que são partes da
planta, estão pendurados em altos pêndulos, da mesma forma que o pedaço de
carne está pendurado nas alturas, em guindastes. Entretanto há uma oposição
essencial, pois enquanto a planta se posiciona numa haste natural, carregada de
energia vital, o pedaço de carne está suspenso por um pêndulo artificial, numa
máquina, além de estar despojado de vida. Portanto, ambos configuram uma
oposição essencial entre vida e morte. Só que, embora despojado da energia
vital, o pedaço de carne está sendo elevado às alturas, tocando os astros, o
que remete a um espaço cósmico, que transcende a realidade terrestre.
A articulação entre estas imagens, promovendo a
fusão de sentidos contrários e estabelecendo equivalências entre realidades de
natureza diferente, remete à ideia de um tempo ou um espaço mítico, que une
todas as criaturas da terra e do céu. Como todos os sentidos gerados no corpo
deste poema, também a oposição entre vida e morte é só aparente, pois esconde
uma realidade maior, a realidade mítica, próxima do caos, da qual emana a
energia vital, responsável pela eterna criação e recriação da vida. Por esta
perspectiva mítica, morte e vida não se opõem, mas se alternam indefinidamente
num movimento circular. Assim, o espaço verticalizado aponta também para um
espaço mítico, ligado a um tempo circular, no qual todas as oposições se
fundem, como se fossem uma única realidade.
Coroando estas associações, motivadas pela
organização visual e sonora do poema, há uma outra referência que confirma a
presença de um espaço sagrado. Na terceira estrofe, as máquinas elevam a carne
“às alturas do espaço ou das colunas de que se nutre o tempo”. A imagem das
colunas pode ser relacionada ao “mármore” e, juntas, remeter à presença do
sagrado. As referências múltiplas referências espaciais, mais significativas
para a estruturação do poema do que as referências temporais, reforçam a ideia
de justaposição dos objetos promovendo uma ordem estranha neste universo.
É importante atentar para o fato de haver duas aparições
do vocábulo “tempo”. Uma se relaciona ao tempo do cotidiano e aparece com o
sintagma “no abismo dos dias”, na primeira estrofe. A outra emerge relacionada
a duas imagens metonímicas de um templo – o “mármore” (matéria pelo edifício) e
as “colunas” (parte pelo todo). As duas referências remetem à ideia de um tempo
cronológico e de um tempo sagrado, que extrapola o tempo histórico. As duas
manifestações do tempo “rasuram” e “abrem interstícios”, deixando suas marcas –
“os ecos”, do título – na matéria. As marcas do tempo remetem à ideia de
memória e estão relacionadas a uma espécie sacrifício de imolação da carne,
“estendendo-a no mármore”. É como se a carne estivesse sendo elevada a um outro
nível de realidade. Parece que as marcas do tempo, que podem ser associadas
também aos ecos, imprimindo rasuras na carne, têm um papel importante nesta
ascensão.
No mundo criado pelo poema de Nava reina uma
aparente desordem e indeterminação, decorrentes da falta de ligação lógica e
temporal entre os objetos. O intenso desregramento dos sentidos, intensificado
pela aparente ruptura sintática, promovida pelo uso frequente do hipérbato,
favorece a apreensão do mundo via sensorial. Concorre para a criação da
paisagem desconhecida e estranha a estrutura sinestésica, na qual sons e
imagens se fundem figurando um modo específico de relacionamento do sujeito
lírico com o mundo.
A predominância das enumerações de vocábulos, a
sequência ininterrupta de orações coordenadas, que se justapõem, enfatizam a
desarticulação lógica, mas também concorre para a criação de relações
inusitadas, de livres associações, que promovem a “fusão” e a “simultaneidade”
e aceleram, até suprimem, o tempo histórico, o lembra um comentário de Octavio
Paz (1984) acerca das manifestações do tempo na poesia moderna: “o que acaba de
acontecer já pertence ao mundo do infinitamente distante e, ao mesmo tempo, a
antiguidade milenar está infinitamente próxima”.
As imagens proliferam disseminando-se pelo texto,
da mesma forma que os ecos ressoam desde o título até o último verso. O
movimento se expande em diversas direções, corroborando a pluralidade de
sentidos interligados pelo processo de criação, que inclui o ato da escrita e
da leitura. As imagens, partindo do núcleo central – a “carne” –, espalham-se
pelo texto, de acordo com um movimento de subida até os astros e de descida ao
fundo do abismo, perfazendo uma espécie de círculo. A visualização do círculo é
potencializada pelos vocábulos “os ecos” que abrem o poema, constituindo o
título, e o fecham, como as últimas palavras do verso final.
O encadeamento dos versos potencializa, no nível do
discurso, a ambiguidade. Se, por um lado, há uma quebra das frases que
desarticula os versos, fragmentando-os visualmente, por outro lado, a
continuidade do sentido de um verso a outro favorece uma ideia contrária de
sequência lógica e ordenadora. Este recurso assume função relevante no final do
poema, pois confere um destaque imenso à palavra carne, que finaliza o último
verso da penúltima estrofe. Os dois versos seguintes, que formam o dístico
final, referem-se a este vocábulo, potencializando sua importância como a
imagem nuclear, à medida que ressalta sua natureza espacial: “onde inda
vibram/do extinto amor os ecos”. Esta conotação espacial já havia sido apontada
na segunda estrofe por meio dos versos “a mesma [carne] onde a rasura/ do tempo
abre interstícios”.
A contaminação mútua entre vários elementos em
todos os níveis do poema enfatiza a correspondência entre as sensações,
promovendo o livre intercâmbio de sentidos, que, desta forma, também constituem
ecos ressoando por todo o texto. A referência aos ecos, no último verso, traz
novamente a relação dos mesmos com os termos “rasura” e “interstícios” que
também são, tal como os ecos, marcas gravadas na carne, evidenciando uma
correspondência de ordem sinestésica entre visão e audição.
Os “ecos” que já tiveram o sentido associado ao
ritmo (sons recorrentes), às marcas deixadas na carne pela ação do tempo
(rasuras), no final do poema assumem outra conotação, ligada à memória. Memória
de um sentimento que já se extinguiu desta carne: o amor. Este amor também pode
ter vários sentidos, quando associado aos demais elementos. Pode se referir a
uma energia cósmica, responsável pela eterna criação e recriação de todas as
coisas, da qual ficaram os ecos (resquícios de memória), na carne. Pode se
referir a resquícios da memória de um indivíduo, que tenha habitado o espaço do
corpo, ao qual pertenceu a carne exposta. Mas pode, também, ser um resquício
mais recente, de um corpo que acabou de ter tido uma experiência amorosa tão
intensa e perturbadora que resultou num estado interno de completa
desestruturação e fragmentação do sujeito, do qual a paisagem é uma figuração
possível.
Esta carne pendurada à beira do abismo, elevada à
altura dos astros, imolada no templo, que recebeu rasuras tanto do tempo mítico
quanto do tempo cronológico, que se ergue ao lado das glicínias, pendurada como
os cachos de cor púrpura, constitui o espaço privilegiado no qual “vibram” “os
ecos” do amor. Impossível não nos lembrarmos do modo como Nava conceitua o
processo de criação, no texto sobre a poesia de Antonin Artaud: “todo o
acto poético é uma cosmificação”, “que se opera a partir do caos”, promovido
pela “destruição da língua” (NAVA, 2004). Não é possível realizar uma
leitura fechada de qualquer poema de Luís Miguel Nava. Tal como Rimbaud, ele
não escreve para nos fazer compreender nada. Ele escreve para nos fazer ver e,
desse modo, ampliar nossa consciência do mundo.
NOTA
1. Todorov fundamenta sua análise na distinção
que Étienne Souriau faz, no livro Correspondence des arts (1947),
entre as artes representativas, que remetem ao seu exterior, e as artes
apresentativas, nas quais a obra e o objeto se fundem e se confundem. Segundo
Todorov, na literatura, não há verdadeiramente arte apresentativa, pois seu
material de trabalho, a linguagem, sendo um sistema de signos constituído fora
da obra, já traz significantes atrelados a significados preestabelecidos. Mesmo
assim é possível distinguir entre as obras que fazem um uso representativo da
linguagem, nas quais os significantes remetem a significados que extrapolam o
texto, e as obras que fazem um uso apresentativo da linguagem, em que o
significante deixa de ser transparente e transitivo, servindo à criação de novos
sentidos dentro do texto (TODOROV, 1980).
REFERÊNCIAS
BACHELARD, Gaston. A psicanálise do fogo. Tradução
de Maria Isabel Braga. Lisboa: Estudios Cor, 1972.
BARTHES, Roland. Le
grain de la voix. Entretiens
(1962-1980). Paris: Seuil, 1981.
___. S/Z, uma análise da
novela Sarrasine. Trad. Léa Novaes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992.
ELIADE, Mircea. Le Sacré e Le Profane. Paris: Gallimard, 1965
ELIOT, T. S. Tradição e talento individual. In:
___. Ensaios. S. Paulo: Art Ed., 1989.
GIDE, André. Les
nourritures terrestres. Paris: Gallimard, 1980.
HELDER, Herberto. A colher na
boca. Lisboa: Edições Ática, 1961.
LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou o
livro dos prazeres. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.
LOTMAN, Iuri. A estrutura do texto artístico.
Lisboa: Estampa, 1978.
NAVA, Luís Miguel. Poesia completa - 1979-1994.
Lisboa: Dom Quixote, 2002. (Poesia do Século XX)
___. Ensaios reunidos. Lisboa: Assírio
& Alvim, 2004.
Paz, Octávio. Os filhos do barro: do
romantismo à vanguarda. Tradução de Olga Savary. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1984.
ROSA, António Ramos. Poesia, liberdade
livre. Lisboa: Ulmeiro, 1986.
___. O indeterminável e o desconhecido na poesia
moderna. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 24, Coimbra, março 1988.
TODOROV, Tzvetan. Une
complication de texte: les Illuminations. Poétique, Revue de
théorie littéraire, n. 34, Paris, 1978.
___. Os gêneros do discurso. Tradução
de Elisa Angotti Kossovitch. São Paulo: Martins Fontes, 1980. (Ensino Superior)
VICENTE, Adalberto. Uma parada selvagem; para
ler as Iluminações de Rimbaud. São Paulo: Ed. UNESP, 2010.
MARIA LÚCIA OUTEIRO FERNANDES (Brasil, 1950). Livre Docente em Literatura, Professora Associada da UNESP/Araraquara, onde trabalha desde 1997, tendo atuado também, de 1992 a 1997, na Universidade Federal de Viçosa (UFV), e em outras faculdades particulares em Resende, RJ; Poços de Caldas, MG e Rio de Janeiro. Mestrado em Letras/Literatura Brasileira na USP (1984) - Novíssima: estética e ideologia na década de vinte (EDUSP, 1987) e Doutorado em Letras/Literatura, Cultura e Contemporaneidade na PUC/Rio (1994) - Narciso no labirinto de espelhos: perspectivas pós-modernas na ficção de Roberto Drummond (EDUNESP, 2011). Publicou também Contrabandistas do pensamento – crítica e literatura no Brasil (Ed. Opção, 2017); Rupturas e desdobramentos: reverberações críticas da Semana de Arte Moderna (Pontes Editores, 2023); Tradição, modernidade e modernismo na lírica portuguesa (Pontes Editores, 2023); além de muitos artigos em periódicos e capítulos de livros. Livros publicados em parceria com colegas: Intelectuais portugueses e a cultura brasileira (2002), Estrelas extremas; ensaios sobre poesia e poetas (2006); Modernidade lírica: construção e legado (2008); Matéria de poesia: crítica e criação (2010); Poesia na era da internacionalização dos saberes (2016); Entre os diversos trabalhos de extensão realizados, destaca-se a participação especial no documentário À Procura de António Botto (2019), realizado para a RTP2, pela Mares do Sul Produções.
DAMARIS CALDERÓN (Cuba, 1967). Poeta, narradora, pintora, docente y ensayista. Ha publicado más de dieciséis libros en varios países, entre ellos Cuba, Chile, Alemania, España y México. Participó en festivales internacionales de poesía en Holanda, Francia, Uruguay, Argentina, Perú, México, entre otros países. Parte de su obra ha sido traducida al inglés, holandés, francés, alemán, noruego y serbocroata e incluida en numerosas antologías de poesía cubana y latinoamericana contemporánea. En esta edición de Agulha Revista de Cultura presentamos otro aspecto fundamental de su inquietud creativa, su obra plástica. En entrevista, Damaris revela: Para mí la cultura está ligada a la tierra, a sus orígenes, al hecho de escribir, de cribar, de labrar; la escritura en bustrófedon, que era la manera de los bueyes y el paisaje. Y eso es. Si uno mira la literatura latinoamericana se va haciendo conciencia de paisajes diferenciados; ustedes tienen esto, nosotros esto otro. Recuperar la conciencia de que somos un todo, de que el cuidado del ecosistema, de la planta, de cada árbol, es parte también del cuidado del ser humano, del planeta. Los árboles y el paisaje escriben su propia poética, su propia música. Una pintura con la que ningún pintor podría competir. En ese sentido, sentir que coexistimos, que nos nutrimos y debemos cuidarnos. Son palabras que encajan muy bien en su pintura, cuyas líneas, ángulos, colores, se mezclan en la búsqueda de un punto erótico en el que el hombre se revela parte de ese todo que ella también evoca en su poesía.
Agulha Revista de Cultura
Número 253 | julho de 2024
Artista convidada: Damaris Calderón (Cuba, 1967)
Editores:
Floriano Martins | floriano.agulha@gmail.com
Elys Regina Zils | elysre@gmail.com
ARC Edições © 2024
∞ contatos
https://www.instagram.com/agulharevistadecultura/
http://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/
FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
ELYS REGINA ZILS | elysre@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário