Passo pela rue Honoré-Chevalier, cansado como um peregrino pobre, chego à rue Cassette e busco o número 59, onde aquele magnífico poeta nasceu, em 11 de dezembro de 1810. A rua termina no 31 e esbarra na rue de Vaugirard. Dali para adiante é chamada Jean Bart, começando pelo número 1. Esse é um caso de numeração que foi alterada. Impossível localizar o prédio onde Alfred de Musset nasceu. Sei, no entanto, que ele percorria aquelas ruas para chegar ao Collège Royal Henri IV, na rue Clovis, onde estudou na infância.
Musset morou na rue de Grenelle 59, de 1824 a 1830, nos tempos em que estudou nas Faculdades de Direito, na place du Panthéon e de Medicina, na rue de l’École-de-Médecine, as quais abandonou, sendo admitido à École des Beaux-Arts, em 1828.
Fui ao
local e vi a placa na qual se informa que o poeta ali viveu. Uma senhora, sob o
grande portal daquele palácio ornado de belas estátuas, me explica que atualmente
funciona ali o Musée Mailol. A residência do poeta foi adaptada à nova arquitetura
do museu. As dependências do seu antigo apartamento já não existem.
Foi em
1828 que Musset promoveu um recital para uma plateia constituída de grandes escritores
e leu, entre outros, estes versos de Contes
d’Espagne et d’Italie, seu primeiro livro, editado em 1830:
C’est le temps de la ville Oh!
Lorsque l’an dernier
J’y revins, que je vis ce bon
Louvre et son dôme,
Paris et sa fumée, et tout ce
beau royaume.
(J’entends encore au vent les
postillons crier).
Pelo ano
de 1830, Musset começa a publicar seus poemas na Revue de Paris e, desde 1833, os divulga na renomeada Revue des Deux Mondes. Era o tempo em que
ele percorria, em cabriolet, as ruas iluminadas com lanternas a gás para visitar
o salão da rica Delphine de Gerardin, onde conheceu Liszt, Rossini e Chopin. Frequentava,
também, o café Anglais, no boulevard des Italiens, esquina com a rue Marivaux, e
o café de la Régence, na galeria do Palais Royal. Musset costumava acompanhar Victor
Hugo nas escaladas às torres de Notre-Dame, para contemplar o pôr do sol.
Na continuação
da rue du faubourg de Montmartre, ao cruzar o boulevard Poissonnière, vislumbro,
à direita, a passage des Panoramas e, de pronto, estou no cruzamento das rues Montmartre,
Feydeau e Saint-Marc. Vou pela rue Saint-Marc, onde aparece do outro lado a passage
des Panoramas. As calçadas são estreitas para tanta gente que anda apressadamente,
de modo que, ao escrever estas linhas, em pé, preciso estar atento para não esbarrar
nalgum semelhante. Alguns passam raspando em mim. Esquivo-me e continuo. É preciso
saber manobrar com pouco espaço.
Na rue
de Favart, avisto os paredões do Opéra-Comique e, adiante, o boulevard des Italiens,
à esquerda da qual vejo, na esquina com a rue de Marivaux, o restaurante Le Marivaux,
antigo café Anglais, refúgio sentimental de Alfred de Musset. Decorado com luzes
de Natal, neste dezembro de festas, o estabelecimento fica exatamente atrás do avoengo
e grandioso Opéra-Comique.
Por uma
coincidência feliz, assisti, à noite, no Opéra-Comique, à ópera Fortunio, de autoria
de André Messager, criada em 1907, e inspirada na peça Le Chandelier, de Alfred
de Musset.
Dandy,
inventor de fantasias, jogral e jogador, Alfred semeava idílios nas alcovas de mulheres
aristocratas, de atrizes e de senhoritas das maisons de tolérance. Escrevia, fervorosamente, tendo sua estreia na
dramaturgia ocorrido em 1830, com a encenação da peça La nuit vénitienne, no Théâtre de l’Odéon. Os temas italianos o apaixonaram
sempre.
Apesar
de o público haver recebido essa peça friamente, em 1830, no Théâtre de l’Odéon,
Musset recebeu, naquela noite, o maior testemunho de admiração jamais vivido. Quando
ele adentrava o teatro, ao atirar ao chão o resto de um cigarro, viu um jovem recolher
num papel a ponta do cigarro, como uma relíquia preciosa. Assim conta o seu irmão
Paul de Musset, na famosa Biographie por
ele escrita.
Naquela
Paris de tantos flirts e amores fortuitos,
onde cortejava duquesas e atrizes e frequentava os banhos chineses (les bains Chinois)
no boulevard des nº. 27, Alfred de Musset se sentia, no entanto, só. Encharcava-se
de absinto, misturado com cerveja, e se refugiava no jardin du Luxembourg ou no
jardin des Plantes. De fato, em seu soneto Une promenade au
jardin des plantes, ele diz, logo de início: Sous ces arbres chéris, où j’allais à mon tour/pour cueillir, en passant,
seul, un brin de verveine.
Os tais
banhos chineses ficavam num edifício, atualmente residencial, de portal em arco
e pátio retangular, onde vi bicicletas e motos estacionadas, restaurantes, um ateliê
de quadros, uma clínica odontológica, uns velhos candelabros e um chão de pedras
que falam da antiguidade e das mudanças que o tempo lhes impôs. No lado direito
da entrada do pátio, há, na altura do segundo andar, um pedaço de mármore escuro
que provém de tempo anterior ao do resto da fachada. Na parte baixa, de ambos lados,
há dois restaurantes populares: uma pizzaria e um especializado em yakisoba, (culinária chinesa, disfarçada
de japonesa). Entro no yakisoba e almoço.
Regresso, em seguida, pelo boulevard Haussmann e uma surpresa se afigura na esquina
da rue Laffitte, no final da perspectiva: a feérica visão da basílica do Sacré-Coeur,
tendo aos pés, em distância mais próxima, as colunas de Notre-Dame-de-Lorette.
No seguimento
do boulevard des Italiens, vejo o Gaumont Opéra, na esquina onde essa artéria urbana
passa a se chamar de boulevard des Capucines.
O notável
desempenho de Musset na criação dramatúrgica lhe engrandece a obra literária. Não
obstante sua decepção inicial com o metiê cênico, as peças seguintes que ele escreveu
foram objeto de reiterados elogios por parte da crítica especializada. André del Sarto, o grande pintor italiano
que trabalhou na corte francesa de François I, é objeto de uma de suas peças mais
admiradas. Na fabulação de Musset, a fatalidade se abate sobre o artista em seu
ateliê em Florença, quando é traído pela esposa e pelo discípulo Cordiani, desventura
que o induz ao suicídio. A realidade histórica é outra. Andrea del Sarto era escravo
de uma mulher, cuja beleza o subjugava. Não cometeu suicídio: morreu de peste aos
42 anos, em 1531.
A peça
de Alfred foi publicada em abril de 1833, na Revue des Deux Mondes. Somente quinze anos depois é que os diretores
de teatro descobrem Musset e encenam, sucessivamente, na Comédie Française, Un Caprice, em 1847, e mais três peças, em
1848: Il ne faut jurer de rien, Il faut qu’une porte soit ouverte ou fermée
e Le Chadelier, esta representada no Théâtre-Historique.
Em nova versão apresentada em 1850, no Odéon, Musset retoca André del Sarto, fazendo morrerem Cordiani
e André.
Théophile
Gautier, o mais entusiasta de seus incentivadores, é pródigo em elogiar-lhe o estro. Un Caprice era, para Gautier, a obra mais
fina, mais delicada e mais graciosa que a Comédie-Française produzira desde o tempo
de Marivaux (1688-1767). Quanto a Lorenzaccio,
escrita por Musset na idade de 20 anos, tratava-se de um chef-d’oeuvre que lembra as profundas análises de Shakespeare.
Lorenzaccio é ambientada em Florença, quando a cidade está ocupada pelas
tropas do imperador Carlos V, que instalou no trono, em 1537, o duque Alexandre
Médici, um tirano que rivaliza com seus adversários da família Strozzis. Seu primo
Lorenzo toma o partido dos rivais dos Médicis e, para vingar a prisão dos filhos
de Philippe Strozzi, assassina o duque Alexandre. Morto o tirano, o Conselho dos
Oito elege Cosme de Médici, que assume o governo de Florença, jurando fidelidade
a Carlos V. Lorenzo é, por fim, assassinado pelos fiéis à aristocracia dos Médicis.
A peça só foi montada em 1896, no Théâtre de la Renaissance, por Sarah Bernhardt,
30 anos depois da morte de Musset.
O tédio
da vida e a melancolia sofrida com a morte do pai foram curados por Musset à base
de música, leitura, absinto e cerveja. Leitor entusiasta de Leopardi, Petrarca e
Casanova, espectador dos concertos do Opéra e do Théâtre Italien, Musset escrevera
obras maravilhosas sobre a Itália, antes de visitar o país de seus devaneios. Contes d’Espagne et d’Italie, La nuit vénitienne, André del Sarto e Lorenzaccio
perfazem uma lista de obras-primas que comprovam esse fenômeno extraordinário.
Seus estudos
de cultura italiana suscitaram-lhe o desejo extremo de ir à Itália, viagem que realizou
na companhia de George Sand (Amandine Aurore Lucile Dupin, baronesa de Dudevant).
O namoro com Sand, então jovem escritora que publicava na Revue des Deux-Mondes começou no restaurante Les Trois Frères, na galeria
do Palais-Royal. Um dia, passeando pelos jardins de Paris, ele aos 23 anos, e ela
aos 29, (então casada com o barão Casimir Dudevant, e acompanhada dos filhos) decidiram
viajar juntos a Veneza.
George
Sand, mulher decidida, independente, vai à rue Grenelle, nº 59 e pede à mãe de Alfred,
Madame Edmée, licença para viajar com o poeta, do qual cuidaria com afeição materna.
O casal parte, no inverno de 1833 e a aventura termina com uma febre quase mortal
de Musset, que regressou a Paris, em abril de 1824, debilitado e deprimido. George
Sand, que já tivera alguns amantes, inclusive Prosper Mérimée (célebre autor do
livro Carmen, que deu ensejo à ópera de
igual título, da autoria de Georges Bizet), amasiara-se com o Dr. Pagello, médico
de Alfred, em pleno hotel Danieli, diante do fantástico Grand Canal veneziano.
Por sua
parte, conquanto sofresse desbragadamente a frustração do namoro com a escritora,
Alfred não baixou o tom de suas aventuras. Reatou o romance com Sand no ano seguinte,
porém logo aconteceu a ruptura definitiva. Diversos novos relacionamentos, com muitas
garotas, saciavam parcialmente sua sede de amor. Ninon, por exemplo, à qual ele
dedica as Stances (Je regarde le ciel, Ninon, et je vous vois)
era Marie Nodier, filha de Charles Nodier, o talentoso contista que dirigia a Bibliothéque
de l’Arsenal, onde promovia animados saraus poéticos. Segundo Paul de Musset, essa
musa, que morava na rue de Buci, foi também a inspiradora do poema Nuit de Décembre e também da novela Emmeline.
Fui ao quai Voltaire, número 25, e fotografei
o endereço onde Musset viveu de 1834 a 1849. O tempo talvez não tenha desfigurado
significativamente a formosa fachada clara do grandioso edifício de belo balcão
central e grandes janelas retangulares. No mesmo prédio, além da placa indicativa
de que o poeta ali habitou, outra informa que viveu também, de 1939 a 1972, Henry
de Motherland, que foi membro da Academia Francesa.
Na continuação
do quai Voltaire, em direção a Saint-Michel e à Île de la Cité, chego ao quai Malaquais
19, onde estava situada a “mansarde bleue”, ninho dos amores do casal romântico
George e Alfred. A placa, sobre alto e amplo portal verde, revela que George Sand
viveu ali de 1832 a 1836. Noutra placa, quatro números antes, se informa que ali
residiu Anatole France.
No quai
Malaquais, após haver visitado o local onde morou George Sand, medito à margem do
Sena. Passa o rio como se não passasse. Deixa
fluir o sereno ondular. Ele passa por mim, e eu por ele, sem que nos encontremos
no passeio. Existimos, porém, no mesmo hábitat, sob os arcos das pontes de cimento
e a celestial abóbada do espaço, viajantes de um destino misterioso.
Sento-me
à sombra, feito uma criança e me descalço para melhor sentir a energia que nos alimenta.
Porque o Sena corre, abraçando o chão e eu respiro com ele o ar vertente que nos
reúne no afã de viver.
Tive o prazer de ler Le fils du Titien o mais vagarosamente possível
para que a satisfação da leitura não acabasse depressa. O relato, que tem lugar
em Veneza, é uma réplica do romance de Alfred de Musset e George Sand. Enquanto
Béatrice quer alçar o jovem amante aos píncaros da Arte, Pippo sacrifica a arte
pelo amor.
O tempo histórico da narrativa é fevereiro
de 1850. Pippo, ou Tizianello, tem 25 anos e vive nas proximidades da Riva degli
Schiavoni e do palácio Nani. Perambula naquele sestiere veneziano, arrastando sua espada e trajando sua capa, sob os
raios da lua, que se reclina por trás da ilha Giudecca. A aurora doura o palácio
ducal. Uma mulher, com aspecto de femme de
chambre, entrega a Pippo um estranho presente: uma bolsa de veludo, bordada
de ouro e se retira sem nada dizer. Ele desconfia que aquela peripécia provém de
Monna Bianchina, uma bela namorada que Pippo abandonara.
A signora Dorothée, madrinha do Tizianello, revela-se como a remetente
da tal bolsa aveludada, cuja utilidade principal era trazer ao afilhado grande sorte
nas jogatinas do salão da condessa Orsini, que ele frequentava, jogador inveterado.
A signora Dorothée assegura ao rapaz que
a pessoa que confeccionara o aquele presente é uma das mulheres mais nobres e belas
de Veneza.
Béatrice Loredano, viúva do procurateur
Donato, era a mulher que presenteara Pippo com a bolsa bordada em ouro, após haver
contemplado um quadro (o único de Tizianello) e se encantar com o talento do jovem
artista. Naquele século de Júlio II e Leão X, a pintura era uma religião para os
artistas e uma glória para a Itália.
Depois de conhecer Béatrice Donato,
Pippo deixa de frequentar o salão da condessa Orsini, onde as apostas e os amores
se mesclavam em sua vida de sedutor de belas damas. Ele passava a metade do dia
com sua maîtresse e a outra metade a olhar
o mar e a beber vinho de Samos num cabaré da ilha de Lido. Como o preconceito social
pesava sobre a união de uma mulher da nobreza com um pintor, o casal não se expunha
publicamente. Em vez de percorrerem os labirintos de Veneza, que para Alfred de
Musset é a patrie du plaisir, aqueles
apaixonados amantes vogavam em gôndola ao redor da ilha dos Armênios, entre o céu
e o mar, sob o plenilúnio que ilumina os amores.
Béatrice insiste no projeto de fazer
do filho de Ticiano o sucessor do pai, que fora o rei dos artistas. Tizianello pintara
apenas um magnífico quadro, que um incêndio destruíra, no palácio Dolfin. Embora
dotado de extremo talento, não interessava ao artista prosseguir na carreira de
pintor. A amante consegue convencê-lo a reduzir as horas de ócio para pintar-lhe
o retrato e pousa com seu vestido de tafetá, ornada de joias, como a Vênus coroada, do pintor italiano Páris Bordonne.
Do ponto de vista de Béatrice, Pippo
personificava o conflito entre o talento e a preguiça. Pippo, por sua vez, acredita
que não vale a pena tentar ombrear-se à grandeza de seu pai. Tampouco estava seguro
de que seria possível algum pintor superar o retumbante êxito do velho Vecellio.
Entre os pintores, apenas Rubens fora tão atrevido quanto Ticiano, imenso artista.
Tizianello sentia-se pleno com as graças que Deus lhe outorgara: a riqueza e uma
mulher bonita que o amava.
Conquanto o jogo e a vida boêmia o
enfeitiçassem, Pippo aceita o desafio de trabalhar um pouco todos os dias e até
concebe o projeto de produzir uma tela que represente Raphael, no Campo Vaccino,
em Roma, momentos antes da morte daquele mestre, no ano de 1520, aos 37 anos.
Um certo Tito, pintor menor, parente
longínquo de Ticiano, adotara o nome artístico de Tizianello, para fazer-se passar
por herdeiro de Ticiano. Um dia, ao visitar o Convento dos Servitas, Pippo o encontra
e chuta a base do andaime em que subira o pretenso Tizianello. Em consequência,
o usurpador oscila, perde o equilíbrio e cai no meio de suas tintas das quais ficou
manchado da mais estranha maneira.
Os adversários teriam duelado ali
mesmo, sob os portais do templo, se um sacerdote não tivesse apartado a briga. O
impostor se diz ameaçado de morte e os circunstantes quase acreditam. Contudo, Pippo
se identifica como filho de Ticiano e aplica ao farsante uma lição de moral, recriminado-o
por usar indevidamente o nome do glorioso pintor.
De volta a casa, o artista termina a linda tela
que retrata a beleza de sua musa e a intitula Vénus amoureuse. Escreve também um soneto, em que louva os encantos
de Béatrice e declara ser aquele seu último quadro, o qual, por mais belo que seja,
não vale um beijo do modelo.
Musset se inspirou em sua namorada,
Aimée d’Alton, para criar o modelo de Béatrice. O idílio vivido com Aimée não foi
longo. Ele se apaixonou, em seguida, pelas atrizes Rachel e Pauline Garcia, vinculadas
ao Théâtre-Italien.
Da imensa admiração de Musset pela
terra de Dante, ficaram tantos registros que seria difícil comentá-los aqui. Menciono,
entretanto, o mais belo poema que li sobre Veneza, que consta nos Contes d’Espagne et d’Italie. Em suas estrofes,
mormente no final do poema, ao referir-se às lágrimas que lhe custaram a volúpia,
percebe-se uma espécie de profecia do que ele viveria, quase cinco anos depois,
quando visitou Veneza com George Sand:
Dans Venise la rouge,
Pas un bateau qui bouge,
Pas un pêcheur dans l’eau,
Pas un falot.
Seul, assis à la grève,
Le grand lion soulève,
Sur l’horizon serein,
Son pied d’airain.
Autour de lui, par groupes,
Navires et chaloupes,
Pareils à des hérons
Couchés en ronds,
Dorment sur l’eau qui
fume,
Et croisent dans la
brume,
En légers tourbillons,
Leurs pavillons.
La lune qui s’efface
Couvre son front qui
passe
D’un nuage étoilé
Demi-voilé.
Ainsi, la dame abbesse
De Sainte-Croix rabaisse
Sa cape aux larges plis
Sur son surplis.
Et les palais antiques,
Et les graves portiques,
Et les blancs escaliers
Des chevaliers,
Et les ponts, et les
rues,
Et les mornes statues,
Et le golfe mouvant
Qui tremble au vent,
Tout se tait, fors les
gardes
Aux longues hallebardes,
Qui veillent aux créneaux
Des arsenaux.
Ah ! maintenant plus
d’une
Attend, au clair de
lune,
Quelque jeune muguet,
L’oreille au guet.
Pour le bal qu’on prépare,
Plus d’une qui se pare,
Met devant son miroir
Le masque noir.
Sur sa couche embaumée,
La Vanina pâmée
Presse encor son amant,
En s’endormant;
Et Narcissa, la folle,
Au fond de sa gondole,
S’oublie en un festin
Jusqu’au matin.
Et qui, dans l’Italie,
N’a son grain de folie?
Qui ne garde aux amours
Ses plus beaux jours?
Laissons la vieille
horloge,
Au palais du vieux doge,
Lui compter de ses nuits
Les longs ennuis.
Comptons plutôt, ma
belle,
Sur ta bouche rebelle
Tant de baisers donnés…
Ou pardonnés.
Comptons plutôt tes
charmes,
Comptons les douces
larmes,
Qu’à nos yeux a coûté
La volupté!
Alfred
de Musset foi nomeado bibliotecário do Ministério da Instrução, em 1838. Por detestar
o ofício burocrático, o poeta se ausentava sempre de seu gabinete, ao longo do expediente
diário. Certos dias, nem sequer comparecia ao trabalho. Em 1843, posto a serviço
da Guarda Nacional, Alfred negligencia suas funções e chega a ser punido com alguns
dias de prisão. O sucesso no teatro viria a recompensar aquelas agruras dos empregos
nas tirânicas instituições do Estado. Repercutiram, favoravelmente, as peças André del Sarto, Le Chandelier, On ne badine pas
avec l’amour e Il ne faut jurer de rien,
apresentadas, sucessivamente, no Théâtre-Français (antigo nome da Comédie-Française).
Musset recebe a Légion d’Honneur em 1845
e é eleito para a Académie Française em 1852, depois do sucesso de Les Caprices de Marianne, publicada na Revue des Deux Mondes em 1833 e apresentada
no Théâtre Français em 1852. Nessa fase de sua maturidade existencial, o alcoolismo
e o tabagismo agravaram-lhe a doença dos pulmões. Sua irmã Marcelline ocupou-se
do poeta, nos derradeiros anos em que a saúde de Musset se foi debilitando gradualmente.
Sigo,
de manhã, em direção à rue Mont-Thabor, o derradeiro domicílio de Musset. Depois
de Opéra, o metrô para de repente, antes da estação Madeleine. E não há qualquer
explicação por parte do condutor. Silêncio. Algumas pessoas conversam. São 13h30.
Ouvem-se passos do lado de fora, nos trilhos. Calor e penumbra.
Algumas pessoas falam
baixo para não demonstrar preocupação. Duas mulheres, sentadas à minha frente, abanam-se.
Ouvem-se, novamente, passos do lado de fora do trem, como alguém voltando do lugar
aonde ia. O escuro do lado de fora não deixa ver quem está ali. O trem vai lotado.
Algumas pessoas viajam em pé.
Num repente, acendem-se
as luzes e o motor volta a funcionar, depois de 11 minutos de interrupção. O trem
prossegue até Concorde, onde desço, com a sensação de quem se livra de um problema.
A rue du Mont-Thabor
é paralela à rue Rivoli e ao jardin des Tuileries, onde, numa noite de primavera,
sob os floridos castanheiros, Alfred de Musset escreveu La Nuit de Mai. Os prédios
da rua são largos e têm grandes janelas. O de aspecto mais antigo e de maiores janelas
é o de número 6, onde Musset morreu, no dia 2 de maio de 1857. O poeta prodígio
viveu somente sete anos nessa residência, cuja fachada denuncia que foi reformada.
Efetivamente, já se passaram 164 anos. Pergunto-me o que restou daquele tempo. Pelo
menos, há uma grande placa em honra à memória do poeta, que é uma das glórias da
literatura francesa. Ele faleceu, portanto, com 47 anos. A última ocasião em que
desfrutou da vida noturna de Paris foi no jantar a que comparecera, a convite do
príncipe Napoleão, no Palais-Royal. Desde então, já não saiu de seu leito de enfermo.
A rue du Mont-Thabor
começa na rue d’Alger. Por ela me encaminho ao jardin des Tuileries, onde é possível
desfrutar da tarde que o Sol aquece de luz. É preciso sentar um momento à sombra
do arvoredo para prosseguir. Os tetos de Paris são cinzentos, cor de melancolia.
Árvores verdes e céu azul alegram o instante.
Agulha Revista de Cultura
Número 225 | março de 2023
Artista convidada: Briget Bate Tichenor (França, 1917-1990)
editor | FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
editora | ELYS REGINA ZILS | elysre@gmail.com
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