Ao falar sobre a obra do escultor Paulo Aguinsky, é imprescindível
que se faça um retrospecto comentando brevemente sobre a origem primordial do artista
Paulo Aguinsky. Natural de São Borja, cidade localizada no extremo oeste do rio
Grande do Sul, na fronteira com a Argentina, separada geograficamente pelo rio Uruguai.
Se um rio é um bom divisor físico de fronteiras, por outro lado, do ponto de vista
de influências e trocas culturais, que por ventura possam se estabelecer entre os
povos vizinhos, este divisor pode ser pouco representativo; pois desde os mais simples
hábitos são exportados e importados passando inevitavelmente por adesões de vocábulos,
costumes, forma de selecionar e preparar alimentos, etc. sem entrar em detalhes
sobre a assimilação de conceitos, pendores pelas mesmas músicas, das artes e festas
que se fundem e multiplicam. De maneira geral os fronteiriços organizam-se de forma
subliminar em uma irmandade particular, porém muito própria para cada região.
Paulo Aguinsky nasceu em 1942, final da segunda guerra mundial em que a efervescência
deste fato deixou profundas chagas comprometendo de forma global todos os povos,
mesmo aqueles que estavam muito distante do conflito. Paulo Aguinsky, neto de imigrantes,
tanto por parte de pai como de mãe, oriundos da Europa, escaparam das atrocidades
do nazismo e vieram para a América do Sul, precisamente Argentina e Brasil. Eram
agrupamentos de pessoas com formação diferente, conhecimentos diversos, alguns técnicos
em vários setores do comércio e da indústria. Artistas, entre estes, tios de Paulo
Aguinsky; músicos profissionais em sua terra natal, que prontos, chegados a Buenos
Aires trataram de logo arrumar um pseudônimo portenho, e “seguiram o baile”; formaram
uma orquestra, adaptando-se ao gosto e predileções do meio cultural, obtendo desta
arte meio de sobrevivência dentro do setor musical. Tendo a boa sorte de atuar naquilo
que faziam de melhor.
Nesta época os meios de comunicação
eram precários no Brasil e ainda mais contundentes em lugares distantes dos grandes
centros como Rio de Janeiro e São Paulo. Distante até mesmo era Porto Alegre. O
sinal de rádio somente era exequível nos dias límpidos em todo o estado. (Sem comentar
a extensa e prestimosa antena acessória; um robusto fio de cobre em espiral que
serpeava no teto da sala de um extremo a outro).
As falas em português com frequência estavam naturalmente assistidas por
vocábulos da língua espanhola – o consagrado “portunhol”, falado sem preconceito,
não só lá na São Borja mas em quase toda a estendida fronteira do Brasil.
Terminadas as aulas da manhã, a tarde era livre: correr nos campos vizinhos,
caçar passarinhos com bodoque, banhar-se nos açudes; longe dos olhos do pai e da
mãe nada era proibido. Nos fins de semana ir pescar piavas no rio Uruguai com o
pai era uma expectativa que crescia a cada dia durante a semana.
Das atividades culturais, talvez a
mais marcante da infância de Paulo Aguinsky, tenham sido as “as trovas”, evento
domingueiro esperado com ansiedade que ocorria no auditório da pequena rádio local
da cidade. Os trovadores que se desafiavam deviam reunir, entre tantos assuntos
um elemento fundamental que os qualificava e que gerava grande entusiasmo entre
os ouvintes pela capacidade que dispunham os contendedores de improvisarem respostas
surpreendentes, em versos rimados, com tanta rapidez e precisão! As trovas na escola, durante a hora do “recreio grande”
era um dos ‘brinquedos preferidos, formado com platéia e tudo. Aguinsky e seu colega
Jucata formavam uma dupla de protagonistas trovadores; dos mais entusiastas e aguardados
pelejadores. Se tomarmos como ponto de vista a necessidade de sinalizar um marco
que possa identificar um indivíduo com um artista, diríamos que “a trova”, para
o menino Paulo Aguinsky foi a chama inicial que se ascendeu
para a sua arte, e, é a mesma luz que perdura e o ilumina até os dias atuais, quer
na poesia quer nas artes plásticas – O continuado poder de criar e improvisar.
Uma vez que se possua ou se adquira
a capacidade de improvisar, expandem-se as funções que ultrapassam os limites daquilo
que entendemos do que é real. A vida é algo que ignoramos sua verdadeira natureza
e, aquilo que poderemos denominar de arte, nada mais é que uma necessidade do compartir,
é a expressão elevada do arrebatamento, a possibilidade de pôr à vista os mais genuínos
dos relacionamentos humanos. Aos onze anos de idade Paulo Aguinsky foi matriculado
em um internato em Porto Alegre, (era costume na época, dadas as deficiências do
ensino nas cidades interioranas), e o que ocorria já no primeiro grau. As famílias
que dispunham de condições encaminhavam os filhos para outros centros com mais recursos.
Assim, para o “Paulinho”, como era chamado por todos, conteve seu derradeiro adeus
as caçadas de bodoque, aos banhos de açúde, as pescarias de piavas no rio Uruguai
com o pai, adeus brincadeiras, amigos, trovas… Adeus São Borja.
Uma criança separada de seu reduto familiar onde brinca e interage com o
meio ambiente através de seus brinquedos e brincadeiras com os amigos; vê seu mundo
ruir. A separação dos pais, e de tudo de importante que existe na vida de uma criança;
impinge um grande sofrimento. Configura-se como uma perda implacável, por mais objetiva
e nobre que possa parecer a intenção de quem determina tal ato.
Paulo Aguinsky partiu para o internato com o número “106” bordado em todos
os seus pertences, uma identificação particular, ditame predeterminado, administrativamente
da
escola.Em um internato, que pela sua natureza, recebe estudantes dos mais diferentes rincões, com alunos oriundos das mais variadas e diversificadas formações culturais, torna-se muito difícil, a qualquer recém chegado uma adaptação imediata.
escola.Em um internato, que pela sua natureza, recebe estudantes dos mais diferentes rincões, com alunos oriundos das mais variadas e diversificadas formações culturais, torna-se muito difícil, a qualquer recém chegado uma adaptação imediata.
Na busca por encontrar uma relação
com o novo ambiente, novos amigos, na cata de uma lacuna, de algo que lhe permitisse
“respirar”; Aguinsky, descobriu nos novos livros do currículo a poesia; “eram muito
parecidas com as trovas, mas escritas” e podiam ser relidas infinitamente. De imediato,
tomou-as como seu novo brinquedo. Também a declamação, que a escola tinha como prática
corrente em suas atividades sociais lhe criaram grande alento. Passou a escrever
poemas e publicá-los no jornal da escola, por anos praticou intensamente esporte
e teatro. Conheceu a cerâmica e, de forma autodidata, passou juntamente com a poesia
a dar grande destaque em sua vida a estas duas atividades. Esta foi a forma encontrada
pelo artista para dar vazão à sua espontaneidade, à sua criatividade, à sua capacidade
de improvisar e expressar-se através da arte. Ao formar-se no segundo grau, pensou
fazer o curso de belas artes na Faculdade de Belas Arte em Porto Alegre, mas ficou
inseguro ao perceber a vida de dificuldades que levavam os artistas plásticos de
uma maneira geral na cidade e no Brasil. Pensou que uma profissão bem estabelecida,
que lhe oferecesse condições de continuar realizando sua arte livre, independente
dos aspectos econômicos que tanto desencaminham o trabalho artístico. Formou-se
em medicina em 1972.
SANDRA REGINA SCHERER AGUINSKY (Brasil). Arquiteta e curadora. Professora na URGS. Página ilustrada com
obras de Paulo Aguinsky (Brasil), artista convidado da presente edição.
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Agulha Revista de Cultura
Número 105 | Dezembro de
2017
editor geral | FLORIANO MARTINS
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editor assistente | MÁRCIO
SIMÕES | mxsimoes@hotmail.com
logo & design | FLORIANO
MARTINS
revisão de textos & difusão
| FLORIANO MARTINS | MÁRCIO SIMÕES
equipe de tradução
ALLAN VIDIGAL | ECLAIR ANTONIO ALMEIDA FILHO | FEDERICO RIVERO SCARANI | MILENE MORAES
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todos os direitos reservados © triunfo produções ltda.
CNPJ 02.081.443/0001-80
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