quinta-feira, 4 de setembro de 2025

ESTER FRIDMAN | Duas razões selvagens da filosofia



1 Assim falou o poeta maldito

Se Nietzsche já é um filósofo controverso, interpretado de forma tão completamente diferente por cada leitor, seu livro Assim Falou Zaratustra é, sem dúvida, o mais controverso de toda a sua obra. Seria um dos motivos de tamanha controvérsia a linguagem tão peculiar e não familiar na qual foi escrito? Uma leitura atenta à obra de Nietzsche como um todo nos revela um autor cujo procedimento de pensamento é diferente do procedimento de pensamento do homem ocidental em geral. Mas, se seu modo de pensar não é ocidental, tampouco o é puramente oriental. O que o diferencia é que ele não está preso às amarras do gregarismo, e nem à metafísica da linguagem. Ele diz que “…entramos em um grosseiro fetichismo, quando trazemos à consciência as pressuposições fundamentais da metafísica da linguagem, ou, dito em alemão, da razão. Esse vê por toda parte agente e ato: esse acredita em vontade como causa em geral; esse acredita no ‘eu’, no eu como ser, no eu como substância, e projeta a crença na substância-eu sobre todas as coisas (…) E nas Índias como na Grécia se fez o igual equívoco: ‘É preciso que já alguma vez tenhamos habitado um mundo superior (…), é preciso que tenhamos sido divinos, pois temos a razão!’ (…) A ‘razão’ na linguagem: oh, que velha, enganadora personagem feminina! Temo que não nos desvencilharemos de Deus, porque ainda acreditamos na gramática…” [1]

De qualquer forma, a meu ver, o procedimento do pensar nietzscheano tende mais para o modo de pensar oriental do que para o ocidental. Para o oriental, por exemplo, nada impede que uma coisa seja e não seja ao mesmo tempo. Para nós, ocidentais, ou uma coisa é, ou não é. Ou algo é verdadeiro, ou é falso. Nosso pensamento não admite que algo seja verdadeiro e falso ao mesmo tempo. O pensamento oriental admite. O pensamento simbólico também admite. Assim, levantei a hipótese de que este filósofo poeta escreveu Assim Falou Zaratustra em linguagem simbólica. Mas, por que Nietzsche faria uso de uma linguagem simbólica, e não da linguagem conceitual, para escrever um livro? Melhor deixar que ele mesmo responda:

 

Os conceitos filosóficos individuais (…) crescem em relação e em parentesco um com o outro; (…) não deixam de pertencer a um sistema (…) – tudo isto se confirma também pelo fato de os mais diversos filósofos preencherem repetidamente um certo esquema básico de filosofias possíveis. (…) embora se sintam independentes uns dos outros com sua vontade crítica ou sistemática, algo neles os conduz, alguma coisa os impele numa ordem definida, um após o outro – precisamente aquela inata e sistemática afinidade entre os conceitos. (…) O curioso ar de família de todo o filosofar indiano, grego e alemão tem uma explicação simples. Onde há parentesco linguístico é inevitável que, graças à comum filosofia da gramática – quero dizer, graças ao domínio e direção inconsciente das mesmas funções gramaticais –, tudo esteja predisposto para uma evolução e uma sequência similares dos sistemas filosóficos: do mesmo modo que o caminho parece interditado a certas possibilidades outras de interpretação do mundo. (…) O encanto exercido por determinadas funções gramaticais é, em última instância, o encanto de condições raciais e juízos de valor fisiológicos [2]

 

Sobre isso, Kossovitch fez o seguinte comentário:

 

As funções gramaticais definem de uma vez por todas as possibilidades de exercício do pensamento, que não passa de uma combinatória de categorias gramaticais. (…) A linguagem da filosofia está centrada na da comunicação. Como esta, ela está a serviço da conservação. (…) As afinidades que a ligam à linguagem gregária podem ser resumidas na sua utilidade para a espécie. Pensar é, neste plano, produzir esquemas em vista da conservação. É a linguagem que assinala a cumplicidade da filosofia e da conservação. Ela marca os limites dentro dos quais esta pode se exercer, mas, além disso, ela amarra-a às pulsões gregárias. [3]

 

Assim, a linguagem simbólica pode ter sido a forma que Nietzsche encontrou de escapar ao aprisionamento da gramática, de superar a pressão da linguagem, sair do círculo percorrido pelos filósofos e não ficar somente na intelectualidade – não ser apenas mais uma repetição. Zaratustra não quer conservar – ele veio para transformar, para inovar. E se, como diz Kossovitch, “as funções gramaticais definem de uma vez por todas as possibilidades de exercício do pensamento”, Nietzsche, através de Zaratustra, buscaria possibilidades outras de pensamento, que não se deixam definir pelas funções gramaticais. O texto em Zaratustra, sim, se desdobra obedecendo à gramática. Entretanto, a linguagem simbólica aqui, apesar de ser transmitida através de palavras, que por sua vez estão inseridas nas frases, e seguem as regras gramaticais, por não fazer parte do universo conceitual, talvez esteja, de alguma forma, livre das armadilhas da gramática. É uma hipótese. Além disso, tal linguagem poderia ser uma forma de seleção de leitores: um livro para espíritos não-gregários, uma vez que não foi escrito em uma linguagem gregária. Daí o subtítulo: “Um livro para todos e para ninguém”.


Acho provável que Nietzsche, ao estabelecer um contato íntimo com textos antigos, na condição de filólogo, tenha absorvido vestígios desse procedimento de pensar anterior ao procedimento conceitual, anterior ao pensamento racional socrático. O pensamento antigo, mais próximo do pensamento simbólico, pensa o mundo como algo onde tudo está ligado, vê o mundo na sua totalidade. No período em que viveu Sócrates, e naquela região onde viveu, de onde herdamos nossa cultura, houve uma mudança significativa. A visão de totalidade começa a sair do cenário para dar lugar a uma visão de mundo fragmentada. Além disso, o homem começa a se perceber como indivíduo responsável por seus atos. Antes eram os deuses os responsáveis por tudo o que acontecia. Agora, se um homem comete um crime, não é mais a ação de um deus, mas dele como indivíduo. Tudo começa a ser visto não mais junto, mas dividido, separado. É assim que opera a linguagem conceitual. Sujeito e objeto não são um, como era na linguagem simbólica, mas dois. Agora falamos e pensamos o mundo dividido em partes, logo, o mundo é feito de partes; logo, precisamos de especializações.

Depois de tanto tempo vivendo como ângulos, Nietzsche parece querer trazer de volta a vida como “summa summarum”, [4] como totalidade, resgatando assim, de certo modo, e diferencialmente, o estado dionisíaco. Para ele, a maior de todas as crenças possíveis é a crença “de que apenas o que está isolado é censurável, de que tudo se redime e se afirma no todo”. Ele batizou essa crença com o nome de Dionísio. [5]

Assim, para transmitir uma mensagem redentora do mundo, não fragmentada, para transmitir uma mensagem veraz, que fala diretamente ao coração, como os ditirambos dionisíacos, como Cristo, o grande simbolista – assim o denomina Nietzsche no Anticristo; para transmitir não o que é consciente, pois para Nietzsche o que é consciente é raso, ralo, estúpido, mas sim o que não se tornou consciente, Zaratustra falou simbolicamente, pois os símbolos falam o indizível.

 

Prestai atenção, meus irmãos, a todas as horas que vosso espírito quer falar por símbolos: ali está a origem de vossa virtude. [6]

 

A meu ver, o Zaratustra, sendo uma paródia da Bíblia, foi escrito na mesma linguagem que esta, ou seja, simbólica, da mesma forma que muitas escrituras sagradas. Assim, a despeito de vários intérpretes de Nietzsche o considerarem ateu e materialista, eu o considero exatamente o oposto. Não cabe aqui uma exposição das inúmeras concepções de Deus existentes, ou da diferença entre religião e espiritualidade, uma vez que esse texto limita-se ao estudo da linguagem. Por toda a minha vida me fiz a seguinte pergunta: por que não escreveram esses livros sagrados de forma objetiva, com a nossa linguagem? Por que temos que ficar decifrando o que quiseram dizer? Agora eu posso responder. A linguagem que chamei de objetiva, a linguagem conceitual, não fala ao coração, só à razão. De acordo com Nietzsche, foi desenvolvida junto com a consciência, e só remete ao que é raso, ralo, superficial. Tudo o que aprendemos com ela, não incorporamos, porque ela só fala à pequena razão, não à grande razão. [7] E quando não incorporamos o que aprendemos, aquilo fica só na superfície. Por outro lado, quando é a linguagem simbólica que nos fala, podemos não ter um entendimento racional, podemos não tirar nenhum saber, mas aquilo que ouvimos entra no coração, é compreendido pela grande razão.

Penso que, ao adotar o estilo simbólico, Nietzsche está criticando a exclusividade da linguagem conceitual na Filosofia, a exclusividade da razão socrática, o Cristianismo, mas, acima de tudo, está acessando aquela parte do pensamento que, de acordo com ele, não se torna consciente. Assim, ele não está trabalhando com o que é da natureza de comunidade e de rebanho, com o que é superficial, signo, vulgarizado, generalizado. E, especificamente no Zaratustra, através de um jogo de oposições, ele traz uma mensagem redentora do mundo e da vida em sua totalidade. A linguagem simbólica revela essa totalidade que Zaratustra quer transmitir. A totalidade não é passível de ser transmitida por palavras, ou seja, por signos de comunicação, porque estes, por sua natureza, lidam com um mundo dividido, fragmentado. Ao adotar o estilo simbólico, Nietzsche resgata o saber instintivo, inconsciente, que foi subjugado por Sócrates e pelo socratismo. Para Nietzsche, a razão é sim, importante, mas não se pode continuar negando a existência e importância também dos instintos, que, aliás, para ele, guiam secretamente o pensamento consciente de um filósofo.

 


2 Prisioneiros do tempo

Vida, Mente, Universo, Consciência, Tempo, Espaço… Alguém sabe o significado dessas palavras? Será que dentro de nossa condição humana é possível saber? Um grande número de pensadores e filósofos através dos tempos vem tentando desnudar os mistérios da vida e até então ainda não os conhecemos. Talvez seja porque temos usado a ferramenta errada, qual seja – o pensamento. Em especial a civilização greco-romana posterior a Sócrates vem atribuindo um valor excessivo à razão, ao intelecto e seu produto, o pensamento lógico analítico. Ninguém criticou mais esse tipo de conduta do que Nietzsche, que costumava dizer que a decadência começou com Sócrates, exatamente por isso. Com séculos e séculos de condicionamento foi ficando cada vez mais difícil pensar por outra via que não a lógica, cujo funcionamento corresponde ao hemisfério esquerdo do cérebro. Mas e o hemisfério direito, da imaginação e do pensamento simbólico, porque não é valorizado e devidamente utilizado, ao menos na mesma proporção de seu vizinho? Jiddu Krishnamurti, em uma de suas palestras publicadas em livro, diz que “Estamos condicionados a pensar em termos de progresso, de realizações gradativas. As pessoas pensam em desenvolvimento psicológico, mas será que existe algo como psicologicamente ‘eu’, realizando qualquer outra coisa que não seja a projeção de um pensamento?” Ora, é bem possível que tudo o que conhecemos seja mera projeção do pensamento! E um “eu” psicológico pode nem sequer existir! Krishnamurti sugere que para descobrirmos se existe algo que não seja meramente uma projeção do pensamento, portanto uma ilusão, precisamos investigar se o pensamento pode ser mantido em suspenso, não ao modo de Descartes, mas suprimindo-o para que a mente permaneça imóvel. Acho essa ideia fascinante, através da observação, perceber que mente e pensamento são coisas distintas, em seguida, conseguir suspender todos os pensamentos. Depois ele irá dizer que não é possível parar os pensamentos que, como o tempo, não para, mas ao saber diferenciar a mente do pensamento, deixamos de ser comandados por este, e, dessa forma, temos acesso a uma verdade outra, a uma condição outra, que ele chama de liberdade. Liberdade, segundo ele, seria não estar preso ao pensamento e ao seu jogo de opostos que cria uma série de desejos e aversões. Conhecemos bem essa história, desejamos o que nos parece bom e prazeroso, e temos aversão ao que nos parece mal e nos dá desprazer.

Com relação ao tempo, sabemos que tempo e espaço são condições de nosso aparato cognitivo, não são conceitos que se aplicam fora da realidade que conhecemos através do intelecto e dos sentidos, realidade esta bem limitada. Emanuel Kant descreve de forma brilhante a questão do tempo/espaço em seu livro A Crítica da Razão Pura. Mas ele não entra na questão que Krishnamurti aborda sobre a relação intrínseca do tempo com o pensamento. O pensamento se dá no tempo e depende da memória. Segundo ele, pensamento e tempo são praticamente sinônimos, embora isso possa parecer estranho. A civilização e tudo o que conhecemos – as culturas, religiões, ciências, todas as invenções, tudo foi criado pelo pensamento. Mas será que o pensamento é algo confiável? Para Nietzsche é algo absolutamente nada confiável. Sabemos que o pensamento lógico analítico não consegue abranger a totalidade, ele só consegue abranger algumas partes, uma de cada vez, e o pior, ao compreender cada parte, não consegue associá-la ao todo; diferente do hemisfério direito que compreende a totalidade, embora não saiba dividi-la para nomeá-la. Por isso Nietzsche diz que somos fragmentos – um é uma orelha, outro é um nariz, e assim por diante. Somos fragmentos e vemos tudo fragmentado. Como nosso mundo pode dar certo dessa forma? Nosso intelecto funciona na base dos opostos, divisão, análise e comparação. Assim, para entendermos o que é uma coisa temos que compará-la com outra. Para que haja entendimento racional pelo pensamento, este separa o pensador do objeto pensado – a famosa divisão de sujeito e objeto. Toda divisão gera conflito. Mesmo nas questões subjetivas, como na Psicologia, por exemplo, ao pensar sobre a psique, esta passa a ser objeto, separado da pessoa que o pensa. Aliás, é mister questionar se o pensamento lógico analítico pode ser utilizado para pensar sobre assuntos da Psicologia, uma vez que esta lida com múltiplos fatores que de lógicos nada tem. Não da lógica do intelecto. O pensador, ao pensar sobre qualquer coisa, seja sobre o designer de uma cadeira, seja julgando o comportamento de seu amigo, seja criando normas para a sociedade ou pesquisando sobre uma doença, se logo em seguida ao ato de pensar ele não voltar ao estado de integridade, mas permanecer na divisão, ele terá a falsa impressão de que ele é separado de tudo o que não é ele, ou seja, todas as outras coisas e todos os outros seres vivos, inclusive o planeta no qual habita. E pior – ele vê tudo o que acha que não é ele como inimigo, e quer tê-los sob controle. Como praticamente todos os seres humanos fazem isso o tempo todo, temos a ilusão de sermos separados de tudo o que nos rodeia, e a condição de conflito tornou-se a condição “normal”. Casais brigam, pais e filhos brigam, amigos brigam, vizinhos brigam, partidos políticos brigam, religiões brigam, nações brigam. E é nesta condição que nossa civilização e cultura foram criadas. Assim, muito embora algumas pessoas empenham-se arduamente em acabar com a pobreza, com a violência, com a injustiça, com os preconceitos, com as guerras, com as doenças, jamais irão conseguir se continuarem pensando e atuando dentro dos limites da razão e das percepções sensoriais do mundo físico. A violência, a injustiça, os preconceitos, as guerras, as doenças e todo o sofrimento só acabarão quando cada um, individualmente, compreender que tudo isso acontece dentro de si mesmo, de cada um de nós. Se uma pessoa não consegue passar os dias de sua vida com sua mente em silêncio, apenas observando os pensamentos, mas, pelo contrário, fica a mercê de seu eterno jogo de opostos, como ela conseguirá silenciar a violência, a injustiça, os preconceitos, as guerras e as doenças? Enquanto formos escravos do pensamento, que por definição é dual, estaremos criando oposições. Sim, somos nós que criamos as oposições. Cada grupo que se forma, seja uma religião, um esporte, uma posição política, sempre achará que a sua posição é a correta, e o outro está errado. Haja vista a política moderna e sua luta de poderes nomeando suas posições de esquerda e direita. Nietzsche pontuou toda a problemática da polaridade: todos os opostos são fios da mesma meada, são graus da mesma coisa. Assim, preto e branco são iguais, esquerda e direita são iguais. Quem se diz ateu na verdade não o é, como a própria palavra diz: “a” = prefixo de negação e “teu” vem do grego “theos”, que significa Deus. Assim, ateu é a negação de Deus. Ora, se está negando Deus está admitindo sua existência. As línguas antigas, como bem observou Freud, só tinham uma palavra para designar os opostos, porque os antigos sabiam que estes são a mesma coisa. Não eram como as línguas modernas que tem uma palavra para designar “branco” e outra para “preto”, uma para designar “dentro”, e outra para designar “fora”. A língua alemã ainda guarda muitos resquícios do alemão antigo, e a língua inglesa ainda guarda algumas poucas palavras que contém o seu oposto, como, por exemplo, a palavra “without” – “with” = “com” e “out” = “sem”, que hoje a usamos apenas para significar “sem”. Quem não percebe que os opostos são apenas graduações da mesma coisa, gasta sua energia à toa e não mudará nada, como nada mudou desde a época das cavernas até hoje. As mudanças foram só externas, nos objetos utilitários e na tecnologia, mas a humanidade continua não conhecendo a si mesma, a complexidade de sua psique. Quem leu a obra inteira de Freud sabe que ele fez tentativas para compreender, mas não conseguiu sair do aprisionamento do intelecto, e por isso Reich e Jung acabam por dele se afastar e seguir seus próprios caminhos, o primeiro com descobertas incríveis sobre a nossa energia e o segundo mergulhando no inconsciente, cuja lógica é bem diferente da lógica consciente da razão. É provável que a humanidade só mude quando todos perceberem que o jogo de opostos é o verdadeiro problema, e a solução para acabar com todo o sofrimento é libertar-se da escravidão do pensamento, utilizar o pensamento apenas para o que ele serve – resolver questões práticas. O pensamento não vai além disso, não atua na psicologia e em nenhuma questão subjetiva. E todos os problemas que vemos lá fora começam dentro de cada um, são subjetivos. Enquanto cada um continuar atuando dentro dos parâmetros duais e limitantes do pensamento, continuar afirmando: eu gosto disso, eu não gosto daquilo; eu quero isso, eu não quero aquilo; continuará prisioneiro da polaridade, se posicionando de um lado e rejeitando o outro. Estar para além do bem e do mal seria a saída. Nietzsche percebeu isso, tentou ajudar a humanidade com sua obra, não foi compreendido e enlouqueceu. Que possamos, mais de um século após sua morte, compreender suas palavras e colocá-las em prática antes que seja tarde demais.


Ao observar a si mesmo, e também ao mundo, que é a mesma coisa, percebemos que vivemos simultaneamente em muitas dimensões, todas pertencendo a um todo e relacionadas entre si, – as dimensões física, etérica, emocional, mental inferior, mental superior e a dimensão espiritual, sendo que esta última tem muitos degraus. Claro que esses termos – “dimensões”, “níveis” e degraus” são oriundos do pensamento que tudo divide; quando se tem a percepção do todo não existe divisões e não existe evolução, pois evolução só existe na linha do tempo. A humanidade dos últimos milênios tem tido a percepção apenas das dimensões, digamos assim, inferiores, – física, etérica, emocional e mental inferior. Uma minoria tem a vivência do mental superior e das dimensões espirituais. O grande problema é que as dimensões inferiores estão presas ao tempo.

Desde a antiguidade aos tempos modernos mestres e avatares vem tentando ajudar a humanidade a acordar de seu estado precário de existência, seu estado verdadeiramente doentio, permeado por misérias e mazelas, tentando mostrar que nenhum sofrimento é necessário, que é possível viver uma vida de abundância e plenitude, mas, infelizmente, não conseguimos compreendê-los porque não conseguimos nos libertar da prisão do pensamento. Krishnamurti percorreu o mundo dando palestras sobre a importância de estarmos em silêncio interior enquanto atuamos no mundo, observando os movimentos do pensamento para assim nos darmos conta do caos interior que somos, e ao ter consciência do caos, colocar ordem na casa. Se cada um colocar ordem em sua casa interna, toda a sociedade, que é composta por cada um de nós, viverá em ordem – sem conflito, violência e desamor. Não adianta batermos na mesma tecla dos últimos milênios, buscando soluções aos cada vez mais graves problemas, com as mesmas ferramentas de sempre, que, se nunca funcionaram, por que haveriam de funcionar agora? Mestres de Yoga, assim como Osho, Gurdjieff, Rudolf Steiner, literaturas antigas como os Vedas, a Bíblia, a Cabala, o Alcorão, enfim, toda a tradição antiga da Índia, Suméria, Egito, Japão, China, descobertas arqueológicas sobre as civilizações anteriores à nossa, como Atlântica e Lemúria, toda essa riqueza de conhecimento genuíno, de nada tem nos servido para efetivamente transformar nossa condição e terminar com a miséria humana. As lindas lições de vida de Krishna, Moisés, Buda, Cristo, infelizmente não foram compreendidas e seguidas. Hoje, todos os sinais indicam que estamos no final de uma civilização, já que o final das anteriores se deu no auge da decadência. Como sempre, o final se dá igual ao filme Titanic – o navio afundando enquanto os músicos continuam tocando e as pessoas se comportando como se a catástrofe não tivesse nada a ver com elas. E assim afunda a humanidade.



NOTAS

1. F. NIETZSCHE, Crepúsculo dos Ídolos, “A razão na filosofia”, § 5, trad. de Rubens R. T. Filho.

2. Idem, Além do bem e do mal, cap. I, § 20, trad. de Paulo C. de Souza. A expressão aqui traduzida por condições raciais, no original está como: Rasse-Bedingungen, que pode também ser traduzida por particularidades raciais.

3. Leon KOSSOVITCH, Signos e Poderes em Nietzsche, p.80-82.

4. F. NIETZSCHE, Ecce Homo, Por que sou tão sábio, § 2.

5. Idem, Crepúsculo dos Ídolos, “Incursões de um extemporâneo”, § 49, trad. de Paulo César de Souza.

6. Idem, Así Habló Zaratustra, 1ª parte, “De la virtud que hace regalos”, §1, trad. do espanhol para o português de minha autoria.

7. Nietzsche chama aquilo que conhecemos por razão de a pequena razão, e o corpo de a grande razão.

 

 


ESTER FRIDMAN (Brasil, 1963-?)
. Filósofa e escritora, pesquisadora da linguagem simbólica, seu tema de mestrado foi A Linguagem Simbólica no Zaratustra de Nietzsche. Estudiosa também das filosofias da Índia, escreveu Kriya-Yoga e a Filosofia dos Kleshas no Yoga Sutra de Patanjali.





ARIADNA PINEDA (México, 1980). Estudió la Licenciatura en Artes Visuales en la Facultad de Bellas Artes de la UMSNH, así como Diseño de moda en Instituto INMODART en la ciudad de Morelia, Michoacán. Su experiencia profesional se ha forjado creando pintura, escenografía teatral, diseño de vestuario teatral y dancístico, escultura, fotografía, ilustración y muralismo. Sus exposiciones individuales han girado la mayoría en torno al arte con técnicas experimentales realizando obras arte háptico-senso-perceptual para personas con discapacidad visual, otras exposiciones de arte fumage y pintura al óleo, todas con su particular estilo surrealista. A la fecha son 13 sus exposiciones individuales desde el 2011. Participa en exposiciones colectivas desde 1996 dando un total de 38 colectivos. Algunas de sus obras se encuentran en Italia, Canadá, EU, en manos de coleccionistas privados. Ariadna en su creación encontró un nuevo camino con precedencia a partir de años de exploración, experimentación y especialización en la pintura al óleo y el arte fumage, encontrando su propio lenguaje, hoy busca dar a conocer con luz propia su obra surrealista más reciente para tomar con mayor fuerza los caminos de la creación. Ariadna Pineda es la artista invitada de esta edición especial de Agulha Revista de Cultura.

 


Agulha Revista de Cultura

CODINOME ABRAXAS # 06 – ATHENA (PORTUGAL)

Artista convidada: Ariadna Pineda (México, 1980)

Editores:

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Elys Regina Zils | elysre@gmail.com

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