MS Você tem se pronunciado em vários lugares
a respeito de uma “corrente subterrânea” na poesia brasileira. No que essa corrente
se diferencia da corrente dominante da lírica nacional? Quais seus autores relevantes?
FM Aqui primeiramente se destaca o tema das
escolhas. A riqueza existente em certa diversidade aos poucos foi dando lugar a
um pequeno vício retórico que mescla facilismo artificioso da linguagem e informalidade
de um falar gracioso. Retrospectivamente podemos ver a forma como foram entronizados
os poemas-piadas de um Oswald de Andrade ou a ourivesaria esvaziada de sentido de
grande parte da Geração de 45, sobretudo aquela que desemboca no mais estéril formalismo
do poema-processo ou da poesia concreta. Soa verdadeiramente ridícula a contenda
traçada entre fundo e forma, como se fossem inimigos mortais e a poesia resultasse
da sobrevivência exclusiva de um desses recursos. A chamada geração marginal oferece
pequenos sinais de recuperação, mas então infelizmente se verifica uma fragilidade
dupla: ausência – já por um dilema histórico de presunção autodestrutiva – de referencial
estético amplo e consistente, e ausência de visão de mundo consistente o suficiente
para que através dela se construísse um discurso poético expressivo. A partir daí
cedemos uma vez mais aos encantos do aprimoramento da forma em detrimento do sentido.
O que chamo de corrente subterrânea se define exatamente por aquelas vozes de uma
multiplicidade de ofertas que foram sendo em muitos casos desprezadas intencionalmente,
variedade relevante de recursos estilísticos, amplitude de registros e em especial
a riqueza de não padecer da avaria histórica do que chamas de “corrente dominante”,
a ruptura entre fundo e forma. Nomes: Jorge de Lima, Drummond de Andrade, Murilo
Mendes, Dante Milano, Augusto Meyer, Dora Ferreira da Silva, José Santiago Naud,
Lêdo Ivo. Eu conversava muito com Sérgio Campos, um dos grandes poetas brasileiros
nascidos nos anos 40 – infelizmente morreu há mais de 10 anos em completo ostracismo
– sobre a ironia que é ter esses nomes todos em um ambiente subterrâneo ou mesmo
marginalizado. Por isto que falei inicialmente em escolhas. Fizemos as erradas e
hoje pagamos um preço imenso. Perdemos os referenciais que seguramente teriam enriquecido
a lírica em nosso país. Prejuízo histórico que não sei se recuperável.
MS Seu antigo parceiro na Agulha – Revista de Cultura, Claudio Willer,
tem se pronunciado de maneira favorável à produção poética atual, afirmando que
tem muita coisa de qualidade sendo produzida, mas que faltam críticos que se debrucem
sobre essa produção crescente e diversificada. Suas declarações nesse sentido parecem
ir em direção contrária, expressando certo pessimismo e desapontamento com a produção
atual. Afinal, temos ausência de produção de qualidade ou uma produção ainda a ser
revelada, separando-se o joio do trigo?
FM Há um pouco de cada coisa. Começaria pelo
fato de que Willer é mais entusiasta do que eu. Muito do que ele aponta como boa
poesia para mim não passa de diluição de beat
ou surrealismo, o que pode até ser um avanço, considerando que safra anterior de
diluições tomava por base cabralismos,
concretismos e oswaldismos. Outro ponto
é que círculo de amizades e a condição de editores de uma revista nos permitem acesso
a textos inéditos, identificando quando há relativamente boa poesia sendo escrita,
embora ainda não publicada. Por último, o ato de publicação em si não resolve muito
se não há circulação dessa produção, se ela não encontra atenção por parte dos meios
periódicos de difusão. Evidente que importa, sobretudo, a criação, mas quando tratamos
do tema no plano crítico, a circulação é indispensável. Há um aspecto no que chamas
de “produção atual” que me parece mais valioso do que ficar a citar nomes: a diversidade
de fontes, o interesse despertado por outras tradições líricas e também por outras
áreas de criação. São pequenos sinais que ajudam a criação a se libertar do peso
morto da retórica literária. Sempre recordo uma frase luminosa de Rubén Darío, ao
dizer que conhecer diversas culturas era a melhor maneira de se livrar da tirania
de algumas delas.
MS Cada vez mais você é um nome de referência
quando o assunto é poesia brasileira no universo hispano-americano, com participação
frequente em eventos e livros publicados em vários países de língua espanhola. O
mesmo não parece ocorrer no Brasil. A que você atribui tal fato? Confirmação do
ditado perverso de que “santo de casa não obra milagre”?
FM No mínimo, eis aí bom motivo para uma bela
risada. Acho que tem em parte que ver com esse ponto de cegueira que venho comentando,
certa limitação de perceber quem está apontando em outras direções que não a dos
vícios cartoriais. Nada pessoal, nada que pertença ao ninho das paranoias. É um
caso bem comum de trânsito em nossa cultura. O Brasil ainda tem uma mentalidade
gremial, de distribuição de riquezas entre associados e credibilidade dada a prêmios
e outros arranjos florais. E há gente que se especializa nos estatutos dessa gincana.
Fora desse ambiente apenas o reinado sutil das exceções. Márcio, o mundo está em
todos nós, é parte de todos nós. Imagino alguém se identificando com qualquer coisa
que à primeira mão esteja mesmo na contramão de uma tradição. O toque de sedução
do esquisito. Passado este primeiro momento as teias vão sendo tecidas, as conexões
vão sendo percebidas. Um nozinho aqui e outro ali, pronto, já chegamos naquilo que
se costuma chamar de poética, estética, estilo. Tudo porque o confronto é a matriz,
não há distinção, personalização, voz própria, fora do confronto. Acho que no Brasil
se tem uma leitura inversa da coisa.
MS Em algum momento você se ressente de estar
no Nordeste do Brasil? Acha que a sua produção e atuação seriam mais valorizadas
e facilitadas caso estivesse no eixo Rio-São Paulo, publicado por grandes editoras?
FM Mas eu não estou em Nordeste algum. Nem o
Nordeste. Tampouco ando em busca de cargos. Tenho plena mobilidade para mudar de
residência quando houver motivo que o valha. E não me ressinto de nada, querido.
Toco em tais temas apenas em atenção à tua curiosidade. O Nordeste, no Brasil, deu
sempre ao país a sua melhor literatura, assim como a música e a plástica. Mas é
uma tolice dividir o país dessa maneira. O país foi rico em duas fundamentais circunstâncias de sua história graças a Pernambuco
e Minas Gerais. Nos dois momentos fomos sugados até a alma. Não sabemos manter o
que é nosso porque não sabemos com exatidão o que é nosso. Há uma espécie de impregnação
colonial que não nos permite destronar fantasmas. Toda vez que a imprensa toca em
China e Índia, ao lado do Brasil, como sociedades emergentes, eu penso que não é
a experiência milenar dos dois outros países, sua essência cultural, mas sim o aprendizado
de uma estratégia econômica, de política econômica, de determinação social, longe,
muito longe, do que se poderia aceitar ou entronizar no Brasil. É quando mais gosto
de meu país. Quando intuo que jamais se converterá em Índia ou China. Por outro
lado, não sei qual mérito nos faça tão felizes em copiar certos paradigmas franceses
e estadunidenses até hoje. Rateio regionalista hoje no Brasil é suicídio de uma
sociedade. Não temos no Brasil um problema cultural, no sentido literário ou musical,
por exemplo, mas antes um desastre social. Agravado enormemente porque ninguém chama
para si a responsabilidade sobre o tema. Caminho pelas ruas de Sidney, de onde te
escrevo, vejo os mínimos cuidados, já incorporados ao cotidiano da cidade, no que
diz respeito à infraestrutura urbana em geral. Fecho os olhos, recordo meu país,
e sinto o quanto permanecemos na idade das trevas. Observo o tratamento dado a um
acidente como o dilema das enchentes em Queensland, inesperado como não se pode
assim chamar os deslizamentos no Rio de Janeiro ou o aguaceiro em New Orleans. De que nos serve recordar aqui o quanto que
o Congresso Nacional, no Brasil, enriqueceu às custas de liberações de verba para
um Nordeste que jamais se beneficiou delas? Como superar uma sociedade baseada no
cinismo?
MS A relação autor/leitor vem sendo substituída
de maneira contumaz pela relação produtor/consumidor. Você mesmo chegou a afirmar
que “o grande drama da criação hoje está na circulação e não na produção”. Quais
as implicações disso para quem busca na literatura algo mais que um produto feito
para atender um perfil consumidor?
FM Mas a quem importa o tipo que busca encontrar
a si mesmo numa prateleira de livraria? Haverá salvação para esse tipo de leitor?
Não ria. O que eu indago é se a minha preocupação deve ser com esse cúmplice disfarçado
de vítima. Acho que há duas relações aqui que precisam ser aclaradas. De um lado
há o fabricante, industrialmente um produtor, a peça de mercado, que faz com que
o disco, o livro, qualquer coisa que traga ainda certo cheiro de arte, circule de
mão em mão. Outro figurante é o Estado, aquela fantasmagoria que em nossos países
costumamos chamar de política cultural, absolutamente inexistente. Tudo estaria
perfeito se houvesse o que agendar, seja para proteção ou produção. Na prática,
na velha e boa prática, qualquer canção é pensada no sentido de atender à delineação
dessa dupla, mercado/Estado. Usei a canção por ser o exemplo mais popular em termos
de circulação artística. Imagine a situação referente a um poema ou uma escultura.
Evidente que a arte não foi destruída pelo Estado ou pelo mercado. Mas em um país
chamado Brasil, onde a cultura não se realiza senão como uma expressão espontânea
e invariavelmente basbaque diante do próprio espelho – porque aqui somos todos geniais
antes mesmo de sê-lo –, uff, aqui tudo nos leva a uma piada que se contava no bairro
carioca em que vivia o compositor Cazuza, ele sempre encharcado de si mesmo – um
bêbado que aparecia em um daqueles bares do chamado Baixo Gávea e dizia: “…mas se
o Cazuza é chamado de gênio, o que dizer do Beethoven?!” Evidente que é outra a
leitura que se entende acerca de influências e graus de potência estética entre
gerações, países etc. O que interessa aqui é a percepção de nossa pressa em considerar
alguém gênio, senhor dos anéis ou de outras propriedades. Em um lugar assim, querido,
o leitor será sempre vítima. Não te esqueças que tem crescido muito a produção de
pérolas com base no cativeiro de ostras. A metonímia é a ciência dos tolos. O mundo
é uma grande caixa de ressonância metafórica.
MS Quais as alternativas atuais para a circulação
da poesia de qualidade? Existe mercado para a poesia?
FM Jamais existiu. Nunca, nunca. Não sei qual
a curiosidade em torno. Essa preocupação de poetas de se tornarem cantores de rock
ou atores de cinema. Até hoje não houve poeta brasileiro ocasionalmente mais famoso que J. G. de Araújo Jorge. Não sei se era
lido, e até prefiro que o pobre seja um desses casos de autores como Pablo Neruda
e Umberto Eco, que encontramos em estantes de sala em casas de uma ponta a outra
do interior do país e se trocamos duas palavras com o dono da casa ele não faz a
menor ideia do que há ali no interior daqueles livros. Talvez a confusão esteja
na relação conceitual entre circulação e mercado. Mercado para poesia não existe.
O pior poeta que alguém possa sugerir não vende o que lhe valha no bolso o aluguel
de um veleiro em um final de semana no Caribe. Os orgulhosos melhores poetas costumam
achar que somente os piores vendem algo. Ninguém sabe, em geral, de onde vêm os
recursos que sustentam a vida de um artista. Adoro a debandada de maus poetas para
o céu da narrativa, eles vão ali em busca de sucesso e glória, a alma encharcada
de pedrinhas de luz. Como um leitor, sempre hipotético, pode se beneficiar diante
dessa troca contingencial de partido nas artes? Mas o mercado, ah o mercado! Sempre
foi o mercado das almas. Não importa o que se compra e vende e troca, mas sim o
espírito da transação. Não há distinção entre venda de livro e analgésico, disco
e brinquedo a pilha. Quando nos sentimos frustrados, traídos, esquecidos. Quando
nos projetamos nos filhos. Quando tudo na vida equivale a um livro não editado.
Aí está o mercado nos comendo por dentro. Viver é outra coisa. Criar é outra coisa.
MS Você
enveredou pela narrativa com a novela Sobras
de Deus (Edições Nephelibata, 2010), um texto visceral e de inegável qualidade.
Porque só agora a prosa narrativa? Considerando que você já afirmou em inúmeros
lugares que é “essencialmente poeta”, qual o sentido da obra na sua trajetória criativa?
É autobiográfico?
FM Isso do autobiográfico sempre me lembra tolice
igual que é o culto do “baseado em fatos reais” que observamos no cinema. Soa ridículo
ao menos imaginar essa tarja em filmes de Akira Kurosawa, Federico Fellini ou Clint
Eastwood. A pergunta é: o que importa? Se a imaginação, o sonho, a memória, o delírio,
são partes do que eu sou, então tudo em mim é autobiográfico. E tudo o que crio
tem por base o fato real, tangível ou não. Este livro é uma espécie de saga familiar.
Ali estão pais, tios, avós, primos, enriquecidos em sua personalidade, alguns mesclados
entre si, mais ou menos decalcados do que se chama realidade. Certos personagens
na família por acaso permitiam a conversão graciosa em ficção. Mas veja bem: o que
chamas de prosa narrativa está presente em boa parte de minha poesia, assim como
o drama teatral, a crônica policial, as anotações reflexivas. A diferença é que
em essência o olho com que observo o mundo é o da poesia, o que quer dizer que não
me importa a análise e sim a comunhão.
MS Uma característica sua é a disposição para
o diálogo, inclusive no campo da poesia, compondo poemas a quatro mãos. Como tem
sido a experiência de compartilhar esse momento normalmente tão solitário como é
a escritura literária?
FM Suponho que se eu fosse músico ninguém me
faria tal pergunta. Creio que a criação em si vale tanto pelo resultado, apresentado
na forma de uma obra, quanto pelas forças que move para alimentar-se. Compartilhar
a intimidade com alguém é entregar-se ao mundo, não somente habitar, mas deixar-se
habitar. Não entendo como o poeta pode aceitar a sua solidão como dilema ou castigo.
Jamais observei o tema por tal ângulo. Quando não estou criando é quando mais me
sinto só. A solidão tem, portanto, outra composição para mim. Tenho escrito poemas,
letras de canções e até mesmo ensaios – a quatro mãos. São originalmente improvisos,
como se fôssemos músicos de jazz ou praticantes de um daqueles jogos surrealistas.
Isto ajuda a reforçar o sentido estético de cada um, enriquece a pessoa e até mesmo
o léxico, recorda que não estamos sós no mundo, aprimora a extração cósmica da criação
em si. Um homem pode viver isolado do mundo e ser quem melhor lhe compreende. O
inverso, caso comum de trânsito, tem resultado em inumeráveis desastres históricos.
Em geral nos divertimos nos cinema ou na televisão com a vulnerabilidade das sociedades
humanas. Rimos e dormimos para amanhã acordar bem cedo, levar o filho à escola,
a mulher ao emprego e seguir participando dessa mesma vulnerabilidade. Eu não vejo
nenhum sentido nisto. Assim como procuro uma mulher que divida meu dia com as coisas
mais entranháveis, que se divirta comigo a tatear o mundo, eu vivo a propor a mesma
relação amorosa a outros artistas. Busco gente com quem escrever poemas, compor
músicas, pintar, rascunhar, tomar cerveja, matutar sobre a existência. Não vou,
afinal, levar essa vida toda que tenho dentro de mim para o túmulo.
MS Em 2008 apareceu Brincos do Mar e o Infinito, CD com canções suas em parceria com Mário
Montaut e Ana Lee. O projeto terá continuação? Uma curiosidade: você faz distinção
entre letra e poema? Sabe de cara quando está escrevendo para o livro ou para a
canção, ou isso se dá depois?
FM A criação adora confundir o criador. Venho
escrevendo um livro com um poeta mexicano dedicado a músicos de jazz, série de poemas
que são diálogos intimistas com músicos e compositores de nossa preferência. Outro
dia me sentei para escrever o poema que seria meu diálogo com Louis Armstrong. Havia
rascunhado algo que teimosamente não avançava, quando então me surge a lembrança
de Alberta Hunter com aquele seu olhar traquino de quem havia descoberto o soro
da imortalidade. Poucos minutos depois estava escrito o poema a ela dedicado. Fui
traído pela intenção. A poesia salvou
a si mesma. Com isto quero dizer que se já me sentei para escrever um poema e saiu
uma letra de canção ou vice-versa, é detalhe que nunca vem ao caso. Evidente que
há uma distinção entre o poema e a letra de canção, o que não impede que alguns
poemas sejam musicados – basta pensar na tradição dos lied na música erudita – ou que muitas letras deem a impressão de não
caberem na melodia quando as escutamos. Em geral, há dois tipos de poetas: os que
fogem da métrica e da rima como o diabo da cruz e aqueles que não sabem viver sem
pelo menos um desses artifícios. Junte-se a isto o fato de que, ocasionalmente,
os letristas de canção podem alcançar, mais do que fama propriamente, uma conta
bancária mais sorridente que a dos poetas, e eis o alvoroço: poetas detestam letristas
de canção (risos). Quanto ao disco que fizemos, Mário Montaut, Ana Lee e eu, não,
não chegamos a pensar, os três, em gravar outro disco. Continuo compondo com um
e outro. Este encontro com ambos me reanimou a voltar a pensar na criação de letras
de canção, algo que sempre me apaixonou e a que raramente me dediquei. Tenho em
curso a ideia de gravação de um disco reunindo canções que fiz com oito parceiros.
MS Vários músicos e compositores são citados
em seus poemas e entrevistas. Vê relação entre a música que você escuta e o ritmo
e sonoridade de seus versos? Você se considera um poeta mais ligado ao som ou ao
sentido?
FM Jamais pensaria em separá-los. A música entrou
em minha vida primeiro do que qualquer outra expressão artística, porque meus pais
ouviam muita música em casa e música distinta entre si. Eu convivi muito pouco com
meus pais em um primeiro momento. Eu ficava mais na casa da minha avó materna e
ali não havia nada de música, mas sim umas telas curiosas na parede, umas naturezas
mortas em que peixes e frutas bailavam de uma maneira fascinante para mim. Quando
comecei a fazer colagens, essa época na casa de minha avó aflorou de tal maneira
que me pus a cortar e colar, em minúcias, o que anos depois reconheceria como uma
influência mágica das naturezas mortas belgas e holandesas do século XVIII. É interessante
observar que não cheguei ali, naquela técnica, por influência surrealista, mas sim
por um desdobramento espontâneo de quando ainda tinha algo em torno de 6 anos, em
que recortava figuras das páginas de gibis para lhes dar movimento. Diabos, Márcio,
vou te contar umas coisas aqui sobre música. Dois discos me desorbitaram de uma
maneira até hoje determinantes em minha poesia: Filmore East (1971), do Mothers of Invention e A música livre de Hermeto Pascoal (1973). Não havia mais rock ou jazz
propriamente em nenhum dos dois casos. Zappa e Hermeto haviam ousado na intromissão
de uma linguagem em outra. Impossível contar com uma dose tão radical de alquimia.
Era tudo o que eu precisava para sacramentar minha intuição em torno da mestiçagem
na criação. A vida é um entrecortado infinito de relações. Eu faço versos com a
vida inteira. Não estou fora de nada.
MS Sei que você é leitor de comics e aprecia quadrinhos, inclusive já
tendo chamado atenção pra influência deles na sua criação. Como se dá a relação
entre a literatura que você produz e os quadrinhos? Que aspectos você transpõe de
um formato para o outro?
FM Quando criança eu lia os clássicos da literatura
mundial adaptados para fotonovelas. Foram, de alguma maneira, meus primeiros gibis.
Casos como Os irmãos Karamazov, O Conde de Monte Cristo, O morro dos ventos uivantes, As viagens de Guliver, eu lia o romance e
sua adaptação para fotonovela. E logo algumas adaptações para telenovelas, como
no caso de O médico e o monstro. A sugestão
do traço, principal fonte de dinâmica da narrativa, nos gibis. A imagem em movimento,
no caso da adaptação cinematográfica. O efeito cenográfico no ambiente teatral.
A descrição, cortes, detalhes, mas sempre a palavra presente, ainda que sejam mudos
todos os personagens, na literatura. Quando escrevo não posso passar sem as palavras.
O que faço é aprender com outras linguagens como ser mais sutil e expressivo em
cada passagem de um poema. Mas algo em mim me leva também a pensar em fotos, maquetes,
vídeos, cenografia, canções, e quando estou desfrutando a obra alheia sempre faço
anotações de memória de aspectos que me permitam – um dia, um dia – realizar a soma
de estruturas, estilos, argumentos, que busco.
MS Em vários lugares você tem denunciado o que
chama de “provincianismo” da literatura brasileira. Em que consistiria esse provincianismo?
Sob quais aspectos podemos vê-lo manifestado?
FM Será mais fácil buscar uns poucos lugares
em que ele não se manifeste. E não é a literatura, pois aqui o plano é de ordem
cultural. O que é curioso é que a literatura seja uma expressão desse provincianismo
e não uma recusa ao mesmo. Há algo velado no país que é fazer a crítica de si mesmo.
O país não está aberto a um diálogo de observações sobre seus erros e acertos. Cada
bloco que consideramos como capítulo de nossa história é lacrado e não se pode voltar
a ele para apontar suas falhas. Não é que haja um decreto em tal direção, mas sim
que agimos como se houvesse. A velha distinção entre lei e ordem. Aqui a história
é a lei. E a lei naturalmente é escrita por um grupo de gente que zomba da ordem.
Trato metaforicamente do assunto, eu sei. Há pouca conversa sobre a constituição
de uma sociedade essencialmente mestiça como a brasileira. Poucos fazem ideia do
que houve com a drástica redução do componente indígena. Menos ainda do imenso componente
negro, a fatura angolana que nos foi passada e que evidencia mais intimidade entre
as duas culturas do que se possa sonhar ou aceitar atualmente. A equação básica
que resultou no preocupante traçado urbano das capitais brasileiras com um regime
social curiosamente definido a partir das favelas, onde ao Estado falta apenas admitir
que perdeu o controle dessa zona de guerra.
Diabos. Adiamos essa discussão eternamente. A literatura não é reflexo de uma sociedade.
Espera-se um pouco mais de um escritor. Podemos separar a filmografia do Woody Allen,
por exemplo, em duas instâncias: a sátira e a crônica. Hoje, que faz apenas a crônica,
indagamos, qualquer um admirador seu fora dos Estados Unidos: de que valeu tanta
sátira? O que deve uma sociedade à seu artista tem um papel idêntico ao que lhe
deve ele. Voltamos ao Brasil?
MS O catolicismo, religião dominante no Brasil,
sempre foi um elemento de base na formação das nossas elites intelectuais. Em alguns
lugares você tem se referido a esse fator de maneira bastante desfavorável. Quais
as consequências disso na nossa produção literária? Onde se encaixam aí os casos
de católicos anárquicos como Murilo Mendes e Jorge de Lima?
FM Não se trata de prejuízo literário. Tampouco
é uma questão de alimentar vitimário. Não gosto da ideia de Murilo Mendes e Jorge
de Lima serem postos como incompreendidos por um tipo de intelectual que até hoje
cisca em um galinheiro muito apropriado. Não. Foram evidências de uma condição medíocre
de nossa cultura, da sujeição aos ditames de capelinhas arregimentadas por gente
como Tristão de Athayde e Mário de Andrade, sem falar na leitura equívoca em relação
a ambos da parte de um crítico como Wilson Martins e em uma corja irrepreensível
de signatários que fez voto de fé de toda modalidade de autismo em nossa cultura,
igreja onde comungam concretistas e demais
insalubres vozeiros das vanguardas pós-tudo
(termo tão pomposo quanto inócuo). Interessante observar é que catolicismo atualmente
foi devorado por esse ecumenismo rock’n’roll às avessas, e ninguém encontra mais
motivo para contestar os argumentos tornados históricos. Resta como preocupação
real o que não entra na seara de interesses de nenhum escritor neste país: qual
literatura brasileira ensinamos às nossas crianças?
MS Você tem feito uma crítica forte ao que chama
“caráter trocadilhesco” da cultura brasileira, apontando inclusive fatores antropológicos
para isso. Podia delinear melhor essa ideia?
FM Sociedades burocráticas adoram siglas. Sociedades
que não se levam a sério adoram trocadilhos. O Brasil é uma mescla curiosa das duas
coisas. Quando criança ouvia dizer que IAPC significava Isto Ainda Pode Cair. São
inúmeras as siglas de órgãos públicos que foram convertidas em pilhéria. A veia
dos poemas-piadas surgidas no Modernismo foi a artéria mais concorrida de nosso
imaginário poético, com adeptos de toda ordem – basta pensar em José Paulo Paes
e Paulo Leminski – e um extenso monturo de livros. Veja o exemplo do humor produzido
para a televisão. O recurso ao duplo sentido, se recordarmos personagens clássicos
de Chico Anysio, enriquecia a leitura dos mesmos: a linguagem criava um jogo de
ambiguidade que a tornava mais sedutora. A piada tornou-se hoje um recurso apelativo
do leviano e do execrável, curiosamente em uma sociedade em que tudo é leviano e
execrável. Os poetas-piadas dos anos 70 são hoje os redatores dos programas de humor
da televisão. Este é o espírito. E sempre que alguém toca no tema surge alguém a
recordar aquela bobagem do Brasil não ser um país sério. Ou ainda pior: a interpretação
de que a voz crítica é a de um ressentido que por uma razão ou outra não participa
do rateio. Nisto o país é seríssimo.
MS Você menciona o Octavio Paz e o Milan Kundera
como ensaístas de sua predileção e leitura. O Octavio Paz é uma quase unanimidade,
enquanto o Kundera é mais conhecido por seus romances, alguns inclusive alvos de
críticas negativas. Como foi a descoberta desses autores? O que te interessa especificamente
na obra ensaística de cada um? Vê relação entre elas?
FM Vamos devagar que o andor é de barro, segundo
reza a ladainha popular. A minha predileção em relação a ambos diz respeito a temas.
O mexicano tratou da poesia com a mesma paixão reveladora que o checo tratou da
narrativa. São exemplares neste sentido. Vamos começar pela tua observação de que
um seja “mais conhecido” que o outro pela criação. Kundera não existia no Brasil
antes da adaptação de um romance seu para o cinema. Seu caso lembra um pouco o de
Italo Calvino, não pelo cinema. Uma súbita descoberta gerou um frisson que fez com que inúmeros livros fossem
publicados no Brasil. Passada a temporada, os mesmos títulos se acumulavam em prateleiras
de remarcados. Já o que se passou com Octavio Paz foi mais aparentado do ambiente
cult. As péssimas traduções de seus dois
livros mais difundidos entre nós, El arco
y la lira e Los hijos del limo são
bons fundamentos para o aprendiz de feiticeiro que se interesse pela poesia. Sua
poesia é menos fascinante que a trama analógica do ensaio. Mesmo quando se identifica
com a mitologia indiana – pelos anos que ali vive –, o que se percebe é que a ideia
da vacuidade já estava presente em sua poesia, em sua visão de mundo. Este é seu
mistério, sua fonte inesgotável de metáforas. Sob este prisma observa não só a poética,
mas também a política, em todos os seus ensaios. Sua leitura da poesia que lhe é
contemporânea é ambígua, quando menos, trate dos pares mexicanos ou hispano-americanos.
A visão crítica da narrativa em Milan Kundera é menos caprichosa. Contrapõe personagens,
verifica tensões na construção de ambientes que circulam da arquitetura da linguagem
à linguagem da arquitetura em romances fundamentais para a história do gênero no
ocidente. Há uma grande riqueza em sua observação de paralelismos entre as estruturas
narrativas no romance e na música erudita. Este foi um aspecto que me fascinou bastante.
Não entro no mérito das críticas negativas acerca dos romances de Kundera. O português
Saramago é frígido em sua narrativa. O italiano Umberto Eco é algébrico. Kundera
possui um grau de economia de linguagem que o tornaria melhor aluno de Calvino em
uma de suas aulas, se fosse o caso. Calvino, no entanto, era latino, e jamais conseguiu
ser tão econômico na linguagem quanto Kundera. Eu não teria a menor dúvida em incluir
o autor de A insustentável leveza do ser
entre os grandes romancistas europeus do século XX. Ao mesmo tempo, caso incluísse
a Octavio Paz entre os grandes poetas americanos do mesmo período, não o faria sem
antes me referir a aspectos renovadores e relevantes na poética de muitos de seus
pares.
MS Sua poesia tem uma forte relação com as artes
plásticas, expressando-se inclusive por meio de colagens. Como você dimensiona a
distinção entre os dois mundos? Se tocam, se afastam, se interpenetram? Poemas inspiram
colagens, colagens te impelem ao poema? Ou a coisa se dá de maneira mais indireta?
FM A grande ponte é a imagem. Não estou muito
de acordo em relação ao termo “colagem”. Sob dois aspectos. Houve um tempo em que
fiz colagens, no termo clássico: tesoura, cola, matrizes, descoberta de outro mundo
a partir de aproximações de elementos díspares. Logo passei a tratar com os recortes
cada vez mais minúsculos, que remetem à minha infância, seja pelos catálogos de
naturezas mortas que havia na casa de meu pai como também pelo fato de que eu gostava
de recortar as figuras dos gibis para manuseá-las tridimensionalmente, claro, com
a força imaginativa da infância. Passei então a usar a fotografia no sentido de
criar ângulos, formas, sombras, que pudesse eu mesmo recortar para o exercício ainda
convencional da colagem. A utilização mais íntima da fotografia me levou a deixar
de lado a colagem e passar a lidar com a sobreposição. Acho que até do ponto de
vista amoroso, a sobreposição é mais sugestiva que a colagem. Já não se trata de
provocação, mas sim de realização. Alquimia. A escritura de um poema não pode ser
vista como aquela coisa simplória de um papel em branco, um lápis e um devaneio
qualquer na cabeça. Todos nós escrevemos poemas assim. Ali está ele. Não importa
de onde veio. Até hoje não se sabe com certeza que importância possa ter isto na
vida. Vivemos em sociedades cada vez mais distantes da poesia, do mundo de descoberta,
fascinação e equilíbrio de diversidades que ela inspira. Qualquer jovem poeta evita
indagar a si mesmo por que rabisca aquelas imagens. Diante de um prato novo que
alguém sugere em um restaurante, olhamos e o interpretamos de maneiras diferentes: uns com o olfato, outros com a
visão, poucos se atrevem a provar antes de uma informação mínima e da aprovação
de algum desses sentidos. Os meus seis sentidos desconhecem qualquer fator hierárquico.
Nem pensemos no leitor. Como um poeta reage diante da poesia, distante da sua, de
outro que lhe é contemporâneo?
MS O
começo da busca saiu em 2002.
De lá para cá muita coisa aconteceu. Como você avalia a trajetória do livro até
agora? Avançamos algo com relação ao diálogo com os países hispano-americanos e
suas literaturas?
FM Mas este não é um livro dedicado ao diálogo
com as literaturas hispano-americanas e sim tocado pela necessidade de se criar
um ambiente de leitura e discussão da presença do surrealismo nessa parte do continente
americano. Evidente que ali também nos chama a atenção a absurda ausência de conhecimento,
da parte brasileira, em relação ao que se passa na fatia majoritária da América.
Mas chama essencialmente a atenção para a falta de conexão intercontinental, pois
o livro, embora tendo sido publicado no Brasil, não se limita aos problemas fronteiriços
internos. Trata do preconceito dirigido contra o surrealismo. Somos uma sociedade
com 200 milhões de habitantes. O livro teve uma tiragem de 1.000 exemplares. A editora
o deu por esgotada. Saíram resenhas em alguns importantes veículos de imprensa,
incluindo algumas entrevistas que me foram feitas, para revistas, jornais, rádio
e televisão, no Brasil e em alguns países hispano-americanos. Tudo até muito bonito
e surpreendente. Mas evidente que é uma trajetória ineficiente. Escolha ao acaso
algum poeta brasileiro e indague a ele sobre poetas hispano-americanos fora do circuito
das circunstâncias. As quatro primeiras décadas do século passado viram nascer,
na América Hispânica, algumas vozes fundamentais e que certamente teriam impedido
o nascimento ou ajudado a sepultar certa frivolidade da lírica brasileira. O sentido
inverso também teria algum valor, e livraríamos a lírica hispano-americana de certa
adiposidade metafórica. Body and soul.
O que torna esta uma belíssima canção é o espírito do conectivo. É isto o que falta
entre nós.
MS Seu mais recente trabalho na área da ensaística
literária chama-se Um pouco mais de surrealismo
não causará dano algum à realidade e deve ser publicado em 2011 no México e
na Venezuela. Que nova abordagem o livro traz ao assunto? Como está organizado?
Fale um pouco sobre ele.
FM O livro foi originalmente preparado como
parte do programa de um seminário que dei na Universidade de Cincinnati (Ohio, Estados
Unidos). O seminário foi um pouco mais abrangente, porque tratava também da plástica
e do surrealismo na Europa. Resolvi dar a ele uma espécie de leitura final, de minha
parte, em relação ao tema, especificamente no que diz respeito ao continente americano.
O tema não tem fim se nos dedicamos a considerar as tolices escritas a respeito.
A pior delas é justamente a que não entende a distinção entre dois mundos que separa
Europa e América. Observa o entendimento do poeta inglês, A. Alvarez: “Embora as
polêmicas e teorias surrealistas fossem consistentemente mais extremadas do que
a sua prática, que muitas vezes era apenas decorativa, o surrealismo, ainda assim,
mudou a maneira pela qual o mundo é percebido”. Agora olha um outro poeta, o mexicano
José Emilio Pacheco, o que ele diz: “o surrealismo não foi adotado como uma tendência
exclusiva pelos jovens que então o descobriram, mas sim como um elemento natural
e imprescindível na visão das coisas e na retórica do ofício que estão na base dos
livros que fizeram a literatura mexicana dos anos 60” . A combinatória dessas duas
visões já nos insulta a escrever outro livro. Pacheco parece querer do surrealismo
o que ele jamais poderia dar. A crítica feita por Alvarez jamais poderia se aplicar
ao surrealismo na América (naturalmente não cabe aqui falar nos equívocos de toda
ortodoxia). Que tolice falar em “tendência exclusiva” ou “elemento natural” quando
o tema essencial é a criação artística. O surrealismo na América é imperativamente
uma poética. E neste sentido trouxe à lírica de cada país enriquecimento que ainda
está por merecer uma leitura limpa. Vejamos agora o que disse o argentino Ernesto
Sábato: “Era necessário o terrorismo dos surrealistas para empreender qualquer empresa
de reconstrução”. Não havia necessidade de reconstruir algo na América nos anos
20, século XX. Quando atingimos o ponto da reconstrução, quatro décadas depois,
o “terrorismo” dos anos 60, o surrealismo já então era interpretado como fora de
área, zona vencida pelo tempo. O que faço em meu livro é tentar mostrar um mapa
sem preconceito de duas formas de identificação americana com o surrealismo. A relação
entre magia e cartesianismo, como a encontramos na lírica americana, por exemplo,
é impensável sob a ótica europeia. O que é mito para uma cultura é mera bugiganga
para outra. Interpretar o surrealismo por essa ótica é o mesmo que explicar o mundo
unicamente pelo relato do escrivão de frota dos conquistadores.
Entrevista concedida a Márcio Simões. Realizada através
de trocas de e-mail entre Sidney
e Natal, dezembro de 2010, janeiro de 2011. Foto do poeta, Natal, 2010 © Márcio
Simões. MÁRCIO SIMÕES (Brasil, 1979). Poeta e tradutor. Autor dos livros O Pastoreio do Boi (2008) e Fúrias de Orfeu (2017). Fundou e dirige o
selo Sol Negro Edições.
Colagens
reproduzidas nesta página:
1990 A partitura extraviada
1990 O lobo e o pastor
1996 Um livro de Ângela
1997 Noites rastejantes
*****
Organização
a cargo de Márcio Simões e Floriano Martins © 2017 ARC Edições
Artista convidado
| Floriano Martins
Imagens ©
Acervo Resto do Mundo
Esta edição
integra o projeto de séries especiais da Agulha Revista de Cultura, assim
estruturado:
1 PRIMEIRA
ANTOLOGIA ARC FASE I (1999-2009)
2 VIAGENS
DO SURREALISMO, I
3 O RIO DA
MEMÓRIA, I
4 VANGUARDAS
NO SÉCULO XX
5 VOZES POÉTICAS
6 PROJETO
EDITORIAL BANDA HISPÂNICA
7 VIAGENS
DO SURREALISMO, II
8 O RIO DA
MEMÓRIA, II
9 SEGUNDA
ANTOLOGIA ARC FASE I (1999-2009)
A Agulha
Revista de Cultura teve em sua primeira fase a coordenação editorial de Floriano
Martins e Claudio Willer, tendo sido hospedada no portal Jornal de Poesia. No biênio
2010-2011 restringiu seu ambiente ao mundo de língua espanhola, sob o título de
Agulha Hispânica, sob a coordenação editorial apenas de Floriano Martins. Desde
2012 retoma seu projeto original, desta vez sob a coordenação editorial de Floriano
Martins e Márcio Simões.
Visite a nossa
loja
Nenhum comentário:
Postar um comentário