Nascida no Rio de Janeiro, Hilda Machado teve uma carreira acadêmica e profissional
diversificada. Concluiu mestrado em Artes na Universidade de São Paulo (USP) em
1987 e doutorado em História Social na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
em 2001. Foi professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), atuando na área
de pesquisa em cinema e história. Estudou direção de cinema em Cuba e trabalhou
como pesquisadora em instituições no Brasil e no exterior, incluindo a New York
University e a University of London. Em 1987, seu curta-metragem Joílson marcou ganhou prêmios de melhor direção
em festivais de cinema no Brasil, como Gramado e Recife. Foi presa em 1978 durante
a ditadura militar no Brasil. Apesar de ter publicado apenas dois poemas em vida
na revista Inimigo Rumor, sua obra poética foi descoberta e publicada anos
após seu suicídio em 2007. Seu livro de poemas, Nuvens, organizado por
ela em 1997, permaneceu inédito até ser publicado postumamente em 2017. Em 2019,
o livro póstumo de poemas inéditos lhe rendeu o Prêmio Jabuti de Literatura. Sua
história é marcada pela redescoberta de sua poesia por outros poetas e pesquisadores,
que reconheceram a singularidade de sua voz literária.
MISCASTING
So you think salvation lies in pretending?
PAUL BOWLES
estou
entregando o cargo
onde
é que assino
retorno
outros pertences
um
pavilhão em ruínas
o
glorioso crepúsculo na praia
e
a personagem de mulher
mais
Julieta que Justine
adeus
ardor
adeus
afrontas
estou
entregando o cargo
onde
é que assino
há
77 dias deixei na portaria
o
remo de cativo nas galés de Argélia
uma
garrafa de vodka vazia
cinco
meses de luxúria
despido
o luto
na
esquina
um
ovo
feliz
ano novo
bem
vindo outro
como
é que abre esse champanhe
como
se ri
mas
o cavaleiro de espadas voltou a galope
armou
a sua armadilha
cisco
no olho da caolha
a
sua vitória de Pirro
cidades
fortificadas
mil
torres
escaladas
por memórias inimigas
eu,
a amada
eu,
a sábia
eu,
a traída
agora
finalmente estou renunciando ao pacto
rasgo
o contrato
devolvo
a fita
me
vendeu gato por lebre
paródia
por filme francês
a
atriz coadjuvante é uma canastra
a
cena da queda é o mesmo castelo de cartas
o
herói chega dizendo ter perdido a chave
a
barba de mais de três dias
vim
devolver o homem
assino
onde
o
peito desse cavaleiro não é de aço
sua
armadura é um galão de tinta inútil
similar
paraguaio
fraco
abusado
soufflé
falhado e palavra fútil
seu
peito de cavalheiro
é
porta sem campainha
telefone
que não responde
só
tropeça em velhos recados
positivo
câmbio
não
adianta insistir
onde
não há ninguém em casa
os
joelhos ainda esfolados
lambendo
os dedos
procuro
por compressas frias
oh
céu brilhante do exílio
que
terra
que
tribo
produziu
o teatrinho Troll colado à minha boca
onde
é que fica essa tomada
onde
desliga
CABO FRIO
Nuvens
passageiras
miragens
peregrinas enfunadas pelo Nordeste
queda
de folhagem
muda
retórica
O
Sudoeste dá rédeas à repulsa
nuvens
erráticas devoram rivais
Orfeu
despedaçado por bacantes drapejadas de vapor
Em
dia sem vento
a
falta de engenho permite
purezas
de sabão e macieiras em flor
talco
no chão do banheiro
sorvete
marca Aristófanes
Mas
quase sempre ele pisa seus véus
Duas
mãos de cinza desmaiado
sobre
fundo esmaltado é perícia
renda
luxo
magnífico e corrupto
realização
elegante de algum mandarim
leque
de plumas de avestruz tintas de rosa
levemente
agitado diante da luz
O CINEASTA DO LEBLON
Aquele que escavar em
sua consciência
até a camada do ritmo
e flutuar nela
não perderá o juízo.
NINA GAGEN-TORN
O
brilho de laranja ao sol
amendoeira
rubra e pavão
oculta
sobressaltos faustianos
encenam-se
dramas na alma
suadas
peripécias
lágrimas
mímesis
em
sítios escusos está a mocinha raptada por um turco
e
a nudez do missionário espancado
folheia-se
uma antologia de acidentes
títulos
afundam
e
no lodo
personagens
sem nome
e
escândalos de fancaria
O
comércio incessante
distrai
das caudalosas sociologias do fracasso
idades
do ouro perdidas
terror
espetacular
recorta
o esforço de colosso trágico
alçar-se
acima da imensa massa de vencidos
violinos
pela indesejada que fatalmente alcança e ceifa
carnaval
exterior que é dublagem
Nos
domingos de lua cheia
um
infante sôfrego obriga a minuciosos tratados
miuçalhas
monopólio
asperezas
contrabando
e
então
razias
de corsário
na
lua nova cruzo a cidade pra beijar a sua boca
transpor
morros e encontrar a elevação
tropeça-se
em pétalas de rosas
em
trufas
visitas
ao paraíso
as
quartas-feiras são turvas
e
trazem as penas do inferno
telefonemas
seus
telefonemas
meus
telefonemas
da outra
e
a ex
compomos
o obrigatório conflito
repetir
com honestidade a velha trama
até
que ao fim do primeiro bimestre
erra-se
no açúcar
escorrega-se
na farsa
e
mudam-se todos para a novela das 7
Homem
da lua
fantasia
de rudes hormônios
o
bicho se coça
fervor
marcial e bico de passarinho
cavalo
rampante que rasga com as patas convenções de estilo
atravessa
pontes queimadas
alcançou
o vale feroz
terremoto
maior que o de Lisboa arrasa cidadelas
afrouxa
parafusos
e
do colchão abala a mola-mestra
ouviu,
carro?
tribos
bárbaras desabam sobre a minha Europa
ouviu,
montanha?
mudaram
os livros que eu agora levo pra cama
antigas
lendas fabulosas
uma
grosseira rapsódia
cinco
escritos libertinos
eu
bebo como num banquete em Siracusa
e
gozo como as prostitutas de Corinto
palmeira,
ouviu?
[UM HOMEM
NO CHÃO DA MINHA SALA]
Um homem no chão da minha sala
alonga sua raiz
galo que estufa o pescoço
cana-de-açúcar e bronze
poças, chuva, telha-vã
rio que escorre na velha taça empoeirada
O homem no chão da minha sala
cidades de ouro
castelos de mel
velhas metáforas
sinos línguas gelatina
O céu no chão da minha sala
Esse homem no chão da minha sala
provoca o veneno da cobra
pulgas atrás das orelhas
mexeu nos meus bibelôs
consertou aquela estante
revirou a roupa suja
desenterrou flores secas
fraldas
chifres
quatro cascas de ferida
um disco todo arranhado
e um punhado de pelos
Aquele homem no chão daquela sala
me fez cruzar o ribeirão dos mudos
estufa de tinhorões gigantes
no piso do meu mármore
ele acordou a doida
as quatro damas do baralho
uma ninfeta de barro
e a cadela do vizinho
Daquele homem no chão da minha sala
há meses não tenho notícia
desde que virei a cara
saltei janela
fugi sem freio ladeira abaixo
perdi o bonde
estraguei tudo
IMPOSSIBILIDADES
Viver suspensa nas nuvens
pôr nas nuvens o meu amor
e nunca mais cair das nuvens
SAGITARIANA
Qui trop embrasse,
mal étreint.
Parar
de fazer mil coisas ao mesmo tempo
de bater de encontro às coisas
de encontrar elefantes dentro das
lojas
Sou de porcelana
O HOMEM
DO MAR
O homem do mar era uma construção
serena
peixe fresco
corda
alcatrão
e a lembrança de velhos poderes
imperiais no Canal
O nosso foi um fogo que queimou
sem nos queimar
morreu na praia
estátuas silenciosas de sal
virávamos páginas em branco
a velha pergunta transbordando sempre
de cada livro no alto da biblioteca
de alto preço
de cada escultura construída no
além-mar
O mau fado me deixou a ver navios
ressaca impronunciável e alheia
falsas falésias
falácias
enseada escura
e canoa furada
BRIANDA ZARETH HUITRÓN (México, 1990). Originaria de Temascalcingo de José María Velasco, México. Artista plástica y pintora surrealista. Realizó sus estudios de pintura en la Academia de San Carlos en Ciudad de México. Sus múltiples facetas artísticas y personalidad curiosa la llevaron a descubrir el surrealismo, corriente en la que encontraría una manera de comunicarse con el mundo. Plasma interpretaciones poéticas donde lo cotidiano es transformado en una realidad fantástica y onírica. Pinturas mágicas que señalan los deseos de la vida por salir en un cuadro. Ha expuesto individualmente y de manera colectiva en México y en el extranjero. Exposiciones individuales: Museo Leonora Carrington de Xilitla, ENCUENTROS ONÍRICOS en el año 2025. Museo de la Mujer, REVELACIONES ONÍRICAS, en el año 2022. PAISAJES ONÍRICOS para el Festival Temascalcingo Honra a Velasco, en el Año 2021. VENTANA A MUNDOS ONÍRICOS, en el Centro Cultural Futurama, Ciudad de México, en el año 2020. Exposiciones Colectivas Col-art en la Galería Oscar Román año 2025 Muestra pictórica EL OFICIO DEL PINTOR, de la Academia de San Carlos, Año 2019. DIMENSIONS, Festival Wave Gotik Treffen, celebrado en Leipzig, Alemania, en el año 2018. Ha participado en la Cátedra por los 100 años del surrealismo, en la Facultad de Filosofía y Letras de la UNAM, impartiendo conferencia sobre surrealismo femenino. Recientemente su obra ha sido publicada en el libro Mujeres Mexicanas en el Arte, de la editorial Agueda y en THE ROOM SURREALIST MAGAZINE, revista de surrealismo internacional. Brianda Zareth Huitrón es la artista invitada de esta edición de Agulha Revista de Cultura.
Agulha Revista de Cultura
Número 263 | dezembro de 2025
Artista convidada: Brianda Zareth Huitrón (México, 1990)
Editores:
Floriano Martins | floriano.agulha@gmail.com
Elys Regina Zils | elysre@gmail.com
ARC Edições © 2025
∞ contatos
https://www.instagram.com/agulharevistadecultura/
http://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/
FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
ELYS REGINA ZILS | elysre@gmail.com
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