• QUARTETO
KOLAX
No palco do Katalox
Kolax, antes que se inicie a coletiva sob a direção de Anita Borgia, Zuca Sardan,
Pedro Kz e Dr. Flor aproveitam a deixa pra luzirem sob os holofotes solferinos do
Theatro Galhoffa, e trocarão ideias brilhantes pros primeiros chegados torcedores
de nossa Galera Kolax. Então… Mas que reboliço é esse?
TORCIDA: BRAVOOO!!! ZUCA!!! PETROK!!!
FOGUETÓRIO: PAFF!!! POFF!!! PACA-POOONGA!!!
FUMEX: Cuidado com os foguetes!!! Olha o incêndio!!
As cortinas já estão fumegando… Pois então, diga lá, Zuca, presto!!!, o que é a
Recensão???
ZUCA SARDAN: Na segunda metade do Século XIX, a fotografia
foi inventada e iniciava seus primeiros ensaios… inicialmente puramente científicos…
faziam sequências de um voluntário barbado andando nu num estrado… a seguir duma
garbosa amazona galopando um alazão… uma cena de uma feira de legumes, o Rei da
Noruega ao balcão, o Rei Zuku com suas sete Rainhas, e assim por diante. Eram estudos
científicos do movimento, e cenas de praça e balcão…
FUMEX: Mas e a Arte? Pedro Kz, a Divina Arte?… Se a
Fotografia nasce com a intenção de descrever cientificamente a Realidade, como a
Realidade reage à fotografia? Pertence a beleza da Realidade à Fotografia? E a quem,
afinal, pertence a Beleza? À Arte?… Ou à Realidade? Eis a questão.
PETRO KZ: Zuca, como lucidamente expuseste, a fotografia causou escândalo ao invadir um território
em que a arte reinava sobre a natureza e podia mentir a vontade. Com o tempo, a
fotografia transformou-se em mestra da contrafação e a arte, desocupada, desenvolveu
uma atração irresistível pela verdade absoluta… E onde situar a beleza? Será terrestre,
atmosférica ou um je ne sais coá na lagoa? Poderíamos passar a bola a Platão…
Ou ao Dr. Flor…?
FOGUETÓRIO: SCATCHIMBO VUP-VUP!!! PLAKA TAPUMBA!!!
DR. FLOR: Dona Mentira sempre cavalgou com seu fino
turbante multicor. Por vezes tão traquina colecionava juras de seus fãs que se empilhavam
pelo caminho para vê-la trotando velhos vícios de linguagem. Ao adentrar a Taberna
Luckacs, maldosamente pedia um Malbec, sabedora que era ali onde clandestina funcionava
a gráfica dos evangelhos agnósticos. Todos a miravam e se entreolhavam. Dona Mentira
adorava esses pileques da resistência. Mascou aqueles olhares todos e se pôs uma
vez mais a cavalgar fazendo pose de quem sabia estar sendo fotografada.
ZUCA SARDAN: Eu bem acho que poderíamos começar a pingolejar
anúncios premonitórios do Kolax, tal o Arcanjo dando umas buzinadas variadas,
cá e acolá… de que se vai desarrolhando o Armagedom… um anúncio, com alguma amostrinha
grátis, tal os antigos trilas, em cineminhas periféricos, aos poucos avançando pra
Metrópolis… provocaríamos assim as primeiras inquietações nas caboclas brejeiras,
nas japonesinhas ingênuas do Braz, nas fornarinas fornidas da Vila Madalena, nos
professores da Sarbonna, no Macron, no Putin, no Napoleão em Santa Helena, no Louvre,
na Torre Eiffel, e enfim nos altos jurados e juradas da Comissão de Seleção pro
Prêmio Norbel. Começaríamos a campanha pela Agulha RC, pelo Lyceo Pytanga,
pela Materika, pela Zuca Magazine (poderosa em Amsterdam), na TriploV
(tirânica em Lisboa), e no Gran Hotel Insolación, em Tenerife, de que são hóspedes
o nosso Príncipe Maurício de Nassau, e Maria Callas. E eu telefonaria pessoalmente
para o Rei de Zanzibar.
DR. FLOR: Também poderíamos despertar as monjas estreitas
de Gibraltar e os pinguins irados de Adelaide. Encheríamos a torcida como o bolo
nupcial da Pastora Passaredo, que confunde caroços de goiaba com os doze apóstolos.
Santo O’Dell preparou um modelito primaveril para que todos parecessem saídos
de uma adaptação da fábula das Ardósias. As sementes da mesma Grande Goiaba, que
não se converteram ao Vigarismo, bem poderia ser nossos diplomatas vigilantes documentando
peripécias afins pelo mundo inteiro. A um preço camarada, contrataríamos o melhor
fabricante de pandeiros para robustecer o baticum das sesmarias. E nuvens amigas
ganhariam peso e bafejariam pequenos caprichos de nossa pauta, previamente desfiados
para atender aos gostos que não se deixaram confiscar pela filosofia parda dos guetos.
Aos bagaços as sarabandas mal costuradas. Se deixarmos simplesmente a noite passar,
nada nos garante que amanhã faça sol.
ZUCA SARDAN: A grande questão será: qual a diferença
entre um Kolador e um Plagiador? A “Fonte”, do Duchamp, por exp., será um Kolax,
ou… um plágio dum objeto feito no próprio objeto?
Anita Borgia,
já com os papelotes prontos para seu perguntório aos três viajantes do paradoxo,
adentra os bastidores e mostra na ponta da língua uma pedra de toque para dar mais
suculência à conversa:
ANITA BORGIA: Xiiiiiiiiiii… Num nível menos metafísico,
um advogado poderá responder. Num nível mais metafísico, e dito assim muito grosseiramente,
o Kolador cria na cola e o Plagiador, não. O Kolador cria no objeto mesmo, ou nas
circunstâncias de produção/consumo do objeto. Talvez a “Fonte” seja este caso, assim,
simplesmente. Mas no nível talvez mais interessante, que para mim é o de que as
ideias andam rolando por aí e em certo sentido (não em todos) não são de ninguém…
aí não sei.
PEDRO KZ: O plagiador também pode vir a ter seu mérito.
Acho que a diferença do colador é que o plagiador é considerado em um contexto em
que se destaca seu interesse em enganar os outros em relação aos “direitos autorais”.
Entraria aí uma análise específica do contexto para saber em que medida esses outros
(incluindo em alguns casos, o verdadeiro autor da obra) merecem ser enganados ou
não, e se essa enganação pode contribuir para instalar uma situação mais ou menos
profícua… Quanto ao enigma do plágio na fonte de Duchamp, proposto pelo Zuca, proponho
a elaboração de uma solução coletiva colada com remendos pós-estruturalistas...
ANITA BORGIA: Parece que em sentido estrito não existem
propriamente plagiadores. Nem quando copiam tudo, vide Borges (Jorge Luis) e seu
“Pierre Menard, autor do Quixote”.
ZUCA SARDAN: Somos, todos os artistas, koladores, mas
só os koladores kolax assumem sua kola como o faziam os antropófagos modernistas.
DR. FLOR: A figura do Kolador me atrai somente quando
ele se afirma mais como um delirante do que simplesmente um criador de imagens a
partir de outras. A rigor, por mais que em certos casos a memória evite tocar no
assunto, somos todos koladores, em essência, considerando que a criação não existe
sem o fenômeno da transmutação dos corpos. A literatura aboliu um dos mais altos
truques dos ambientes plásticos e sonoros: a cópia. Poetas e prosadores, em geral,
creem – até honestamente – em um método fundacional de identidade que descarta o
passado. Esquecem que a singularidade da escrita, como em qualquer outra área da
criação, só vem à tona após um carteado inesgotável de mutações. O conceito de direitos
autorais pertence ao mundo jurídico. Ninguém pensaria em apor a sua assinatura em
uma obra de Gaudí, por exemplo, porque ela se defende sozinha, ela já reuniu em
si o número suficiente de mutações para se tornar inconfundível. Se a arte, ao longo
do século XX, foi perdendo singularidade, é outra a questão, não acham?
PEDRO
KZ: Sim, é preciso uma urgente avaliação da crise atual, do contra-ataque enfurecido
dos devotos de São Tomás de Aquino, que querem regulamentar a cola a partir da mimese
de Aristóteles… É preciso conclamar a sanha libertária das futuras edições do Katalok! Para tanto precisamos de um manifesto,
e para assinar o manifesto, um nome para o nosso Kollektiff…
ANITA
BORGIA: Proponho, como no quadro do Magritte, Les chasseurs au bord de la nuit. Alguém faz uma tradução bacana disso?
O título em espanhol aí no arquivo da imagem é mentira, é só para eu me guiar nas
aulas.
ZUCA SARDAN: Que tal, Anita, Os caçadores à beira da noite…? Hm Hm (pigarrito)… Não sei se o Magritte
ia aprovar… Enfim, segue a lista:
1) XafarizTropical
2) Foguete Voador
PEDRO
KZ:
1) Ciganos da Meia-Noite
2) Quarteto Prateado
ANITA
BORGIA:
1) Caçadores à beira da noite. Sem o artigo. E o Magritte
não liga, ele também era um kolador.
DR.
FLOR: Os Beatles têm o famoso caso da banda do Sargento Pimenta. Frank Zappa
tem um disco intitulado The Best Band You
Never Heard in Your Life. Eu
havia pensado em algo assim, que pudesse render boas explanações sobre o enterrado
plano de uma mente coletiva que agora tratamos de desencavar. Qual foi o Zuca que
eu brequei? Isoladamente gosto de XAFARIZ
TROPICAL, mas ainda acho que deveria ser algo mais fisgante, do tipo AS NOITES MIGRATÓRIAS DE UM XAFARIZ TROPICAL. Vamos tentando.
ZUCA SARDAN: Muito
bem, Floriano, bisogna a gente ir tentando. Como dizia o Nelson Rodrigues, só o
gênio absoluto descobre o Óbvio!… Inspirado no saudoso Mestre, peço vênia pra colocar
na lista: Quarteto Kolax. Ou, talvez melhor…
Mvseo Kolax.
DR.
FLOR: Gostei muito de QUARTETO KOLAX,
vai direto ao ponto daquela sutil simplicidade que abrange o mundo inteiro. É cativante
e ambíguo, pode ser um bando de malucos das tintas, grupo musical ou quatro bandidos
preparados para uma nova onda de assaltos. Se a tchurma toda topar, pode ser este.
PEDRO
KZ: Ótimo, pois evoca T. S. Eliot, Beethoven e Kali, a deusa hindu… tal como citada
no canto quarto do quarto canto do quarto em que o Ezra Pound cumpriu prisão domiciliar!
ZUCA SARDAN: Bravooooooooooooooooooo.
ANITA
BORGIA: Não entendi, não estávamos ainda em processo de escolha do nome? Me parece que
a decisão não foi definitivamente fechada…
Ainda cabem recursos… instâncias… Existem propostas que mereciam ser preservadas
ao menos em nota, como “Caçadores beirando a noite”…
PEDRO
KZ: Esta talvez seja a última oportunidade de externarmos uma opinião a propósito do gênero da recensão. Gostaria de fazer uma singela
referência à relação, pra lá de múltipla, de pictura e poiesis… Reforçarmos uma
proposta edificante para despertar nos leitores mais discursivos uma demanda por
imagens, e nos mais expectativos uma demanda pelo verbo…
ANITA BORGIA: Vocês estão mudando de assunto…
ZUCA
SARDAN: Uma balança justa entre texto e ilustração… É justamente a proposta do komix, arte que surge em tiras nas edições
dominicais dos jornais usamericanos cuja importância vai aceleradamente crescendo…
ATÉ A CATARSE
DESPUDORADA DO PÚBLICO
*****
• ÍNDICE
AS CORES PREFERIDAS
DE ANITA BORGIA
AS TÁBUAS RELAXADAS
DA FOLIA
ELECTRA
VAMP STAR
ENIGMAS DA PEDRA
LASKADA
ENTREVISTA
CREPUSCULAR DO CIRCO CYCLAME
KATALOK KOLAX TRIO
MESA
QUADRADA NO SALON KOLAX
TABULA RASA DAS
RECENSÕES
TREM CARTHAGO: O FUTURO A TODA PROVA
DIÁLOGO MULTICOR COM ANITA BORGIA
EDIÇÃO COMEMORATIVA | CENTENÁRIO DO SURREALISMO
1919-2019
QUARTETO
KOLAX é uma carroça de
atores percorrendo os escombros da arte contemporânea com seu teatro automático.
Seus integrantes são Anita Borgia, Dr. Flor, Pedro Kz e Zuca Sardan. As imagens
que acompanham a edição, reconhecidas ou não, por efeito cênico, são estrategicamente
anônimas.
Agulha
Revista de Cultura
20 ANOS O MUNDO CONOSCO
Número
125 | Janeiro de 2019
editor
geral | FLORIANO MARTINS | floriano.agulha@gmail.com
editor
assistente | MÁRCIO SIMÕES | mxsimoes@hotmail.com
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& design | FLORIANO MARTINS
revisão
de textos & difusão | FLORIANO MARTINS | MÁRCIO SIMÕES
ARC
Edições © 2019
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