quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

AGULHA REVISTA DE CULTURA # 199 – dezembro de 2021

 

• EDITORIAL – AOS 21 ANOS, DOBREM AS APOSTAS

 


Este ano de 2021 a Agulha Revista de Cultura editou 36 números, o que significa a publicação de 360 ensaios sobre os mais diversos temas ligados às artes e à cultura em vários países, aí incluída a série PARTITURAS DO MARAVILHOSO: https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/10/agulha-revista-de-cultura-projeto.html. Este número atual, 199, encerra um período de alta voltagem e passa o bastão para outro marco, o número 200, que circula em poucos dias, tão logo se inicie 2022. Será o ano de nova série, SURREALISMO SURREALISTAS, além de trazer novas contribuições através de seus projetos paralelos, CONEXÃO HISPÂNICA: http://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2020/11/conexao-hispanica-2021.html, e o ATLAS LÍRICO DA AMÉRICA HISPÂNICA: https://revistaacrobata.com.br/atlas-lirico-da-america-hispanica/, este último uma parceria com a revista Acrobata, que o acolheu com inestimável generosidade. Também este ano publicamos, em 9 partes, a versão em espanhol de um belíssimo projeto que prepara a grega Agathi Dimitrouka: “Bolívar, eres bello como un griego”, tão querida amiga e valiosa colaboradora nossa. Dentre as matérias que agora publicamos incluímos uma série de depoimentos de amigos colaboradores, muitos deles ao longo desses 21 anos, uma festa que fala melhor por nós do que qualquer coisa que poderíamos dizer neste editorial. Um desses depoimentos, no entanto, assinado por Maria Estela Guedes, trazemos aqui para o editorial, como uma espécie de entranhável aperitivo.

Nossa artista convidada é inestimável Ithel Colquhoun (Índia, 1906-1988), surrealista genial, sobre quem, em meu livro 120 noites de Eros – Mulheres surrealistas, escrevi este retrato relâmpago:

 

A obra variada de Ithell Colquhoun inclui pintura, colagem, narrativa, ensaio, diário e poesia. Em um de seus livros, The mantic stain, ela aborda algumas técnicas que desenvolveu, a exemplo da grafomania entópica, que ela entendia como o tipo mais austero de abstração geométrica, espécie de radicalização do automatismo por ela levado ao extremo. Ithell inventou algumas técnicas surrealistas, sendo uma delas a parsemage, em que se espalha numa superfície de água o pó de carvão ou giz colorido, para que seja desnatado e então se passa levemente um papel, preferencialmente cartão duro, sobre a mesma superfície, revelando imagens fortuitas. The mantic stain é um dos raros livros teóricos sobre o Surrealismo escrito por mulheres. Embora tenha participado do grupo surrealista britânico – do qual acabou sendo expulsa por recusar afastar-se de outro grupo ao qual pertencia, de estudos do ocultismo –, Ithell sempre se considerou uma artista independente, tendo sido também uma das surrealistas que mais extensivamente experimentou diversas técnicas. Seus conhecimentos de ocultismo e prática mágica, cujo interesse havia sido despertado desde a adolescência a partir da leitura de um livro de Aleister Crowley, deram à sua obra um caráter alquímico, onde os processos automáticos, explorando sempre uma coincidência dos opostos, revelam uma sexualidade oculta que une mulher e natureza.

 

Os Editores

 

MARIA ESTELA GUEDES | Aos 21 anos da Agulha Revista de Cultura

 

21 anos perfaz a Agulha Revista de Cultura, sinal de maturidade. E também de resistência, portanto de sucesso. Ora vejamos: o que o tempo nos tem ensinado é que as revistas em papel, salvo exceções institucionais, em geral têm vida curta. Fácil é entender: as institucionais são financiadas pela instituição, donde a estabilidade, ao passo que as de curta vida, publicadas a expensas dos interessados (ou pais deles), devem a instabilidade e curta vida justamente à precariedade do financiamento. E, no entanto, a duração de vida pode ser entendida de outro ponto de vista: revistas que se limitaram a 1, 2 ou 3 números, constituem às vezes referências históricas e culturais, porque estabeleceram marcos para mudança, dando a conhecer novas ideias, novos estilos e novos autores. As revistas institucionais apresentam limitações na ordem do novo, apesar da sua longa vida. O exemplo da Orpheu é canónico, na escassez dos seus dois números e, não obstante isso, ponto de partida para o modernismo português, o que a tem feito durar mais de cem anos.


Com as revistas publicadas na Internet não se passará o mesmo, pelo menos do ponto de vista financeiro, mas muitas apareceram e já desapareceram como estrelas cadentes, outras, como a Agulha Revista de Cultura, permanecem, na sua função de padrões, ou monumentos destinados a assinalar presença memorável.

Com a Agulha Revista de Cultura entramos no espaço virtual, quase em absoluto ignoto há 21 anos, pelo menos na abertura proporcionada pela nova tecnologia às publicações culturais. Há 21 anos, mal começava ainda a Internet a ser balbuciada pela cultura – Floriano Martins, à testa da Agulha, é um pioneiro, cujo segundo mérito, neste âmbito, é o de ter puxado outros para perto de si e empurrado muitos para a edição virtual. O seu exemplo despoletou interesses, especializados ou não. Hoje, a Agulha Revista de Cultura é um veículo de difusão mundial de cultura que ninguém pode ignorar.

Neste ponto, cabe mencionar a ilusória especialização da Agulha enquanto veículo do Surrealismo, porque de um lado a visão que os criadores sul-americanos têm do surrealismo equivale à nossa de modernidade; em sequência, os limites para admissão de trabalhos na Agulha nunca foram rígidos, se porventura existiram: a revista sempre se quis de cultura, o que lança a rede a peixes que inclusivamente navegam em mares mais vastos que os da Literatura ou das Artes Plásticas. De resto, falando dos seus projetos editoriais, Floriano Martins revela o seu desejo de difundir a tradição lírica dos países da América Hispânica. Cabe refletir um pouco mais sobre o assunto, mas agora precisamos de apressar o passo.

Floriano é o homem da Agulha, e por isso da costura, da colagem de uns a outros espaços. Ao longo da sua caminhada pela Internet ele soube coligar-se, ora com meios idênticos de edição, ora com a tradicional papelaria. Uma das primeiras coligações estabeleceu-as com Soares Feitosa, diretor e proprietário do Jornal de Poesia, website que alojou a Agulha em seus primeiros anos. Outras parcerias foram estabelecidas com o Triplov, no qual foi co-fundador da Revista Triplov; com a revista Acrobata, a Agulha edificou o Atlas Lírico da América Hispânica, obra que publica poetas de dezanove países. Paralelamente, o projeto Conexão Hispânica publica ensaios sobre as obras, permitindo uma mais completa visão daquilo a que Floriano Martins chama a tradição lírica dos países hispano-americanos. Destes projetos têm resultado outros, em diferente suporte, caso da coletânea de entrevistas publicada em papel, Escritura Conquistada.

A publicação tradicional, como forma de a Agulha se fixar mais no tempo, e dar a centenas de autores a satisfação de acariciar nas mãos um livro, tem vindo a expandir-se. Muito importante foi a Coleção Ponte Velha, na Editora Escrituras, sediada em São Paulo, onde se publicaram dezenas de escritores portugueses, que assim viram transportada a sua audiência, não só para o estrangeiro, mas, além do Atlântico, para um Novo Mundo. E talvez aqui eu confunda a Agulha com Floriano Martins, mas na verdade é difícil dissociar as duas identidades.

Mais recente experiência da edição em papel foi a aliança de duas editoras, ARC e Cintra. ARC – Agulha Revista de Cultura. Uma bela coleção, O Amor pelas Palavras, deu luz a umas dezenas de títulos e autores, como sempre oriundos de diversos quadrantes, incluído o indígena, como se tornou marca da revista e do seu mentor, larga nas conexões de arte, literatura e origem dos participantes.

Pessoalmente, tenho beneficiado muito do convívio com a Agulha e com o seu diretor, por isso é com toda a veemência que desejo a sua sustentação durante mais vinte e um anos – pelo menos. E não cause estranheza que exprima nesta linha final o meu apreço e a minha grande amizade, com um abraço de parabéns à Agulha Revista de Cultura na pessoa de Floriano Martins.

 


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• ÍNDICE

 

AGATHI DIMITROUKA | Bolívar, eres bello como un griego [Parte final]

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/agathi-dimitrouka-bolivar-eres-bello_30.html

 

BERTA LUCÍA ESTRADA | Los apuntes de Humboldt, de Daniel Montoya

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/berta-lucia-estrada-los-apuntes-de.html

 

FLORIANO MARTINS | Más allá del Modernismo y la Antropofagia: los otros surrealismos del Brasil

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/floriano-martins-mas-alla-del.html

 

JEAN PUYADE | Benjamin Péret: um surrealista no Brasil (1929-1931)

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/jean-puyade-benjamin-peret-um.html

 

LUIS EDUARDO CORTEZ RIERA | Sor Juana y Goethe: del Barroco al Romanticismo

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/luis-eduardo-cortez-riera-sor-juana-y.html

 

MANUEL IRIS | Vela de armas, de Juan Calzadilla

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/manuel-iris-vela-de-armas-de-juan.html

 

MIGUEL PEREIRA | Entrevista: Glauber Rocha

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/miguel-pereira-entrevista-glauber-rocha.html

 

ROSA SAMPAIO TORRES | O Capítulo X da Divina Comédia

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/rosa-sampaio-torres-o-capitulo-x-da.html

 

TERRY GILLIAM | O sentido da vida em Fernando Freitas Fuão

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/terry-gilliam-entrevista-fernando.html

 

VÁRIOS AUTORES | A festa dos 21 anos da Agulha Revista de Cultura (depoimentos)

https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/2021/12/varios-autores-festa-dos-21-anos-da.html 

 



 


Ithell Colquhoun

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[A partir de janeiro de 2022]
 

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Agulha Revista de Cultura

UMA AGULHA NA MESA O MUNDO NO PRATO

Número 199 | dezembro de 2021

Artista convidada: Ithell Colquhoun (Índia, 1906-1988)

editor geral | FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com

editor assistente | MÁRCIO SIMÕES | mxsimoes@hotmail.com

logo & design | FLORIANO MARTINS

revisão de textos & difusão | FLORIANO MARTINS | MÁRCIO SIMÕES

ARC Edições © 2021

 

Visitem também:

Atlas Lírico da América Hispânica

Conexão Hispânica

Escritura Conquistada

 


Um comentário:

  1. A Agulha é um caso extremo de altíssimo talento beirando o génio de uma incursão pelo que de melhor e mais significativo se faz num mundo de sensibilidade, conhecimento e imaginação realmente criadora no Novo Mundo e em todos os outros universais.
    Vai o abraço firme e de muita amizade do teu, de sempre,
    Nicolau Saião

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