sábado, 27 de junho de 2020

LEDA RITA CINTRA | O mercado editorial e livreiro do Brasil no ano de 2020


2020 – Grassa a pandemia do Coronavírus no planeta terra!
A economia ameaça ruir mesmo nos países mais estruturados. No Brasil, um país não-leitor, em que a economia já vinha combalida desde, pelo menos, 2013, as estruturas balançam quase caindo ao perverso ritmo da inadimplência.
E o mercado livreiro/editorial, nesse país de poucos leitores, sente a ameaça cada vez mais de perto!
Livrarias fechadas por conta da pandemia, perdem alguns de seus maiores chamarizes de leitores/clientes. Os cursos deixam de ser realizados, as feiras são adiadas ou simplesmente deixam de ser realizadas, a comercialização pessoal de títulos inexiste, noites de autógrafos canceladas ou transformadas em chamados virtuais!
Então em abril deste ano as vendas despencam, segundo o SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros), com uma baixa de 45,35% em volume e em 47,6% em valor, mesmo as livrarias recorrendo a várias estratégias para atrair os leitores, incluindo nisso as vendas digitais das próprias livrarias ou aproximando-se de plataformas como a Amazon, Instagran, Watsapp e Facebook que lentamente começam uma arrancada tímida para melhores vendas. Já em maio essa perda comercial foi menor, ficando na casa de 33%, dados do SNEL e do relatório mensal da NILSEN.
Esse panorama faz os livreiros, em sua Associação Nacional pensarem na necessidade urgente de um apoio governamental para superar essa crise enquanto o presidente entrega a diretoria responsável pela compra de livros educacionais para o PL (Partido Liberal) na pessoa do deputado Garigham Amarante Pinto, cuja diretoria fica responsável pelas ações educacionais de Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), responsável, entre outras ações, pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), cuja última edição comprou 172,50 milhões de exemplares, num investimento de 1,4 bilhão de reais.
Apontando para o auxílio emergencial para o setor como saída, há vários projetos buscando esse auxilio, como o dos deputados da Frente Parlamentar do Livro e da Leitura que lançaram um projeto com linhas de crédito para segurar o setor durante a pandemia. Jandira Fegali também lançou um projeto com esse intuito, assim como ainda outros parlamentares.
E se pensarmos em grandes livrarias como a Cultura e a Saraiva, que há pouco tempo se expandiram por todo o país e mesmo o exterior, incluindo nessa leva a carioca Travessa, e que atualmente se encontram inadimplentes, pensamos no século XX, quando pequenas livrarias fizeram história no Brasil, como a livraria Parthenon, fundada por José Mindlin, a Jaraguá e talvez a mais famosa delas em São Paulo, a Mestre Jou, em que o mestre, soberano, reinou até seu falecimento.
Épocas diversas e essas pequenas livrarias não suportaram o avanço das mega livrarias melhor situadas nas grandes cidades e cerraram suas portas. Mas então o país era outro, em vez do obscurantismo de hoje, se espelhava nas culturas europeias em que ler era primordial para a vida!
Podemos culpar a televisão por isso? Não, a televisão foi culpada, segundo alguns por tentar (o que não aconteceu) destruir o público leitor de jornais… A internet? Sim, esse elemento tira um tanto dos leitores já poucos, não pela qualidade, mas pelo tempo a que a ele as pessoas se dedicam.
Então vem a Amazon, com a oferta de livros digitais, a grande culpada pela diminuição dos livros físicos segundo certas opiniões; ledo engano porque, em várias partes do mundo, como nos EUA e muitos países da Europa, em que essa plataforma segue firme e forte, os leitores já perceberam que livros físicos e digitais podem e devem caminhar juntos!! Esse é o caso da França, Itália, Inglaterra e alguns outros… Leitores há para todo tipo de publicação, como livros físicos e digitais há para todo tipo de leitores.
O que acontece no presente momento em nosso país é que o súbito fechamento das lojas físicas, imposto pela pandemia surpreendeu os leitores acostumados a ler apenas títulos impressos, mas que, adeptos do hábito da leitura migraram para os digitais, os famosos e-books, que nesses meses deram verdadeiro salto em vendas.
Segundo Marcelo Gioia, CEO da Bookwire no Brasil, em declaração ao Publishnews, o salto em vendas alcançou 9,5 milhões de livros digitais entregues ao público leitor brasileiro, o que, em comparação com 2019, apresentou um crescimento de 57%.
Sinal dos tempos. Não muito bem recebida por alguns e com uma política nem sempre das mais agradáveis, a Amazon com os e-books permitiu a continuidade de publicações em tempos de mercado livreiro e editorial muito difíceis!!
Um exemplo disso é a Editora Cintra, que mantenho desde 2013, quando comecei a publicar apenas no digital, o que nos permitiu resgatar títulos apenas pela qualidade, e que muitas vezes foram recuperados das gavetas de seus autores ou do limbo do esquecimento rejeitados pelas editoras tradicionais sob a alegação, aliás até certo ponto compreensível, de que este ou aquele título, embora responsável por um excelente texto não atrairia público, logo era impublicável pelo investimento de uma edição impressa. Atualmente, em parceria com a ARC Edições, de Floriano Martins, a Editora
Cintra publica todos os seus títulos em e-book e também em papel pela Amazon, ou em tiragens impressas da própria editora, o que mostra que os livros digitais são uma oportunidade para as pequenas editoras de servirem seus leitores da forma como melhor lhes agrada, provando que livros digitais ou impressos, são sempre livros, obras a serem resguardadas do esquecimento.
Por isso, na minha opinião, os livros digitais não significam em absoluto a morte dos livros físicos aqui ou em qualquer outro pais. Para o leitor brasileiro significa apenas uma ressignificação do livro, que não precisa ser papel para ter qualidade!! Esperemos que essa onda se fortaleça, cresça e não atrapalhe os livros físicos, mas com eles permaneça!
Outro lado dos e-books no Brasil são os autores, que nem sempre percebem a importância dessa inovação para seus escritos e títulos, o que certamente acontecerá em pouco tempo, já que a própria Amazon agora disponibiliza quaisquer títulos tanto em e-book como em papel ao mesmo tempo. Ajustes ainda faltam e talvez o mais importante deles, nessa plataforma, seja a impressão dos títulos em vários países, como no nosso, para que os livros em papel não sofram os acréscimos do frete que vem diretamente e apenas dos EUA, o que onera cada título.
Mas nem só de frete é acrescido o livro. Por muito tempo trabalhando em outras editoras, ouvi a reclamação dos mais diversos leitores do preço dos livros. E isso, em nosso país de poucos leitores, é grave, porque impede uma arrancada para uma maior procura de títulos, o que acaba por impedir que o país forme leitores. E devemos muito desse alto preço dos livros à quantidade de impostos que o editor é obrigado a pagar para o governo para tirar seu produto das gavetas dos escritores e levá-lo até o público, impresso. Então, se uníssemos essas duas correntes – leitores e e-books, poderíamos formar o hábito que nos faz tanta falta da leitura, porque o e-book, por onerar muito menos ferozmente o editor, pode ser oferecido aos leitores a preços módicos. Além disso, como dizia nosso grande autor Esdras do Nascimento
– que mala pode conter três mil livros e ser leve como um kindle? Sim, o e-book oferece essa possibilidade aos leitores e aguardamos apenas o momento em que livros físicos e digitais caminhem juntos, como até hoje caminharam rádio e televisão, internet e jornais!!
Mas… e as editoras que publicavam apenas no impresso? Aquelas que hoje se vêm diante de lojas fechadas, algumas inadimplentes? Voltamos à Associação Nacional das Livrarias…é preciso um apoio do poder público emergencial, embora acreditemos que raras são as que ainda não publicam ao mesmo tempo no impresso e no digital, faltando apenas que o público leitor escolha uma dessas opções, sem desprezar a outra. E isso pode ser confirmado pelo surgimento das editoras independentes, que apostam num mercado quase nunca fácil e que fazem suas publicações sem desprezar nenhuma das opções!
Não se pode, entretanto, culpar apenas a pandemia pelo fechamento de algumas editoras, grandes ou pequenas, mas coalizões malsucedidas, em que grandes editoras estrangeiras engoliram as nacionais e também o fato de que desde 2014, quando se deixou de publicar os editais governamentais para compras de livros para a Educação, muitas foram as pequenas editoras que viram suas portas fecharem por falta exclusiva de verbas. Havia, é verdade, um patamar enganoso que sustentava essas editoras e esse patamar, patrocinado por editais públicos, fez com que muitas publicações não visassem a qualidade dos textos, mas apenas a necessidade de cumprir com as exigências dos editais, sempre recheados de recomendações que cerceavam frequentemente o poder de criação dos autores, deixando de lado as necessidades e ansiedades das crianças, com a desculpa de que teriam de estar na idade adequada para que elas entendessem, ignorando a frase da maravilhosa Tatiana Belink, uma das maiores criadoras deste país, que dizia: Criança entende tudo!


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Agulha Revista de Cultura
UMA AGULHA NO MUNDO INTEIRO
Número 153 | Maio de 2020
Artista convidado: Teresa Sá Couto (Portugal)
editor geral | FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
editor assistente | MÁRCIO SIMÕES | mxsimoes@hotmail.com
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