domingo, 15 de setembro de 2024

VIVIANE DE SANTANA PAULO | Surrealismo Alemão

 


Os movimentos expressionista – iniciado na Alemanha a partir de 1905 – e surrealista – na França por volta de 1920 – possuem semelhanças entre si. Os temas da época como a guerra, a vida na cidade, o medo da perda de identidade e decadência geral caracterizavam as obras dos escritores expressionistas. E assim como os surrealistas, os representantes do expressionismo não se importavam com a compreensão do texto. Enfatizavam o acontecimento sem construir um caminho racional e evidente. Desta forma, não raro, autores de língua alemã foram muitas vezes classificados de expressionistas, e não surrealistas.

Nomes como Elisabeth Langgässer, Ernst Jünger, Egon Vietta, Rudolf Schlichter e outros receberam o rótulo de surrealista ao longo do tempo. No entanto, pesquisadores chegaram à conclusão de ser mais apropriado chamá-los de supranaturalistas ou super-realistas. O especialista Gregor Streim compreende na poética de Ernst Jünger, Egon Vietta ou Rudolf Schlichter uma forma de Überrealismus (superrealismo), na qual o sonho deixa de ser o mecanismo das forças imaginárias e passa a ser meio de revelação mística. Robert Walser seria o autor de língua alemã “com as mais fortes afinidades e paralelos com os métodos poéticos do surrealismo. E Franz Kafka possuiria traços de surrealismo em alguns de seus escritos, como em O Processo.

Os autores, cujas obras são classificadas como precursoras do surrealismo alemão, são Carl Einstein (1885-1940), Gottfried Benn (1886-1956), Yvan Goll (1891-1950), Paul Celan (1920-1970) e Hans Arp (1886-1966). Os nomes de Richard Anders (1928-2012), Gerd Henniger (1930-1990), Johannes Hübner (1921-1977), Joachim Klünner (1924-2006), Lothar Klünner (1922-2012), Joachim Uhlmann (1925-2020), Rudolf Wittkopf (1933-1997) são até hoje menos conhecidos, e formavam um grupo em torno do anuário SPEICHEN (1968-1971). E por fim, o nome da artista Unica Zürn (1916-1970), que ocupa um lugar especial.

Carl Einstein foi uma das figuras formadoras da cena artística alemã dos anos 20, tornando-se o principal teórico da geração romântica e do surrealismo, especialmente nos círculos literários nos quais faziam parte Georges Bataille e Michel Leiris. Ficou conhecido com a obra Arte do Século XX. Seu radicalismo criativo e intelectual, bem como sua posição mediadora entre as artes, as nações e as culturas, levaram ao renascimento do Expressionismo da Restauração do pós-guerra. Em 1912, Einstein publica Bebuquin ou os diletantes do milagre, no jornal expressionista The Action. Concebido como um anti-romance o texto antecipa o dada e o surrealismo. Em 1915, foi a vez de Negerplastik que aparece como uma ampliação do campo de visão em comparação à estética da chamada arte primitiva. Bebuquin ou os diletantes do milagre é uma mistura dinâmica de narração, diálogo, poesia, panfleto, pregação ou oração, em que a superação da razão, do equilíbrio, da simetria e da unidade é conjurada como a possibilidade de um novo pensamento que permite sensações inéditas. No enredo, aparece uma sociedade bizarra que rejeita a racionalidade ou procura duplicá-la tendo a morte como uma forma de mortificação trivial, como irracionalidade existencial, mas também como projeção de anseios. Os capítulos apresentam cenas fantásticas repletas de ação ou caracteres indefinidos. O texto tematiza diferentes visões da existência através de crítica linguística explícita, citação ou paródia de dicção científica, formas religiosas de discurso, digressões filosóficas ou teorias sobre arte.

A supremacia do sonho é para Gottfried Benn uma espécie de realidade absoluta. Nas primeiras prosas de Benn, sobretudo, em O Jardim de Arles (Der Garten von Erles, 1920), muitas vezes não é possível definir em qual esfera o protagonista se encontra, se em um estado de sonho ou em algum lugar intermediário. O Jardim de Arles pode ser interpretado como um protocolo do inconsciente inspirado no texto de André Breton, Campo Magnético (Les Champs Magnétiques, 1919). Além do tema da viagem e da desorientação, a visão corre através do olhar pela janela… No seu apartamento, em Berlim, sentado encontra-se um professor particular de filosofia e escreve: Você pode dividir toda a humanidade em julgamentos descritivos ou metafísicos, Homer ou Simmel, turbilhões ancestrais - agora em que dilúvio? O Jardim de Arles é uma erupção de associações que remete o leitor ao reino desconhecido de um estranho território, de Éfeso via Taiti até a lama ovárica da Europa – e chegam a um jardim distante, ponto de encontro do ego de lêmure e do crânio de Adriano, alcançando o enigmático fim. Isso é amarelo puro. Dissolve-se como açúcar. Deus não pode estar longe. O que Deus é hoje: comprimido ou arbusto original com carbonato de potássio ou planta de coca. A paisagem é construída por meio de uma mescla de elementos difusos e irreais.

Yvan Goll é considerado um clássico franco-alemão do século XX. Além de sua prosaromances e dramas – sua poesia reflete acima de tudo o desenvolvimento político e literário daquele século. A obra de Goll, escrita em francês e alemão, oscila desde os primórdios socialmente críticos do expressionismo até o surrealismo e às imagens linguísticas herméticas. Em 1920, escreve o texto dramaturgo intitulado Überrealismus, uma alusão ao conceito surrealista de Apollinaire, que traduziu para o alemão. Nos textos Carta a Apollinaire (Lettre a Guillaume Apollinaire, 1924) e Três bons espíritos da França (Trois bons esprits de France, 1919), Goll procura retomar a genuinidade do termo surrealista e o expande empregando novos conceitos como o suprarrealismo, ultratempo no temporal (Überrealismus! Überzeitlichkeit im Zeitlichen), primeiramente no âmbito dramaturgo, como nas peças Matusalém ou o eterno Burguês – drama satírico e Os Imortais, para ser estendido à poesia.

O franco-alemão Hans Arp (1886-1966), mais conhecido nas artes plásticas, foi um expoente do construtivismo, dadaismo e surrealismo. No poema Opus Zero (Opus Null, cerca de 1924) as palavras são aglutinadas sem nenhum sentido, transformando-se em um nonses. O irracional e o subconsciente são destacados, transcendendo a negação e o absurdo: Eu sou o grande o isso-aquilo / o rigoroso regimento / o caule de ozônio sine qua non/ o anônimo um por cento. / O P. P. Tit e também a bunda / trombone sem boca e buraco / as grandes louças de Hércules / o pé esquerdo do cozinheiro direito. / Sou a longa vida longa/ o décimo segundo sentido no ovário / o Augustinho completo / em diáfana saia de celulose. A obra de Arp é caracterizada por uma grande diversidade artística, ele não foi apenas um pintor e escultor, mas também poeta. Desde o começo de sua carreira publicou poemas e textos, primeiro no idioma alsaciano, depois em alemão e francês. Arp foi co-fundador do movimento Dada, em Zurique, e atuou nos círculos surrealistas de Paris na década de 1920.

No caso de Paul Celan, fortemente influenciado pelo simbolismo e surrealismo franceses, ele associa motivos bíblicos e hassídicos em sua poética, em razão da experiência traumática do Holocausto vivida por ele e que possui uma presença marcante em sua obra, como no famoso Fuga da Morte (Todesfuge), poema que traduz o horror de Auschwitz por meio da linguagem. O estilo repleto de contradições, paradoxos, metáforas e a força da imaginação, remetendo ao sonho, levaram-no a ser denominado como poeta surrealista e seus poemas foram classificados como fantásticos. Os frequentes paradoxos são descritos como parte da busca de Celan pela realidade, concentrando-se principalmente na realidade tangível e reprodutível por meio da linguagem. As imagens e idéias em seus poemas, portanto, nunca são totalmente irreais. Celan usa uma técnica surrealista que inclui elementos da realidade (racional), mas compondo-os de tal maneira que entram em conflito com as expectativas do leitor e, portanto, parecem absurdas e surrealistas. Essa técnica é chamada Entfremdung (estranhamento), como podemos reconhecer no poema O Banquete (Das Gastmahl): Desguarnecida seja a noite extraída das garrafas na alta arquitetura / da tentação, / O limiar colhido com os dentes, antes da manhã da semeada / Ira: / ainda desponta-nos um musgo, antes dos moleiros / estarem aqui, / encontrar o silente cereal entre nós na vagarosa roda… / Sob o céu venenoso estão outros caules amarelados, / são outras as apostas nos sonhos do que aqui, onde jogamos / os dados pelo desejo, / do que aqui, onde no escuro troca-se esquecer e / milagre, / onde tudo vale uma hora e cuspimos satisfeitos / na água ávida da janela arremessada à arca iluminada; / arrebenta na rua do humano, para a glória das nuvens! / Então vistam os casacos e subam comigo nas mesas: / como ser outro que não se deite nem se erga, por entre os cálices? / Para quem beberemos os sonhos, a não ser para a vagarosa roda?


A criação do anuário SPEICHEN tinha como objetivo estabelecer sua própria plataforma para as visões estéticas, culturais e políticas do grupo de artista, incluindo Richard Anders e outros. E serviu para intervir no centro do debate da época sobre a função da poesia e da arte, o compromisso social e a autonomia artística. Entre os autores convidados estavam Erich Arendt e Paul Celan. Richard Anders é o único poeta alemão a pertencer ao círculo de André Breton e possuir contato com o cofundador do movimento surrealista norte-americano, FrankIin Rosemont, e Edouard Jaguer, o editor do lnfosurr, o último órgão oficial dos surrealistas. No poema de Anders “Pedra azulada sobre a sombra do punhal” (Steinbläue über dem Dolchschatten), publicado no início da década de 1960, no qual se lê: Porque a carne / dorme com o osso / os olhos rolam sobre a mesa / dançando com pernas de leão / a mesa sobre o mar / o mar abre janelas / sobre um mar de rostos (Weil das Fleisch / mit dem Knochen schläft / rollen Augen über den Tisch / tanzt löwenbeinig / der Tisch übers Meer / öffnet das Meer Fenster / über einem Meer von Gesichtern), é um exemplo de associações desconexas e ilógicas, no qual o significado não pode ser identificado, tão pouco uma espécie de humor lírico. Neste poema, o verso dorme com o osso, remete ao princípio da promiscuidade irrestrita que prevalece na esfera surreal sem qualquer tipo de barreira entre as coisas. A mesa dança como um leão pelo mar, todas as coisas dançam umas ao redor das outras em uma enxurrada de metáforas bizarras, imagens paradoxais, quimeras nunca antes vistas em uma exuberância turbulenta, abrindo espaço para diversas interpretações. E igualmente gerando dificuldades de interpretação. Nas obras, Discurso da boca de sombra (Schattenmundreden), A face dividida (Das entzweite Gesicht) e Horror branco (Weißes Entsetzen), escritos sob a chamada escrita automática, desertos e mares são movidos, céu e inferno são deslocados e chocados um contra o outro, heróis bíblicos e os espíritos guardiões alados galopam pelo ar em metáforas inusitadas e irracionais que muitas vezes rosnam sob os longos saltos que precisam dar com sua pesada bagagem de adjetivos e predicações. A ordem e a estrutura de significado são desconstruídas, e o próprio significado se torna a grande loucura. O absurdo se impõe em sua beleza e fantasia.

Os primeiros trabalhos dos surrealistas alemães em torno do Speichen foram divulgados nos cabarés de artistas de vanguarda em Berlim Ocidental, alimentados pelo entusiasmo de um novo começo e da liberação da arte no fim da guerra. Os programas exploravam as tradições e as tendências atuais do modernismo europeu, juntamente com renomados artistas visuais, compositores, dançarinos e atores. No círculo da galeria berlinense Rosen, que apresentava, entre outras tendências, o chamado surrealismo do pós-guerra, os artistas visuais se relacionavam entre si, colaborando regularmente nos eventos. Textos e traduções dos autores apareceram nas primeiras revistas e periódicos licenciados pelas forças de ocupação, principalmente na revista Die Fähre (mais tarde Literarische Revue), de Munique, e na Athena, de Berlim. Johannes Hübner, Joachim Uhlmann, Lothar e Joachim Klünner mantinham o projeto da revista Meta, de Karl Otto Goetz, e também a revista Cobra. O muro de Berlim, construído em 1961, e a divisão da cidade em setores americano, francês, inglês e soviético, levaram os poetas a ultrapassar as fronteiras na busca de contatos e amizades. Os boêmios de Kreuzberg em torno de Günter Bruno Fuchs e Robert Wolfgang Schnell circulavam entre eles, assim como Johannes Bobrowski, Erich Arendt e Manfred Bieler. Ademais, os poetas do círculo do Speichen desempenharam papel extraordinário como tradutores na divulgação da literatura. Rudolf Wittkopf e Gerd Henniger foram premiados pelo trabalho de tradução, mas, acima de tudo, por suas próprias obras.

O intercâmbio do grupo com os diferentes poetas e tradutores era intenso e rico, assim como a troca de correspondência com Cyrus Atabay, Samuel Beckett, Claire Goll, Wolfgang Koeppen, Hubert Fichte e Walter Höllerer, entre outros. Autores como Paul Celan, Hans Henny Jahnn, Michael Hamburger participavam das atividades. A revista Profile, sediada em Heidelberg, e a editora Henssel Verlag ofereceram um fluxo constante de publicações. Johannes Hübner e Lothar Klünner, que se consideravam surrealistas, traduziram a obra do poeta francês, René Char, com quem mantiveram estreita amizade, também com o escritor e filósofo Maurice Blanchot.

E neste cenário, onde as artistas e autoras mulheres eram pouco reconhecidas ou ignoradas, surge o nome de Unica Zürn, dona de uma obra artística singular, composta de escritos, anagramas e desenhos. Sua obra foi exposta em Paris na Exposition du internationale surréalisme, que ocorreu no mesmo ano da documenta II, em 1959, na qual também participou. Os anagramas constituíam uma atividade intensa em sua fantasia.

Unica Zürn nasceu em Berlim em 1916, teve um casamento fracassado com o comerciante Laupenmühlen, e perdeu a custódia dos dois filhos. Para ganhar seu próprio sustento escrevia contos, que eram publicados em jornais de Berlim, e peças de rádio. Seus primeiros desenhos em filigrana foram influenciados pelo pintor e ator Alexander Camaro, com quem teve um breve caso. Em 1953, conhece o artista Hans Bellmer, muito mais velho do que ela, com quem se casou. Bellmer morava em Paris há 15 anos e pertencia ao círculo surrealista. Viveram juntos em más condições naquela cidade.

A obra principal de Bellmer, As bonecas, criada em meados dos anos 30, feita a partir de manequins femininos desmontados e remontados, enfatizando o componente sexual, parece ter sido inspirada em Zürn. Como se Bellmer a visse como uma boneca viva. E, realmente, há semelhança entre as bonecas e a aparência e o caráter de Zürn: ela era bonita e graciosa, silenciosa e vulnerável. Zürn sofria de episódios de esquizofrenia e passava períodos internada na clínica psiquiátrica, vindo a cometer suicídio em 1970, atirando-se da janela, após saber que o seu marido pediu a separação após um derrame. As obras A Casa das Doenças (Das Haus der Krankheiten) e O Homem no Jasmim (Der Mann im Jasmin) são uma tentativa da artista de processar por escrito o vaguear entre mundos – entre a doença e o ser artista – entre a arte e a loucura, e torná-lo visível. Hoje em dia, as obras de Zürn vêm alcançando um público mais amplo.



 

TRÊS SURREALISTAS ALEMÃES

 

1 PAUL CELAN

 

FUGA DA MORTE

 

Leite negro da madrugada nós o bebemos à noite

nós o bebemos ao meio-dia e pela manhã nós o bebemos à noite

nós bebemos e bebemos

cavamos uma cova nos ares e lá não se jaz apertado

Um homem mora na casa ele brinca com as cobras ele escreve

escreve quando escurece para a Alemanha

teu cabelo dourado Margarete

 

ele escreve e sai ficando em frente à casa e as estrelas brilham

ele assobia chamando os seus cães

assobia mandando os judeus cavarem uma cova na terra

ele nos ordena a tocar para dançarmos

 

Leite negro da madrugada nós o bebemos à noite

nós o bebemos pela manhã e ao meio-dia nós o bebemos à noite

nós bebemos e bebemos

Um homem mora na casa ele brinca com as cobras ele escreve

escreve quando escurece para a Alemanha

teu cabelo dourado Margarete

Teu cabelo cinza Sulamith

 

cavamos uma cova nos ares lá não se jaz apertado

 

Ele ordena cavem mais fundo na terra uns e outros cantem e toquem

ele pega o seu cinto de ferro e o agita seus olhos são azuis

finquem suas pás mais fundo uns e outros continuam dançando

 

Leite negro da madrugada nós o bebemos à noite

nós o bebemos ao meio-dia e pela manhã nós o bebemos à noite

nós bebemos e bebemos

um homem mora na casa teu cabelo dourado Margaret

teu cabelo cinza Sulamith ele brinca com as cobras

 

Ele ordena toquem a música da morte com mais doçura a morte é um mestre da Alemanha

tirem um tom mais sombrio dos violinos e então erguereis como fumaça no ar

então tereis uma cova nas nuvens lá não se jaz apertado

 

Leite negro da madrugada nós o bebemos à noite

nós o bebemos ao meio-dia a morte é um mestre da Alemanha

nós o bebemos à noite e pela manhã nós bebemos e bebemos

a morte é um mestre da Alemanha e seu olho é azul

ele te atinge com uma bala de chumbo te acerta em cheio

um homem mora na casa teu cabelo dourado Margarete

ele atiça seus cães para cima de nós e nos presenteia com uma cova no ar

ele brinca com as cobras e sonha que a morte é um mestre da

Alemanha

 

teu cabelo dourado Margarete

teu cabelo cinza Sulamith

 

TODESFUGE

 

Schwarze Milch der Frühe wir trinken sie abends

wir trinken sie mittags und morgens wir trinken sie nachts

wir trinken und trinken

wir schaufeln ein Grab in den Lüften da liegt man nicht eng

Ein Mann wohnt im Haus der spielt mit den Schlangen der schreibt

der schreibt wenn es dunkelt nach Deutschland

dein goldenes Haar Margarete

 

er schreibt es und tritt vor das Haus und es blitzen die Sterne

er pfeift seine Rüden herbei

er pfeift seine Juden hervor läßt schaufeln ein Grab in der Erde

er befiehlt uns spielt auf nun zum Tanz

 

Schwarze Milch der Frühe wir trinken dich nachts

wir trinken dich morgens und mittags wir trinken dich abends

wir trinken und trinken

Ein Mann wohnt im Haus der spielt mit den Schlangen der schreibt

der schreibt wenn es dunkelt nach Deutschland

dein goldenes Haar Margarete

Dein aschenes Haar Sulamith

 

wir schaufeln ein Grab in den Lüften da liegt man nicht eng

 

Er ruft stecht tiefer ins Erdreich ihr einen ihr andern singet und spielt

er greift nach dem Eisen im Gurt er schwingts seine Augen sind blau

stecht tiefer die Spaten ihr einen ihr anderen spielt weiter zum Tanz auf

 

Schwarze Milch der Frühe wir trinken dich nachts

wir trinken dich mittags und morgens wir trinken dich abends

wir trinken und trinken

ein Mann wohnt im Haus dein goldenes Haar Margarete

dein aschenes Haar Sulamith er spielt mit den Schlangen

 

Er ruft spielt süßer den Tod der Tod ist ein Meister aus Deutschland

er ruft streicht dunkler die Geigen dann steigt ihr als Rauch in die Luft

dann habt ihr ein Grab in den Wolken da liegt man nicht eng

 

Schwarze Milch der Frühe wir trinken dich nachts

wir trinken dich mittags der Tod ist ein Meister aus Deutschland

wir trinken dich abends und morgens wir trinken und trinken

der Tod ist ein Meister aus Deutschland sein Auge ist blau

er trifft dich mit bleierner Kugel er trifft dich genau

ein Mann wohnt im Haus dein goldenes Haar Margarete

er hetzt seine Rüden auf uns er schenkt uns ein Grab in der Luft

er spielt mit den Schlangen und träumet der Tod ist ein Meister aus

Deutschland

 

dein goldenes Haar Margarete

dein aschenes Haar Sulamith

 

 

2 UNICA ZÜRN

 

A VIDA, UM SONHO RUIM

 

O ser humano é fumaça. Todos rezam,

morrendo por vingança. Todos! Nada mais

do que noite. Eu, miserável, morrendo por

todos esses destroços. Noite! Coragem! Ela,

a névoa caçoa de mim. Estrelas,

estrelas austeras, breve vou rir

dos erros, riam! Rir do melhor!

Quebrar tudo ao meio: Nariz,

ventre, braço direito. Truque vil

do amor! Tortura! Ai de mim, chama

do sonho pálido - ele riu

de mim, o impostor da vida

e nada trouxe. Pobre alma.

 

 

DAS LEBEN, EIN SCHLECHTER TRAUM

 

Der Mensch ist Rauch. Alle beten,

sterbend um Rache. Alle! Nichts

als Nacht. Ich Elender sterbe um

all’ diese Scherben. Nacht! Mut! Er,

der Nebel lacht mich aus. Sterne,

ernste Sterne, bald lache ich um

den Irrtum, lache! Lache bestens!

Breche alles mittendurch: Nase,

Bauch, rechten Arm. Elende List

des Liebens! Marter! Ach, Leuchten

des bleichen Traums – er lachte

mich an, der Lebenstäuscher

und brachte nichts. Arme Seele

 

 

NÃO SEI COMO FAZER AMOR

 

Como sei, amor não se “faz”.

Ele lastima envolto a uma luz de cera no telhado.

Ah, ele cresce na luz, ao vento à

noite. Ele desperta como suave imagem, no gelo

do nunca, em súplica: vigila, como eu. E sei

que como eu o amor não se faz.

 

 

ICH WEISS NICHT, WIE MAN DIE LIEBE MACHT

 

Wie ich weiss, ,macht‘ man die Liebe nicht.

Sie weint bei einem Wachslicht im Dach.

Ach, sie wächst im Lichten, im Winde bei

Nacht. Sie wacht im weichen Bilde, im Eis

des Niemals, im Bitten: wache, wie ich. Ich

weiss, wie ich macht man die Liebe nicht.

 

 

DA VIDA DE UM IMPRESTÁVEL

 

Há neve caída. Com orvalho e sementes

ela brilha na areia. Sete olhos

Sugam seda, névoa, tinta, espuma.

E um ganso cansado se desfolha.

 

 

AUS DEM LEBEM EINES TAUGENICHTS

 

Es liegt Schnee. Bei Tau und Samen

leuchtet es im Sand. Sieben Augen

saugen Seide, Nebel, Tinte, Schaum.

Es entlaubt sich eine müde Gans.

 

 

3 RICHARD ANDERS

 

FORA DO SONHO

 

Paredes vazias

espelhos falsos

lágrimas cinzentas

 

Tenta-se fazer voar com as asas

as estátuas

mas o vento não sopra

dorme ocioso em algum lugar

 

Antes de chegarem

a essa região desolada

caem nuvens do céu

 

Suas ruínas amorfas

estão espalhadas pelas praças

 

E os relógios de pêndulo estão em to-

que de recolher

 

 

AUS DEM TRAUM

 

Aus der Traum

Leere Mauern

falsche Spiegel

graue Tränen

 

Man versucht mit den Flügeln

der Statuen zu fliegen

aber der Wind kommt nicht

schläft irgendwo faul

 

Bevor sie diese trostlose

Gegend erreicht haben

stürzen Wolken vom Himmel

 

Ihre unförmigen Trümmer

liegen auf den Plätzen umher

 

Die Pendeluhren haben Aus-

Gangssperre



NOTA

As traduções são todas assinadas por Viviane de Santana Paulo. 



VIVIANE DE SANTANA PAULO (São Paulo, 1966), poeta, romancista, tradutora e ensaísta. Estudou filologia germânica e românica na universidade de Bonn. É autora dos livros, lebendiges wensen namens gedicht – vom satelliten aus gesehen / ser vivo chamado poema – visto do satélite (coletânea de poesia bilíngue – Engelsdorf Verlag, Leipzig, 2023); Viver em outra língua (romance, Solid Earth, Berlim 2017), Depois do canto do gurinhatã (Multifoco, Rio de Janeiro, 2011), Estrangeiro de Mim (Gardez! Verlag, Alemanha, 2005) e Passeio ao Longo do Reno (Gardez! Verlag, Alemanha, 2002). Em parceria com Floriano Martins, Em silêncio (Fortaleza, CE: ARC Edições, 2014) e Abismanto (Sol Negro Edições, Natal/RN, 2012). Foi membro da equipe editorial da Ila-Latina, revista de cunho social-político com sede em Bonn (Informationsstelle Lateinamerika e.V.). Seus textos foram publicados em revistas e antologias na Europa e América Latina. Traduziu diversos poetas alemães, incluindo Jan Wagner, Nora Bossong, Ron Winkler, Josef Kafka, Sarah Kirch, Paul Celan, Gottfried Benn.
 

 


ANTONIA EIRIZ (Cuba, 1929-1995). Se graduó de la Escuela de Bellas Artes de San Alejandro en 1957. Participó en la II Bienal Interamericana de México en 1960 y en la VI Bienal de Sao Paulo en 1961, donde su obra recibió una mención honorífica. De 1962 a 1969 impartió clases en la Escuela de Instructores de Arte y en la Escuela Nacional de Arte, ambas en La Habana. En 1963 ganó el Primer Premio en la Exposición de La Habana, organizada por la Casa de las Américas. Al año siguiente, la Galería Habana presentó su importante exposición “Pintura/Ensamblajes”. En 1966 expuso su obra junto a Raúl Martínez en la Casa del Lago de la Universidad Nacional Autónoma de México, y un año después en el 23 Salón de Mayo en París, Francia. Eiriz tenía una forma muy particular de captar su entorno, optando por retratar las situaciones más dramáticas y grotescas de la condición humana, lo que provocó que su obra fuera incomprendida por el gobierno revolucionario, lo que la llevó a jubilarse anticipadamente. A finales de los años sesenta abandonó la pintura y se dedicó a la promoción de formas de arte popular, transformando su casa en un taller donde enseñaba técnicas como el papel maché y los trabajos textiles a la comunidad local. En 1989 recibió la Orden Félix Varela del Consejo de Estado de Cuba, la más alta distinción del país en el ámbito cultural. En 1991 se realizó una exposición de su obra titulada “Reencuentro” en la Galería Galiano de La Habana y en 1994 recibió una beca de la Fundación John Simon Guggenheim. Después de su muerte en 1995, el Museo de Arte de Fort Lauderdale organizó una retrospectiva de su obra: “Antonia Eiriz: Tributo a una leyenda”. Ahora ella es nuestra artista invitada, en esta edición de Agulha Revista de Cultura.




Agulha Revista de Cultura

Número 255 | setembro de 2024

Artista convidada: Antonia Eiriz (Cuba, 1929-1995)

Editores:

Floriano Martins | floriano.agulha@gmail.com

Elys Regina Zils | elysre@gmail.com

ARC Edições © 2024


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