ATO 1
Palco escuro. É possível ouvir uma pequena peça de Edgar Varèse – Density
21.5 – tocada por um serrote com arco de
violino e um xilofone de água. A luz vai aparecendo aos poucos, conforme a
música vai sumindo, mostrando no centro do palco um cubo de acrílico
hermeticamente fechado com uma base de 3 metros, suspenso do solo cerca de 30
cm. Dentro do cubo estão cinco criminosos condenados à morte que aguardam a
data de sua execução. Todos eles usam a mesma roupa típica de prisioneiro.
VALENTÍN
Em uma sentença de prisão perpétua, contar os dias equivale
a um desejo mórbido de saber quanto tempo dura a eternidade. Mas não vou viver
para sempre. Nem a eternidade.
SANTIAGO
Posso programar um jogo da forca que vai invadir toda a rede
reproduzindo o rosto de cada usuário na tela com a silhueta dos fragmentos de
seu corpo se formando de acordo com os pensamentos maquiavélicos.
VALENTÍN
Mas aqui você não poderá fazer nada. Até o suicídio exigiria
pelo menos o uso de uma corda.
ASTRID
É irônico que estejamos condenados à eternidade.
ABELARDO
A eternidade pode ser um milésimo de segundo infinitesimal,
pode tomar a vida de três gerações, ou ter a duração fugaz de uma borboleta.
ASTRID
Olhando dessa forma, eu diria que a eternidade é uma igreja
gótica ou o templo de Poseidon ou Machu Picchu. As pedras são eternas, mesmo
quando se tornam pó elas se transformam e viram pedras novamente. Algo que não
acontece conosco, embora acreditemos ser o centro do universo.
VALENTÍN
Pode ser, talvez a eternidade seja energia e nós somos
energia. Isso não nos torna eternos?
SANTIAGO
Acredito que eternidade são sonhos, pelo menos quando
consigo entrar naquele terreno ambíguo posso fugir deste cubo e sentir o vento.
Às vezes ele fica violento e se disfarça de furacão e depois me derruba. Quando
acordo ao ar livre já não existe, só vejo este cubo que me afoga, não só porque
as suas paredes me impedem de escapar, mas porque estou com vocês, a minha
verdadeira tortura.
CAYETANO
Nos meus sonhos arranho o tempo e sigo as pegadas dos
elefantes ou tento me pendurar na cauda de um cometa ou passar pelo olho do
furacão de Santiago. É assim que concebo a eternidade.
VALENTÍN
O dilema é que o duvidoso reluta em aceitar que é incerto.
Mesmo quando ensinado sobre a grandeza da dúvida, persiste com seu ar de
certeza pomposa.
ASTRID
Sem certeza sobre o destino da eternidade?
SANTIAGO
Nos momentos mais exatos, quando as dúvidas são sobre o
epicentro de suas remissões no mundo, ele percorre outras trilhas insondáveis de certezas
circunstanciais. Talvez um trevo de quatro enigmas seja a melhor maneira de se
dedicar à causa das lâmpadas irredutíveis. Lá
ouviremos um grito pantanoso de arrependimento inútil quando o outono entrar no
baile e reunir dúvidas antes da meia-noite.
VALENTÍN
Ainda acho que eu poderia contornar a previsão do tempo e
reverter nossas convicções.
ASTRID
Como você pode pensar em contornar a vigília do tempo e
anular nossas sentenças sem ter certeza do destino da eternidade? É como entrar
na boca do lobo, ou pior, entrar no labirinto do Minotauro sem Teseu.
CAYETANO
Duvidar é o único exercício filosófico que me interessa. As
verdades absolutas ou reveladas são aquele uivo pantanoso a que alude Santiago.
No entanto, não acredito em arrependimento, nem acredito em perdão. Quem se
arrepende e pede perdão já não é o mesmo que cometeu o crime pelo qual estamos condenados
a viver neste cubo estreito e fedorento.
ASTRID
Você quer dizer que nossa verdadeira condenação não é
estarmos trancados aqui e apoiar um ao outro neste espaço miserável, mas viver
para sempre com o último minuto que mudou a liberdade pelo confinamento?
CAYETANO
Quer dizer, não é necessário espalhar a lágrima. A certeza
às vezes parece estupidez, assim como uma lágrima parece vidro.
VALENTÍN
Além disso, acho que a eternidade é uma espécie de truque
banal que nos arrasta por seu labirinto indecifrável.
CAYETANO
Isto é certo. Certas coisas duram mais que outras, talvez
porque não saibam contar o tempo necessário para seu fim ou começo. Muitos
outros se perdem na história das mãos e a todo o momento anunciam sua própria
morte. Melhor desvendar a fábula e a crença de que Deus pode um dia ser útil, e
quando nos falta a compreensão de ser qualquer um, ele pode vir nos dizer que
um bom ladrão não rouba tempo nem espaço, mas sim a ilusão de que tudo tem seu
preço.
VALENTÍN
Não sei se é certo falar em preço. Em todo caso, a minha
experiência aponta para a ambiguidade do paradoxo, a forma como este mesmo cubo
onde estamos pode ser a cópia de outra realidade que nos leva para dentro de
seu espaço que sai aqui e ali e se encontra com outras tantas formas de olhar
as coisas.
ASTRID
Como as bonecas russas?
VALENTÍN
Quando os policiais descobriram que eu tenho essa obsessão
por embalsamar cadáveres de crianças, encontraram em minha casa uma coleção
real de bonecas, as minhas meninas sagradas, e viram nisso uma obsessão sexual,
uma versão que revela mais da hipocrisia da acusação do que da própria
realidade criminal. Eu nunca poderia fazer sexo com elas. O que me interessou
foi encontrar um ponto de esplendor de indiscutível beleza. As bonecas russas
saem umas das outras, como representação de algo que não tem fim. No entanto,
esse movimento nelas é finito. Minhas bonecas estão próximas umas das outras e
podem atingir uma projeção infinita, como os volumes de uma biblioteca
inesgotável ou os verbetes de uma enciclopédia cujo fim é desconhecido. Acho
que é assim que entendo a eternidade, essa possibilidade de definir o infinito
de acordo com a percepção de cada um.
SANTIAGO
De qualquer forma, tudo é relativo. Recentemente você alegou
que poderia contornar o relógio do tempo e anular nossas convicções, e de certa
forma concordo com você. Muitas vezes me pergunto: o que é o tempo? Isso
realmente existe? É algo que imaginamos ou que nos é imposto? Refletimos sobre
a eternidade porque estamos condenados à prisão perpétua e sabemos que a única
saída deste cubo é quando nos levarem para a frente do pelotão. Este é o nosso
único túnel de fuga – tudo o mais é ilusão ou pesadelo.
ASTRID
Às vezes, os pesadelos são melhores do que a realidade.
Somente assim podemos escapar do confinamento deste cubo que nos afoga e que
nos torna inimigos quando deveríamos abaixar nossas espadas. As bonecas russas
são um artifício com o qual enganamos a realidade. Assim que dormem, elas
desaparecem e ficamos apenas nós cinco, uns de frente para os outros. O que
resta são os cadáveres embalsamados das meninas de Valentín.
CAYETANO
O confinamento nos transforma em bestas indomáveis. Não
paramos de pensar em suicídio e, antes de terminarmos com nós mesmos, avaliamos
mil maneiras diferentes de assassinar os demais. Pelo menos eu os mato a cada
momento e de maneiras muito diferentes. Imagino banquetes em que cada um de
vocês é servido em uma grande mesa, na qual eu sou o único comensal, o rei do
banquete.
ABELARDO
Alguém acha que veremos o pelotão?
ASTRID
Por fim, Abelardo diz algo. Que dúvida você tem?
ABELARDO
Há quanto tempo estamos aqui? E como acabamos neste cubo
maldito que não nos permite ver nada além deste espaço confinado? Sem luz ou
cadeira. Nenhum ruído ou serviço de alimentação. Não te surpreende que não
tenhamos sede ou fome aqui e que nossa aparência não tenha mudado?
CAYETANO
Em que está pensando, Abelardo?
ABELARDO
A passagem do tempo pelas dobradiças das portas geralmente
não é tão intensa quanto o nado de certos peixes contra a corrente. Talvez o
rio tenha outra medida das impurezas do tempo. Ou talvez a ferrugem tenha um
segredo que mil portas não podem desvendar. Onde começa a passagem de um
quebra-cabeças para outro é algo que portas e rios dificilmente explicam. Como
a ferrugem escondida nos olhos dos peixes.
CAYETANO
Não sabemos quem somos ou que razão nos trouxe aqui, isso é
verdade. Possivelmente cometemos um crime e também podemos ser acusados de sermos inocentes. Se a
eternidade nos testa, ela espera que admitamos a culpa ou a inocência?
ABELARDO
E existe realmente alguma lógica para tal julgamento? O
certo é que, assim como afiar um lápis, removemos a ferrugem do tempo. O que
acontece é que, enquanto o lápis se esgota rapidamente, o tempo é inesgotável.
SANTIAGO
Minha única certeza, se tal coisa existe, é que a eternidade
nos prendeu neste cubo infame e, como Dorian Gray, não envelhecemos nem
morremos… e que não há retratos de nós… nem mesmo espelhos onde possamos nos
contemplar.
ASTRID
Nesse caso, nos banhamos a cada momento na fonte da eterna
juventude que Juan Ponce de León tanto buscou? Maravilhosa descoberta… e não
sabíamos? Muitas pessoas pagariam fortunas enormes para ter o privilégio que
impede a passagem do tempo de arruinar nosso corpo e mente.
ABELARDO
Possivelmente sim. No entanto, não há privilégios sem
condenações, e a nossa é o encerramento perene neste cubo que não tem túneis ou
grades.
CAYETANO
Para mim, a pior condenação não é ficar preso para sempre,
mas sim o isolamento total do mundo. Há quanto tempo não vimos mais ninguém?
Nós nem sabemos há quanto tempo estamos aqui. São semanas, anos, séculos,
milênios? As pessoas que conhecemos ainda estão vivas? Como está o mundo lá
fora? Tudo continua igual? Poderíamos nos adaptar a essa realidade se fôssemos
perdoados amanhã? Essas são as grandes e temíveis questões. Não acho que estou
preparado para as respostas.
ABELARDO
[Rindo descaradamente,
deixando todos boquiabertos.] E pensar que me acusavam de ser um sonhador…!
Agora, Cayetano, a eternidade, como a realidade, nada mais é do que um efeito
de suspensão. Nunca saberemos com certeza a extensão da ausência. Somos como
espelhos cegos, assim como o mar parece um rio que perdeu uma de suas margens.
Aceito que estamos condenados ao absurdo. E não haverá melhor onda de
resistência do que simplesmente isolar o que lembramos do mundo exterior.
CAYETANO
Eu admito minha insanidade. Talvez sejamos limitados demais
pela moldura, a silhueta desgasta tudo o que queremos e conquistamos.
ABELARDO
Dê uma boa olhada. Imagine uma imagem à nossa frente. Uma
floresta por trás dessa pintura viveu esquecida por décadas até que a moldura
foi quebrada. Uma natureza morta às vezes é apenas uma miragem que o olho
evita. Tanto relemos a memória que temos pela frente que resistimos a aceitar a
loucura de outras máscaras que devoram a paisagem e daquilo que insistimos em
esquecer, talvez para que o mundo seja um remake
menor da queda de sua moldura.
ASTRID
Acho que agora todas as certezas de Santiago se foram…
SANTIAGO
Talvez eu ainda tenha uma: a de que nunca iremos para o
pelotão. Mas ao mesmo tempo me pergunto qual é o valor dessa certeza.
ASTRID
Sua única e última certeza me parece infernal. Não tenho
medo do pelotão, a morte é meu único desejo. Não aspiro à eternidade nem quero
beber da fonte da juventude eterna. Essas duas opções parecem ainda mais
assustadoras para mim do que a condenação neste cubo.
SANTIAGO
[Com um gesto de
impaciência e profundo desgosto.] Você não entendeu nada, Astrid! O pelotão
somos nós mesmos, atiramos em nós mesmos vinte e quatro horas por dia. Isto se
ainda pudermos levar em conta essa maldita medida temporária. Possivelmente
estamos mortos há séculos e ainda não aceitamos isso. Jamais sairemos daqui nem
escaparemos para nos olharmos naquele espelho terrível que são os olhos de cada
um de nós, o único espelho que não é cego.
ASTRID
[Prestes a chorar
enquanto balança o cabelo.] Quanta crueldade e ódio há nessa fala! Que
necessidade há de me dizer que nem tenho o direito de pensar na morte? E o que
é pior, como se atreve a me dizer que a foice nunca virá me derrubar? Você é um
monstro!
SANTIAGO, ABELARDO, CAYETANO E VALENTÍN
[Em uníssono.]
Monstros não existem, Astrid! Pare de pensar em contos de fadas, eles não têm
lugar aqui!
SANTIAGO
Eu vou dizer algo. Nunca considere o tempo um problema.
Imagine o quanto podemos ser sagazes ao enfrentar a avalanche de nossos mais
diferentes sentimentos. Uma torneira aberta a noite toda pode inundar qualquer
sonho. Sempre dei preferência aos trabalhos corporativos, pois apresentam um
campo mais amplo de paradoxos. Ao lidar com um cliente individual, não podemos
ir além da linha entre a verdade e a mentira. Ao contrário, se aceitarmos um
pedido de uma multinacional, por exemplo, podemos trabalhar com um número
infinito de linhas que confundem os conceitos. Certa vez, dois grandes bancos
doaram milhões para um fundo de apoio a crianças carentes na África, realoquei
valores de contas secretas, certamente tráfico de drogas, fazendo com que
fossem primeiro transferidos para bancos estatais, de onde desviei o dinheiro
para o cliente, incluídas as cifras de meu contrato. Em meio a esse engano, não
se sabia mais o que era certo ou errado, mais ainda: ninguém mais estava
interessado em saber.
ASTRID
Sempre afirmei que, se alguém vai viver de joelhos, é melhor
morrer de pé, mas agora vejo que a realidade tornou ingênua a crença no
livre-arbítrio. Todos nós temos vítimas e algozes em nossos corações, e nossas
escolhas são como imagens desbotadas de velhos cenários, já quase completamente
desacreditados.
ABELARDO
A filosofia é prejudicada pela falta de significado do mundo
real. Identificar um modus operandi,
em um assassinato em série, pode ser a tática engenhosa de uma gangue de
meninos depravados dispostos a colorir o motivo da loucura.
SANTIAGO
Como se um de nós estivesse disposto a morder a pele do
outro para provar a existência da matéria. Tangíveis ou não, aqui somos como
cinco vacas pastando o absurdo.
CAYETANO
As vacas pastam de forma que os biscoitos se tornem
comestíveis, pois se escondem na parte inferior do endereço da embalagem. Os
aspiradores também conhecem as leis tangíveis do mundo comestível e promovem as
melhores oficinas de mordidas, bem como festas de arrecadação de fundos no
império da pasta de dente. A verdade é que mesmo a carne morta muda de cor após
a primeira mordida, da mesma forma que as asas apenas se reconhecem com a
sincronicidade desperta de seus voos.
ABELARDO
Gosto da ideia de Santiago. Nesse caso, somos atores eternos
no teatro do absurdo. Mas o que não é assim? Onde está a lógica e onde a
loucura? Qual a linha que as separa? Os pesadelos não são mais coerentes do que
a lógica pura?
SANTIAGO
É por isso que falo a verdade e minto. Eles não se
complementam? Existem verdades absolutas? Eu não acredito. Nem podemos viver em
uma farsa eterna, pelo menos não permanentemente. A cada madrugada haverá
sempre um fio que não estará muito tenso.
ASTRID
Em outras palavras, somos apenas fantoches movidos por uma
força desconhecida? É por isso que nos falta livre arbítrio? A liberdade é uma
utopia e por isso mesmo não importa se estamos presos ou nas ruas? Os
transeuntes das grandes avenidas são prisioneiros de forças ocultas, por isso
ignoram tudo? Ou são prisioneiros de si mesmos? Estou perguntando sobre o
discurso de Santiago sobre as multinacionais. São elas que controlam os fios
dos quais nos penduramos a cada momento? Sabemos no fundo que, se nos movermos
muito, acabaremos pendurados? Em outras palavras, a única saída possível está
em nossas mãos?
ABELARDO
Os conceitos são corporativos, sempre têm uma finalidade
específica. A verdade é que não existe uma força desconhecida que governa
nossas vidas. Não acredito em fatalismo. Até mesmo o acaso cria em um vazio sem
perspectiva. Há uma acomodação sinistra, como a cobertura de seguro de vida,
que dá grande apelo à morte.
SANTIAGO
Existe até mesmo essa falta de equilíbrio entre a eternidade
e o momento. Um dreno marginal pelo qual nossa existência flui. Criamos
metáforas para evitar que a essência das coisas nos escape. No entanto,
acabamos usando essas mesmas metáforas para escapar de nós mesmos. Abandonamos
alguns aforismos que deveriam guiar nossos seguidores. E nessa margem
imaginária onde vamos pousar, certamente os fantasmas de tudo o que matamos em
um instante nos aguardam. Acreditando que jamais sairemos deste cubo infernal, essa
agora me parece a maior ilusão. Para isso, precisaríamos ser imortais, não
criminosos fracassados que
se deixaram prender. A imortalidade é
outro engano. [Abelardo interrompe a fala
de Santiago com a mão levantada. Santiago se vira
para ele.] Não concorda, Abelardo? [Quando
Abelardo começa a dizer algo, toda a cena de repente fica em completa
escuridão, encerrando assim o primeiro ato.]
ATO 2
Palco escuro. Agora ouvimos a mesma peça de Edgar Varèse tocada pelo
mesmo serrote com arco de violino e um xilofone de água. A luz vai aparecendo
aos poucos, à medida que a música vai sumindo, mostrando no centro do palco o
mesmo cubo de acrílico, onde apenas quatro dos criminosos condenados à morte
aguardam agora a data de sua execução. Abelardo se foi.
SANTIAGO
E Abelardo, o que aconteceu com ele?
VALENTÍN
O mesmo que acontecerá com todos nós. Falamos o tempo todo
sobre a eternidade e pensamos que fazemos parte dela quando, na realidade, os
únicos seres imortais são os cadáveres de minhas meninas embalsamadas. Elas
ainda estarão lá em dois mil anos, como se fossem múmias egípcias. Existe o
ponto crucial da imortalidade… tanta filosofia e ninguém percebe?
ASTRID
Rapaz, você é cínico! Parece que você é o único com os pés
no chão!
SANTIAGO
Ainda não entendi nada! Como Abelardo poderia desaparecer?
Ele, que sempre teve uma palavra ou explicação filosófica, simplesmente
evaporou? Esse é o nosso destino? E isso já havíamos discutido sobre sua
inexistência!
CAYETANO
E por que não poderia evaporar? Em última análise, esse é o
nosso único destino.
VALENTÍN
Ouçam! Sem gritos ou tiros. Até o silêncio se recusa a
explicar o paradeiro de Abelardo.
ASTRID
Chega, Valentín! Esse cinismo não resolve nada.
VALENTÍN
Não é mais cinismo, Astrid. Abelardo desapareceu do cubo e
logo desaparecerá de nossa memória. Talvez a sua filosofia seja a causa, afinal
nunca soubemos que crime ele cometeu. Estou começando a pensar que nada disso
importa. Assim como as religiões são o resultado de uma mentira – os dogmas são
impostos em retaliação à realidade –, os crimes são um truque das
circunstâncias. A moral por trás deles nada mais é do que miragens no deserto
dessas almas errantes que vagam pela terra em busca de proteção.
CAYETANO
As noites são contadas no prato. Quem dorme com fome não
conhece a noite, mas apenas a escuridão voraz de um abismo que adia a
consciência da morte em cada um. O que diabos você queria entender, Santiago? O
que há para entender sobre suas bonecas de pelúcia?
VALENTÍN
As bonecas são minhas…
CAYETANO
Aqui dentro não importa mais quem de nós pertence a um crime
ou outro. Eu sei que as bonecas são de Valentín, mas eu queria provocá-lo. Sua
reação mostra que você ainda acredita na individualidade do ser. Valentín é
nosso artista, satisfeito com a assinatura de sua obra. Você nunca poderia ser
um criminoso simplesmente porque não acredita em plágio. Seus pulsos são a
marca de sua passagem pela terra.
VALENTÍN
Quanto desprezo há em suas palavras, Cayetano! Você não faz
jus ao seu nome. Não sei se gosto de plágio ou não, não importa. Seus crimes
são comuns, mesmo que você não seja original. Você é como as minhas bonecas
russas. Quanto mais eu lhe conheço, mais insignificante você é. Você poderia
andar na areia lavada pelas ondas e mesmo assim seus pés não deixariam marcas.
E não porque você seja etéreo – não tenha muitas esperanças –, apenas porque
você é menor do que o meu polegar.
CAYETANO
Ha ha ha… !!!!!!!!! Você caiu na rede. Meu abismo é
insondável e infinito, e pegou você! Você se deixa provocar neste espaço onde
não há oxigênio para quatro, nem mesmo para dois. Aqui nos engolfamos, servimos
uns aos outros… e hoje está servido o banquete e você é o único que não está
comendo!
ASTRID
Mesmo neste cubo as tempestades são passageiras. Sonhamos em
destruir um ao outro e um minuto depois choramos em seu ombro. A única certeza
que tenho é que me tornarei o esquecimento, e não porque haja névoa ou abismo,
mas porque a memória humana é muito frágil. Mesmo as religiões, bastiões de
muitos, estão diluídas no ar.
SANTIAGO
O abismo controla as apostas nesse jogo de máscaras. Ainda
não entendo muitas coisas. Talvez o cinismo de Cayetano encontre sinais de
presunção em Astrid quando ela quer cair no esquecimento. Acredito que o
esquecimento é uma espécie de dom secreto que não contempla a totalidade da
humanidade. Alguns são vagamente lembrados, o que é uma forma de evitar chegar
a uma etapa além daquela eternidade de que tanto falava Abelardo. Os grandes
mundos estão esquecidos. A pequenez da vida nos persegue como fios de memória.
CAYETANO
Agora é a vez de Santiago mostrar as ondas sonoras de seus
pensamentos. Não se esqueça que teremos que continuar neste viveiro de
especulação. Não estamos transformando esta caixa de alucinação em uma sala de
interrogatório. Ao menos aqui não devemos encontrar exatamente a harmonia, mas
sim o lugar de adoção onde podemos ser qualquer coisa, sem imposições morais.
ASTRID
Nosso crime pode ser termos cometido uma forma legítima de
violência. A sociedade até conspira contra a integridade do crime. Vivemos em
um mundo de acólitos onde ninguém deveria ser autêntico. As pessoas que
frequentei estavam perdendo a beleza porque só gaguejavam slogans. Fui traído
por um amante que me considerava um espião em nosso íntimo, precisamente porque
eu não cumpria integralmente as ordens da cúpula.
VALENTÍN
A política é um exercício de vassalagem.
CAYETANO
Isso é bom! Um romance de deuses e mártires excomungados.
Uma evolução assustadora de assuntos. O rastreamento dramático de pessoas que
não sabem sua verdadeira causa.
VALENTÍN
Ou talvez sejamos simplesmente vítimas das causas.
SANTIAGO
Todos nós somos vítimas de algo ou alguém. Não há ninguém
que possa escapar desses projetos. Não porque sejam divinos, mas porque é a lei
inelutável da vida e dos grupos gregários… e o ser humano é gregário por
natureza.
VALENTÍN
O que o amante de Astrid não entendeu é que somos todos
espiões e é por isso que nos traímos a cada segundo. Os slogans dos pequenos
grupos radicais ou reacionários funcionam da mesma maneira. Eles são projetados
para fazer uma lavagem cerebral e evitar que os acólitos pensem, reflitam,
analisem e critiquem. Assim, na China ou na URSS e mesmo em Cuba, se realizavam
autoexames onde aqueles que se consideravam traidores deviam de certa forma
pedir perdão, e já discutimos outro dia que o perdão não existe. Quem se
recusasse a fazê-lo estava em um expurgo do qual era bem possível que ele nunca
mais voltasse.
ASTRID
Somos todos traidores? Portanto, a redenção não existe?
VALENTÍN
Que não me acusem de cinismo de novo, mas não esqueçamos que
os rios também se afogam. A quantos metros reconhecemos as miragens? A política
acabou com a eficácia da nossa forma de identificar e resolver evidências. A
mecânica dos nacionalismos cortou e colou espelhos instruídos nas fronteiras
para revelar graças que jamais poderiam ser alcançadas. Quem entre nós
recusaria uma xícara de chá com o Chapeleiro Louco? [Cayetano mal conseguiu conter o riso com as declarações de Valentín.]
Somos mais do que traidores, Astrid. Somos os falsos iniciados de uma realidade
suspeita onde, é claro, a redenção é uma farsa. Não sem um invejável grau de
lucidez, Robert Charroux previu que em
uma sociedade futura os sentidos se tornarão cada vez mais atrofiados e
substituídos por uma organização protetora criada pelo cérebro. Vivemos em
uma linha de perversão que matou a subjetividade. Não nos reconhecemos. Somos a
cópia daquele outro que por sua vez nos imita, ambos classificados como
fantasmas de uma humanidade despovoada.
CAYETANO
Alguém ainda se preocupa com o elixir da imortalidade?
VALENTÍN
É por isso que o purgatório ou limbo deste cubo maldito não
me engana. Não há pelotão esperando por nós. Não saberemos mais o que está
acontecendo lá fora. Somos receptores de frequências canceladas. Nenhum sistema
foi programado para garantir um novo código genético, por exemplo.
ASTRID
Sem possibilidade de reencarnação?
VALENTÍN
A transferência dessas luzes espirituais é algo que dá certo
encanto ao impossível. Somos governados pela memória, mas isso faz parte do
mecanismo do cérebro. A morte aniquila todo culto à personalidade. A
eletricidade liberada certamente encontrará outro casulo, mas essa
transmigração não envolve vidas sequenciadas. Os vasos comunicantes atuam
apenas na consciência. Sem memória, o homem se livra da duração de seus dons.
CAYETANO
Parece que estou ouvindo Georges Orwell, o que você diz é o
que ele escreveu em 1984… e em 1984 a
realidade superou a ficção. Em que ano ou século estamos? Não sabemos. E, no
entanto, Orwell ainda é tão atual quanto no final do século XX. O que
confirmaria que os seres humanos pertencem apenas a um rebanho de ovelhas
obedientes, talvez geneticamente selecionadas para evitar outros equívocos. De
certa forma, foi isso que aconteceu conosco. Astrid é a prova convincente do
que afirmo. Caso contrário, nem a traição de seu amante, nem a fúria da cúpula
que a condenou a este inferno seriam explicadas
ASTRID
Vocês ainda não responderam à minha pergunta: não consideram
isso importante e, ainda, pode-se dizer que somos a reencarnação de milhões de
pedestres anônimos que vagam pelas ruas das cidades do horror que a
subjetividade, a que alude Valentín, criou naquele século XX que Orwell tão bem
descreveu. Se não fosse assim, já teríamos desaparecido há muito… e aqui
continuamos discutindo a transmutação da alma e a armadilha do livre arbítrio.
VALENTÍN
Você finalmente diz algo coerente, Astrid! O culto da
verdade é a face oculta da falácia a que estamos condenados.
SANTIAGO
Por que não estamos com fome? Que verdade se esconde por
trás dessa ausência de sensação? Aposto que cada um de nós gostaria de ser seu
próprio mestre de justiça. A humanidade trata a verdade como se fosse um pacote
para aqueles que primeiro tocaram a face de Deus. A verdade é um prêmio. Esta é
a conclusão aterrorizante de nossas ações. Os Manuscritos do Mar Morto
trouxeram à luz outra versão da verdade bíblica. Prova exemplar de que Deus
sempre foi imensamente fascinado por ameaças.
VALENTÍN
Vergonha para todos os corpos que dependem do espírito.
SANTIAGO
Exatamente isso. Aos olhos dessa doutrina, todos somos
criminosos. O pecado é um monstro desprovido de humanidade. Deus é a explicação
de todas as nossas mentiras.
VALENTÍN
Por isso sempre busquei a beleza e não a verdade.
SANTIAGO
Já pensamos em como nossas frases são distorcidas? Que
crimes realmente cometemos?
ASTRID
A beleza é mais importante do que a verdade? De que beleza
eles estão falando? Como a verdade, a beleza é um sopro cultural e até bastante
subjetivo. Mesmo que você tente estabelecer modelos estéticos universais, eles
sempre encontrarão armadilhas, como verdades absolutas e, claro, eles variam
rapidamente.
VALENTÍN
O maior crime que cometemos todos os dias é continuar
vivendo. Às vezes, acredito que o suicídio é a única forma de redimir
penalidades. Não importa se são de natureza religiosa e, portanto, morais, ou
se são castigos impostos pela sociedade, como parece ser o nosso caso.
SANTIAGO
E voltamos ao cerne da questão, do qual nunca podemos
escapar. Quais são os nossos castigos? Que crimes hediondos cometemos que nem
temos possibilidade de resgatar as sentenças e, portanto, permanecemos
trancados neste balde fedorento, aparentemente por toda a eternidade?
CAYETANO
No entanto, não podemos tomar nenhuma decisão. Estamos
sujeitos a essas reflexões em uma espiral contínua que nada resolve. O próprio
tempo em que nos dedicamos a este jogo de sombras nada mais é do que uma
fantasia de almas reveladas sem muita gravidade. Como um gerador de plasma
esquecido em um sarcófago egípcio. Beleza, verdade, culpa, perdão, só podem ser
reminiscências de um futuro simulado. A rigor, não passamos de um grande
engano, uma corrente rochosa construída como fonte de aparências. A humanidade
se tornou seu próprio trompe-l’oeil.
ASTRID
Como uma esfera delineada pelas características subjetivas
do conteúdo projetado para não mostrar nenhuma reação. Este é o nosso
verdadeiro castigo?
SANTIAGO
Estamos profundamente enterrados em nossos desejos. Talvez a
própria ideia de punição seja uma farsa. Fomos simplesmente esquecidos aqui
nesta caixa mortuária. Certamente iremos desaparecer um a um, como aconteceu
com ... Como se chama?
VALENTÍN
Abelardo.
SANTIAGO
Pois bem. Existe uma armadilha relacionada ao mecanismo do
tempo, que parece esquecimento. Na verdade, isso deve ser indiferença. A
verdade é indiferença. Esquecer é beleza. E nós somos as estátuas de sal desse
feitiço deplorável. O sal preserva os cadáveres da putrefação – como múmias
egípcias –, à diferença de que antes fomos desventrados. Nenhum de nós pode
intuir com certeza quando e como será sugado para o sarcófago que o espera há
milênios… [Uma chuva de sal cai
diretamente sobre Santiago e um buraco o suga sem que seus companheiros de cela
percebam seu desaparecimento. A escuridão ilumina seus fogos negros e o
silêncio envolve qualquer perspectiva da linguagem.]
ATO 3
Palco escuro. Mais uma vez a mesma peça de Edgar Varèse tocada por um
serrote com arco de violino e um xilofone de água. A luz vai aparecendo aos
poucos, à medida que a música vai sumindo, mostrando no centro do palco o mesmo
cubo de acrílico, onde estão apenas três dos criminosos condenados à morte
aguardando a data de sua execução. Abelardo e Santiago se foram. Astrid está
deitada no chão. Cayetano está sentado em um lado do cubo. Valentine anda de um
lado para o outro, inquieto.
VALENTÍN
Estou muito chateado com essa falta de fundamento que nos
faz desaparecer. Não estou preocupado com o destino de Abelardo e Santiago, mas
sim que sejamos eliminados sem nenhuma razão aparente ou poder de reação. Para
o inferno com o destino. O que me irrita é este incrível milagre do castigo:
bem-aventurados os que já não existem. É como uma seita religiosa, onde os
pacotes de sacrifício são vendidos sem que os tolos fiéis tenham o direito de
saber seus motivos. Eu teria a curiosidade de me lançar em uma realidade
paralela. Talvez tenhamos sido sequestrados para outra aldeia alienígena. Ou o
privilégio de uma metamorfose. Ah, como eu queria ser uma lontra! Mas não há
nada disso. Uma lágrima se abre na seda do espaço e simplesmente deixamos de
ser. Não é simplesmente estranho, mas desprezível, inaceitável.
CAYETANO
Neste cubo infernal, onde os problemas metafísicos não têm
lugar e onde o destino saiu de cena, não interessa pensar em um personagem a
mais ou a menos. Já se passou muito tempo desde que parei de me interessar pela
vida ou pelo que Valentín chama de desaparecimento. Você não percebe que não há
vida aqui? Quanto a mim, apenas vegeto. E vocês, incluindo Astrid La Pasionaria, existem apenas nos meus
piores pesadelos.
ASTRID
[Ela dá um pulo e não
esconde a indignação.] Seu problema, Cayetano, é justamente que você não honra
o seu nome. Você raramente fala e quando o faz é para ferir quem quer que
esteja à sua frente com o pior da fúria. Agora foi a minha vez. Não sei o crime
pelo qual você foi lançado no abismo inelutável deste cubo ou, pelo menos, não
tenho certeza se você nos disse a verdade. O que posso dizer é que meu crime,
se assim se pode chamar, é a busca da verdade e a denúncia da desgraça. Sim,
você pode rir o quanto quiser. Pelo menos à minha frente tenho barricadas que,
embora invencíveis, são reais. As revoluções raramente funcionam e, quando o
fazem, privilegiam apenas uma pequena parte da sociedade. No meu caso, acabei
neste buraco negro onde vermes como você vegetam e fedem. Eu admito, sou uma
perdedora, mas pelo menos tentei lutar um duelo contra o destino, algo que você
nunca faria.
VALENTÍN
Também acredito nessa possibilidade, Cayetano, de sermos o
pesadelo uns dos outros. Talvez estejamos cada um em seu próprio cubo, isolados
de tudo, sofrendo os efeitos de alguma droga inoculada e controlados pelo olhar
de uma equipe de bastardos malvados. Cada personagem delirante – este é um caso
em que a criação é pura ilusão – representa um estágio no labirinto de nosso
inconsciente. Aqueles que são eliminados devem expressar a impossibilidade de
encontrar uma solução para nossos aspectos depressivos. Talvez isso explique o
fato de que este cubo está completamente vazio por dentro. Nenhum lugar para
sentar ou mesmo aquele buraco característico de resíduos de uma cela de prisão.
Não há pia ou espelho. E até as paredes dão a impressão de que não há nada lá
fora. Uma coisa é certa: eles nos observam. Não há outra explicação. Resta
saber se somos cobaias de um sonho ou de um plano de vigília.
CAYETANO
Ah! Astrid, sou um sonhador. As palavras de Valentín me dão
uma mistura de alegria e preocupação. Na verdade, elas me assustam. Porque
sempre valorizei a integridade de meu cérebro. Planejo meus crimes com rigor
poético. Eu nunca escolheria minhas vítimas ao acaso ou me permitiria algum
tipo de falta de controle apaixonado que me levaria a matar alguém. Não sei
como você vai me julgar, Astrid, porque reconheço a seriedade de sua causa,
enquanto que eu me considero apenas um artista do crime. Certamente, o mundo
nunca estará disposto a aceitar minha poesia. Gosto de chamar assim a minha
inclinação para o perfeccionismo. Vivemos na terrível sombra da hipocrisia. Os
valores humanos são tão circunstanciais que a mesma pessoa pode atuar sob
diferentes prismas no mesmo dia. É por isso que as palavras de Valentín me
assombram, isto porque, como entendo a situação que ele evoca, penso em vocês
como meus outros eus, em uma constância de conflitos que podem eliminar esse
meu sonho.
ASTRID
Não sei se devo valorizar suas palavras ou temê-las, mas,
pelo menos você tem a coragem de abaixar a espada. O que eu realmente acredito
é que você é muito presunçoso quando fala de seus crimes como atos poéticos. Se
fossem assim, você não ficaria trancado aqui por não sei quanto tempo. Crimes
poéticos, se tal coisa existe, são perfeitos, e você está condenado ao
desaparecimento e ao esquecimento total. Tenho certeza de que nem mesmo se
lembra dos assassinatos. E essa é a pior das condenações.
VALENTÍN
Astrid, todos têm a possibilidade de construir o próprio
abismo, e Cayetano tem a profundidade do esquecimento. Para que lembrar? Nem
sabemos se no próximo segundo seremos capazes de nos contemplar e nos machucar.
Você gosta do voo dos abutres. É por isso que você planeja em círculos até
descer e pegar a presa. Bela revolucionária!
CAYETANO
Certamente concordo com Valentín. E sempre pensei no
esquecimento como uma dádiva. O esquecimento nos liberta do arrependimento e
das astúcias do ego. Não são poucos poetas que não se lembram de seus poemas. E
há um crime mais flagrante contra as letras do que contra o sangue. No entanto,
não se sabe de um mau escritor que tenha sido detido pela má qualidade de sua
obra. Os crimes também são uma expressão de fraude existencial. Em geral,
condenamos o que nos incomoda. Quando uma obra arquitetônica entra em colapso,
seu engenheiro calculista raramente é interrompido. Sem falar em crimes
políticos, catástrofes ambientais e amores traídos. Eu defendo que uma
sociedade deve revisar as lacunas criadas entre a lei e a justiça.
VALENTÍN
Mas de que adianta se insurgir contra alguma coisa agora?
Você acha que algum dia vamos sair daqui?
CAYETANO
Não, não é isso. O que pensamos não deve se limitar a um
universo pragmático. Nossas ideias nem sempre são passíveis de realização. Veja
a utopia incondicional de Astrid. Eu mesmo planejei muitos crimes que não
poderia cometer. E também há planos frustrados. Com tanto tratamento de
subornos, nossas sociedades – se podemos chamá-las de nossa – são um ponto de
apoio preciso do impossível. Claro que não vamos sair daqui, meu querido anão.
Ou sairemos como Abelardo e Santiago já partiram. Seremos drenados por um dos
bueiros da realidade. Na medida em que este cubo pode ser visto como uma
realidade. Agora, eu gostaria de saber quantos projetos de embalsamamento para
suas bonecas ficaram na gaveta, devido à impossibilidade de materialização.
ASTRID
A reflexão de Valentín é bastante aguda. Infelizmente
vivemos em uma época em que fazemos do historicismo o foco de todas as nossas
investigações, e ainda assim vivemos no esquecimento perene. A catástrofe de
ontem é esquecida em face da que vivemos hoje e então... ad infinitum... Além disso, uma grande parte da população humana
vive fora desse historicismo. Eles apenas se lembram de sua própria cosmogonia
e isso é mais do que suficiente. Poetas ruins às vezes são mais lembrados do
que bons. Estes nem circulam nas mãos dos leitores. E assim eu poderia
continuar listando a impossibilidade do ser humano de deixar uma marca,
sobretudo uma que seja válida para que quem vem atrás não se perca no caminho.
CAYETANO
Bem ... não acredito em tanto pessimismo. Penso, por
exemplo, na Nona Sinfonia de
Beethoven ou no Bolero de Ravel ou em
Michelangelo ou em Shakespeare e percebo que nem tudo está perdido.
VALENTÍN
Mas não se trata de se perder ou não. O ponto central é que
vivemos diante dessa impossibilidade: a perpetuidade do que somos. Somos
levados a acreditar que essa perpetuidade é fruto da competição. E que existe
um juiz supremo de nossas ideias e ações. Talvez, como uma forma secreta de
resistência, e é daí que vem a dissensão entre ideia e ato. Claro, o risco de
uma esquizofrenia generalizada era inevitável, o que acabou alimentando tanto o
empório das religiões quanto o ganho de capital da indústria farmacêutica.
CAYETANO
Você não dá importância a todas as grandes obras artísticas
da humanidade?
VALENTÍN
Como espectador delas, sim. No entanto, há duas coisas que
não posso deixar de considerar: as grandes obras do passado apenas confirmam
que estamos empobrecendo nosso espírito, ou então somos levados a uma nostalgia
corrosiva, que não nos permite ver que as obras do presente são igualmente
valiosas. Minhas bonecas, por exemplo, tenho a mesma consideração por todas
elas. Não acho que uma seja melhor do que outra. Mas é claro que, para que essa
perspectiva me sirva, devo manter meu senso crítico sempre renovado. Escolher
as meninas que ficarão bem cheias, aprimorar sempre as técnicas utilizadas etc.
Caso contrário, serei derrotado por uma falsa ambição de eternidade. [No final desta frase, Valentín continuou
gesticulando e falando, incapaz de ouvir sua voz. Astrid e Cayetano olharam
para ele espantados, indecisos sobre o que deveriam fazer. No entanto, tudo
correu muito rápido. O corpo de Valentín se desintegrou, como se ele estivesse
sendo levado para outro lugar. Logo desapareceu completamente e a escuridão
tomou conta da cena.]
ATO 4
Palco escuro. A mesma peça de Edgar Varèse é tocada pelos mesmos
serrote com arco de violino e xilofone de água. A luz vai aparecendo aos
poucos, à medida que a música vai sumindo, mostrando no centro do palco o mesmo
cubo de acrílico, onde estão apenas dois dos criminosos condenados à morte
aguardando a data de sua execução. Nem Abelardo, nem Santiago, nem Valentín
estão mais lá. Astrid e Cayetano estão sentados no chão, de costas para o
público.
ASTRID
Agora sabemos que um de nós será o próximo a partir, e temo
pela agonia solitária de quem for o último.
CAYETANO
Antes você disse que não tinha medo da morte ou do
desaparecimento. E agora você começa a imaginar um fim carregado de solidão? Há
quanto tempo vivemos aqui sem ele? Podemos ser gregários, podemos viver neste
cubo com outra pessoa – como é o nosso caso –, e ainda assim a solidão está lá.
No que me diz respeito, é a minha única companhia, não preciso de mais ninguém.
O que eu preciso é de silêncio e você fala demais.
ASTRID
Nós vivemos aqui possivelmente por séculos e você ainda me
culpa por minha existência? De certa forma, quem tem medo é você. Você é
incapaz de suportar a presença de outro ser humano. Talvez porque seus crimes
sejam tão hediondos que você prefere que ninguém olhe nos seus olhos. Ou você
ainda acredita na redenção? Nesse caso, você é ainda mais ingênuo do que eu
pensava. E a ingenuidade é algo pelo que se paga caro neste abismo em que
vegetamos. [Um silêncio constrangedor
toma conta daquele momento. Logo um arranhão circular aparece no chão, cujo
conteúdo está manchado de preto. Astrid é a primeira a notar o que parece ser
um buraco.] Olhe para isso. Então chegou a hora de um de nós?
CAYETANO
Não acredito. Deve haver outro motivo para este buraco. Na
verdade, é realmente um buraco? [Cayetano
entra no buraco e nada acontece.] É só uma farsa, um buraco falso.
ASTRID
Talvez este cubo também seja apenas uma aparência. Afinal,
nenhum de nós tocou suas paredes. [Astrid,
dizendo isso, toca uma das paredes do cubo.] É muito sólido, não é uma
mentira. Estamos realmente presos aqui.
CAYETANO
Este buraco sem vida deve ser pura provocação.
ASTRID
Ou talvez algo que nos avise que devemos fazer melhor uso de
nosso tempo. Talvez devêssemos posicionar melhor nossos medos. Você quer
começar?
CAYETANO
Não sei por que você fala de medo. Pelo menos não faça no
plural. A solidez das paredes deste cubo só existe em pesadelos e nossas vidas
são apenas isto, pesadelos. É bem possível que você não exista e que seja
apenas um monstro que eu mesmo engendrei nas longas noites sem dormir. Para que
eu possa imaginar a cada momento o assédio e tortura que posso lhe infligir.
Também me deleito com as várias maneiras de assassiná-lo. E, para dizer a
verdade, elas são infinitas.
ASTRID
Bem… bem… bem… Passo a citar: – O sonho da razão produz monstros. Agora, quando você já está com um
pé na outra dimensão, está se referindo a Goya? Nunca escondo que o medo faz
parte de meu devir. Sem medo, eu não seria nada. O medo me mantém alerta.
Talvez seja por isso que você nunca foi capaz de me torturar, muito menos me
matar. Éramos cinco prisioneiros, quatro homens e eu, que sou mulher. É até
possível que você desapareça antes de mim. Assim, pelo menos as estatísticas
parecem confirmá-lo.
CAYETANO
Na verdade, nunca pensei em nenhum de nós como quatro homens
e uma mulher. Assim que cheguei aqui percebi que talvez fôssemos parte de um
contrato ou de uma estratégia para mudar a órbita da realidade. Talvez sejamos
a mesma pessoa, desfigurados por transmutações de diferentes dimensões. De que
outra forma podemos aceitar o esquecimento de como acabamos aqui? E enquanto
nos eliminavam, um a um, que forças elétricas justificariam isso? Não sabemos
se Abelardo e os outros dois, cujos nomes já não me lembro, foram assassinados
ou não. Na verdade, nem sabemos se eles existiram.
ASTRID
Essas dúvidas também são válidas para nós. Alguém está
traficando em nossas memórias ou somos apenas uma hipótese incompreensível de
transmigração de almas? Agora que somos apenas nós dois, o que somos? Ou
melhor: somos dois ou apenas um projetando sobre o outro uma expansão de suas
angústias paralelas, que de outra forma não seria capaz de distingui-las? E o
fato desta morada misteriosa que pensamos seja uma prisão estar hermeticamente
fechada, de impossível comunicação entre o interior e o exterior, não lhe
assusta? Entro em pânico, principalmente quando penso que a qualquer momento –
e como os momentos são confusos nunca saberemos se é ontem ou amanhã – posso
ficar aqui verdadeiramente sozinha.
CAYETANO
Esta é a sua condenação ou a minha? Ter que suportar seu
medo deve ser como suportar minhas dúvidas. Em todo caso, a única certeza é que
vivemos em uma enteléquia. Você não sabe se eu existo e para mim você só existe
na medida em que eu a imagino. E já que às vezes eu nem penso em você, mesmo
estando à minha frente, você simplesmente deixa de existir. Nisso, Platão
permanece um filósofo necessário e contemporâneo.
ASTRID
Toda essa verborragia com a qual você quer parecer culto,
refinado e profundo serve apenas para escondê-lo de seus próprios medos. A
prova é que você mal falava antes. E agora, quando os outros companheiros
desapareceram, você não para de tagarelar como um papagaio molhado. Você é
patético! Que pena que você me dá!
CAYETANO
Agora finalmente entendo o que está acontecendo. Você está
articulando uma distração no funcionamento desta maldita caixa, então sou o
próximo a ser eliminado. Tanto é que, enquanto falo, já sinto que estou
desbotando, mesmo na ausência de espelhos me vejo perdendo a forma. Você não
terá proteção em sua solidão. Você não encontrará refúgio em seus sonhos porque
não conseguirá dormir. Você não vai decifrar os enigmas de sua loucura porque
não haverá mais simultaneidade de abismos. Você terá o final mais rude e nem
vai perceber. Quando ele desaparecer completamente, você não existirá mais.
ASTRID
É por isso que você está saindo imediatamente, porque
prefiro enfrentar o vazio do que ficar ao seu lado. Para o inferno com você! [A última frase foi gritada no escuro.]
ATO 5
Palco escuro. Ouvimos a mesma peça de Edgar Varèse, mas desta vez
executada apenas pelo serrote com arco de violino. Quando a luz acende,
encontramos o corpo nu de Astrid deitado no chão. A música para e ela se senta,
cobrindo o rosto com as mãos.
ASTRID
Tenho medo de abrir os olhos e me encontrar cercada de
fantasmas. Essas sombras silenciosas que se alimentam de nosso medo. A memória
está cheia de fantasmas. As experiências insatisfatórias, as farsas oníricas,
as frustrações da vigília. De repente, aparecem as silhuetas de mundos
paralelos, a desfiguração de nossas ansiedades e conflitos. Procuro um padrão,
o esboço de um roteiro desta existência que nos massacra. Não acho que a
sequência de substituições dos infratores com os quais compartilhei este cubo
foi o padrão que poderia apontar para uma lógica aceitável. Talvez as variações
da música que regem cada ciclo. Talvez a maneira como minha memória se reduziu
a quem eu sou e não tenho certeza de quem poderia ser. Se eu fosse deixada para
ser a última, poderia ser a bandeira de um castigo previamente designado, ou um
reflexo da anarquia que caracterizou minha vida, a ponto de a sociedade me
considerar uma criminosa. Eu deveria rir agora. Lembro-me de outros cativeiros,
compartilhados com cúmplices de viagens, que sempre foram muito sérios,
enquanto eu argumentava que a anarquia não poderia existir sem uma intensa dose
de humor. O mundo que pretendemos destronar, destruir sua prescrição de valores
morais, seu cartão de renúncia, este mundo, antes mesmo de ser lamentável, é
risível, e a mera necessidade de uma ruptura anarquista é um fato ridículo. E
que eu seja – qualquer um pensaria – a pessoa certa para semear essa bagunça, é
motivo para rir. [Aos poucos ela se
levanta e se move de um lado para o outro, seus olhos perdidos e o medo
apertando suas mãos.] O abismo é possivelmente a força mais poderosa que
existe no universo. Ele é o criador e o destruidor. Por isso nos atrai como se
fosse um imenso ímã que gravita no centro da Terra. Seus dedos, longos e
calejados, movem os fios em que cada um de nós está pendurado. Sei que minha
hora final está aqui, ao meu lado, bastará olhar nos meus olhos por um milésimo
de segundo para que o ímã me absorva sem deixar vestígios. O que vai sobrar de
mim? Nada, nem mesmo a memória de meu fracasso monumental. Já não há
testemunhas, nem fotos, nem vídeos que deem conta da minha passagem pelo mundo
ou por este cubo que absorveu a parte mais longa da minha efémera existência. O
esquecimento é um rei que dá xeque-mate na rainha… e eu nem cheguei a ser um
peão. Em todo caso, fica a questão de quanto tempo eu poderia ter ficado nesses
vazios da existência em que nos perdemos. Este espaço, que supostamente habito,
é um reflexo do absurdo, e talvez seja ele quem me habita, talvez eu seja a
casa desse vazio. Uma forma estranha de estar no mundo. Eu olho para o meu
corpo e tento me lembrar do meu rosto. Sempre pensei que os espelhos são uma
espécie de contaminação da alma, um veneno que desfigura o íntimo. E agora
preciso recorrer à memória ou à imaginação para revelar minhas feições. [Ela toca o rosto com as mãos.] Tenho
medo de descobrir que não faz sentido saber quem eu sou. Até o significado de
estar aqui, isolada de tudo, que bem me fará saber? Eu sou Narcisa e quando dei
as costas para o meu próprio eco em meus punhos cresceram correntes infinitas
que me impedem de seguir em frente. De certo modo são uma gruta cujo silêncio
torna ainda mais infernal a solidão em que afundo inexoravelmente. E se não me
lancei nas águas é porque neste inferno elas não existem e a minha memória é
incapaz de as recordar na medida certa. A solidão me sufoca, impede-me de
respirar, e quando penso que chegou o fim, a última hora, sai das entranhas da
cavidade torácica um sopro que me impede de afundar no nada. Segundos depois, a
tortura começa novamente. Vegeto na minha própria sujeira, rastejo como um
réptil condenado a viver no pavor. [Ela
continua a andar de um lado para o outro da caixa, quando de repente a luz
começa a se apagar, como se fosse queimar.] O que é isso? É este o primeiro
sinal da realidade, a existência de uma luz, embora só a tenha percebido em
seus últimos momentos? Que morte nos espera, a minha ou a da luz? Mais cedo ou
mais tarde, tudo parece estar voltado para o reverso. O olhar acidentado
daquela lua decadente agora me lembra que essa ausência de tudo que eu
encontrei um dia seria preenchida com algo, como alguém se virando e finalmente
descobrindo coisas inimagináveis. Mas o que vou descobrir agora, quando é mais
provável que ela já esteja morta? [A luz
se apaga completamente e, em seguida, um fio de luz em movimento aparece acima
da cabeça de Astrid, acompanhando-a onde quer que ela caminhe dentro do cubo.]
Talvez eu esteja morta há décadas e nunca aceitei isso. Senão, como entender
que neste cubo vegeto sem comer, sem beber, sem banheiro, sem banho? Como
entender a presença fantasmagórica dos quatro condenados à morte com os quais
compartilhei este espaço miserável e a quem estava unida pelo desespero e pela
infâmia? Mesmo assim, devo admitir que esse legado deixa suas marcas e até
lições. Embora o que aprendemos nem sempre seja o que sonhamos em nossa
juventude. A realidade é um jogo de espelhos infinitos em que nos perdemos como
se fosse um labirinto. Apenas neste caso não há Ariadnas para ajudar com fios
ou Dédalos para construir asas para voar para longe. Não há nem sombra. Mesmo
com aquela luz que desce de um teto imaginário, que me segue como um animal
faminto. Não há sombra. Só posso imaginar a projeção de meu corpo no mundo. E
como não vejo meus olhos, também não consigo ver o que está acontecendo dentro
de mim. A verdadeira anarquia deve ser aquela confiança cega na imaginação. Sem
parâmetros, bússola, história. A cada passo um novo abismo se forma e nós
mergulhamos nele como se nada pudesse nos alcançar. A escuridão é uma obsessão
que não conhece a anarquia. O caos é a caneta com a qual escrevemos nossas
vidas. A anarquia, por outro lado, é a verdadeira fonte do inesperado, do
indecifrável. É inútil saber o nome das coisas. A origem de cada ser é uma
ilusão atribuída à nossa fragilidade emocional. [Enquanto Astrid fala, o fio de luz é reduzido a quase nada, até que
desapareça completamente, deixando a cena completamente escura. Em silêncio por
um momento. Ouve-se um grito de júbilo.] Ah, essa luz já não me cega. Esse
abismo já não me engole. Só entrei no túnel que não tem caminho de volta, a luz
conduz meus passos até o fundo de sua boca, não caminho, não salto, não danço.
E, no entanto, me movo com grande facilidade, como se tivesse asas nos
tornozelos. Talvez seja Dédalo que os colocou sem que eu percebesse. [Um segundo de silêncio.] A escuridão não
me domina mais. Não preciso de fantasmas ou utopias. Estou preenchida nessa
ausência absoluta de tudo. Viva? Morta? Não importa. Um dia, todos nós
aprenderemos a ser exatamente isso. Nada. [O
palco permanece escuro, as cortinas estão fechadas. Fim do quinto e último ato.]
∞
BERTA LUCÍA ESTRADA (Colômbia, 1955). Poeta, dramaturga, crítica literária e de arte, autora do blog El Hilo de Ariadna do jornal El Espectador (Colômbia). Membro do PEN Internacional/Colômbia. Ela é uma livre-pensadora, feminista, ateia e defensora da alteridade. Publicou treze livros, entre eles La route du miroir (poesía, 2012), Náufraga Perpetua (ensaio poético, 2012), Trilogía de la agonía (comprende las siguientes obras: El museo del Visionario, Naufragios del Tiempo y Las sombras suspensas –escritas a quatro mãos com Floriano Martins, 2021).
∞
A GRANDE OBRA DA CARNE
A poesia de Floriano Martins
1991 Cinzas do sol
1991 Sábias areias
1994 Tumultúmulos
1998 Autorretrato
2003-2017 Floração de centelhas [com Beatriz Bajo]
2004 Antes da queda
2004 Lusbet &
o olho do abismo abundante
2004 Prodígio das tintas
2004-2015 Estudos de pele
2004-2017 Mecânica do abismo
2005 A queda
2005 Extravio de noites
2006 A noite em tua pele impressa
2006 Duas mentiras
2006-2007 Autobiografia de um truque
2007 Teatro impossível
2008 Sobras de Deus
2008 Blacktown
Hospital Bed 23
2009-2010 Efígies suspeitas
2010 Joias do abismo
2010-2011 Antes que a árvore se feche
2012 O livro invisível de William Burroughs
2012-2014 Em silêncio [com
Viviane de Santana Paulo]
2013 Anatomia suspeita da realidade
2013 My favorite things [com
Manuel Iris]
2013 Sonho de uma última paixão
2013-2015 Breviário dos animais fabulosos fugidos da memória
2014 Mobília de disfarces
2014 O sol e as sombras
2014-2015 Reflexões sobre o inverossímil
2015 Enigmas circulares
2015 Improviso para dois pianos [com Farah Hallal]
2016 Cine Azteka [com Zuca
Sardan]
2016 Circo Cyclame [com Zuca Sardan]
2016 Trem Carthago [com Zuca Sardan]
2016 A vida acidental de Aurora Leonardos
2016 Altares do caos
2016-2017 Convulsiva taça dos desejos [com Leila Ferraz]
2016-2017 Obra prima da confusão entre dois mundos
2017 O livro
desmedido de William Blake
2017 Antigas formas do abandono
2017 Manuscrito das obsessões inexatas
2017-2020 A volta da baleia Beluxa [com Zuca Sardan]
2017-2022 Nenhuma voz caba no silêncio de outra
2018 Atlas revirado
2018 Tabula rasa
2018 Vestígios deleitosos do azar
2021 Las mujeres desaparecidas
2021 Museu do visionário [com Berta Lucía Estrada]
2021 Naufrágios do tempo [com Berta Lucía Estrada]
2022 As sombras suspensas [com Berta Lucía Estrada]
2022 Las resurrecciones íntimas [com Berta Lucía Estrada]
2023 Huesos de los presságios [con Fernando Cuartas Acosta]
2023 Inventário da pintura de uma época
2023 Letras del fuego [con Susana
Wald]
2023 Primeiro verão longe de casa
∞
1991-2023 Mesa crítica
[Prefácios, posfácios, orelhas]
2013-2017 Manuscritos
∞
Poeta,
tradutor, ensaísta, artista plástico, dramaturgo, FLORIANO MARTINS (Brasil,
1957) é conhecido por haver criado, em 1999, a Agulha Revista de
Cultura, veículo pioneiro de circulação pela Internet e dedicado à difusão
de estudos críticos sobre arte e cultura. Ao longo de 23 anos de ininterrupta
atividade editorial, a revista ampliou seu espectro, assimilando uma editora, a
ARC Edições e alguns projetos paralelos, de que são exemplo “Conexão Hispânica”
e “Atlas Lírico da América Hispânica”, este último uma parceria com a revista
brasileira Acrobata. O trabalho de Floriano também se estende pela
pesquisa, em especial o estudo da tradição lírica hispano-americana e o
Surrealismo, temas sobre os quais tem alguns livros publicados. Como artista
plástico, desde a descoberta da colagem vem desenvolvendo, com singular
maestria, experiências que mesclam a fotografia digital, o vídeo, a colagem, a ensamblagem
e outros recursos. Como ele próprio afirma, o magma de toda essa efervescência
criativa se localiza na poesia, na escritura de poemas, na experiência com o
verso, inclusive a prosa poética, da qual é um dos grandes cultores. A
grande obra da carne – título emprestado de um de seus livros, é uma
biblioteca desenvolvida como espaço paralelo dentro da Agulha Revista
de Cultura, a partir de uma ideia do próprio Floriano Martins, de modo a
propiciar acesso gratuito a toda a sua produção poética.
∞
OBRA POÉTICA PUBLICADA
Cinzas
do sol.
Rio de Janeiro: Mundo Manual Edições, 1991.
Sábias
areias.
Rio de Janeiro: Mundo Manual Edições, 1991.
Tumultúmulos. Rio de Janeiro: Mundo Manual
Edições, 1994.
Ashes of the sun. Translated
by Margaret Jull Costa. The myth of the world. Vol. 2. The
Dedalus Book of Surrealism. London: Dedalus Ltd., 1994.
Alma em chamas. Fortaleza:
Letra & Música, 1998.
Cenizas del sol [con Edgar
Zúñiga]. San José, Costa Rica: Ediciones Andrómeda, 2001.
Extravio
de noites.
Caxias do Sul: Poetas de Orpheu, 2001.
Estudos
de pele.
Rio de Janeiro: Lamparina, 2004.
Tres estudios para un amor loco.
Trad. Marta Spagnuolo. México: Alforja Arte y Literatura A.C., 2006.
La noche impresa en tu piel. Trad. Marta Spagnuolo. Caracas:
Taller Editorial El Pez Soluble, 2006.
Duas
mentiras.
São Paulo: Edições Projeto Dulcinéia Catadora, 2008.
Sobras de Deus.
Santa Catarina: Edições Nephelibata, 2008.
Teatro imposible. Trad. Marta
Spagnuolo. Caracas: Fundación Editorial El Perro y La Rana.
2008.
A
alma desfeita em corpo. Lisboa:
Apenas Livros, 2009.
Fuego en las cartas. Trad. Blanca
Luz Pulido. Huelva, España: Ayuntamiento de Punta Umbría, Colección Palabra
Ibérica, 2009.
Autobiografia
de um truque.
São Pedro de Alcântara: Edições Nephelibata, 2010.
Delante del fuego. Selección y
traducción de Benjamín Valdivia. Guanajuato, México: Azafrán y Cinabrio
Ediciones, 2010.
Abismanto [com Viviane de Santana Paulo].
Natal: Sol Negro Edições, 2012.
O livro invisível de
William Burroughs. Natal: Sol Negro Edições, 2012.
Lembrança
de homens que não existiam [com
Valdir Rocha]. Fortaleza: ARC Edições, 2013.
Em
silêncio [com
Viviane de Santana Paulo]. Fortaleza: ARC Edições, 2014.
Overnight medley [com
Manuel Iris]. Trad.
ao espanhol (Juan Cameron) e ao inglês (Allan Vidigal). Fortaleza: ARC Edições,
2014.
O
sol e as sombras [com
Valdir Rocha]. São Paulo: Pantemporâneo, 2014.
A
vida inesperada.
Fortaleza: ARC Edições, 2015.
Circo Cyclame [com Zuca Sardan]. Fortaleza: ARC
Edições, 2016.
O iluminismo é uma baleia [com Zuca Sardan]. Fortaleza: ARC Edições,
2016.
Espelho
náufrago.
Lisboa: Apenas Livros, 2017.
A
grande obra da carne.
Fortaleza: ARC Edições, 2017.
Tabula
rasa [com
Valdir Rocha]. Fortaleza: ARC Edições, 2018.
Antes
que a árvore se feche (poesia
reunida). Fortaleza: ARC Edições, 2018.
Tríptico da agonia [com Berta Lucía Estrada]. Fortaleza:
ARC Edições, 2021.
Las mujeres desaparecidas. Santiago,
Chile: LP5 Editora, 2021.
Un día fui Aurora Leonardos.
Quito: Línea Imaginaria Ediciones, 2022.
El frutero de los sueños. Wilmington, USA: Generis Publishing,
2023.
Sombras no jardim. Fortaleza: ARC Edições, 2023.
∞
Agulha Revista de Cultura
Criada por Floriano Martins
Dirigida por Elys Regina Zils
https://arcagulharevistadecultura.blogspot.com/
1999-2024
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