Cultura em desafio - A América Latina que nos falta
Em 2012 a Agulha Revista de Cultura concebeu este
projeto, infelizmente não realizado pela ausência de parceiros na área de
captação e gestão de recursos. Uma vez que ainda o consideramos como atual e
necessário, aqui reproduzimos seu primeiro capítulo, com o espírito de
compartilhar ideias que poderiam enriquecer culturalmente nosso país.
Os Editores
ESTRUTURA
GERAL E BASE CONCEITUAL | O projeto ora apresentado constitui
naturalmente delineamento técnico, formação de pessoal, atuação junto a
mercado, além de diversos outros detalhes. Anexos oportunamente darão conta do
planejamento e adequação às perspectivas de produção e curadoria. O que
interessa a princípio é referir seu campo de ação, de acordo com os tópicos que
seguem:
1.
Estabelecimento de linha estratégica de diálogos entre produtores culturais nos
20 países que constituem a América Latina em sua configuração ibérica.
2.
Estabelecimento de protocolo de permuta de informações sobre história,
atualidade e perspectiva dos mecanismos de produção cultural em cada país.
3. Gravação de
uma série de programas que permita registro das discussões sobre conquistas e
obstáculos das ações de política cultural em cada país, com abertura para a
identificação e proposição de políticas comuns.
4. Definição
de parcerias junto à TV estatal no Brasil e equivalentes em toda a América
Latina, além dos canais abertos ao ambiente cultural em países como Estados
Unidos, Espanha e Portugal.
O objeto final
do projeto se define pela produção de uma caixa com três DVDs e um libreto,
contendo a edição principal da série de gravações, assim como textos
informativos e críticos (português, espanhol, inglês) e breve ensaio
fotográfico. A edição destina-se, em primeira instância, a facilitar a
retransmissão dos programas nas redes de televisão – estatal e privada –, tanto
no Brasil quanto em todos os demais países envolvidos. Adentrando os bastidores
de sua produção, cabe listar alguns pontos nevrálgicos:
1. Identificar
em cada país um representante que possa propiciar intermediação entre meios
privados e institucionais de difusão televisiva.
2. Precisar o
raio de ação em coberturas televisivas do projeto em si, de maneira que se
possa já a partir daí estabelecer relações institucionais entre os países
convidados.
3. Definir
zonas comuns de interesse em projetos culturais já existentes em cada país, a
exemplo de festivais de cinema, dança, teatro, música e incentivos de criação e
pesquisa junto a universidades e outros veículos de apoio ao pensamento
crítico.
A realização
do mesmo envolve um tripé com a seguinte configuração de parceiros:
1. Concepção e
regência: Agulha Revista de Cultura.
2. Produção e
promoção: a definir.
3. Realização
e edição final: a definir.
Como parceiros
na área promocional e de expansão em sua difusão, deverá buscar essencialmente uma
ampla divulgação do mesmo em todo o território nacional.
A América
Latina caracteriza-se essencialmente pela diversidade de aspectos culturais. A
própria presença das matrizes coloniais assumiu tons distintos no encontro com
a pluralidade da cultura em cada região. Contudo, ao longo da história esses
povos, que foram construindo uma biografia repleta de paralelismos, perderam
parcialmente o sentido de uma similitude de culturas, o que certamente teria
propiciado melhor argumentação dos incansáveis focos de resistência ou
assimilação das culturas provenientes de outras partes do planeta que aqui
vieram dar. É verdade que a mestiçagem prevaleceu e nos enriqueceu enormemente,
porém nos faltou uma riqueza ainda maior, de superação das dificuldades pertinentes
a cada cultura em particular, aquela gerada pelo intercâmbio entre as mais variadas
formas de apropriação desse múltiplo caldo cultural. Inclusive a feliz
interferência que poderia haver provocado a cultura nas relações políticas e
econômicas.
O Brasil em
inúmeras oportunidades poderia ter representado o papel de catalisador desse
processo de sedimentação cultural, criando ambiente para a interlocução
indispensável e permanente entre os 20 países que compõem a América Latina,
fundados a partir da colonização ibérica. Estrategicamente situados em todo o
continente americano, inclusive o Caribe, impressiona hoje que não tenha sido
dada a devida atenção a esse mapa afortunado que poderia equivaler e mesmo
transpor as conquistas propiciadas pela criação de uma União Europeia. A
história costuma cobrar um preço muito alto por esses deslizes estratégicos. Ao
mesmo tempo, o homem possui um talento natural para recuperar-se de imperícias
de toda ordem.
Uma vez mais a
oportunidade se verifica e seduz pela configuração política que se apresenta
neste início de século, o que permite a argúcia na proposição de um projeto de
arregimentação de diálogos entre as diversas culturas latino-americanas,
interlocução esta que abre passo para o fomento de parcerias que tratarão de
operar não somente no ambiente cultural, no convívio e consequente
enriquecimento de nossas artes, como também em outros planos estratégicos que
envolvem o estabelecimento de políticas de ações comuns em áreas como o turismo
e a educação.
O enriquecimento
crescente da tecnologia digital é hoje um saudável desafio a que
institucionalmente a cultura comece a ser percebida como fator menos da área do
entretenimento do que seu potencial estratégico permite. É inaceitável que o
Estado não tome para si a tarefa de enriquecimento cultural, deixando de ser
utilizado como mero patrocinador da produção artística. Neste sentido, o Brasil
tem muito a aprender com as diretrizes históricas da política cultural
mexicana, por exemplo. Inclusive com seus erros justamente no excesso a
patrocínios na área de projetos individuais. A utilização da tecnologia digital
permite hoje um planejamento de ações culturais que podem, de forma
irrecusável, por uma vez mais em questão a necessidade de estabelecer laços
entre os países da América Latina.
O projeto que
aqui será apresentado tem intrinsecamente a ver com uma tomada de posição, no
que diz respeito, em âmbito continental, a qual diretriz seguir ou qual
mecanismo adotar. Ao apresentá-lo sob um título naturalmente provisório e tão
assertivo não foi outra a intenção do que pôr em destaque a urgência em
definir, mais do que uma meta, a conduta. O que o título apresenta como “Uma
América que nos falta”, é um desafio à construção de uma América com que
sonhamos, porque não cabe imaginar que brasileiros sonhem com uma Europa,
sobretudo dentro de uma leitura que mescla exotismo e subdesenvolvimento, com a
qual costumamos ser relacionados. Esta é, portanto, uma oportunidade de
composição de um outro padrão de referência cultural em relação à América
Latina, uma forma de fortalecer uma coautoria do Continente a partir da cultura.
Até aqui temos
o delineamento de princípios que regem uma política cultural destinada a ser
vanguarda em momentos decisivos da história nacional, e que agora se vê diante
de assumir um papel histórico internacionalista. O presente projeto traz
implícito, mais do que apenas sugestão retórica, o apontamento de um marco.
Este é o momento de se criar condições para a concretização, através do efeito
histórico da primeira pedra lançada, de uma União Latino-Americana. Não resulte
no sonhado, nada representará equívoco ou investimento indevido, pois estará
dado o grande passo para que a América Latina exista como unidade vigorosa a
partir de sua pluralidade cultural.
ÍNDICE DESTA EDIÇÃO
ALCEBÍADES DINIZ MIGUEL | A beleza
onírica do abismo (Dolphi Trost e o exílio perpétuo)
http://arcagulharevistadecultura.blogspot.com.br/2015/09/alcebiades-diniz-miguel-beleza-onirica.html
CLAUDIO WILLER |
A poesia de Roberto Piva e o surrealismo
FLORIANO MARTINS
| Surrealismo en América: últimas pistas
GABRIEL JIMÉNEZ EMÁN | La filosofia venezolana y su
lugar en la América Latina
HAROLD ALVARADO TENORIO | La poesía de Carlos Drummond de Andrade
HERNÁN
ORTEGA-PARADA | Enrique Gómez-Correa y la sobrevivencia del Surrealismo
IBRIELA BIANCA |
Roberto Piva, leitor de P.P. Pasolini
LETÍCIA RAIANE DOS SANTOS | A
vida como vertigem: aspectos surrealistas em O agressor, de Rosário Fusco, e O
anjo, de Jorge de Lima
MARIA DE FÁTIMA NOVAES PIRES |
Narrativa historiográfica, narrativa
literária - a arte da escrita em João Gumes
http://arcagulharevistadecultura.blogspot.com.br/2015/09/maria-de-fatima-novaes-pires-narrativa.html
[Artista convidado] ZUCA
SARDAN | Duas versões do mesmo crime
1. KAZIMIR PIERRE | As espirais mesmerizantes. Passeio pela
obra gráfica de Zuca Sardan
2. ZUCA SARDAN & FLORIANO MARTINS | O cálice emborcado.
Tragicomédia sem ato falho
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